Daniel Cassol - Especial para a Carta Maior
Porto Alegre - O Rio Grande do Sul passou a contar com o maior parque da América Latina. No dia 5 de maio, o governador Tarso Genro assinou a ordem de serviço para o início das obras do Parque Eólico do Chuí, que junto com os parques do Hermenegildo e de Geribatu, em Santa Vitória do Palmar, formará o Complexo Eólico Campos Neutrais, da Eletrosul, com 583 megawatts de capacidade instalada, gerando energia para 3,7 milhões de pessoas.
No dinâmico mercado do setor, o Rio Grande do Sul se posiciona entre os maiores estados brasileiros em potência instalada de energia eólica. Dinâmico porque trata-se de um mercado em crescimento e sobre o qual ainda pesam alguns entraves para um desenvolvimento ainda mais acelerado.
Diretor de Infraestrutura e Energia da Agência Gaúcha de Desenvolvimento e Promoção do Investimento (AGDI), órgão vinculado à Secretaria de Desenvolvimento e Promoção do Investimento (SDPI) do Governo do Rio Grande do Sul, Marco de Franceschi analisa em entrevista à Carta Maior os desafios do setor e as dificuldades que vêm sendo superadas para que o Rio Grande do Sul se torne uma das regiões mais atrativas para investimentos em energia eólica, na comparação com o Nordeste brasileiro, principal competidor.
“Nós vamos competir com eficiência, com a parceria do Estado, com logística, capacidade de mão de obra. É isso que estamos oferecendo às empresas”, afirma Franceschi, responsável pela execução da política de incentivo à indústria eólica no Rio Grande do Sul.
Na entrevista, ele relata as principais ações voltadas ao fortalecimento do setor e analisa os desafios diante de entraves como a falta de equipamentos e a insuficiência de linhas de transmissão.
O Rio Grande do Sul voltou a contar com o maior parque eólico da América Latina, com a concretização do Complexo Campos Neutrais, na Zona Sul do Estado. Quais são as dimensões deste complexo?
O maior parque que tínhamos até agora era o da Enerfín, de 300 MW. Começou com 150, mas duplicou e está em torno de 300 MW. O Complexo Eólico Campos Neutrais, na Zona Sul, vai somar 583 MW de potência instalada. Vai ser um complexo muito grande – o maior da América Latina –, composto por 28 parques eólicos em Santa Vitória do Palmar e Chuí. O mapa eólico do Estado demonstra que aquela região tem potencial muito forte, só que em contrapartida nós temos lá uma condição ambiental extremamente frágil. O grande sucesso neste projeto está em controlar o impacto ambiental. Porque é uma região do Taim, ou seja, área de proteção permanente, à beira d'água, tem todas as condições contrárias. E o parque está tendo sucesso em mitigar todos os problemas ambientais, conseguiu todas as licenças e está executando o parque, por isso também o Complexo Eólico Campos Neutrais é diferenciado, pelas condições ambientais que tem o entorno.
Como o Rio Grande do Sul se posiciona em relação aos demais estados brasileiros no ranking da produção de energia eólica no Brasil?
Nós estamos hoje em terceiro lugar em potência instalada. Provavelmente vamos continuar beirando o segundo, porque os outros estados também estão instalando muita coisa. A energia eólica está crescendo bastante no Brasil. Esse status de primeiro, segundo, terceiro, não é o que estamos levando mais em consideração.
O que nós estamos tentando fazer é extrair ao máximo do que nós temos em potencial. Temos contratados, a serem instalados até 2017-2018, 2 gigawatts. Nós temos hoje 568 MW instalados, e a cada dia entram em operação novos parques. É difícil dizer, uma vez que os outros estados também estão instalando energia, se vamos passar ou não os demais estados. É um negócio muito dinâmico. Mas o Rio Grande do Sul continua sendo um dos principais estados do Brasil em termos de energia eólica. Ceará, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul, além da Bahia, que está entrando muito pesado neste processo e tem um potencial muito grande também.
Um detalhe interessante no Rio Grande do Sul é que as áreas com potencial eólico estão em regiões do Estado deprimidas economicamente.
