ASPECTOS E QUESTÕES SOBRE LIBRA
MODELO DE PARTILHA CONCESSÃO E MONOPÓLIO
Considerei 2 resultados alvo principais: o que fica para a União e o que fica no País x o que vai para fora.
Os cenários:
- Produção e preços abaixo do mínimo esperado (<4000 b/d e < $60)
- Produção esperada para Libra, combinadas com faixas de preço abaixo de $60, de $60-$80, $80-$100 e >$100.
- Sem Petrobrás (0%)
- Petrobrás com 30% (mínimo da Partilha contra 0% da Concessão)
- Petrobrás com 40% (Libra).
- Petrobrás com 100% (“monopólio”, lance único ou contratação direta).
Os resultados, salvo erro ou informação equivocada, mostram que, na comparação do modelo de Partilha com o de Concessão, a Partilha vence em praticamente todas as simulações, mesmo nos piores casos de produção e preço:
Exceto no caso “monopólio”, O PAÍS nunca perde no modelo de partilha.
No caso específico de monopólio, considerado o pior cenário de preço e volume, curiosamente, o País só perde na Partilha (pequena diferença contra de 1,8% em 89%, neste único caso) porque a Petrobrás teve parte do seu capital bem aumentado para estrangeiros no governo FHC.
Nos piores cenários de preço e produção, a União (Estado) pode perder um pouco comparativamente (máximo de 3,9%), mas o País sempre ganha.
No caso esperado para preço e volume em Libra, a Partilha ganha em qualquer caso.
Notar que pela participação estrangeira promovida no governo FHC, mesmo com monopólio e melhores cenários, uma parcela dos ganhos sempre irá para fora do país (entre ~9 a ~13% óleo equivalentes).
Ressalte-se que além se buscar uma visão geral (e não cálculos precisos, mas não muito diferentes), o foco é “quanto da sua riqueza o País resgata” e não lucros empresariais ou similares menos sócio-econômicos.
Premissas e Parâmetros utilizados:
Tabela ANP de Partilha (9,93 a ~45%)Tabelas contidas na lei de Concessão de 1998 (PE de 0 a 40%), embora haja uma menção de um certo “congelamento” decretado por FHC em 1998 que não consegui levantar o que seja. Considerei o limite legal cheio de PE 0~40% na Concessão (vi também menção de que o governo (qual?...) pode “abrir mão” ou reduzir a PE (participação especial) na Concessão.
Royalties de 15% fixos na Partilha e o máximo da Concessão (10%), que varia entre 0%, 5% ou 10%)
Conversão de M3/Trimestre/Campo “fiscalizado” para B/D poço, considerando uma qtde. de 130 poços em Libra (dividindo a produção de pico estimada do campo (1,4 M/d) pela estimada na oferta 10-12, ~11m/d).
Participação estrangeira na casa de ~40% (menos União, BNDEs(Par), Fundos e outros acionistas publico-privados nacionais).
Custo-óleo de 30%, conforme difundido.
COMENTÁRIOS E ASPECTOS COMPARATIVOS GERAIS:
- O modelo de Concessão não aproveita ganhos em preço, só em volume (ate 40%). O de Partilha beneficia-se também com o aumento de preços.
- O modelo de partilha permite um controle muito melhor da produção e aspectos relacionados (sem riscos de “fiscalização”, invertida), por colocar a Petrobrás como operadora única (gerando e podendo resguardar algum know-how).
- Além da União, o país sempre ganha mais no modelo de Partilha por exigir conteúdo nacional (crescente) a partir de ~37% e também da parte mínima de 30% do custo-óleo que fica no país (podendo crescer até 100%).
- A pretensão (previsível e esperada) da oposição de tirar os 30% mínimos da Petrobrás só piora os resultados porque além de perder a participação de 30% nos resultados, alavancada pelo custo-óleo e pela participação nacional não existente no modelo de concessão, perde a participação em custo-óleo que ficaria aqui.
- No modelo de Partilha, a participação é sempre alavancada em termos de custos/investimentos x participações finais nos resultados (Petrobrás, União e País).
- Embora os opositores do modelo de partilha digam que estamos “partilhando uma riqueza “sem riscos”, eles mesmos usam o risco de volume e preço (este o mais imprevisível) para depreciá-lo, embora só nos muito piores cenários de volume e preço haja uma pequena diferença desfavorável.
- Devemos lembrar que nestes piores cenários de preço (<$60), o break-even da operação (e quiçá amortização de investimentos) estará se aproximando do inviável em QUALQUER CASO (a menos que os custos de produção se reduzam com o tempo).
- Os opositores do modelo de partilha mencionam que a Petrobrás “poderia endividar-se” para assumir sozinha (fato), esquecendo-se do risco acima (preço), que exige dezenas de bilhões em investimentos e um custo operacional altíssimo podendo até quebrar a empresa na eventualidade dos piores cenários de preço (ou mesmo um erro crasso de previsão de volume, bastante improvável).
- A partilha com outras empresas dilui riscos e, como já vimos, embora reduza as receitas, elas serão alavancadas (proporcionalmente maiores) em relação tanto aos investimentos quanto aos custos operacionais e aos riscos (além de financiamento “sem juros”, em óleo, não financeiro).
- O modelo partilhado (que não proíbe a Petrobrás de entrar 100% em nenhum campo) é mais saudável e seguro também nos aspectos de defesa de interesses, que passam a ter maior multilateralidade (no caso, Inglaterra, Holanda, França e China). Isto sem considerar conspirações militares (aí...). Estamos falando de estratégias de produção e preço.
- É considerável a diferença de preocupação social entre os modelos, onde um se preocupa basicamente com as empresas e o outro as respeita, mas dá um enfoque muito maior na União (Estado), País (indústria nacional, empregos) e royalties maiores, além de (pouco prováveis) ganhos em preço.
- Por considerar eminentemente volume, o modelo de concessão deixa de ganhar nos aumentos de preço (que serão aproveitados só pelas empresas).
- A participação obrigatória, além de assegurar sempre receitas maiores e diluição de custos e riscos alavancados nas receitas, garante controle operacional melhor e receitas fiscais menos sonegáveis ou discutíveis (ex. da Vale privada).
Questões:
1) Entendendo-se que a tabela de partilha dá proteção à proximidade
do break-even para as exploradoras, pode-se melhorá-la nos seus piores
índices (a primeira coluna, abaixo de $80 ou $60) para os próximos
leilões?2) É seguro considerar-se produção por poço ou há salvaguardas implícitas de custo e controle da Petrobrás para que não haja “trapaças”, para que eles tenham uma produção nominal rentável? (ex ingênuo: múltiplos poços na mesma pequena área).
3) Há (ou quais as) expectativas tecnológico-operacionais de redução de custos (fixos e variáveis) na produção ultra-profunda (pré-sal)?
4) Entendendo que cada plataforma opera diversos poços, qual o valor estimado de investimentos e custos operacionais fixos e variáveis em cada uma das cerca de 17 plataformas e cada um dos seus poços?
5) Pergunta para os opositores (ex: Sauer): Qual a alternativa sugerida ao que está sendo feito, considerando-se viabilidade política nacional e internacional, economia atual (idem) e riscos de mercado (tecnologia e usos energéticos)? Sem “sonhática”!
Algumas críticas infundadas, falaciosas ou equivocadas dos opositores da Partilha
Não há risco: há o enorme risco de preço que pode
inviabilizar e quebra o investidor. Por isso, não é uma questão de se a
Petrobrás “pode se endividar”, mas se DEVE fazê-lo sozinha. Mesmo sem
considerar outros riscos militares e conspiratórios, a diluição dos
custos e investimentos é saudável (preço, produção e aliança
estratégica), pelo menos neste ponto inicial, aguardando outras
consolidações da empresa e do País.Com o monopólio o lucro fica todo aqui: Não, cerca de 40% de participação estrangeira na Petrobrás, promovida por FHC sabe-se lá por que razões, sempre irá para fora, e existirá em qualquer modelo.
Estão doando o patrimônio nacional: Não, estamos (também) partilhando, em proporção vantajosa, os enormes investimentos e custos operacionais.
“FHC está se sentindo pequeno” (Ildo Sauer): forçou a barríssima e só nesta frase “descuidada” jogou fora (boa parte de) sua credibilidade política: Só a Vale!... Além do mais quem quebrou o monopólio da Petrobrás, reduziu o controle da União e aumentou bastante a participação estrangeira foi o mesmo príncipe “sentindo-se pequeno”. Comassim?!
