segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

POLÍTICA - O ovo da serpente.

Cláudio Lembo

De São Paulo


A Europa silencia. A inteligência nativa e lá de fora se cala. Neste marasmo de ideias, os astutos tomam a frente. Oferecem imagens de segurança e paz. Apresentam o silêncio como lenitivo.

Um processo se desenrola sem alardes. Em pleno regime democrático, geram-se ovos de serpente, como apontou Bergman em seu clássico filme sobre o nascimento do nazismo.

Não chegou até esta América Latina a plenitude deste quadro. Alguns órgãos da imprensa internacional, porém, já apontam a explosão de um forte movimento de direita na Hungria.

Segundo informações, uma Constituição de corte autoritário e cerceadora das liberdades foi aprovada intempestivamente pelo parlamento húngaro e regência do Primeiro Ministro Viktor Orban.

Mau presságio. A crise econômica e a ganância dos operadores financeiros geraram uma insatisfação surda nas sociedades. Esta pode explodir de maneiras as mais diversas.

O rompimento dos padrões civilizados de convívio. O exercício das funções sem respeito às instituições. O uso arbitrário da autoridade. A confusão entre o público e o privado.

Em momentos de crise mais aguda - parece ser o caso da Hungria - surgem os políticos ousados e sem qualquer tradição democrática. Apelam, neste caso, para um declive à direita.

Em 1938, personalidades de direita, apoiadas por empresários inescrupulosos, permitiram o nascimento do nazismo e do fascismo. Estes conduziram a humanidade para a maior tragédia da História.

Aqui, nestes trópicos ensolarados, tudo parece ir bem. Praia, mar e sol compõem a trilogia do mês de janeiro. Quando, porém, o verão se for às mentes se voltarão para a alta da inflação.

A queda da produção industrial. Os resultados insatisfatórios das vendas de fim de ano. A volúpia tributária dos entes federados. A apresentação excessiva dos problemas, sem apontar soluções.

A tudo isto se acrescentará os conflitos de opiniões em um ano eleitoral, como será este 2012. Todos estes ingredientes, por si só, explosivos, podem levar às mais esdrúxulas situações.

Os políticos dos diversos partidos precisam estar atentos à situação social. Não bastam meras palavras. As ações objetivas necessitam ser exercitadas. Os meios de comunicação devem rever a presença de banalidades em sua programação.

O excesso de libertinagem e de imagens de forte erotismo, em dose constante, vilipendia a dignidade das pessoas receptoras das mensagens. Tudo parece permitido. Geram um mundo sem limites.

Quando as fronteiras do bom senso são rompidas pelas muitas variáveis existentes, surgem arautos da moralidade e da ordem. Aí é um Deus nos acuda. Ninguém segura.

Este é o risco do momento atual por toda a parte. O tumor rompeu-se na Hungria. Espera-se que a União Europeia tenha a coragem de intervir e apontar o bom caminho da permanência em democracia.

Caso contrário, há o risco de contaminação. O mau exemplo poderá se estender para outros países. O silêncio voltará a descer sobre a Europa. Será uma fatalidade. Um trágico volver ao passado.

A humanidade - e os brasileiros incluídos - conheceram regimes sem qualquer limite na imposição de violências contra as pessoas. Conseguiu superar tão triste fase.

É, pois, conveniente que todos reflitam sobre os perigos do momento atual, particularmente os detentores de autoridade. Há excessos que não são producentes.

O desrespeito entre integrantes dos órgãos públicos é catastrófico. Produz uma carga de intranquilidade nem sempre percebida por quem está em altos postos.

O Poder enlouquece as pessoas. Estas se esquecem que este é uma vitrine altamente visível. Qualquer deslize é anotado com agudez pela sociedade.

Os abutres dos estados democráticos podem se aproveitar da fraqueza dos atores públicos e infringir pesadas à cidadania.

Cláudio Lembo é advogado e professor universitário. Foi vice-governador do Estado de São Paulo de 2003 a março de 2006, quando assumiu como governador.

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