Essa é a grande vantagem. O potencial eólico está nas zonas mais deprimidas do Estado. Isso promove uma movimentação muito grande. Para se ter uma ideia, Santa Vitória do Palmear tem um PIB baixíssimo. Com a entrada desse potencial eólico todo, o município vai ter um retorno financeiro em termos de divisão do ICMS muito grande, já que a base do cálculo é o PIB gerado. Isso vai dar uma alento para os municípios que tem potencial eólico, porque eles vão ter recursos maiores pra investir em saneamento, saúde, educação, ou seja, nos serviços básicos que são afetos às prefeituras. O setor eólico vai ajudar na distribuição de renda e na melhoria das economias dessas populações.
Em termos de competitividade, um dos entraves para o Estado diz respeito à produção de equipamentos. Como esta questão está sendo enfrentada?
Esse é um dos grandes problemas que temos. As fábricas estão basicamente no Nordeste. No Rio Grande do Sul, o custo dos equipamentos chega a ser mais ou menos 10% maior do que para o Nordeste. Mesmo assim, estamos conseguindo instalar os parques, ganhar os leilões e executar esses parques. É uma grande vantagem que temos de execução e trabalho. Outra vantagem do Rio Grande do Sul é uma logística melhor, logística de conexão e transmissão, planejamento, mão de obra mais bem treinada. O Rio Grande do Sul tem condições melhores de instalação desses parques e só por isso que temos condições de competir em alto nível. Porque os estados do Nordeste têm todas as vantagens: a maior parte dos fabricantes está lá. Para se ter uma ideia, uma pá eólica, que tem de 45 a 55 metros de comprimento, leva um tempo enorme para vir de Sorocaba para cá, e o custo disso é gigantesco.
É um processo altamente custoso para instalação de equipamentos no Rio Grande do Sul. Nós estamos trabalhando pesadamente nisso, a AGDI está atraindo empresas para cá, já temos quatro fábricas de torres no Estado, temos agora uma fábrica de aerogeradores que vai se instalar aqui também, e estamos trabalhando muito pra buscar uma fábrica de pás, que está faltando na cadeia produtiva.
Qual é a função da Agência Gaúcha de Desenvolvimento e Promoção do Investimento (AGDI) neste processo?
Nós temos uma lei que é a RS Eólica. Isso dá a responsabilidade de incentivar o setor eólico à Secretaria de Desenvolvimento e Promoção do Investimento. Eu sou o executivo dessa lei. Qual é a nossa responsabilidade? Além de atrair as empresas e as indústrias do setor eólico, é viabilizar os projetos de geração de energia. Trabalhamos com o licenciamento ambiental, com as empresas operadoras e com os construtores de parques para que possamos agilizar os processos de licenciamento ambiental, de isenção fiscal, de importação de equipamentos, a logística de transferência de equipamentos ao Estado. Ou seja, trabalhamos em todas as áreas para ajudar as empresas a viabilizarem os projetos. E nós estamos também trabalhando com a política industrial do setor.
Construímos uma política de incentivo fiscal, de licenciamento, para que esse modelo fique o mais redondo possível. Em conjunto com a FEPAM [Fundação Estadual de Proteção Ambiental] nós fizemos o zoneamento ambiental, e isso é muito importante porque normalmente o atlas eólico não mostra as áreas mais complexas em termos de licenciamento ambiental. Estamos fazendo algo inédito no Brasil. Primeiro, estamos atualizando o atlas feito em 2001, quando a presidente Dilma Rousseff era secretária estadual de Minas e Energia. À época, esse atlas foi feito a 50 metros de altura, agora vai ter medida de 100 e 150 metros, porque é a altura que efetivamente se instala os equipamentos. A primeira coisa é isso. Em segundo lugar, estamos fazendo o zoneamento ambiental. No atlas, teremos o potencial eólico e o zoneamento. Quando o empreendedor for buscar uma área pra fazer o investimento, ele já vai saber exatamente o que precisa fazer ambientalmente. Vamos encurtar o caminho do licenciamento ambiental, que é o que efetivamente tranca neste processo de geração de energia eólica.
Quando este novo atlas fica pronto?
A estimativa é julho. O pessoal reclama muito que o setor ambiental do Rio Grande do Sul é complicado. A questão é que no Rio Grande do Sul a maior parte dos potenciais eólicos estão em zonas de proteção permanente, então a demanda de estudos para licenciamento é muito superior. Nós temos um bioma que precisa ser preservado e ninguém quer estragar isso sobre hipótese alguma. Mas fazemos o máximo para que coexistam os projetos ambientais e os eólicos. A FEPAM está reestruturando seus processos e conseguindo dar conta do recado.