Ao Brasil não interessa uma produção acelerada (idem Sauer): ora, só vamos ter produção “acelerada” daqui a muito anos, numa janela de 35 anos! Lembrando que Libra, embora a maior, é apenas uma fração do Pré-Sal, cujos 80% ou 90% restantes poderão demorar mais ainda! “Quequeisso” cara-pálida? Vamos ficar discutindo com as ongs, sindicatos e associações de bairro enquanto a Lusitana roda?! Ainda que fosse um erro, temos mais 80% ou 90% pra aprimorar e décadas pela frente!
Temos que ter o “monopólio” da exploração: (ou “entregar” só para a Petrobrás). Ora, como brasileiro que sou, também gosto muito da idéia, desde que possamos assumir o investimento E O RISCO sozinhos (O Ildo mesmo diz que nenhuma petroleira do mundo tem esta munição). O fato é que esta lambança é do FHC “pequeninho”. Alguém em sã consciência acha que o Congresso aprovaria mesmo uma “volta” ao monopólio?! Ora, o que se fez foi “despiorar”a lei de Concessão, aprovando-se uma outra bem melhor (não ideal!) de Partilha, resgatando maiores benefícios da riqueza para a União (Estado), o País e a Petrobrás. O resto é mimimi que deve ser cobrado dos neoliberais fernandistas e corretores do país.
Tínhamos que dar 100% à Petrobrás: além da Petrobrás, por obra e graça do “FHC pequeno-sentido” (o fundamental causador de toda esta discussão agora), ter uns 40% de participação estrangeira, mesmo com “monopólio”, há o respeito à (nova e viável) lei. Foi um leilão, nada impede legalmente a Petrobrás de ser contratada ou fazer lance sozinha. Há também o alívio na dose cavalar de investimento e a dita diluição de riscos.
O preço pode (ou “vai”!...) cair: Ora se o preço cair aos níveis que os opositores sugerem (ou desejam?), INVIABILIZA-SE a exploração do Pré-sal (pelo menos aos custos de águas ultra-profundas de hoje, que dominamos). Além disso, imagine-se a Petrobrás investir dezenas de bilhões e antes mesmo de começar a produzir, parar! Querem uma armadilha para quebrar a Petrobrás?! Ou é melhor ter esse risco diluído com a Shell, Total CNPC e CNOOP? Partilhando uma parte proporcionalmente vantajosa das receitas em relação aos custos/investimentos?
Não houve leilão: Houve dezenas de interessados (40?), 11 inscritos (pagaram para inscrever-se) e um lance (de 5 empresas). Qualquer leilão no mundo (partindo de um mínimo) se encerra com o lance mais alto. Único ou múltiplo. Perfeitamente normal.
Foi pelo mínimo: Se a União perde, a Petrobrás (uma empresa) também respirou um pouco mais, pois em qualquer caso ela também pagará para a União. Um tanto de leas por elas (40/60).
As outras são despachantes de luxo no endividamento: Até onde entendo, o endividamento de cada sócio para entrar num negócio é de si próprio (sua parte) e não “do negócio”. Cada um traga a sua parte como puder e arque com seu custo financeiro. Se bem entendi, a Petrobrás ainda será parcialmente financiada (partida) sem custos financeiros diretos, pagando em óleo.
Bônus é mero truque para cobertura fiscal: Ora, além de 6 bilhões deste pretenso “truque” serem da Petrobrás (que entendi poderá ser financiado em óleo pelas demais), qual o problema de um controlador de empresa alocar parte de sua participação em cobertura de outros compromissos seus? Gostaria eu de dispor de um negócio em que além da minha participação societária, + royalties adicionais, + participação especial na produção, + obrigação dos sócios em comprar boa parte com a minha “família”, eu também pudesse cobrar um “bônus”de entrada (“luvas”).
Blábláblá e etc: é muita opinião emocional (também gostaria que fosse melhor), um gasto em energia ruim e ineficaz. O ótimo é inimigo do bom e a perfeição é uma meta. Críticas para melhorar serão bem vindas e boas para nós todos.
Comentários
Quem escolhe ser cego, fica
seg, 28/10/2013 - 22:06
Quem escolhe ser cego, fica fora da luta28 de outubro de 2013 | 08:28Tenho lido artigos de pessoas absolutamente obturadas dizendo algumas barbaridades sobre o leilão de Libra.
Hoje, saiu um deles, nas páginas “muy amigas” de O Globo, assinado pelo ex-deputado Vivaldo Barbosa.
Creio que é natural em todos, inclusive neste blogueiro, certa tristeza por não termos todo o petróleo – em Libra e fora dele – sendo exclusivamente explorado pela Petrobras. Isso seria o ótimo que, como se sabe, é o pior inimigo do bom.
Daí, porém, a partir para uma manipulação vergonhosa dos números vai imensa distância. Não é possível defender bons propósitos com mentiras. Pior: acaba-se, como a Terra é redonda, indo somar ao lado dos inimigos do Brasil.
Diz Vivaldo:
Por outro lado, os grandes países produtores como Arábia Saudita, Noruega e Venezuela, ficam com 80% do petróleo na partilha. Os 20,8% dados pelo consórcio para a União (41,65% sobre o óleo lucro) ficaram muito baixos (a União tinha 100% antes do leilão). Os 79,2% do petróleo ficam com o consórcio, sem parâmetro no mundo.
Ora, nem José Serra, com suas reconhecidas habilidades matemáticas, chega a tanto, senhores.
Como tenho infinita paciência, de novo explico, para que esse tipo de patranha não prospere.
E, agora, quase desenhando.
Suponhamos que você tenha uma nota de 100 reais, lá em Manhu-Mirim e pergunte quem quer ir buscar lá, para você.
Você diz que, para fazer isso, ele terá de pagar uma taxa a você, um bônus, de perto de 1 real.
O seu melhor amigo diz que fará isso e pega um ônibus para lá, a R$ 15 a passagem: R$ 30, ida e volta.
De onde sai esse dinheiro? Do bolso dele? É obvio que não. Ele é seu amigo, não a Irmã Paula.Sai destes 100.
Sobraram 70.
Como Manhu-Mirim cobra um imposto para alguém sair de lá com dinheiro – um tal de royalty, de 15% – o seu amigo já largou 15 reais na saída da rodoviária. Porque esse tal royalty é do valor bruto, não importa quanto custe o ônibus. E é dinheiro que, evidente, vai sair daquela pelega de 100 reais.
Ficaram 55, se a Escola Isabel Mendes, da velha Guanabara, me ensinou direito.
Estes 55 vão ser rateados entre você e seu amigo: 41,65% para você, o resto para ele.
Portanto, R$ 22,91 para você e R$ 32,09 para ele.
Mas, como você ainda cobra um “imposto de amizade” ao seu amigo, de 34% de tudo o que ele ganhar, ele tem de repassar a você 34% destes R$32,09, ou R$ 10,91.
Ficam, para ele, portanto, R$ 21,18, do qual ele tem de tirar aquele um real que te pagou de “bônus”. Sobram, portanto, R$ 20,18
Como você é o prefeito de Manhu-Mirim, ficou com os 15% daquele valor cobrado lá: R$ 15.
15 mais 22,91 e mais 10,91 dá 48,82. Mais aquele realzinho, 49,82 reais
Se você ficou com R$ 49,82 e seu amigo com R$ 20,18, quanto dinheiro têm vocês dois juntos, perguntar-me-ia a Dona Vilma, minha professora lá na Isabel Mendes.
- Ah, tia, é só somar 49,82 com 20,18, isso dá R$ 70, é moleza.
Aí, no ano seguinte, a Dona Vilma ia me ensinar a calcular percentagem e perguntaria quantos por cento 49,82 são daqueles 70 reais do total.
E eu iria fazer uma regra de três simples: se 70 reais são 100 por cento, 49,82 reais são “X”. Multiplicando em cruz, dá 4982 divididos por 70, ou 71,17%.
Mas isso não é tudo: como o seu amigo tem uma esposa chamada Petrobras, que fica com 40% de tudo o que ele ganha, a Dona Petrobras fica com 40% daqueles R$ 20,98: ou seja, com R$ 8,39.
Dona Vilma vai me perguntar de novo: quanto você (49,82) e Dona Petrobras (8,39) ficaram, juntos?
Fácil, tia: 49,82 mais 8,39 dá 58,21.
-E quantos por cento isso é daqueles 70 reais?
- 5821 divididos por 70 dá 83,16%.
Desculpem o primarismo, mas só assim para desobturar mentes cegadas pela ideologia, que deve ser luz para ver e não treva para esconder.
Dito isso, vamos cuidar dos argumentos que usam os inimigos da Petrobras,da política de exigência de conteúdo nacional, daqueles que querem, estes sim, transferir para o estrangeiro a riqueza do pré-sal de Libra e de outros mais.
