"Tumulto nas ruas gregas aguça crise política, eleva o risco de calote e assusta credores e União Europeia", constata Vinícius Torres Freire, jornalista, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, 17-06-2011.
Eis o artigo.
A Grécia se segura com um dedo na corda bamba. A situação é periclitante a ponto de o FMI ter se resignado a emprestar um dinheirinho de emergência para o governo grego fechar as contas do mês de julho. Sem o dinheirinho, a Grécia quebra já.
Nos programas de TVs de finanças, nos blogs, nas trocas de e-mails, muita gente falava ontem em "momento Lehman" da Grécia. Trata-se de referência, claro, ao bancão de investimentos americano que foi à breca em meados de setembro de 2008, arrastando de vez o planeta para a crise financeira e para a Grande Recessão de 2008-2010.
Trata-se de um exagero - ou pelo menos parece. A Grécia não é assim "too big to fail", grande demais para quebrar, embora, deixada à própria sorte, possa causar estragos extensos e duradouros. De resto, os europeus e o FMI ainda são bem capazes de evitar a bancarrota final do país. Mesmo muitíssimo a contragosto. O problema agora é que a União Europeia e o FMI começam a correr o risco de serem emparedados pelo impasse político e social grego.
O que acontece se o governo grego socialista se desmanchar, sem conseguir votar mais um imenso arrocho social e econômico, como prometeu a fim de receber nova transfusão de dinheiro? O que acontece se o tumulto nas ruas derivar para uma insurreição, de modo a desencorajar qualquer nova coalizão de governo a prosseguir nas "medidas de ajuste" (recessão e achatamento da renda por cinco anos, pelo menos)?
União Europeia e FMI virariam as costas? Deixariam a Grécia dar o calote, quebrar bancos gregos, avariar seriamente alguns bancos franceses e alemães, alem de causar pelo menos algumas semanas de pânico no mercado? Pior ainda, no caso de desordem grega terminal, com abandono do euro, o que seria da moeda europeia e do custo da dívida de Irlanda, Portugal, Espanha, Itália?
Volte-se ao assunto "insurreição". Pode parecer exagero agora. Mas foi uma insurreição, tumulto grave e mortes na rua, que deu cabo do programa de arrocho e da dolarização na Argentina, em 2001 (programa que justamente tentava achatar gastos públicos e salários a fim de salvar sua adesão ao dólar).
O FMI está liberando uma parcela do empréstimo acertado em 2010, embora o governo grego não tenha conseguido cumprir sua parte no acordo, parte no resto praticamente impossível de cumprir. Nos anos 1980, o Brasil quebrado descumpria espertamente os acordos, mas, para ver novo dinheiro, pelo menos assinava novas "cartas de intenções", ou remendos delas. Sim, a Grécia fica na União Europeia da moeda única e, apesar do tamanho, pode causar estrago muito maior que o Brasil dos anos finais da ditadura militar. Ainda assim.
Ressalte-se o tamanho da encrenca. Os socialistas gregos não se entendem. O tumulto está na rua. A União Europeia não chega a um acordo sobre como ampliar e estender o pacote de empréstimos à Grécia, pois querem que os credores privados entrem com algum tutu no programa (o que porém pode configurar calote se a "ajuda privada" for compulsória). Os irlandeses começam a sugerir que os credores privados paguem parte da conta da salvação da banca irlandesa.
O novo pacote grego pode ficar para agosto, setembro. Os gregos e os "mercados" vão viver de um susto e uma corrida.
Fonte:IHU
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