Na atualização do atlas eólico, como o Rio Grande do Sul ficará na comparação com a situação de 2001?
O nosso atlas feito em 2001 dá conta de que o Rio Grande do Sul tem o maior potencial eólico no Brasil, a 100 metros, mas de maneira calculada matematicamente. Nossa estimativa matematicamente feita é de 115 GW. Medida, a estimativa é que vá para 160 a 165 GW, porque algumas áreas que não tinham potencial quando medidas a 50 metros talvez tenham potencial medidas a 100 metros. Isso a uma velocidade de vento de pouco mais de 7 metros por segundo.
Mas hoje há empresas desenvolvendo equipamentos para ventos muito menores, ventos de 4 metros por segundo, e nós temos isso praticamente em todo o Rio Grande do Sul. E não estamos levando em consideração a Lagoa dos Patos, por exemplo, que tem um potencial gigantesco, mas o custo de instalação de projeto eólico offshore, ou seja, na água, é muito superior. Como temos muito potencial a ser explorado em terra, não tem nexo investir em potencial offshore.
Em reportagem recente, o jornal Zero Hora apontou atrasos na conclusão de parques eólicos e de linhas de transmissão no Estado. Por que ocorreram?
Existiu esse atraso por diversos fatores. A linha de transmissão tem 500 quilômetros, passando por rodovias, ferrovias, linhas de telefonia, torres de telefonia, ou seja, um número gigantesco de processos que desembocam no processo ambiental e no IPHAN. Esses processos acarretam alguns atrasos em licenciamento. Em segundo lugar, alguns equipamentos demoraram a chegar também. Como o mercado está aquecido, as fábricas estão com os seus pedidos cheios e às vezes demora pra entregar. Os problemas que aconteceram foram esses: alguns processos ambientais e entrega de equipamentos. São coisas pontuais que já foram solucionadas.
A demora na entrega de equipamentos é um problema que afeta o setor em todo o país?
Nós temos poucos fabricantes no Brasil. E é aquela história do ovo e da galinha: o fabricante não vem porque o mercado não está forte ainda e o mercado não consegue ficar forte porque não tem facilidade de equipamento. Por exemplo: no leilão A-3 do ano passado, pouquíssima gente entrou porque não tinha equipamento e no A-3 são três anos pra deixar o parque pronto. A maior parte dos leilões vencidos foi no A-5, porque são cinco anos para fazer. Onde o Rio Grande do Sul se deu bem foi no A-3, exatamente pela eficiência a instalação. No A-3 do ano passado o Rio Grande do Sul foi o primeiro lugar. No A-5 já foi o terceiro. No A-3 o Rio Grande do Sul se sobressai pela eficiência, pela logística, pela capacidade de execução de obra e, mesmo que o licenciamento ambiental seja complexo aqui, conseguimos realizar o projeto em menos tempo.
No Brasil, quais são os principais entraves para o desenvolvimento da produção de energia eólica?
A produção de equipamentos locais é um desafio. A maior parte dos fabricantes são europeus e chineses. A China concentra o maior número de fábricas de aerogeradores, mas está com o mercado muito aquecido. Já os europeus estão sem dinheiro para investir. Os fabricantes europeus estão com baixa capacidade de investimento. Para vir ao Brasil, instalar uma fábrica aqui e cumprir com as determinações do BNDES Finame, de produzir um equipamento com 60% do custo e 60% do peso no Brasil, tem que investir, desenvolver cadeia. O desafio que nós temos é atrair empresas para o Rio Grande do Sul para fabricar aerogeradores e pás. Fábricas de torres já atraímos: temos quatro fabricantes de torres e estamos inaugurando uma que será uma das cinco melhores fábricas de torre do mundo, que é a Engebasa, que deve inaugurar em julho. Outra que conseguimos atrair para cá foi a Alstom. Nosso desafio é atrair fábricas de aerogeradores e pás, que ainda não temos. Esses são os gargalos que nós enfrentando hoje.
Como o Rio Grande do Sul trabalha para se tornar competitivo em relação ao Nordeste brasileiro, mais atrativo para estes investimentos?
Eles são mais atrativos porque têm algumas vantagens constitucionais que nós não temos e essas são imbatíveis. Nós vamos competir com eficiência, com a parceria do Estado, com logística, capacidade de mão de obra. É isso que estamos oferecendo às empresas.
Em relação à nacionalização da produção de equipamentos, como o Rio Grande do Sul tem trabalhado para atender a regra do BNDES?
Para ser financiada pelo BNDES, a empresa tem que ter uma produção local, ou seja, 60% do peso do equipamento tem ser produzido no Brasil e 60% do custo do equipamento também tem que ser produzido no Brasil. Muitas empresas não conseguem isso. Mas o Rio Grande do Sul tem uma indústria bastante diversificada, um leque bem amplo de indústrias, portanto, uma das maneiras de atrair os investidores é mostrando que aqui eles vão ter condições de viabilizar essa nacionalização muito mais rapidamente. A Foton, por exemplo, está trazendo uma fábrica de caminhões e estimam que vão sair com 80% de nacionalização. Isso não é de graça. O Rio Grande do Sul consegue dar, pela indústria que tem, uma facilidade nesse processo.
Como superar o problema da falta de linhas de transmissão no RS e no Brasil?
Isso é um entrave muito grande. O Rio Grande do Sul ainda não teve esse problema. No Nordeste, por exemplo, diversos parques ainda estão sem conexão. Agora, mudou um pouco o processo de leilão, só podendo participar o projeto com conexão garantida. Nós estamos trabalhando com planejamento para conexão.
Assinamos um convênio com a Eletrosul e estamos planejando isso para 40 anos. Só que o Rio Grande do Sul não tem só energia eólica: tem 89% do carvão brasileiro, tem hidrelétricas a serem feitas, muitas pequenas centrais hidroelétricas. Então, todo esse potencial energético nós estamos planejando como tirar essa energia daqui e transferir para o sistema único nacional. O plano do Rio Grande do Sul é, em 20 anos, ser um exportador de energia. Hoje importamos energia porque produzimos menos do que se consome, só que temos condições de exportar essa energia, se colocarmos em pauta as térmicas a carvão, todo o potencial eólico que nós temos e o potencial hidrelétrico, vamos superar em três ou quatro vezes o que consumiremos. Assim, vamos exportar uma boa quantidade de energia para o Brasil, para o Uruguai, Argentina, podemos ser uma grande usina geradora de energia nessa região da América do Sul.
Diante destes entraves que mencionamos, como o senhor vê o cenário da geração de energia no Brasil?
Tem uma coisa nova que vai acontecer muito forte no Brasil nos próximos anos que é a autogeração, ou geração descentralizada. Aqui na Diretoria de Infraestrutura e Energia da AGDI temos um projeto de desenvolvimento descentralizado, voltado às áreas de ponta da rede elétrica, ou seja, as áreas rurais que são completamente desassistidas em termos de energia. O que é Gerar energia no local de consumo. Isso vai ser feito com paineis fotovoltaicos, parques eólicos de baixa potência, biomassa, biogás. Estamos tentando criar equipamentos que sejam nacionais. Em paralelo a isso estamos tentando colocar a telecomunicação. Isso é uma das coisas que vai crescer muito, porque o Brasil muito grande e tem muita gente ainda no campo e elas precisam permanecer no campo.
Esse processo de desenvolvimento descentralizado que estamos trabalhando aqui AGDI tem um futuro muito grande. A geração descentralizada de energia vai crescer muito. Ainda não é no Brasil porque não temos equipamentos nacionais.
Estamos trabalhando com empresas para que elas se instalem no Rio Grande do Sul para produzirem painéis fotovoltaicos e outras para produzirem aerogeradores de baixa potencia. Vou dar uma notícia em primeira mão: vamos fazer um projeto piloto até o final do ano de geração descentralizada, vamos mostrar uma instalação completa remota, sem conexão com rede, uma amostra de como as coisas podem funcionar. Muitas propriedades rurais recebem energia elétrica monofásica. Isso limita o processo produtivo. Queremos gerar para o produtor rural a possibilidade de aumentar sua capacidade de produção, gerando um círculo virtuoso. Queremos construir um modelo que possa ser executado.
Qual é a previsão?
Até o final do ano queremos montar esse protótipo. Estamos em contato com fabricantes e empresas para esse processo de demonstração.
Porto Alegre - O Rio Grande do Sul passou a contar com o maior parque da América Latina. No dia 5 de maio, o governador Tarso Genro assinou a ordem de serviço para o início das obras do Parque Eólico do Chuí, que junto com os parques do Hermenegildo e de Geribatu, em Santa Vitória do Palmar, formará o Complexo Eólico Campos Neutrais, da Eletrosul, com 583 megawatts de capacidade instalada, gerando energia para 3,7 milhões de pessoas.
No dinâmico mercado do setor, o Rio Grande do Sul se posiciona entre os maiores estados brasileiros em potência instalada de energia eólica. Dinâmico porque trata-se de um mercado em crescimento e sobre o qual ainda pesam alguns entraves para um desenvolvimento ainda mais acelerado.
Diretor de Infraestrutura e Energia da Agência Gaúcha de Desenvolvimento e Promoção do Investimento (AGDI), órgão vinculado à Secretaria de Desenvolvimento e Promoção do Investimento (SDPI) do Governo do Rio Grande do Sul, Marco de Franceschi analisa em entrevista à Carta Maior os desafios do setor e as dificuldades que vêm sendo superadas para que o Rio Grande do Sul se torne uma das regiões mais atrativas para investimentos em energia eólica, na comparação com o Nordeste brasileiro, principal competidor.
“Nós vamos competir com eficiência, com a parceria do Estado, com logística, capacidade de mão de obra. É isso que estamos oferecendo às empresas”, afirma Franceschi, responsável pela execução da política de incentivo à indústria eólica no Rio Grande do Sul.
Na entrevista, ele relata as principais ações voltadas ao fortalecimento do setor e analisa os desafios diante de entraves como a falta de equipamentos e a insuficiência de linhas de transmissão.
O Rio Grande do Sul voltou a contar com o maior parque eólico da América Latina, com a concretização do Complexo Campos Neutrais, na Zona Sul do Estado. Quais são as dimensões deste complexo?
O maior parque que tínhamos até agora era o da Enerfín, de 300 MW. Começou com 150, mas duplicou e está em torno de 300 MW. O Complexo Eólico Campos Neutrais, na Zona Sul, vai somar 583 MW de potência instalada. Vai ser um complexo muito grande – o maior da América Latina –, composto por 28 parques eólicos em Santa Vitória do Palmar e Chuí. O mapa eólico do Estado demonstra que aquela região tem potencial muito forte, só que em contrapartida nós temos lá uma condição ambiental extremamente frágil. O grande sucesso neste projeto está em controlar o impacto ambiental. Porque é uma região do Taim, ou seja, área de proteção permanente, à beira d'água, tem todas as condições contrárias. E o parque está tendo sucesso em mitigar todos os problemas ambientais, conseguiu todas as licenças e está executando o parque, por isso também o Complexo Eólico Campos Neutrais é diferenciado, pelas condições ambientais que tem o entorno.
Como o Rio Grande do Sul se posiciona em relação aos demais estados brasileiros no ranking da produção de energia eólica no Brasil?
Nós estamos hoje em terceiro lugar em potência instalada. Provavelmente vamos continuar beirando o segundo, porque os outros estados também estão instalando muita coisa. A energia eólica está crescendo bastante no Brasil. Esse status de primeiro, segundo, terceiro, não é o que estamos levando mais em consideração.
O que nós estamos tentando fazer é extrair ao máximo do que nós temos em potencial. Temos contratados, a serem instalados até 2017-2018, 2 gigawatts. Nós temos hoje 568 MW instalados, e a cada dia entram em operação novos parques. É difícil dizer, uma vez que os outros estados também estão instalando energia, se vamos passar ou não os demais estados. É um negócio muito dinâmico. Mas o Rio Grande do Sul continua sendo um dos principais estados do Brasil em termos de energia eólica. Ceará, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul, além da Bahia, que está entrando muito pesado neste processo e tem um potencial muito grande também.
Um detalhe interessante no Rio Grande do Sul é que as áreas com potencial eólico estão em regiões do Estado deprimidas economicamente.