PS. O argumento de que a Petrobras tem acionistas estrangeiros, mais uma “dívida” que temos com a nefasta memória de Fernando Henrique, vale tanto para a partilha como está como se o campo fosse totalmente entregue à Petrobras, certo?
Por: Fernando Brito
http://tijolaco.com.br/index.php/quem-escolhe-ser-cego-fica-fora-da-luta/
Gestão de reservas de Libra
seg, 28/10/2013 - 22:16
Gestão de reservas de Libra deveria ser exclusiva do Estado, diz
seg, 28/10/2013 - 10:42
Gestão de reservas de Libra deveria ser exclusiva do Estado, diz 'pai do pré-sal'ELEONORA DE LUCENA
DE SÃO PAULO
As reservas de Libra são estratégicas e o Estado deveria ter contratado a Petrobras (que as descobriu) para operá-las em 100%. A opinião é de Guilherme Estrella, 71, considerado o "pai do Pré-Sal" (ele não gosta dessa denominação, pois diz que o mérito é de uma equipe).
Ex-diretor de Exploração e Produção da Petrobras, o geólogo que mapeou a megareserva faz críticas ao leilão realizado há uma semana e alerta para problemas no interior do consórcio que vai extrair o petróleo (Petrobras, a anglo-holandesa Shell, a francesa Total e duas estatais chinesas).
Daniel Marenco/Folhapress O ex-diretor da Petrobras, Guilherme Estrella, chamado de 'pai do pré-sal'
Para ele, as grandes empresas petrolíferas mundiais, inclusive a Petrobras, representam e defendem os interesses de seus países. "Energia é fator crítico da soberania e do desenvolvimento de qualquer país. Há, portanto, um potencial conflito de interesses geopolíticos absolutamente inerente à presença de estrangeiros numa gigantesca reserva petrolífera como é Libra. Se vai eclodir, não sei. Mas que está lá, está.", afirma.
Nessa entrevista, concedida por e-mail, ele fala da descoberta do Pré-Sal, de desafios tecnológicos e expõe suas dúvidas sobre a exploração do xisto nos EUA.
Folha - Por que o sr. foi contrário ao leilão de Libra?
Guilherme Estrella - As minhas críticas concentraram-se no aspecto estratégico para o Brasil. Trata-se de gigantesco volume de petróleo, agora compartilhado com sócios que representam interesses estrangeiros --de potências estrangeiras--, sobre cujo alinhamento com o posicionamento geopolítico de um país emergente da importância do Brasil não temos a menor garantia.
A Petrobras, que mapeou a estrutura de Libra e perfurou o poço descobridor, como empresa controlada pelo Estado brasileiro, deveria ter sido contratada diretamente, como permite o marco do Pré-Sal. Aliás, a inclusão desta alternativa teve como causa a eventualidade de se tratar com reservas cujas dimensões tivessem valor estratégico para o Brasil, e este é inquestionavelmente o caso de Libra.
O leilão foi um erro estratégico? Foi lesivo ao país?
Não afirmo que tenha sido um erro estratégico, tampouco que tenha lesado os interesses do país. O que defendo é que a decisão do governo em fazer o leilão de Libra, em vez de contratar diretamente a Petrobrás, como prevê o marco justamente para situações excepcionais --como é Libra--, deveria ter sido discutida com a sociedade e também com a base de apoio do governo no Congresso Nacional.
Nesta discussão, todos os motivos que suportam a decisão do governo seriam conhecidos e a discussão poderia levar a um consenso ou não, caso em que o governo tomaria sua decisão, conforme lhe garante a lei.
Como isto não aconteceu, com os dados e informações que estão disponíveis, construo minha opinião, que é a mesma de muitos outros cidadãos brasileiros: de que, concretamente, a contratação direta da Petrobrás para desenvolver e produzir Libra seria a melhor estratégia brasileira, diante do papel destinado ao Brasil no cenário geopolítico e energético mundial ao longo, no mínimo, desta primeira metade do século 21.
A Petrobras poderia operar sozinha?
A própria presidente da companhia afirmou que a Petrobras tinha o maior interesse em operar Libra sozinha, mas que só poderia iniciar os trabalhos em 2015. 2015 é amanhã. Não subsiste, portanto, o argumento de que leiloar Libra agora seria para antecipar a produção.Não aflora qualquer razão para que esta não tenha sido a decisão do governo, pelo menos que tenha sido explicada publicamente ao povo brasileiro.
Sobre o percentual mínimo estabelecido no edital para a parte do Estado brasileiro --menos que 42%-- não posso me pronunciar, pois o governo, também aqui, não deu qualquer informação sobre a racionalidade econômica que existiu por trás deste número.
Acusar de xenofobia aqueles que defendem esta opinião é injusto, equivocado e apequenador da dimensão estratégica do assunto em debate. Seria equivalente a acusar este governo de centralizador e arrogante, disposto a exercer um direito político --ainda que legal-- de decidir questões desta magnitude de forma monocrática, sem ouvir, no mínimo, suas bases de apoio organizadas na sociedade. O que, certamente, não é o caso do atual governo, como todos sabemos.
Por que o governo tirou da Petrobras a possibilidade de operar sozinha no Pré-Sal? Só a questão do superávit primário explica esse movimento?
Será que podemos priorizar exigências financeiras momentâneas com aspectos econômicos e políticos da estratégia geopolítica brasileira ao longo deste século 21? Esse é o ponto e acho que deveria ter sido discutido com a sociedade.
A revista alemã "Der Spiegel" disse que o Brasil leiloou um tesouro por uma pechincha. O sr. concorda?
Não conheço a racionalidade econômico-financeira que levou aos 41,65%. Fantástico. Como geólogo não consigo entender como chegaram a esta precisão! Não posso opinar. Como disse, não tenho informações sobre a racionalidade econômica que desaguou neste super preciso percentual de 41,65%. Não é 41,64 nem 41,66, é 41,65 cravados!
O sr. considera inapropriado ter sócios estrangeiros na exploração do Pré-Sal?
Em momento algum sugeri que ter sócios estrangeiros no Pré-Sal é "inapropriado". O que argumento é que, em se tratando de uma imensa riqueza estratégica concentrada (em Libra) de um produto de tal forma fundamental e sensível para o mundo --e principalmente para as nações hegemônicas mundiais dele dependentes-- a sociedade brasileira tem o dever de discutir a conveniência de tê-las como sócios.
Ninguém desconhece que as grandes empresas petrolíferas mundiais, inclusive a Petrobras, representam e defendem os interesses de seus países-sedes, nos países onde atuam. E neste ponto não se diferenciam empresas estatais ou privadas.
O sr. acha que essa decisão sobre libra é danosa à soberania brasileira?
Não acho que a soberania brasileira tenha sido afetada.
Apenas levanto a possibilidade de enfrentarmos dificuldades, no futuro, caso haja qualquer divergência --ou até mesmo conflito-- entre interesses geopolíticos brasileiros e aqueles dos países representados no consórcio de Libra --todos protagonistas importantes no cenário mundial hoje e ao longo deste século 21-- por suas respectivas empresas.
Estas dificuldades --ainda que no campo das possibilidades-- estariam inteiramente evitadas, não ocorreriam de maneira alguma se Libra estivesse sob gestão exclusiva --100% do petróleo produzido-- do Estado brasileiro através da contratação direta da Petrobras para desenvolver e produzir Libra.
Por que Libra é estratégico?
O caráter estratégico das reservas petrolíferas é inquestionável, como todos sabem. Não se invadem e ocupam militarmente países soberanos para apropriação de refinarias. É possível construir uma refinaria em qualquer lugar do planeta, mas as grandes reservas de óleo e gás estão onde as condições geológicas assim o determinaram. O pessoal da Argélia, do Iraque, da Nigéria, da Líbia, do Egito sabe disto na pele.
O Sudão do Sul foi "fundado" por causa disto. As monarquias medievais, absolutistas e repressoras da Península Arábica são mantidas pelo mesmo motivo: assegurar reservas de petróleo e gás natural às grandes potências hegemônicas ocidentais. Não se está a ver fantasmas! Esta é a realidade fática da geopolítica mundial, escancarada e desavergonhadamente exibida nas últimas três décadas por meio de ações políticas e militares por parte dos países centrais ocidentais. Não há como desconhecer esses fatos.
Seu alerta está relacionado aos interesses divergentes entre produtores e consumidores de petróleo presentes no consórcio? Produzir mais rápido e deprimir preços ou produzir de acordo com visão estratégica, sem derrubar preços? O que seria melhor para o Brasil?
