Balanço de dez anos de governos pós-neoliberais
“O Brasil, famoso por ser o país mais desigual do continente mais desigual do mundo, vive, pela primeira vez, profundos processos de combate à pobreza, à miséria e à desigualdade”Segundo Emir, são governos que, para superar a pesada herança econômica, social e política recebida, priorizam um modelo de desenvolvimento intrinsecamente articulado com políticas sociais redistributivas, colocando a ênfase nos direitos sociais e não nos mecanismos de mercado. Buscam o resgate do Estado como condutor do crescimento econômico e garantia dos direitos sociais a toda a população. Colocam em prática políticas externas focadas nos processos de integração regional e nos intercâmbios Sul-Sul e não nos Tratados (unilaterais) de Livre Comércio com os EUA.
Os resultados são evidentes: o Brasil, famoso por ser o país mais desigual do continente mais desigual do mundo, vive, pela primeira vez, profundos processos de combate à pobreza, à miséria e à desigualdade, que já lograram transformar de maneira significativa a estrutura social do país, promovendo formas maciças de ascensão econômica e social, com acesso a direitos fundamentais para dezenas de milhões de brasileiros.
Dotando o Estado brasileiro de capacidade de ação, estamos podendo reagir aos efeitos recessivos da mais forte crise econômica internacional das ultimas oito décadas, mantendo o crescimento da economia e estendendo, ainda que em situações econômicas adversas, as políticas sociais redistributivas.
Por outro lado, políticas externas soberanas projetaram o Brasil como uma das lideranças emergentes em um mundo em crise de hegemonia, com iniciativas coletivas e solidárias, com propostas que apontam para um mundo multipolar, centrado em resoluções políticas pacíficas dos focos de conflitos e em formas de cooperação solidária para o desenvolvimento das regiões mais atrasadas.
No entanto, esses governos recebem uma pesada herança de um passado recente de enormes retrocessos de todo tipo. O Brasil – assim como a América Latina – passou pela crise da dívida, que encerrou o mais longo ciclo de crescimento econômico da nossa história, iniciado nos anos 1930 com a reação à crise de 1929. Sofreu os efeitos da ditadura militar, de mais de duas décadas, que quebrou a capacidade de resistência do movimento popular, preparando as condições para o outro fenômeno regressivo. Os governos neoliberais, de mais de uma década – de Collor a FHC – completaram esse processo regressivo do ponto de vista econômico, social e ideológico.
Assim, Lula não retoma o processo de desenvolvimento econômico e social onde ele havia sido estancado, mas recebe uma herança que inclui não apenas uma profunda e prolongada recessão, mas um Estado desarticulado, uma economia penetrada pelo capital estrangeiro, um mercado interno escancarado para o mercado internacional, uma sociedade fragmentada, com a maior parte dos trabalhadores sem contrato de trabalho.
Sader ensina: “O segredo do sucesso do governo Lula, seguido pelo de Dilma, está na ruptura em três aspectos essenciais do modelo neoliberal:
- a prioridade das políticas sociais e não do ajuste fiscal, mantido em funções dessas políticas;
- a prioridade dos processos de integração regional e das alianças Sul-Sul e não de Tratado de Livre Comércio com os EUA
- a retomada do papel do Estado como indutor do crescimento econômico e garantia dos direitos sociais, deslocando a centralidade do mercado pregada e praticada pelo neoliberalismo.”
Essas características constituem o eixo do modelo pós-neoliberal – comum a todos os governos progressistas latino-americanos – que faz do continente um caso particular de única região do mundo que apresenta um conjunto de governos que pretendem superar o neoliberalismo e que desenvolvem projetos de integração regional autônomos em relação aos EUA.
E conclui: “Foi uma década essencial no Brasil, não apenas pelas transformações essenciais sofridas pelo país, mas também porque reverteu tendências históricas, especialmente quanto à desigualdade, que tinham feito do Brasil o país mais desigual do continente mais desigual do mundo .A década merece uma reflexão profunda e sistemática, que parta da herança recebida, analise os avanços realizados e projete as perspectivas, os problemas e o futuro do Brasil.”
Até porque, lembrando em certo pensador francês cujo nome agora me escapa: “Quando o passado não ilumina o futuro, o homem tateia no escuro”.
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