Pedro do Coutto
A presidente Dilma Roussef pediu aos empresários peso-pesados, com quem se encontrou quinta-feira no Planalto, para que pressionem o Congresso Nacional no sentido de que o Legislativo cumpra sua obrigação de votar matérias do interesse nacional e não transformar esse dever em matéria de troco por nomeações importantes na administração.
Reportagem de Gerson Camarotti focalizou o tema, acompanhado por foto de Gustavo Miranda, edição de sexta-feira 23. Nesse mesmo dia, Merval Pereira comentou o assunto com o brilho de sempre. O apelo foi marcante, realçou o drama que ela vive no Palácio do Planalto. Mas foi feito na direção errada. Apelar aos empresários, por ação tácita, é reforçar ainda mais o poder econômico que já está presente, de forma direta e indireta, nas decisões e iniciativas de muitos deputados e senadores.
Ela deveria dirigir-se ao povo nas ruas para que se mobilizasse e, assim, enfrentar a imobilidade parlamentar que está ocorrendo, não por discordância quanto aos projetos em pauta, mas sim em função de interesses contrariados ou então não atendidos.
A recondução de Bernardo Figueiredo à direção geral do Departamento Nacional de Transportes Terrestres foi rejeitada sem mais nem menos. Por causa de controvérsias em torno do Código Florestal, fomentadas pela bancada ruralista, a Lei da Copa de 2014 também não foi votada. Houve obstrução, um tipo de conspiração pelo silêncio.
Paralisados permanecem os projetos da nova lei dos Royalties, que aliás prejudica frontalmente o estado do Rio de Janeiro, e o Fundo Complementar de Aposentadoria dos Servidores Públicos. Assunto este extremamente complexo sobre o qual voam interesses potenciais da rede bancária. Pois os bancos administrariam o Fundo, ou os Fundos, depende do texto final.
Mas as dúvidas agora não importam. Importam, isso sim, as decisões. E estas somente podem ser tomadas se a Câmara e o Senado resolverem trabalhar e não adiar tudo, como de costume. Costume, diga-se de passagem, intoxicante. Como é altamente intoxicante a lentidão da Justiça brasileira.
Às vezes, como ocorreu comigo, um simples despacho de um desembargador federal aguarda 27 meses. Duas linhas de texto, no máximo, 27 meses. Não tem cabimento.Mas este é outro assunto, embora emblemático do entorpecimento que envolve as soluções neste país. Para não esquecer um exemplo definitivo: a construção da Perimetral sobre a Avenida Rodrigues Alves, estendeu-se de 1962 a 1979. Começou no governo Lacerda, foi concluída por Chagas Freitas.
Mas me referia à falta de votação proposital de senadores e deputados. Matérias controvertidas na pauta. Em função disso, recordo um discurso feito na Câmara Federal, em 63, pelo deputado Guerreiro Ramos, também sociólogo de renome, um intelectual na política. Era suplente do PTB carioca e assumiu quando Leonel Brizola decidiu licenciar-se. O tema em foco era a reforma agrária. O maior debate da época, problema aliás que continua sem solução. De um lado os defensores da reforma, de outro os contrários.
A questão chave era a desapropriação de latifúndios improdutivos com indenizações em títulos públicos. O debate incendiava o país. Carlos Lacerda, como governador da Guanabara, Herbert Levy, deputado por São Paulo, na época grande acionista do Banco Itaú, contra a reforma. O governo João Goulart a favor. Alberto Guerreiro Ramos, autor da Redução Sociológica, grande obra no gênero, sustentou apenas o seguinte: há várias tendências em choque. Mas todos concordam que o meio agrário é medieval. Então apresentem suas propostas, todos, pois só dessa forma chegaremos à síntese.
A síntese de Dilma Roussef é a opinião pública, o povo nas ruas, não o empresariado.
Fonte: Tribuna da Internet.
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