A turma de topo da Opep controla o preço, mas não tem soberania, autonomia, independência para sustar o suprimento. Simplesmente porque interesses divergentes entre grandes produtores e grandes consumidores não conflitam por causa do preço do barril, mas pelo compromisso dos produtores em suprir incondicionalmente os volumes exigidos pelas economias hegemônicas representadas pelos grandes consumidores.
Gente que estudou o assunto afirma que o barril de petróleo do Oriente Médio sai a mais de US$ 300 para a UE e para os EUA, na condição "all in" dos custos de manutenção militar do status quo daquela região para barrar, pelas armas, qualquer iniciativa que tenda a mudar o quadro atual.
O Brasil é um país diferenciado. De dimensões continentais, privilegiado em riquezas naturais, único em integridade nacional (uma só língua, cultura diversa, mas coesa etc.). Temos reservado um papel de protagonista geopolítico mundial igualmente diferenciado e socialmente muito positivo neste século 21.
De uma hora para outra, este país aparece como uma potência energética, cujas reservas potenciais, em processo acelerado de comprovação, de petróleo e gás natural impactam o quadro energético mundial. Tudo indica que irão contrabalançar, junto com a costa oeste africana o peso do Oriente Médio, a médio e longo prazos, para suprir EUA e UE.
Isso nos obriga, como país soberano, a nos prepararmos para assumir esse papel _de não mais coadjuvante, mas de protagonismo mundial diante desta muitíssimo sensível realidade. A quarta frota [dos EUA] está aí, ressuscitada não por outro motivo.
Este é o quadro já presente, materializado. E se tornará mais agudo ao longo deste século 21.
Dentro deste contexto, não seria mais conveniente que um imensa acumulação de petróleo, como Libra, ficasse 100% nas mãos do Estado brasileiro, com o poder de gerenciar tudo o que lhe concerne sem qualquer ingerência de interesses estrangeiros, quaisquer que os sejam? Isso é permitido no marco do Pré-Sal, quando abre a possibilidade de contratação direta da Petrobras, cláusula aprovada exatamente para situações, como essa de Libra, absolutamente diferenciadas sob o ponto de vista geopolítico mundial. Ainda mais a 300 quilômetros da costa, nas proximidades dos limites territoriais marítimos nacionais, ainda em processo de aceitação pela ONU.
Quando o sr. fala dos custos reais para os EUA e UE do petróleo saudita, de quanto seria o custo no pré-sal comparativamente?
Os custos totais de produção do pré-sal --que chamamos de CTPP-- estão muito abaixo dos atuais valores internacionais do barril, mas trabalhamos duro e ininterruptamente para reduzí-los. Não só por melhoria contínua nos processos de produção, mas fazendo esforço de desenvolver inovações tecnológicas que visem este objetivo.
O que cada um dos sócios da Petrobras busca nessa associação?
Os sócios se interessam, essencialmente, por assegurar suas respectivas partes em óleo produzido. No caso dos chineses para suprir prioritariamente seu mercado nacional, ávido de energia para sustentar o crescimento extraordinário da economia chinesa ao longo da primeira metade deste século, pelo menos. Shell e Total também, mas são já globalizadas e com mercados muito distribuídos além do europeu.
Sobre esses possíveis conflitos de interesses dentro do consórcio, o sr. diria que o Brasil (e a Petrobras) caíram em uma espécie de armadilha?
A participação da PPSA nos consórcios, com poder de veto, consta do texto do marco justamente para que todo o processo, desde a construção do Acordo de Operação Conjunta até as atividades operacionais propriamente ditas, seja controlado pelo governo brasileiro.
Portanto, não há "armadilhas" no modelo de partilha adotado pelo Brasil. O governo brasileiro tem total controle de tudo.
Como seriam essas divisões internas? França e China do lado de consumidores, querendo acelerar a produção? Que mais? Como elas se podem contrapor à Petrobras e ao interesse brasileiro?
A simples presença de interesses estrangeiros --por meio da participação de suas empresas petrolíferas no consórcio de Libra-- pode, em tese, gerar conflitos. Se estivéssemos tratando de um processo industrial de uma commodity comum, periférica, qualquer problema poderia ser facilmente resolvido.
Esse é o ponto central de minha opinião. Energia, especialmente petróleo e gás natural, é fator crítico da soberania e do desenvolvimento econômico, social, científico e tecnológico de qualquer país. Mormente daqueles que são protagonistas hegemônicos da cena mundial e daqueles outros que, por sua magnitude e seu potencial de riquezas naturais, de todos os tipos, como o Brasil, se candidatam para igualmente atuar como protagonistas mundiais e não mais como simples coadjuvantes, periféricos. Só esta realidade, em sua essência geopolítica, já é conflituosa. Lembremo-nos do [Henry] Kissinger, que disse mais ou menos isso : "Os EUA têm que se preocupar é com aquele gigante lá no Sul que, quando se levantar, vai dar um trabalhão danado para ser controlado".
Há, portanto, um potencial conflito de interesses geopolíticos absolutamente inerente à presença de estrangeiros numa gigantesca reserva petrolífera como é Libra. Se vai eclodir, não sei. Mas que está lá, está. Esse é o ponto!
A China quer aprender a operar em águas profundas?
Pode ser que aja interesse na obtenção de conhecimento de engenharia de projeto e operacional para produzir em águas ultraprofundas. É muito importante, mas não é o essencial.
O Brasil não deveria proteger essa tecnologia?
Proteger tecnologia no mundo atual não é o foco das grandes empresas petrolíferas. O esforço maior, concretamente falando, é assegurar a condução das operações --serem operadoras. Porque é na operação, no dia-a-dia, na vivência com as broncas e dificuldades que ocorrem na frente operacional que consiste o real valor do aprendizado contínuo-- de engenharia e pragmático (isto é que é, no final das contas, tecnologia) --que vai permitir a permanente e contínua inovação, advinda de novos conhecimentos e, em decorrência, de novos projetos e novos processos. Operar, principalmente numa ambiência de certa forma nova, onde o conhecimento científico e de engenharia e a competência operacional concentram-se em muito poucas empresas--como no Pré-Sal brasileiro --materializa-se numa inexcedível vantagem competitiva para as empresas petrolíferas. E não foi por outro motivo que a exclusividade da operação pela Petrobras, estabelecida no texto do marco do Pré-Sal, foi --e é!-- tão combatida por aqueles que, de certa forma, refletem os interesses das empresas estrangeiras, contrariados em aspecto essencialmente estratégico sob o ponto de vista da indústria.
No caso específico do Pré-Sal, este trabalho ininterrupto de obtenção/geração de novos conhecimentos e de inovação permanente foca, principalmente em dois pontos centrais: diminuição de custos e contínuo atendimento aos pressupostos da segurança operacional. Quer dizer, no geral, não há qualquer salto tecnológico necessário para produzir o Pré-Sal, como aliás é comprovado pela já significativa produção da Petrobras.
Por que as norte-americanas saltaram fora?
Com meus quase 50 anos "sujando" as mãos de óleo, fico desconcertado quando não consigo construir uma convicção sobre qualquer assunto relacionado ao setor petrolífero, tão rico em suas características, as mais variadas possíveis --políticas, econômicas, científicas, tecnológicas, sociais, militares e outras mais. Pois bem, sinto-me desconcertado com a ausência da Exxon e da Chevron. O que penso são ainda especulações. Por exemplo. Correu há algum tempo, por volta de 2010, 2011, no setor petrolífero mundial, que a Exxon conseguiu do governo angolano mais do que a Petrobras com o novo marco, com respeito à exclusividade das operações.
Obteve um acordo de "preferência" com os angolanos, tendo o direito de decidir se vai ou não operar qualquer descoberta no pré-sal daquele país, independentemente de que empresa que a tenha realizado. Sua ausência no leilão de Libra poderia ter algo a ver com isto? Ou não seria ao contrário, fazer parte da produção no Brasil não poderia ser um grande aprendizado para ajudar no exercício do privilégio de aceitar ou não a operação em certas descobertas em Angola?
Acho que a Chevron está na base do "gato escaldado tem medo de água fria". A pancada que tomaram em Frade [vazamento de 3,7 mil barris de óleo em 2011] repercutiu com extrema dramaticidade na companhia, que é muito séria e competente _sou testemunha pessoal disso. Talvez tenham erroneamente superestimado os riscos operacionais, todos inteiramente mapeados e neutralizados pela Petrobras com a participação, naturalmente, dos parceiros que com ela produzem do Pré-Sal há mais de dois anos. E isto é, a cada dia que passa, mais concreto e consistente.
Alguns ligam a ausência das norte-americanas aos investimentos no xisto. Qual sua visão sobre o xisto? É uma revolução energética?
Coloco "xisto" entre aspas. A tradução de "shale" é folhelho, termo geológico que é até difícil de falar já que encadeia dois fonemas "lh". Folhelho é uma rocha composta por grãos infinitamente pequenos de argila e, por isso, com permeabilidade quase zero. No caso, o gás está nos microporos, entre os grãos de argila e não sai de lá. Para sair tem que quebrar o pacote rochoso de folhelho, fraturar em gigantescas operações de injeção de água, utilizada como fluído de fraturamento.
Este assunto dá um livro. Mas há fatos inquestionáveis.
1. As reservas potenciais são, realmente, muito grandes. 2. Os poços exaurem-se muito rapidamente, não duram meses. 3. Perfuram-se milhares de poços, em áreas rurais e nas cercanias de cidades do meio-oeste americano. Como os poços duram muito pouco, a atividade de perfuração é frenética, descontrolada. Exige infraestrutura de suprimento de grandes dimensões, com grandes impactos sociais nas comunidades antes bucólicas e ultraconservadoras do interior americano. 4. O uso de água é gigantesco; já há casos de esgotamento de lençóis freáticos e falta de água nas cidades. Alguns Estados já proibiram as atividades.
5. O fluído de fraturamento contém produtos químicos altamente agressivos e tem sido comum a poluição de aquíferos potáveis por estes agentes químicos, interrompendo sua utilização para o homem e para a pecuária. 6. As reservas de gás, como sempre acontece, esgotam-se rapidamente e existem, também como sempre, as incertezas geológicas coladas às atividades de exploração e produção. Especialmente quanto às reservas de gás não provadas, como é o caso, os níveis de imprevisibilidade são elevados e surpresas negativas são prováveis de acontecer. É preciso ter cuidado nas extrapolações. 7. Em razão do baixo preço do gás, e do colapso causado pela enorme oferta em pouquíssimo tempo, milhares de sondas já se mobilizam para perfurar para óleo, cujo preço, ainda nos US$ 100 por barril, garante lucros muito mais significativos.
O governo norte-americano, com a prudência necessária, mantém a proibição de exportação de petróleo por empresas que supriam mercados com líquidos que agora foram inteiramente substituídos pelo gás. Micaram com o óleo e apelaram ao governo para que suspendesse a proibição. Sem sucesso.
Resumo da ópera do "shale gas": tem que dar tempo ao tempo.
A presidente nega que tenha havido uma "privatização". Houve? Por quê?
Privatização. Não houve, no sentido estrito do termo. Mas, de qualquer maneira, seria muito menor se a Petrobras fosse contratada diretamente para desenvolver o campo.
A Petrobras precisa de um reajuste logo no combustível para viabilizar os seus investimentos? O que de exato existe nessa discussão sobre preços?
A Presidente da Companhia afirma e reafirma que não haverá a necessidade de reajuste de preços para enfrentar os gastos com o bônus de Libra. Esse assunto de reajuste de combustíveis é hilário.
A Petrobras fez 60 anos. Desde então, a Petrobras é além de uma empresa "do" governo, uma empresa "de" governo de qualquer governo e não poderia ser diferente tal a importância econômica que a empresa exerce no ambiente brasileiro. E isso parece um verdadeiro "tabu". Todo mundo sabe o que acontece na vida real e faz tremendo esforço em afirmar que "não! A diretoria da Petrobras é independente, tem total autonomia para definir os preços dos combustíveis... E a turma da oposição qualquer oposição, a todos os governos fica a acusar incansavelmente o governo de "utilizar a gestão da Petrobrás na condução de sua política econômica".
Também se fala que a Petrobras deveria reduzir a exigência de nacionalização. Isso não seria ruim para o país?
Conteúdo nacional. Aqui você toca num tema decididamente crítico para o desenvolvimento científico, tecnológico e econômico do Brasil.
Começo com uma história.
Descia eu pela Rua Aperana, aqui no Leblon, onde morava quando exerci a maior parte do período de diretor da Petrobras, quando encontrei um antigo colega de superintendência da companhia, quando eu era o superintendente do Cenpes. Era o engenheiro Carlos Aguiar, então superintendente da Área de Materiais da Petrobrás, homem ligado ao desenvolvimento de fornecedores brasileiros para substituir material importado.
O tempo era o da construção no Brasil das plataformas de produção, extraordinário programa do governo Lula para não só abrir milhares de empregos no país como para ressuscitar a indústria naval brasileira apoiada nos projetos de produção da Petrobras.
O Aguiar me disse uma frase que me acompanhou por todo o longo --9 anos-- tempo em que exerci a diretoria de Exploração e Produção da companhia: "Estrella, vamos construir no Brasil, tudo bem. Mas não podemos deixar que o "conteúdo nacional" seja acéfalo!".
Esta foi uma luta que o grupo de profissionais e gerentes da Petrobras, com o qual tive a honra de trabalhar, empreendeu no sentido de criar condições para que empresas genuinamente brasileiras se incorporassem ao esforço nacional de "construir no Brasil tudo o que puder ser construído no Brasil".
O processo de desenvolvimento tecnológico começa com saber operar as máquinas importadas. Meu pai contava que o Roberto Marinho, na década de 1930, importou rotativas alemãs para modernizar o parque impressor de "O Globo". Instalou as máquinas e chamou o Getúlio [Vargas] para o momento solene de acioná-las pela primeira vez. O Getúlio "pam" empurrou a alavanca e... nada aconteceu. Estabeleceu-se um clima de desconforto com o presidente da República, que foi solicitado a repetir o gesto, objeto das inúmeras lâmpadas de "flash" dos repórteres presentes. "Pam" novamente e... nada novamente. Mui polidamente, Roberto Marinho pediu desculpas e transferiu a solenidade. Após isso, reuniu-se com a equipe técnica de "O Globo" para saber o que ocorrera. Ninguém sabia. Disseram apenas que tinham montado a engenhoca "by the book", como dizem os engenheiros, de acordo com o manual. Não houve jeito. Chamaram um alemão, que veio de Zeppelin, numa milionária viagem de uma semana, pois de navio demoraria três meses. O alemão chegou, olhou, pensou não mais que um minuto e disse algo naquela língua centro-européia bárbara, de fora das longínquas fronteiras do Império Romano, que o intérprete balbuciou : "Uma chave-de-fenda, por favor".
Rapidamente atendido, colocou a chave num pequeno parafuso, girou meia volta e ordenou, segundo o intérprete : "Liguem a rotativa". Um engenheiro brasileiro pegou a alavanca antes inservível e "pam": a rotativa ronronou e começou a trabalhar, sem qualquer problema. Lição: não sabíamos sequer operar uma máquina de primeira geração tecnológica.
O final do ciclo é saber projetar as máquinas que operam no sistema industrial em que se atua. No meio, está a etapa da construção dessas máquinas. Se ainda não construímos no Brasil, temos que fazê-lo. Mas --isso é indispensável-- gerenciar o processo de modo que, no mais curto prazo de tempo, adquiramos a competência em engenharia, nas empresas e na academia brasileiras para projetar máquinas ainda mais avançadas, inovações em relação ao que hoje se considera o limite da tecnologia. Se esta etapa não acontecer, muito pouco foi conseguido em termos de autonomia de decisão quanto à escolha e aplicação da tecnologia que melhor nos servirá para resolvermos nossos próprios problemas.
Continuaremos a ser o "chão de fábrica" _muitíssimo importante, mas não suficiente para um Brasil efetivamente soberano e autônomo no concerto mundial das nações desenvolvidas. A verdadeira inteligência, a competência técnico-científica continuará a vir de fora. Não precisamos chamar o "alemão" para botar a máquina em funcionamento ou até repará-la em caso de pane. Mas se quisermos substituí-la por uma mais moderna, será o "alemão" quem a projetará e nos venderá o projeto se assim o governo de seu país autorizar a empresa da máquina a fazê-lo.
A traduzir este desafio, temos a definição do século 21 como o século da "economia do conhecimento" e a imagem de desenvolvimento tecnológico: " É como subir uma escada rolante pela faixa de descida : se parar, desce".
Esse foi o recado do Aguiar. Tenho a plena consciência de que a equipe em que trabalhei fez o possível para avançarmos neste sentido. É importante que se registre a grande ajuda que tivemos do BNDES, da Finep, da Coppe no trabalho que desenvolvemos na Exploração e Produção e na Petrobrás como um todo. Criamos exigências contratuais para que as empresas estrangeiras que se instalassem no Brasil para construir máquinas e equipamentos, até então importados, a serem utilizados pela Petrobras, montassem equipes de engenharia de projetos na filial brasileira, para não ficarem na dependência de seus centros de tecnologia no exterior.
