01 MARÇO 2013
O catastrofismo durou pouco
Luciano Martins Costa, Observatório daImprensa
“Um dos pressupostos essenciais do noticiário econômico é a busca da objetividade, e basta um pequeno desvio de método para que o resultado seja jornalismo de qualidade discutível. O risco maior é sempre dos diários, condicionados por um limite de tempo que nem sempre coincide com a possibilidade de uma boa análise.
No entanto, nesta semana, uma revista de informações que hipoteticamente tem mais tempo para elaborar seus conteúdos, e com isso oferecer um produto mais denso aos seus leitores, produz o efeito contrário. Em tom de profecia, a reportagem de capa de Época anuncia o apocalipse: “O eclipse do Brasil: A festa acabou. A economia empacou. O investidor fugiu. E agora?”
Acontece que a blague sobre o poema de Carlos Drummond de Andrade durou poucos dias. Na edição de quinta-feira (28/2), o insuspeito Estado de S.Paulo
A contradição evidente entre a notícia do Estadão e o cenário apocalíptico apresentado por Época levaria o leitor distraído a considerar que, como tem mais tempo para a apuração e análise dos dados, uma revista semanal estaria mais próxima da verdade quanto aos fatos da economia. Mas uma leitura mais crítica revela que a revista fez uma aposta errada, baseada em opiniões comprometidas.
A reportagem de capa da revista Época
Na quinta-feira (28), a reportagem do Estadão sobre perspectivas otimistas para 2013 é complementada por registro da Folha de S.Paulo sobre o superávit mensal recorde nas contas públicas e reportagem do Globo,mostrando que os investimentos se recuperam nos dois primeiros meses do ano.
A besta do apocalipse
Qual teria sido a trajetória da ideia por trás da reportagem de Época
Contrariando a prática deste observador, de evitar a personalização da análise da mídia, é preciso andar para trás e registrar que o autor da reportagem, muito ativo nas redes sociais digitais, não faz questão de parecer isento – pelo contrário, suas iniciativas e intervenções demonstram claramente sua posição política, manifestamente em oposição ao atual governo.
Diferente de outros repórteres e editores de economia, que em geral preservam um perfil mais discreto, embora sempre críticos com relação à condução da economia nacional, o autor da reportagem de Época
Vejamos, então, de onde o autor tirou a ideia de que o Brasil vai a pique.
Uma leitura cuidadosa da reportagem, aliada à análise de sua linguagem, indica que ele tirou a conclusão que justifica a manchete ao manipular opiniões muito marcadas por interesses específicos: suas fontes centrais são, entre outros, o veterano investidor Mark Mobius, o financista Armínio Fraga e o economista e diplomata Rubens Ricúpero.
De Mobius pode-se dizer que se trata de um investidor com apetite para riscos em países emergentes, que em várias ocasiões se mostrou contrariado com a decisão do governo brasileiro de desestimular o ingresso de capital especulativo. Ricúpero e Fraga são carimbados como ex-colaboradores do governo do PSDB.
Ainda assim, Mobius afirma na reportagem que “mesmo com a queda dos juros e o IOF, os ganhos no Brasil continuam atraentes” e Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central no governo Fernando Henrique Cardoso, entende que o pessimismo de alguns investidores estrangeiros é exagerado.
Dos demais entrevistados, como Carlos Langoni, também ex-presidente do BC, e outros economistas e investidores, não saiu a palavra eclipse ou outra justificativa para o catastrofismo que caracteriza a reportagem.
Não há, nas citações, razões para acreditar que a besta do apocalipse está solta. Tudo saiu direto da cabeça do repórter para a capa de Época.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário