Gosto muito de ler a coluna do Carlos Heitor Cony na "Folha", um verdadeiro oásis em meio ao deserto de homens e ideias emque vivemos, pois o grande cronista não se limita a comentar os fatos do dia a dia, mas sempre vai além, faz a gente pensar um pouco sobre o rumo das coisas.
Nesta terça-feira, por exemplo, Cony escreve sobre as chamadas "notícias enguiçadas", a feliz expressão criada por outro escriba que admiro, o Tutty Vasquez, do "Estadão":
"Com a renúncia do papa, o incêndio numa boate em Santa Maria (no Rio Grande do Sul), o desfile cafona no tapete vermelho, a rotineira e discutível premiação da Academia de Hollywwod, mais uma vez a mídia revelou seu culto à redundância".
Poderia acrescentar também a cobertura dos julgamentos sem fim, sai um entra
outro, a doença de Hugo Chavez, a onipresença de Neymar, o eterno Fla-Flu da disputa política, os royalties do petróleo...
Parece que o noticiário fica dando voltas em torno do próprio rabo, girando em moto contínuo nas velhas e nas novas mídias.
A cada dia sinto mais dificuldades para encontrar um assunto novo que seja realmente capaz de surpreender a mim e ao leitor, que tenha algo a ver com a vida real, uma história que valha a pena ser contada.
Este desafio não se limita à mídia, como mostra Cony, ao lembrar do que aconteceu com o grande ator Walmor Chagas:
"Numa entrevista feita dias antes de se suicidar, Walmor Chagas também criticou a redundância de temas e recursos do teatro e do cinema, principalmente aqui, no Brasil.
Revelou que continuava a receber convites para atuar no palco, nas telas e na televisão, afinal, era um dos maiores atores em atividade. Mas os projetos que recebia eram tão repetitivos e alienados que ele recusava. Preferiu ir embora a aceitar papéis e temas que nada diziam à sua formação e ao seu gosto".
Com o título "Desprezo ao homem comum", Cony também faz referência na coluna a outra característica da mídia atual:
"O homem comum pouco aparece nas diversas mídias tradicionais, com exceção, talvez, dos desabafos e ressentimentos despejados na internet".
Em quaquer atividade, a gente precisa não só gostar do que faz, mas também ver um sentido no nosso trabalho _ não pode ser só para ganhar um salário no final do mes e pagar as nossas contas em dia.
Ao ler a reflexão feita hoje pelo nosso incansável cronista-romancista-pensador, que, entre outras virtudes, tem a capacidade de rir e debochar dele mesmo, e de não confundir cara feia com seriedade, eu me senti menos sozinho nesta dura tarefa de escrever quase todos os dias da vida sem cair na redundância e sem desanimar.
Qual é o segredo, caro Cony?
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