Para as empresas genuinamente brasileiras, trabalhamos para criar condições de financiamento e de assistência técnico-científica para que, não só adquirissem condições de competitividade, como consolidassem suas respectivas competências para a inovação e melhoria contínuas de seus processos produtivos, de modo a atender especificamente as exigências e necessidades das atividades operacionais da Petrobras.
Chegamos a iniciar um trabalho de tentar quebrar oligopólios tecnológicos mundiais para fabricar itens de tecnologias "sensíveis"--como turbinas-- no Brasil.
Ainda com respeito à construção das plataformas no Brasil, fomos sempre muito criticados pelo fato de o custo brasileiro ser maior do que os de Cingapura, do Golfo Arábico e da China. E têm que ser. Sou pessoalmente testemunha das diferenças qualitativas entre as condições de trabalho oferecidas, por lei, aos trabalhadores. Não há comparação. Aqui no Brasil praticamos uma relação capital X trabalho muito mais avançada, muito mais ética e justa que em muitos lugares no exterior, onde é comum se construir em condições absolutamente inaceitáveis para o trabalhador brasileiro.
Se há exigência, muito saudável, de competitividade, vamos enfrentá-las. Mas em condições de igualdade de patamar na qualidade das relações capital X trabalho. E não competir com mão de obra quase escrava.
O que o sr. achou da criação da empresa que vai administrar o Pré-Sal?
A PPSA entra como uma parte imprescindível nos consórcios para contribuir na definição dos Acordos de Operações Conjuntas (sigla "JOA" em inglês), que é o documento básico que vai orientar as operações do consórcio e aprovar e auditar tecnicamente os custos destas operações para efeito de definir o que se chama de "óleo custo", parcela de que os consórcios serão reembolsados.
Como fica a Petrobras depois desse leilão?
A Petrobras se desempenhará em patamares de excelência de sua função de operadora da cumulação de Libra. Foram as equipes de exploracionistas da Petrobras que mapearam a estrutura da gigantesca acumulação. Foi a Petrobras que construiu o primeiro poço descobridor de Libra. É a Petrobrás que detém, no mundo, as mais extensas competência e experiência para operar em águas ultraprofundas. É a Petrobrás, dentre todas as empresas petrolíferas mundiais que tratam do assunto, que possui o mais avançado conhecimento geocientífico das rochas-reservatórios do pré-sal (aspecto tecnicamente crítico e economicamente decisivo para o desenvolvimento da acumulação).
Enfim, como é reconhecido por todo o setor petrolífero mundial, é a empresa que detém as melhores condições para ser a operadora de Libra e do restante das acumulações que ainda serão descobertas na chamada "picanha azul" --designação que, pessoalmente, não gostei, mas isso é "ranzinzice" de minha parte.
O que é a "picanha azul"?
O mapa de contorno da área em que os exploracionistas da Petrobras circunscreveram a provável ocorrência dos reservatórios produtores do pré-sal, que vai de Vitória (ES) até Florianópolis (SC), no mar territorial brasileiro, tem grosseiramente o formato de uma picanha, peça de carne bovina por nós tão apreciada.
Coloriram o interior deste perímetro com a cor azul.
Daí surgiu o nome de "picanha azul". Não foi escolha minha. Considero de gosto discutível esta analogia. Mas "pegou", já estava consagrado e assim ficou.
A presidente traiu seu compromisso de campanha ao leiloar Libra, conforme muitos têm afirmado?
Não acho que a presidente Dilma esteja descumprindo seus compromissos de campanha. Os grandes e mais importantes itens sociais e econômicos das políticas inauguradas pelo presidente Lula em 2003, a ter como principais beneficiários as camadas mais carentes do povo brasileiro, têm sido perseguidos, com sucesso pelo governo Dilma e as pesquisas de opinião estão ai para não me desmentir.
Como petista, o sr. está frustrado?
Não estou frustrado como petista. Tenho consciência, vejo isto no dia-a-dia da vida dos brasileiros, de que os governos do Partido dos Trabalhadores desde 2003 transformaram o Brasil, tiraram da pobreza e da miséria dezenas de milhões de irmãos nossos e mudaram diametralmente a lógica de governar o país, tendo o povo como objeto central das ações de governo. E ninguém pode negar isto.
Isto não quer dizer que, como cidadão, tenha que concordar e defender todas as medidas e decisões que o governo do partido ao qual sou filiado venha a tomar.
Por que o sr. é tido como o "pai do Pré-Sal"?
Foi coisa da imprensa. Eu sempre rejeitei esta "alcunha", que na verdade, para os que conhecem a atividade exploratória, é mesmo depreciativo, na medida em que exploração de petróleo e gás natural é trabalho de equipe, não tem essa de "eu descobri".
A descoberta do pré-sal brasileiro resulta da competência das equipes de exploracionistas da Petrobras. São geólogos, geofísicos e outros profissionais que, desde a fundação da companhia e por ela intensamente treinados, tanto internamente quanto nas melhores universidades brasileiras e no exterior, trabalham na interpretação geológica das bacias sedimentares brasileiras.
Explorar petróleo e gás natural é, essencialmente, uma atividade de pesquisa científica que envolve custos altíssimos, mas que, tendo sucesso, garante um retorno ainda mais significativo.
Mas houve também um fator de política energética, igualmente importante.
Em 2003, por determinação do governo Lula, a Petrobras retomou os esforços para avançar pesadamente nas atividades de exploração e produção, de certa forma contidas no governo anterior, quando o monopólio foi quebrado. A companhia concentrava estas atividades na Bacia de Campos, grande produtora, já que outras bacias deveriam ser objeto de leilões de concessão.
A Petrobras detinha blocos em outras bacias, alguns na vizinha e gigantesca Bacia de Santos, de onde se produzia menos de 1 milhão de m3 de gás por dia no Campo de Merluza, antigo dos contratos de risco, descoberto pela Shell e operado pela Petrobras.
Atendendo à determinação do governo de expandir nossas atividades, deslocamos sondas da Bacia de Campos para a de Santos e as descobertas se sucederam: Mexilhão (descoberta importantíssima de gás natural na medida que enfrentávamos a dependência da importação da Bolívia) e os campos de óleo de Uruguá e Tambaú. Estas descobertas exibiram logo a grande potencialidade da Bacia de Santos, até então não materializada. Mas que existia, teoricamente, nas interpretações dos exploracionistas da companhia. Continuaram os investimentos exploratórios e, em 2006, descobrimos o pré-sal.
Resumo da ópera. Não há essa de "pai do pré-sal", tampouco de pai de descoberta alguma nas atividades exploratórias de qualquer empresa petrolífera, resultante sempre do trabalho e da competência desta que costumo chamar de "estranha e complicada tribo dos geólogos".
Aproveito para reforçar minha opinião sobre a decisão de leiloar Libra e não contratar diretamente a Petrobrás.
São fatos: a) Local: Bagdá, Iraque; b) Data: segundo semestre de 1977; c) Ocorrência: o gerente-geral e o gerente de exploração da Braspetro Iraque são convocados à sede da INOC (companhia estatal iraquiana de petróleo). Somos recebidos pelo diretor da INOC responsável pelos contratos de Exploração e Produção que o Iraque tinha com a Petrobras e com a Elf francesa.
O homem nos comunica, com certa solenidade: "O governo do Iraque determinou que lhes fosse comunicado que o contrato que temos com a Petrobras deverá ser cancelado. As negociações sobre isto devem iniciar-se tão logo quanto possível. Os senhores devem comunicar imediatamente essa decisão do governo do Iraque aos seus superiores no Brasil e solicitar que um representante do mais alto escalão de sua empresa, com poderes de negociar em nome dela, compareça a Bagdá para que se iniciem os trabalhos".
Estupefatos, perguntamos a razão desta decisão, já que cumpríamos integralmente o contrato, sempre com as melhores relações com a INOC e com o governo iraquiano.
E o homem nos respondeu : "Senhores, a Petrobras descobriu um campo gigantesco (Majnoon), com dezenas de bilhões de barris de reserva, e que vai produzir mais de 1 milhão de barris por dia, a metade que o Iraque produz hoje. No momento, o Brasil e a Petrobras têm interesses estratégicos no setor petrolífero internacional que não conflitam com os interesses nacionais da república do Iraque. Mas isto é 'no momento'. O cenário internacional, principalmente o da energia, se transforma constantemente. Não há como assegurar que no futuro, mesmo não tão distante, os interesses de Iraque e Brasil não venham a se distanciar. Em vista disso, e o governo de meu país adianta que é com certo desconforto, pelo que nos desculpamos, considera que a manutenção desse contrato fere a estratégia nacional quanto à gestão de seus recursos petrolíferos. Por isso devemos nos sentar à mesa para negociar a extinção do contrato e garantir à Petrobras e ao Brasil que seus investimentos sejam devidamente ressarcidos, sem qualquer prejuízo para vocês".