Essa é a grande vantagem. O potencial eólico está nas zonas mais deprimidas do Estado. Isso promove uma movimentação muito grande. Para se ter uma ideia, Santa Vitória do Palmear tem um PIB baixíssimo. Com a entrada desse potencial eólico todo, o município vai ter um retorno financeiro em termos de divisão do ICMS muito grande, já que a base do cálculo é o PIB gerado. Isso vai dar uma alento para os municípios que tem potencial eólico, porque eles vão ter recursos maiores pra investir em saneamento, saúde, educação, ou seja, nos serviços básicos que são afetos às prefeituras. O setor eólico vai ajudar na distribuição de renda e na melhoria das economias dessas populações.
Em termos de competitividade, um dos entraves para o Estado diz respeito à produção de equipamentos. Como esta questão está sendo enfrentada?
Esse é um dos grandes problemas que temos. As fábricas estão basicamente no Nordeste. No Rio Grande do Sul, o custo dos equipamentos chega a ser mais ou menos 10% maior do que para o Nordeste. Mesmo assim, estamos conseguindo instalar os parques, ganhar os leilões e executar esses parques. É uma grande vantagem que temos de execução e trabalho. Outra vantagem do Rio Grande do Sul é uma logística melhor, logística de conexão e transmissão, planejamento, mão de obra mais bem treinada. O Rio Grande do Sul tem condições melhores de instalação desses parques e só por isso que temos condições de competir em alto nível. Porque os estados do Nordeste têm todas as vantagens: a maior parte dos fabricantes está lá. Para se ter uma ideia, uma pá eólica, que tem de 45 a 55 metros de comprimento, leva um tempo enorme para vir de Sorocaba para cá, e o custo disso é gigantesco.
É um processo altamente custoso para instalação de equipamentos no Rio Grande do Sul. Nós estamos trabalhando pesadamente nisso, a AGDI está atraindo empresas para cá, já temos quatro fábricas de torres no Estado, temos agora uma fábrica de aerogeradores que vai se instalar aqui também, e estamos trabalhando muito pra buscar uma fábrica de pás, que está faltando na cadeia produtiva.
Qual é a função da Agência Gaúcha de Desenvolvimento e Promoção do Investimento (AGDI) neste processo?
Nós temos uma lei que é a RS Eólica. Isso dá a responsabilidade de incentivar o setor eólico à Secretaria de Desenvolvimento e Promoção do Investimento. Eu sou o executivo dessa lei. Qual é a nossa responsabilidade? Além de atrair as empresas e as indústrias do setor eólico, é viabilizar os projetos de geração de energia. Trabalhamos com o licenciamento ambiental, com as empresas operadoras e com os construtores de parques para que possamos agilizar os processos de licenciamento ambiental, de isenção fiscal, de importação de equipamentos, a logística de transferência de equipamentos ao Estado. Ou seja, trabalhamos em todas as áreas para ajudar as empresas a viabilizarem os projetos. E nós estamos também trabalhando com a política industrial do setor.
Construímos uma política de incentivo fiscal, de licenciamento, para que esse modelo fique o mais redondo possível. Em conjunto com a FEPAM [Fundação Estadual de Proteção Ambiental] nós fizemos o zoneamento ambiental, e isso é muito importante porque normalmente o atlas eólico não mostra as áreas mais complexas em termos de licenciamento ambiental. Estamos fazendo algo inédito no Brasil. Primeiro, estamos atualizando o atlas feito em 2001, quando a presidente Dilma Rousseff era secretária estadual de Minas e Energia. À época, esse atlas foi feito a 50 metros de altura, agora vai ter medida de 100 e 150 metros, porque é a altura que efetivamente se instala os equipamentos. A primeira coisa é isso. Em segundo lugar, estamos fazendo o zoneamento ambiental. No atlas, teremos o potencial eólico e o zoneamento. Quando o empreendedor for buscar uma área pra fazer o investimento, ele já vai saber exatamente o que precisa fazer ambientalmente. Vamos encurtar o caminho do licenciamento ambiental, que é o que efetivamente tranca neste processo de geração de energia eólica.
Quando este novo atlas fica pronto?
A estimativa é julho. O pessoal reclama muito que o setor ambiental do Rio Grande do Sul é complicado. A questão é que no Rio Grande do Sul a maior parte dos potenciais eólicos estão em zonas de proteção permanente, então a demanda de estudos para licenciamento é muito superior. Nós temos um bioma que precisa ser preservado e ninguém quer estragar isso sobre hipótese alguma. Mas fazemos o máximo para que coexistam os projetos ambientais e os eólicos. A FEPAM está reestruturando seus processos e conseguindo dar conta do recado.
