“OS CANHÕES MIDIÁTICOS ATIRAM CONTRA LULA”, na visão de jornal argentino
Por Dario Pignotti, no jornal argentino “Página/12”
“Últimas notícias, extra, extra! “Lula viaja para a Europa, fugindo das denúncias de corrupção que o têm preocupado”; “Revelações do empresário Marcos Valério confirmam a vinculação de Lula com o mensalão”; “Golpeado pelas denúncias, o ex-presidente ameaça voltar a ser candidato”; “Lula ataca a imprensa”.
As manchetes acima são dos canais de televisão, sites da internet e alguns jornais brasileiros, nos últimos quinze dias.
Como se sabe, noticiar não é informar: a narração dos dias que correm, especialmente aquela divulgada em tempo real, busca, por definição, impactar o telespectador, mesmo que o preço a pagar seja mutilar os fatos e escamotear dados indispensáveis para que o público saiba o que está ocorrendo.
Contar de maneira anômala os acontecimentos é característico do espetáculo midiático global, que nem sempre responde a motivações ideológicas. O que o distingue, no caso brasileiro, é a deformação seletiva sobre praticamente tudo o que diz respeito a Lula. O ex governante e líder do Partido dos Trabalhadores (PT) é um personagem crucial no panorama político do país e o dirigente brasileiro de maior estatura mundial – sua influência externa só se equipara à de Dilma Rousseff – e aquilo que se conta/inventa sobre ele, em Brasília, às vezes sofre uma segunda distorção, ao chegar aos jornais de Washington, Buenos Aires ou Madri.
Tomemos alguns exemplos: “Revelações do empresário Marcos Valério confirmam a vinculação de Lula com o Mensalão”, foi uma das notícias na imprensa brasileira na semana que passou. Não é adequado chamar Marcos Valério de “empresário”; ele é, na verdade, um lobista que operou com o Partido dos Trabalhadores e que acaba de receber uma condenação no valor de 40 anos de prisão, por sua participação no “mensalão”, aquele escândalo de desvio de dinheiro [supostamente] público e outras irregularidades, ocorrido durante os primeiros anos da gestão de Lula (2003-2010).
Além disso, em que pese a imprensa local não ter dado por certo, as declarações de Valério ao Ministério Público estão longe de ser críveis, sendo a versão apresentada por um “corrupto” condenado na justiça, que busca atenuar sua pena por meio da “delação premiada”.
Também é inexato mencionar “revelações” aquilo que Valério disse, porque, até o momento, não se tem conhecimento de nenhum documento que apoie a sua versão, sem esquecer que, nos corredores do Congresso, Valério se tornou conhecido como um personagem habituado a lançar bravatas vazias.
Nos últimos dias, ficou demonstrado que as aberrações publicadas no Brasil agravam-se mais uma vez quando chegam ao noticiário internacional. Alguns veículos, além de terem dado por verdadeiro o que Valério afirmou, chegaram a citá-lo como o “sócio” de Lula, algo majestosamente falso.
Outro exemplo do oceano que separa os fatos de sua versão televisiva foi a notícia de que o ex mandatário viajou repentinamente para a Europa “escapando das denúncias de corrupção que o têm preocupado”.
Segundo informações obtidas por este correspondente em novembro, a viagem para a França e a Espanha não se montou com o objetivo de salvar a pele de Lula, já que tinha sido planejada com antecipação o suficiente para incluir um evento em Paris, realizado na quinta-feira passada, onde estiveram Dilma Rousseff e seu colega francês François Hollande. E até o cidadão menos informado sabe que a agenda dos chefes de estado não é um “arranjo” de última hora.
Numa bem documentada reportagem publicada pela revista “Carta Capital”, uma das poucas que denuncia os atropelos da “Rede Globo”, reportou-se que grandes veículos e grupos empresariais financiam uma fundação destinada a recompor o ideário conservador, a ensinar que só há democracia quando impera o “livre mercado”, enquanto estimula o ressentimento antiPT e antiLula, como “expoentes do populismo, do estatismo e da corrupção”.