Anos depois, por causa inclusive de Majnoon, o Iraque foi invadido e ocupado por tropas estrangeiras. Perdeu sua soberania como nação e atravessa décadas de terrorismo total com o genocídio que todos conhecemos.
Claro que não podemos comparar o Brasil com o Iraque, e aqui não vai qualquer desmerecimento àquele país e ao seu povo, do qual conheço alguma coisa. Mas estes fatos são uma inegável lição que temos sempre que levar em consideração.
Que apareçam muitos mais Estrellas
ter, 29/10/2013 - 16:49
(cópia de comentário feito no post sobre a posição de Estrella)Conheço (o respeitado) Guilherme Estrella de reputação e é gente como ele que dá motivos de orgulho ao país e pela Petrobras, desmascarando a incapacidade ou falta de seriedade de brasileiros e empresas brasileiras, estatais ou não.
A Petrobrás, mais nova que quaisquer das antigas "7 irmãs" e criada num país então de menor importância geopolitica (ainda) e imensas deficiências, dá-se ao luxo de estar a frente de praticamente todas elas em perfuração de águas ultraprofundas, descobrindo óleo onde ninguem mais, inclusive as estrangeiras que receberam do governo de FHC concessão de parte de Libra pela merreca de $ 250 mil e nada acharam., devolvendo-a.
E os medíocres oligarco-partidario-piguentos da oposição sequer conseguem (na verdade nem querem) reconhecer este simples fato.
Mas o respeito e admiração pelo Estrella não me impede de discordar dele em alguns pontos, embora esteja em concordância nos demais.
1) Também gostaria que pudéssemos ter 100% de Libra (o que é impossível graças a FHC e a promoção de mais de 40% de capital estrangeiro na Petrobrás). Mas há opções que trocam não tão menos receitas (em óleo ou $) por outros benefícios, como menor risco e maior proteção estratégica de interesses. Os (muitos) argumentos e números estão no post. Sabemos que gostar, desejar, querer, nem sempre é poder. Ainda que parcialmente.
2) O argumento de que as alianças com as estrangeiras pode nos expor a conflitos me parece equivocado. O que pode mais despertar a gula alheia é exatamente não "partilhar". Se partirmos para a hipótese extrema de conflito militar, aí mesmo é que a vaca vai pro brejo, pois sozinhos (nunca 100%) ou associados, não temos (que não me ouçam) mínimas condiçõs de nos defender. Lembrem que o Iraque era considerado uma força armada formidável e até "equiparável" às americanas da região... Perderam o país em 3 semanas. Nós nem precisamos de tanto, pois eles tomariam apenas plataformas em mar aberto... O melhor que poderíamos fazer é afundá-las...terra (mar) arrasada(o)...
De resto, lamento que percamos, pela natural aposentadoria, gente como ele, e torço para que consigamos criar muios Estrellas em nosso país, apesar do esforços contrários da medíocre PPM (plutocracia partidário midiática) que infesta este país.
O Desenho do Tijolaço
seg, 28/10/2013 - 22:23
Esta neste link http://tijolaco.com.br/index.php/repensar-libra-com-as-mesmas-ideias-do-...Repensar Libra com as mesmas ideias do passado?28 de outubro de 2013 | 09:25
Depois de tentar, pela enésima vez, no post anterior, desmanchar a tolice de certos setores – com boas intenções e péssimos métodos e aritmética – vamos cuidar de quem, como disse a Presidenta Dilma, critica as regras da partilha por defender o capital estrangeiro e não quer mostrar a cara.
No mesmo O Globo, Rogério Furquim Werneck, simpatizante tucano de longa trajetória, publica artigo dizendo que é “hora de repensar o pré-sal”.
O título, provavelmente, é obra de um redator piedoso, porque Werneck nem usa sequer essa palavra no texto: o máximo que diz é que, se fosse “num país sério, deveria dar lugar a uma reavaliação criteriosa das restrições que o governo decidiu impor ao leilão”.
Como Werneck não acha o Brasil um país sério, seu artigo dedica-se a lamentar que “a Petrobras não se tenha contentado com a já esdrúxula participação legal mínima de 30%”.
Como nem o Dr. Werneck nem eu somos novos neste combate, republico aqui o que escrevi sobre suas ideias – de resto, as mesmas – há quase dois anos. Ponto por ponto, procuro revelar o que está por trás de seus argumentos.
A lógica do caixeiro
O professor Rogério Furquim Werneck, um dos decanos do ninho neoliberal instalado na PUC do Rio de Janeiro, volta à carga hoje, na sua coluna, contra a Petrobras.
O seu artigo anterior, prevendo uma Petrobras imobilizada, levou, no mesmo dia, uma tunda do pessoal que não confunde a profissão de economista com a de caixeiro, aqueles mascates tão simpáticos do passado, que se preocupavam em vender tudo, bem rápido, como melhor preço possível e voltar logo para encher de novo o baú de mercadorias, para repetir a dose, enquanto as costas aguentassem o fardo.
Levou uma tunda porque, no mesmo dia, a Petrobras vendia títulos em volume recorde – US$ 7 bilhões – e pagando os menores juros já obtidos em toda a sua história.
Porque, ao contrário dos caixeiros, o mercado heavy-metal está olhando a empresa no médio e longo prazo e sabe que suas perspectivas não são boas, são ótimas.
Porque a Petrobras tem as três coisas que são necessárias para fazer uma grande petroleira.
A primeira, é óbvio, é petróleo. E as jazidas brasileiras, no cálculo mais modesto, vão chegar a 40-50 bilhões de barris. Com otimismo, talvez ao dobro.
E a reserva estabelecida pelo regime de partilha estabelecido no lugar das concessões que vigiam garantem a ela o acesso a este mar de petróleo.
A segunda, é capacidade técnico operacional e tecnológica para explorar este petróleo de águas ultra profundas, bem diferente de furar no deserto de monarquias e regimes “domados”. Nem o mais sectário adorador das multinacionais é capaz de negar a liderança absoluta de empresa neste segmento exploratório.
E a terceira, e é aí que a coisa começa a pegar com o nosso mascate intelectualizado, é capital. Porque ela tem um sócio controlador que não apenas pode capitalizá-la como, neste processo ampliar sua fatia na propriedade da empresa e, portanto, na absorção dos lucros que todos sabem – inclusive o professor Furquim – que ela vai gerar.
Curioso que o professor se escandalize com o fato de que o Governo Federal colocou nela – e não foi grátis, pois a cessão das jazidas já mapeadas de Franco e Libra é, como diz seu nome, onerosa, isto é, a União será remunerada por elas – “R$ 75 bilhões de preciosos recursos do Tesouro”.
Desculpe, professor, mas é da lógica do mercado que o sócio majoritário de uma empresa com perspectivas brilhantes coloque nela capital, porque está colocando onde terá retorno.
A alegação que estes recursos poderiam ser alocados em outras áreas é que se constitui, para usar suas próprias palavras, num “primitivismo estarrecedor”.
E não é preciso uma construção teórica para o provar. Basta perguntar - ao Dr. Furquim Werneck, inclusive – se ele pode apontar os benefícios que o povo brasileiro, dono da Petrobras, auferiu com a venda de parte de seu capital na Bolsa de Nova York, na forma de ADRs, no período FHC. Nem mesmo abateu-se na dívida pública ou se acumularam reservas.
Trocamos um naco da Petrobras – só em parte recuperado com a capitalização – por um nada. Ou por despesas que – mesmo admitindo que não houvesse uns espertalhões de outro tipo de PAC, um “Plano de Acumulação no Caribe” – não deixaram nenhum benefício perene para o Brasil.
Como o tolo da história da galinha dos ovos de ouro, ele reclama que tudo está devagar demais. Que o ouro poderia vir mais depressa se a Petrobras não teimasse em usar o plano de investimentos que terá, obrigatoriamente, de realizar para explorar estas reservas num processo de compras nacionais que gere novas plantas industriais, emprego, riqueza e conhecimento dentro do Brasil.
No “primitivismo estarrecedor” do professor Furquim, por exemplo, teria sido um erro a Petrobras encomendar os navios que levantaram a indústria naval brasileira. Na lógica do mascate, se tem navio para vender lá fora, para entregar mais rápido e custando um pouco menos, é lá que temos de comprar.
Foi assim que o mascate mais festejado do Brasil, o sr. Roger Agnelli, comprou a “Frota do Mico”, os supergraneleiros que, quando não racham, não podem aportar na China.
