Por Fábio de Oliveira Ribeiro
Joaquim Barbosa foi o primeiro negro a
assumir uma cadeira no STF. Não foi o primeiro a protagonizar um
bate-boca no Tribunal, mas certamente foi o primeiro a ser filmado
fazendo isto. Foi o primeiro negro a presidir a Corte e também o que
mais irritou a comunidade jurídica em razão de seu autoritarismo e
incontinência verbal.
Sua ascensão meteórica, alavancada pelo
apoio que granjeou na mídia ao aceitar a protelação do mensalão tucano
(mais antigo) e julgar com rigor exagerado o mensalão petista, o
transformou em candidato presidencial em potencial. Durante algum tempo
ele pareceu alimentar a idéia. Mas quando a rejeitou de maneira
inequívoca, Joaquim Barbosa desagradou bastante a mídia brasileira (que
parece estar sempre a procura de um salvador da pátria que possa ser
manipulado).
JB não se notabilizou pelas posições
confortáveis. Mas as polêmicas jurídicas que criou não acrescentaram
brilho à administração da justiça no Brasil. Digo isto pensando
especialmente no mau uso que ele fez da teoria do domínio do fato para
condenar petistas sem provas e apesar da presunção constitucional de
inocência que eles deveriam gozar. Sob seu comando o STF passou a ser
pautado pela imprensa, que adora exercer um poder político absoluto e
extra-constitucional que não lhe foi atribuído pela CF/88.
A mesma imprensa que elevou JB derrubou
D. Pedro I, exilou D. Pedro II, matou Getúlio Vargas e depôs João
Goulart. O que teria ocorrido ao “menino pobre que salvou o Brasil” se
ele tivesse escolhido aplicar serenamente a Lei no caso do mensalão
petista? JB não caiu porque não tinha o apoio da imprensa. A julgar por
algumas manchetes de jornal ele ainda o tem ao abandonar o STF. A
imprensa poderia dizer que lhe faltou a fibra e o destemor de Ricardo
Lewandowiski, Ministro que foi intensa e cruelmente hostilizado pelos
jornalistas durante o julgamento do mensalão. Preferiu transformá-lo em
vítima. Há um racismo sutil e estilizado na conduta da mídia.
No momento de sua queda, JB é tratado
não como o “menino pobre que mudou o Brasil” e sim como o “menino negro”
cujo pirulito foi roubado depois de algumas lambidas. A indignação
hipócrita neste caso mal esconde o ódio que a imprensa devota a todos
que não se prestam a fazer o que os jornalistas desejam (José Dirceu e
José Genoino que o digam). JB andou pelo tapete vermelho e recusou a
coroação. Antes de concluir a tarefa que lhe foi atribuída pela imprensa
(perseguir implacavelmente os petistas enquanto os mensaleiros tucanos
não seriam incomodados), o negro aposentou-se mais cedo. Cedeu às
“forças ocultas”, dizem alguns jornalistas? Duvido muito, pois se
tivesse cedido teria ficado no cargo até o fim e quem sabe até disputado
a presidência como um teleguiado das 7 famílias midiáticas. A renúncia
de JB pode ser interpretada como um ato de traição à mídia?
Sim e não. Sim porque ao deixar o palco
ele terá que ser esquecido. JB não virará estrela, apenas paradigma.
Doravante, toda e qualquer decisão que não seja truculenta e beneficie
os réus do mensalão arrancará suspiros e recordações dos tempos
gloriosos em que o “juiz negro” tratava os bandidos com rigor
carcerário. Não porque após três derrotas evidentes em eleições
presidenciais a imprensa brasileira talvez já tenha percebido que não
pode mais controlar sozinha a democracia brasileira. Isto explica os
arroubos autoritários e saudosismos da ditadura que fazem eco cá e lá. O
contexto não é muito favorável à soluções ditatoriais. Se apostar num
golpe a própria imprensa será mortalmente golpeada.
Talvez JB, que é suficientemente
inteligente, tenha percebido o risco de se render totalmente ao canto da
sereia midiática. Nesse sentido, sua renúncia pode ser interpretada
como um ato digno. Ele não sai do STF para entrar na História. Ele entra
na História porque saiu do Tribunal possibilitando que a Corte
Constitucional recupere sua moderação, sua independência da mídia e,
sobretudo, sua vocação para cumprir e fazer cumprir uma boa
constituição.
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