quinta-feira, 16 de junho de 2011

PORTUGAL - A crise e a política econômica neoliberal.

A Crise e a política económica.

A agenda neoliberal na sua fase mais virulenta

Rui Namorado Rosa


O memorando da troika FMI/BCE/UE terá consequências devastadoras em todas as áreas da vida nacional. Entretanto, o governo acelerou já a aplicação de cortes e congelamentos do financiamento ao sistema científico e tecnológico nacional. O que significa o prosseguimento do caminho que vinha sendo seguido há já alguns anos, mas precipitando o seu agravamento futuro.

O memorando de “entendimento” que é imposto a Portugal pela troika PS-PSD-CDS coligada com a troika FMI-BCE-CE é gerador de um cenário de desastre, tanto pela evidente penalização social com que atinge a vida da população portuguesa em geral (poupando a grande burguesia que detém as grandes fortunas, os principais meios de produção, e os principais cargos de direcção), como pela regressão económica em que o país se encontra e que a “estruturação” aprofunda ainda mais, como também, por conduzir inevitavelmente (como se fosse o seu propósito) ao incumprimento perante os credores da dívida externa (por força das condições leoninas do empréstimo). A aceitação deste “entendimento” representaria um duro golpe à soberania do país e às suas capacidades e condições socioeconómicas por largos anos.
Não parece crível que os principais actores desta encenação não retirem a mesma conclusão quanto à insolvência do país a prazo, caso este “entendimento” avance. Mas pelos vistos o capital nacional-internacional está mesmo apostado ou é isso mesmo que tem em mente - levar por diante esta agressão ao nosso povo (com as conhecidas conivências políticas nacionais), que significaria um verdadeiro saque de dinheiro (fruto do trabalho e do roubo de direitos constitucionais dos portugueses) e de património (empresas, terras, o que quiserem comprar ou levar por conta, com a cumplicidade do trio PS-PSD-CDS). Deixando o país aprisionado numa dívida ainda maior.

Entretanto, o governo acelerou já a aplicação de cortes e congelamentos do financiamento ao sistema científico e tecnológico nacional, designadamente para Laboratórios de estado, Unidades de investigação universitárias, projectos de investigação científica e desenvolvimento experimental, e bolsas de investigação. O que significa o prosseguimento do caminho que vinha sendo seguido há já alguns anos, mas precipitando o seu agravamento futuro, ilustrando aquilo que o “entendimento” prevê no que toca à redução de “despesas” e do “peso” da administração pública (central e autónoma). Não obstante os slogans do “choque tecnológico”, do “compromisso com a ciência” e outras mais campanhas de relações públicas (depois de já esgotadas também as da “sociedade do conhecimento”, da “paixão pela educação”, etc.).
A desarticulação da capacidade científica e técnica do estado serve bem os interesses do grande capital; reduz a capacidade de intervenção do estado em matéria de planeamento, regulamentação, licenciamento, administração; liberta a decisão política da crítica técnica; facilita o negócio do outsourcing; liberta quadros qualificados para oportunidades de negócio a custos flexibilizados; etc. Os milhares de doutorados, arvorados pelo governo em bandeira da modernidade e da prosperidade do país – mas sacrificados neste pretendido saque de saldo - sabem bem quanto pesa o trabalho precário, as condições de trabalho adversas, a incompetência de gestores por conta de um governo retrógrado e corrompido, a falta de financiamento para produzirem, a falta de oportunidades e a emigração forçada.
A vertente científica e técnica do “estado mínimo” não é nada inocente, é duplamente negativa – para a economia e para a administração pública. A economia nacional (sobretudo as PME) perde apoios especializados da parte do estado. E a população fica exposta à ignorância e a abusos que a fragilizam; desde os riscos naturais, a segurança e protecção quotidianas (obras públicas e edificação, produtos alimentares e farmacêuticos, redes de águas e sanitárias, riscos tecnológicos, etc.). Tudo a favor do grande capital sem escrúpulos.

O “entendimento” poderia fingir fazer sentido se fosse no quadro de um sistema financeiro internacional previsível ou estacionário. Porém, o “entendimento” conduz em linha recta à atrofia do sistema económico nacional, já caracterizado por enormes dependências alimentar e energética, sufocando a sua capacidade de resposta. Então, no quadro externo instável e resvaladiço de crise sistémica, sujeito a rupturas e preços descontrolados de bens alimentares e de combustíveis, um provável agravamento do contexto externo de aprovisionamento terá repercussão catastrófica na economia e nas condições de vida dos portugueses, também inflacionando ainda mais a divida externa. Esta vulnerabilidade não pode ser ignorada, ela é um risco adicional iminente, o do efeito multiplicador da crise internacional para o plano interno.

O capitalismo procede em Portugal (como na Grécia, Irlanda e possivelmente noutros países mais da UE) à sua consabida missão de extracção de mais-valia e de acumulação de capital, mas agora e aqui por outra via, designadamente o negócio do saque financeiro (chantagem e agiotismo).
Tal como na Líbia procede entretanto ao saque (dos valiosos recursos do subsolo – hidrocarbonetos e água potável, e dos fundos e reservas das empresas do estado e do banco central) pela via violenta da guerra (ilegal e não declarada).
O capitalismo é uma máquina de exploração de configuração variável e tentacular. O presente saque e a ameaça do seu aprofundamento, aqui em Portugal, servirá sinistramente como uma fonte de financiamento da actual guerra contra a soberania e o património do povo Líbio?

Esta é a agenda neoliberal na sua fase mais virulenta.

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