Na atualização do atlas eólico, como o Rio Grande do Sul ficará na comparação com a situação de 2001?
O nosso atlas feito em 2001 dá conta de que o Rio Grande do Sul tem o maior potencial eólico no Brasil, a 100 metros, mas de maneira calculada matematicamente. Nossa estimativa matematicamente feita é de 115 GW. Medida, a estimativa é que vá para 160 a 165 GW, porque algumas áreas que não tinham potencial quando medidas a 50 metros talvez tenham potencial medidas a 100 metros. Isso a uma velocidade de vento de pouco mais de 7 metros por segundo.
Mas hoje há empresas desenvolvendo equipamentos para ventos muito menores, ventos de 4 metros por segundo, e nós temos isso praticamente em todo o Rio Grande do Sul. E não estamos levando em consideração a Lagoa dos Patos, por exemplo, que tem um potencial gigantesco, mas o custo de instalação de projeto eólico offshore, ou seja, na água, é muito superior. Como temos muito potencial a ser explorado em terra, não tem nexo investir em potencial offshore.
Em reportagem recente, o jornal Zero Hora apontou atrasos na conclusão de parques eólicos e de linhas de transmissão no Estado. Por que ocorreram?
Existiu esse atraso por diversos fatores. A linha de transmissão tem 500 quilômetros, passando por rodovias, ferrovias, linhas de telefonia, torres de telefonia, ou seja, um número gigantesco de processos que desembocam no processo ambiental e no IPHAN. Esses processos acarretam alguns atrasos em licenciamento. Em segundo lugar, alguns equipamentos demoraram a chegar também. Como o mercado está aquecido, as fábricas estão com os seus pedidos cheios e às vezes demora pra entregar. Os problemas que aconteceram foram esses: alguns processos ambientais e entrega de equipamentos. São coisas pontuais que já foram solucionadas.
A demora na entrega de equipamentos é um problema que afeta o setor em todo o país?
Nós temos poucos fabricantes no Brasil. E é aquela história do ovo e da galinha: o fabricante não vem porque o mercado não está forte ainda e o mercado não consegue ficar forte porque não tem facilidade de equipamento. Por exemplo: no leilão A-3 do ano passado, pouquíssima gente entrou porque não tinha equipamento e no A-3 são três anos pra deixar o parque pronto. A maior parte dos leilões vencidos foi no A-5, porque são cinco anos para fazer. Onde o Rio Grande do Sul se deu bem foi no A-3, exatamente pela eficiência a instalação. No A-3 do ano passado o Rio Grande do Sul foi o primeiro lugar. No A-5 já foi o terceiro. No A-3 o Rio Grande do Sul se sobressai pela eficiência, pela logística, pela capacidade de execução de obra e, mesmo que o licenciamento ambiental seja complexo aqui, conseguimos realizar o projeto em menos tempo.
No Brasil, quais são os principais entraves para o desenvolvimento da produção de energia eólica?
A produção de equipamentos locais é um desafio. A maior parte dos fabricantes são europeus e chineses. A China concentra o maior número de fábricas de aerogeradores, mas está com o mercado muito aquecido. Já os europeus estão sem dinheiro para investir. Os fabricantes europeus estão com baixa capacidade de investimento. Para vir ao Brasil, instalar uma fábrica aqui e cumprir com as determinações do BNDES Finame, de produzir um equipamento com 60% do custo e 60% do peso no Brasil, tem que investir, desenvolver cadeia. O desafio que nós temos é atrair empresas para o Rio Grande do Sul para fabricar aerogeradores e pás. Fábricas de torres já atraímos: temos quatro fabricantes de torres e estamos inaugurando uma que será uma das cinco melhores fábricas de torre do mundo, que é a Engebasa, que deve inaugurar em julho. Outra que conseguimos atrair para cá foi a Alstom. Nosso desafio é atrair fábricas de aerogeradores e pás, que ainda não temos. Esses são os gargalos que nós enfrentando hoje.
Como o Rio Grande do Sul trabalha para se tornar competitivo em relação ao Nordeste brasileiro, mais atrativo para estes investimentos?
