domingo, 9 de dezembro de 2012

ANOS DE CHUMBO - Chile processa cúpula do Serviço Secreto.


Chile processa cúpula do Serviço Secreto por crimes no maior centro de detenção da ditadura

O maior centro de detenção e torturas da DINA (Direção Nacional de Inteligência, organismo responsável pela repressão durante os anos de 1974 e 1977), por onde passaram quase 5.000 opositores do regime ditatorial de Augusto Pinochet (1973-1990), se tornou nesta semana alvo de mais um capítulo judicial.
A reportagem foi publicada por Opera Mundi, 06-12-2012.
Conhecido como Villa Grimaldi, casarão antigo escondido em um amplo terreno de Peñalolén (zona leste de Santiago), o local abrigou ações que acabaram na morte de 28 pessoas, além de 211 desparecidos, que, em algum momento, passaram pelo centro.

Nesta terça-feira (4/12), a Corte de Apelações de Santiago deu início a um processo contra 13 agentes da DINA pelos crimes de tortura, assassinato e desaparição forçada de 20 pessoas. A ação é também a última da carreira do ministro Alejandro Solís, responsável pelo Caso Villa Grimaldi desde 1998, que irá se aposentar em janeiro de 2013.

Entre os 13 processados no caso se destacam os nomes dos dois principais comandantes da repressão, incluindo o que foi o principal diretor da DINA, o general Manuel “El Mamo” Contreras, detido desde 1993 por seus crimes contra os direitos humanos, cujas condenações dão um total de 275 anos de prisão. Em um documento divulgado pela CIA em 2000, conhecido como Dossiê Hinchey, Contreras é apontado como informante financiado pela agência durante os anos de 1975 e 1977.

O outro nome de peso é o do brigadeiro Miguel Krassnoff, diretor do Serviço de Inteligência das Forças Armadas (cargo que lhe dava poder de decisão dentro da cúpula da DINA, tendo sido um dos principais elos entre a Junta Militar e os serviços secretos da ditadura).

Krassnoff, que cumpre sentença de 144 anos de prisão (pena acumulada após seis diferentes condenações), foi pivô da conturbada homenagem realizada em novembro de 2011 pela prefeitura da comuna de Providencia, que terminou em confronto entre policiais e familiares de vítimas da ditadura. O idealizador da homenagem, o então prefeito Cristián Labbé foi aluno de Krassnoff na Escola Superior de Guerra, e seu superior na DINA – onde Labbé se destacou, sendo designado como guarda-costas pessoal do ditador Augusto Pinochet.
Entre os 13 indiciados pelo novo processo, apenas se encontram presos Contreras, Krassnoff e outros dois militares que formavam a cúpula da DINA: Pedro Espinoza e Marcelo Moren Brito (conhecido por ter assassinado o seu próprio sobrinho, Alan Roberto Bruce, uma das vítimas de Villa Grimaldi citadas na ação). Os quatro receberam a primeira sentença condenatória do caso em 2005 e cumprem pena no presídio especial de Punta Peuco.

Os outros nove envolvidos nos crimes, que já foram réus em processos anteriores, porém absolvidos, são: Basclay Zapata, Rolf Wenderoth, Orlando Manzo, Fernando Lauriani, Gerardo Godoy, Ricardo Mires, Gerardo Urrich, Manuel Carevic e Raúl Iturriaga Neuman.

Entre as vítimas da ditadura chilena que passaram por Villa Grimaldi estão a ex-presidente Michelle Bachelet e sua mãe, Angela Jeria. Em 2006, a então presidente Bachelet voltou à Villa Grimaldi para inaugurar o que hoje é o Parque da Paz, espaço criado em homenagem às vítimas do centro de tortura.

Cumplicidade da imprensa


As 20 vítimas citadas no novo processo teriam sido, segundo as investigações, algumas das primeiras que passaram pelo centro de torturas de Villa Grimaldi, e a maioria é dada como desaparecida – apenas dois tiveram seus corpos encontrados e seus casos são qualificados como homicídio.

Em entrevista para a reportagem do Opera Mundi, o ministro Alejandro Solís relata que o caso começou a ser solucionado a partir de publicações da imprensa brasileira e argentina sobre mortes de opositores do regime de Pinochet. Segundo Solís, os dados encontrados foram repercutidos pelos meios chilenos, que muitas vezes traziam informação falsa como forma de encobrir as desaparições forçadas, uma manobra conhecida como Operação Colombo.

Em 25 de junho de 1975, o jornal curitibano Novo O Dia (segundo a investigação, uma republicação do antigo diário O Dia, também de Curitiba, mas que durou somente três edições) deu destaque a um suposto confronto entre policiais argentinos e chilenos integrantes do MIR (Movimento de Esquerda Revolucionária), na cidade de Salta, no norte do país, que terminou com a morte de 59 miristas.

Na mesma semana, a revista argentina Lea, que teve apenas uma edição, trazia a informação de que outros 60 militantes do MIR teriam falecido após uma briga com militantes de outros grupos clandestinos, na cidade argentina de Mendoza. Tanto a reportagem da revista Lea quanto a do jornal Novo O Dia traziam os nomes completos das 119 pessoas falecidas, cujos corpos nunca foram encontrados.

O magistrado conta também que as novas investigações do caso tiveram importante apoio da Associação dos Jornalistas do Chile, que, em 2006, realizou uma sindicância interna que ajudou a determinar a falsidade das informações publicadas e terminou com a sanção de quatro diretores dos principais jornais do país na época, por atentar contra a ética profissional.

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