Como Gleisi ascendeu no PT e superou o marido
Não é a primeira vez que a nova ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Helena Hoffmann, vai participar da mesma equipe de governo de seu marido, o titular da Pasta das Comunicações, Paulo Bernardo.
A coabitação aconteceu pela primeira vez em 1999, quando ambos foram convidados pelo então governador do Mato Grosso do Sul, José Orcírio dos Santos, o Zeca do PT. Ela foi para a Pasta da Administração e o marido, para a Fazenda. "Gleisi é mais preparada que o marido e muito mais sagaz", diz Zeca. "Ela teve um papel extraordinário, de valorização e modernização do serviço público. Se articulava com o servidor, com universidades, com a sociedade civil. É um gol de placa da presidente".
A reportagem é de Cristiane Agostine, Vandson Lima, Cristian Klein e Marli Lima e publicada pelo jornal Valor, 08-06-2011.
Zeca conta que conheceu Bernardo no movimento sindical no Banco do Brasil e diz que Gleisi não entrou no seu secretariado por influência do marido, mas, sim, por indicação de representantes do PT em Brasília, onde trabalhava na assessoria da bancada do partido. "Ela criou uma política de cargos e salários, de assistência médica e social", lembra. Com a eleição de Lula, em 2002, Gleisi e Bernardo não participaram da segunda gestão de Zeca e foram para o governo federal.
A nova ministra conviveu diretamente com a presidente Dilma Rousseff na equipe de transição do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, e na definição de políticas para a Itaipu Binacional. Nessa época, Gleisi era diretora-executiva de Finanças da estatal e Dilma comandava o Ministério de Minas e Energia.
No PT, Gleisi foi uma das principais vozes críticas a Palocci, desde que foi deflagrada a crise envolvendo o ex-ministro. Com a divulgação da evolução patrimonial do ex-ministro, a petista reuniu em sua casa a bancada de seu partido e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sugeriu a saída de Palocci do governo.
A trajetória de Gleisi é marcada pela ascensão de assessora parlamentar à ministra da pasta mais importante do Planalto. Entre as características citadas por aliados e opositores, está sua aversão à truculência.
A nova ministra começou a militância no movimento estudantil, filiada ao PCdoB. Gleisi trabalhou como assessora parlamentar na Assembleia Legislativa do Paraná e foi assessora de Jorge Samek, atual diretor-geral da Itaipu Binacional, na Câmara Municipal de Curitiba, em 1988. Um ano depois, Gleisi ingressou no PT. Formada em Direito, com especialização em gestão e finanças, mudou-se para Brasília em 1993 e assessorou a bancada do partido na Câmara, na área econômica. Nessa época, entre os deputados federais estava Paulo Bernardo.
Gleisi passou por dois governos. Além da administração de Zeca do PT, em 1999, foi secretária de Gestão Pública em Londrina de Nedson Micheleti (PT), em Londrina, em 2001.
Depois de atuar como uma das coordenadoras da equipe de transição de Lula, em 2002, a petista foi nomeada diretora de Finanças de Itaipu, cargo em que ficou entre 2003 e 2006. Lula, quando deu posse à diretoria, citou em seu discurso que pela primeira vez uma mulher assumia o cargo de direção na usina.
"Estou comemorando", disse ontem Samek. Segundo ele, Gleisi conseguiu colocar as contas de Itaipu em ordem em poucos meses. Cobrou dívidas ao mesmo tempo em que atuou em obras sociais, como combate à prostituição na fronteira entre Brasil e Paraguai. Mas foi em políticas de igualdade de gênero que ela mais trabalhou nesse período.
A partir de 2003 a advogada, com experiência em administrações públicas, começou a mostrar que tinha interesse em disputar uma eleição. O nome de Gleisi sempre apareceu ligado ao de seu segundo e atual marido, o ministro Paulo Bernardo. Mas a petista surpreendeu já na primeira vez em que tentou as urnas. Nas eleições de 2006, candidatou-se ao Senado pelo PT e, com 45% dos votos, por pouco não venceu o experiente Álvaro Dias (PSDB), que conseguiu 50%. Depois, mesmo apoiada por Lula, foi derrotada na eleição de 2008 para a prefeitura da capital pelo tucano Beto Richa, atual governador do Paraná. Na época, presidia o PT estadual. Em 2010, disputou novamente o Senado e elegeu-se com 3,19 milhões de votos, a maior votação da disputa pelo cargo.
Gleisi sempre defendeu tanto Lula como Dilma e, na campanha passada, assumiu em seu Estado a função de falar da importância de eleger uma mulher para a Presidência. Foi a principal cabo eleitoral de Dilma no Paraná. "Ela fazia mais campanha para a presidente do que para ela", lembra André Passos, ex-presidente do diretório do PT de Curitiba.
Na campanha para o Senado em 2010, Gleisi arrecadou sozinha mais do que todos os seus adversários somados, de acordo com a prestação de contas entregue ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Logrou R$ 7,9 milhões de receita, acima dos R$ 3 milhões conseguidos pelo ex-governador Roberto Requião (PMDB), também eleito, e dos R$ 2,1 milhões de Gustavo Fruet, terceiro colocado.
As doações à petista foram feitas, essencialmente, pelo setor de engenharia e construção, responsável por R$ 3,2 milhões, 40,5% do total arrecadado. O maior doador foi a Construtora Camargo Corrêa, com R$ 1 milhão. A OAS, outra gigante do ramo, também foi generosa com a nova ministra, deixando-lhe R$ 780 mil. Outras onze empresas do ramo destinaram valores a Gleisi.
O PT também destinou grandes somas à campanha da senadora: o Diretório Nacional do partido doou R$ 1,9 milhão. O Comitê Financeiro Único, que arrecadou R$ 2,6 milhões, encaminhou R$ 883 mil só para a campanha de Gleisi. Assim como a senadora, o comitê teve boa parte do seu caixa abastecido por doações de construtoras, responsáveis por R$ 1,95 milhão (75% do total arrecadado). Dos R$ 883 mil que o comitê doou a Gleisi, R$ 584 mil foram repassados em data posterior à eleição. Uma doação de R$ 299 mil foi registrada em 04/08/2010. Outras 16 doações do comitê para Gleisi, em valores menores, foram efetuadas após o pleito.
No TSE, a petista declarou bens no valor de R$ 659.846,00. Gleisi diz ter um apartamento de R$ 245,5 mil e um carro de R$ 88 mil. O restante corresponde a aplicações financeiras e depósito em conta corrente.
No Senado, Gleisi foi a principal defensora da revisão do Tratado de Itaipu, que aumenta de US$ 120 milhões para US$ 360 milhões o montante anual a ser repassado pelo Brasil ao Paraguai. No começo de seu mandato, apresentou um projeto para limitar o teto da remuneração dos servidores públicos.
Gleisi é curitibana, tem 45 anos, dois filhos e é "tuiteira", assim como seu marido. A nova ministra estudou em colégio católico e queria ser freira. Segundo ela, foram os padres que a incentivavam a participar da vida política. Seu nome é uma homenagem a Grace Kelly, princesa de Mônaco, embora tenha grafia diferente. Sua família é de origem alemã e catarinense.
Fonte: IHU
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