Eles são mais atrativos porque têm algumas vantagens constitucionais que nós não temos e essas são imbatíveis. Nós vamos competir com eficiência, com a parceria do Estado, com logística, capacidade de mão de obra. É isso que estamos oferecendo às empresas.
Em relação à nacionalização da produção de equipamentos, como o Rio Grande do Sul tem trabalhado para atender a regra do BNDES?
Para ser financiada pelo BNDES, a empresa tem que ter uma produção local, ou seja, 60% do peso do equipamento tem ser produzido no Brasil e 60% do custo do equipamento também tem que ser produzido no Brasil. Muitas empresas não conseguem isso. Mas o Rio Grande do Sul tem uma indústria bastante diversificada, um leque bem amplo de indústrias, portanto, uma das maneiras de atrair os investidores é mostrando que aqui eles vão ter condições de viabilizar essa nacionalização muito mais rapidamente. A Foton, por exemplo, está trazendo uma fábrica de caminhões e estimam que vão sair com 80% de nacionalização. Isso não é de graça. O Rio Grande do Sul consegue dar, pela indústria que tem, uma facilidade nesse processo.
Como superar o problema da falta de linhas de transmissão no RS e no Brasil?
Isso é um entrave muito grande. O Rio Grande do Sul ainda não teve esse problema. No Nordeste, por exemplo, diversos parques ainda estão sem conexão. Agora, mudou um pouco o processo de leilão, só podendo participar o projeto com conexão garantida. Nós estamos trabalhando com planejamento para conexão.
Assinamos um convênio com a Eletrosul e estamos planejando isso para 40 anos. Só que o Rio Grande do Sul não tem só energia eólica: tem 89% do carvão brasileiro, tem hidrelétricas a serem feitas, muitas pequenas centrais hidroelétricas. Então, todo esse potencial energético nós estamos planejando como tirar essa energia daqui e transferir para o sistema único nacional. O plano do Rio Grande do Sul é, em 20 anos, ser um exportador de energia. Hoje importamos energia porque produzimos menos do que se consome, só que temos condições de exportar essa energia, se colocarmos em pauta as térmicas a carvão, todo o potencial eólico que nós temos e o potencial hidrelétrico, vamos superar em três ou quatro vezes o que consumiremos. Assim, vamos exportar uma boa quantidade de energia para o Brasil, para o Uruguai, Argentina, podemos ser uma grande usina geradora de energia nessa região da América do Sul.
Diante destes entraves que mencionamos, como o senhor vê o cenário da geração de energia no Brasil?
Tem uma coisa nova que vai acontecer muito forte no Brasil nos próximos anos que é a autogeração, ou geração descentralizada. Aqui na Diretoria de Infraestrutura e Energia da AGDI temos um projeto de desenvolvimento descentralizado, voltado às áreas de ponta da rede elétrica, ou seja, as áreas rurais que são completamente desassistidas em termos de energia. O que é Gerar energia no local de consumo. Isso vai ser feito com paineis fotovoltaicos, parques eólicos de baixa potência, biomassa, biogás. Estamos tentando criar equipamentos que sejam nacionais. Em paralelo a isso estamos tentando colocar a telecomunicação. Isso é uma das coisas que vai crescer muito, porque o Brasil muito grande e tem muita gente ainda no campo e elas precisam permanecer no campo.
Esse processo de desenvolvimento descentralizado que estamos trabalhando aqui AGDI tem um futuro muito grande. A geração descentralizada de energia vai crescer muito. Ainda não é no Brasil porque não temos equipamentos nacionais.
Estamos trabalhando com empresas para que elas se instalem no Rio Grande do Sul para produzirem painéis fotovoltaicos e outras para produzirem aerogeradores de baixa potencia. Vou dar uma notícia em primeira mão: vamos fazer um projeto piloto até o final do ano de geração descentralizada, vamos mostrar uma instalação completa remota, sem conexão com rede, uma amostra de como as coisas podem funcionar. Muitas propriedades rurais recebem energia elétrica monofásica. Isso limita o processo produtivo. Queremos gerar para o produtor rural a possibilidade de aumentar sua capacidade de produção, gerando um círculo virtuoso. Queremos construir um modelo que possa ser executado.
Qual é a previsão?
Até o final do ano queremos montar esse protótipo. Estamos em contato com fabricantes e empresas para esse processo de demonstração.
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