Ao professor Furquim, com a lógica do caixeiro, pouco se lhe dá, por exemplo, que a encomenda bilionária de três dezenas de sondas de águas ultraprofundas tivesse sido feita aqui. Ao contrário, ele é capaz de provar, e com razão, que se poderia comprá-las na Escandinávia ou na Coreia talvez até uns 10% mais baratas e com entrega mais rápida.
Ele se agarra na entrevista (ótima, por sinal) do ex-diretor de Exploração da empresa, Guilherme Estrella, de que há um ônus imediato na contratação de equipamentos aqui, que faz uma vinculação entre a velocidade de exploração e a capacidade nacional de prover, em boa parte, os equipamentos industriais que ela irá demandar para rebater uma resposta de empresa de que as compras nacionais não guardariam essa relação.
Ora, se algum texto de assessoria afirmou isso, desta maneira, está mais que claro, nos discursos que fizeram a nova presidente da Petrobras, Graça Foster, e a própria presidenta Dilma Rousseff, que essa é uma orientação estratégica.
Aqui não se cometerá a tolice da história da galinha dos ovos de ouro, de correr loucamente para arrancar todo o petróleo, seja como for, para vender seja como for.
Porque nem mesmo o caixeiro, que pratica essa lógica na venda de quinquilharias, age assim quando se trata dos bens próprios, ao que pertence à sua família. Ou aos “batricios”.
Quando se trata de uma riqueza imensa, não-renovável, estratégica, só pode praticá-la quem é outro tipo de vendedor.
Que geralmente são, ao contrário dos cansados caixeiros que viajavam pelo país, encantando as nossas cidadezinhas remotas, homens “cultos”, bem-vestidos e de modos sofisticados.
Mas, na sua alma de desamor a este povo e seu futuro, pensam com um lápis preso na orelha e oferecem-se como os mascates do Brasil.
Por: Fernando Brito
Excelente trabalho
seg, 28/10/2013 - 23:03
Seria bom termos um resumo da planilha, que é bem extensa. Gostei
bastante dos comentários finais, principalmente sobre a questão do risco
associado a eventuais oscilações dos preços do petróleo (a idéia do
risco zero é uma falácia que vinha sendo sutilmente empurrada).Fernando Safatle: O custo do
seg, 28/10/2013 - 23:08
Fernando Safatle: O custo do incentivo à indústria automobilística
publicado em 28 de outubro de 2013 às 0:16
O PETROLEO É NOSSO?
por Fernando Safatle*
enviado pela Sec Geral do MST, publicado no Diário da Manhã de Goiás
No governo da Dilma o leilão do pré-sal não é privatização, mas, sim, partilha.
A transferência para a iniciativa privada da gestão das estradas, aeroportos e portos não é privatização, mas, sim, concessão.
As várias modalidades de transferência e uso da propriedade estatal se transformaram na realidade em uma batalha semântica.
O governo insiste na sua versão de que nada disso é privatização e, evidentemente, tem motivos de sobra para isso.
Não quer de forma nenhuma dar o braço a torcer na recaída ideológico que se submeteu dando, assim, argumentos aos tucanos de que se renderam finalmente as suas teses, pois, afinal, suas duas ultimas vitorias eleitorais foram obtidas no ringue da estatização versus privatização.
Em plena campanha eleitoral em 2010, a candidata Dilma disse com todas as letras: “É um crime privatizar o pré-sal”.
Afinal, quem está certo? Em essência, apesar de constituírem em modelos distintos, ambos, tanto o dos tucanos como o dos petistas são privatizações, pois, transferem a propriedade para a iniciativa privada.
Só que enquanto o dos tucanos transfere a propriedade ad aeternum para o capital privado, as PPPs, dos governos Lula e Dilma, transferem provisoriamente a propriedade, podendo teoricamente voltar durante um determinado tempo ao Estado.
Envolto na mais terrível contradição de seu governo, a Dilma foi logo aos meios de comunicação tentar explicar que o leilão do pré-sal não privatizou, pois a renda a ser produzida no campo de Libra ficaria 85% com o Estado e a Petrobras.
Isso, evidentemente, não anula a natureza da operação: a transferência de 60% da reserva de petróleo para quatro empresas estrangeiras, duas privadas e duas estatais chinesas.
Por que partilhar com o capital estrangeiro uma reserva de petróleo de cerca de 15 bilhões de barris?
Por que a Petrobras não bancou sozinha a sua exploração? Essa é a pergunta que todos querem fazer.
Na realidade, a privatização do pré-sal foi o resultado de uma sucessão interminável de equívocos que o governo vem cometendo na condução do seu modelo econômico.
Primeiro deles foi reproduzir a mesma política econômica do milagre econômico da época do regime militar que sustentava suas altas taxas de crescimento econômico no incentivo ao crescimento da indústria automobilística.
Os governos Lula e Dilma também jogaram pesado nos incentivos para que a industria automobilística pudesse exercer o seu papel dinâmico na economia, puxando e irradiando seu crescimento para os outros segmentos econômicos.
Retirou IPI, afrouxou o credito, cortou a CIDE, ou seja, fez de tudo para que a indústria automobilística pudesse segurar as taxas de crescimento econômico.
Só que, na medida em que crescia o consumo de carros, pressionava a demanda por combustíveis.
Para que não impactasse o preço da gasolina na inflação o governo não só cortou a CIDE, ou seja, renunciou a recursos que estavam destinados ao investimento na mobilidade urbana, como congelou os preços da gasolina, fazendo a Petrobras bancar um prejuízo monumental.
Com isso, erodiu as finanças da Petrobras.
Alguns anos atrás, segundo Carlos Lessa, a Petrobras tinha reservas no montante de 70 bilhões de reais, hoje, reduziu se a 7 bilhões de reais.
Com esse desmonte da Petrobras, claro, tem dificuldades de levantar os 15 bilhões do bônus de assinatura estabelecido no contrato do leilão do campo de Libra.
Ora, mesmo assim, se houvesse o interesse político da Petrobras bancar sozinha a exploração do pré-sal não precisaria o governo estabelecer um bônus de assinatura tão alto a ponto de impedir sua exploração sozinha.
Com isso, a União vai deixar de ganhar de acordo com Sauer e Comparato 176 bilhões de reais, alem da perda da soberania.
Mas não é tudo. Também têm que entrar na conta dos enormes prejuízos causados a nação os estragos produzidos na mobilidade urbana pela opção que o governo fez de induzir o crescimento da frota de automóveis e o desmonte no setor sucroalcooleiro.
O congelamento dos preços da gasolina fez o Brasil perder o bonde da historia na corrida para se transformar na grande potencia na produção de energia limpa e renovável.
Se não tivesse abdicado do programa do etanol, modificando inclusive seu modelo de exploração em direção a sua democratização, introduzindo mudanças que incorporasse o pequeno e médio produtor rural na sua exploração o etanol estaria abastecendo o mercado e a Petrobras, hoje, ao invés de ser importadora de gasolina, ao contrario, estaria exportando gasolina.
A sucessão de equívocos na política economia do país levou ao descalabro da perda da soberania de um bem estratégico, o petróleo, da perda de liderança mundial na produção do etanol e dos profundos estragos na mobilidade urbana. Depois a culpa é dos vândalos e dos Black Bloc.
*Economista — Fernando.safatle@gmail.com
Fazer Amor ou Estuprar? "Ora", é tudo sexo ...
ter, 29/10/2013 - 16:57
Não desgosto do safatle, mas todos nós "stepamos nos tomatoes" de vez em quando. Dentre outras, ele diz:"As várias modalidades de transferência e uso da propriedade estatal se transformaram na realidade em uma batalha semântica"
Pois é...
É como sexo!
O melhor é não aprofundar o debate
seg, 28/10/2013 - 23:54
O nível do debate anda tão baixo que essa colaboração parece não interessar.Dá-se mais importância as baboseiras do Adriano Pires, por exemplo.
Marina Silva não consegue alcançar a proplemática do tema e Aecinho certamente acha que pré-sal é tempero de tira-gosto.
Campos émais profundo, acha que é preciso melhorar, mas não pergunte o quê.
Daqui há 35 anos...
ter, 29/10/2013 - 16:30
Putz! Somente daqui há 35 anos vão chegar a retirar o petróleo de
Libra, o povo brasileiro vai colher os resultados somente depois de 30
anos da retirada do petróleo.Daqui há 75 anos, vamos estar todos juntos de São Pedro quando isto acontecer.
As revervas do pré-sal é de 100 anos de produção.
Isto aí se um filho de Deus não inventar o moto-perpétuo.
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