Mesas redondas e seminários organizados por essa entidade sustentada por empresas jornalísticas têm como tema recorrente o atual processo que se encerra no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a antiga cúpula do PT, do “Mensalão”, o suposto pagamento de subornos e desvio de [suposto] dinheiro público que comoveu o país em 2005 e pôs em risco a gestão de Lula.
Essas vozes predominantes da imprensa elogiam a intransigência do STF no julgamento dos petistas responsáveis pelo Mensalão, sem mencionar que o mesmo tribunal inocentou o folclórico ex-presidente Fernando Collor de Mello por falta de provas (ele havia renunciado ao cargo para escapar de um “impeachment”) e que há dois anos ratificou a “Lei de Anistia” herdada da ditadura, desafiando a Corte Interamericana de Direitos Humanos que reclamou a sua derrogação.
A campanha eleitoral para a presidência, em 2014, está em curso e o bloco conservador sabe que a Justiça ou, para ser mais preciso, o STF, é um aliado indispensável para dissimular o déficit político resultado da fratura do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), a maior força de centro-direita, onde ainda não surgiu nenhum dirigente capaz de herdar a liderança do octogenário Fernando Henrique Cardoso, o ex-presidente que encarna o antilulismo puro sangue.
Lula é um bicho político tão popular como astuto e, ao falar em Paris durante o seminário aberto por Dilma Rousseff e Hollande, insinuou que pode voltar a ser candidato a presidente dentro de dois anos. Fez a afirmação de forma meio sinuosa, mas suficientemente clara, como para que os executivos e donos de poder entendam a mensagem. E tremam.
Ele também falou da forma assimétrica com que as empresas de informação divulgam as notícias sobre casos de corrupção. “Quando um político é denunciado, sua cara sai na imprensa pela manhã, à tarde e à noite. Mas vocês já viram algum banqueiro corrupto no jornal? Sabem por que não o viram? Porque ele paga as propagandas dos jornais”, comentou Lula.
No dia seguinte, a ‘Rede Globo’ reportou que Lula tinha renovado os seus ‘ataques’ à ‘imprensa livre’.”
FONTE: escrito por Dario Pignotti, no jornal argentino “Página/12” e publicado no site “Carta Maior” com tradução de Katarina Peixoto (http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21419). [Pequenos entre colchetes adicionados por este blog 'democracia&política].
“Últimas notícias, extra, extra! “Lula viaja para a Europa, fugindo das denúncias de corrupção que o têm preocupado”; “Revelações do empresário Marcos Valério confirmam a vinculação de Lula com o mensalão”; “Golpeado pelas denúncias, o ex-presidente ameaça voltar a ser candidato”; “Lula ataca a imprensa”.
As manchetes acima são dos canais de televisão, sites da internet e alguns jornais brasileiros, nos últimos quinze dias.
Como se sabe, noticiar não é informar: a narração dos dias que correm, especialmente aquela divulgada em tempo real, busca, por definição, impactar o telespectador, mesmo que o preço a pagar seja mutilar os fatos e escamotear dados indispensáveis para que o público saiba o que está ocorrendo.
Contar de maneira anômala os acontecimentos é característico do espetáculo midiático global, que nem sempre responde a motivações ideológicas. O que o distingue, no caso brasileiro, é a deformação seletiva sobre praticamente tudo o que diz respeito a Lula. O ex governante e líder do Partido dos Trabalhadores (PT) é um personagem crucial no panorama político do país e o dirigente brasileiro de maior estatura mundial – sua influência externa só se equipara à de Dilma Rousseff – e aquilo que se conta/inventa sobre ele, em Brasília, às vezes sofre uma segunda distorção, ao chegar aos jornais de Washington, Buenos Aires ou Madri.
Tomemos alguns exemplos: “Revelações do empresário Marcos Valério confirmam a vinculação de Lula com o Mensalão”, foi uma das notícias na imprensa brasileira na semana que passou. Não é adequado chamar Marcos Valério de “empresário”; ele é, na verdade, um lobista que operou com o Partido dos Trabalhadores e que acaba de receber uma condenação no valor de 40 anos de prisão, por sua participação no “mensalão”, aquele escândalo de desvio de dinheiro [supostamente] público e outras irregularidades, ocorrido durante os primeiros anos da gestão de Lula (2003-2010).
Além disso, em que pese a imprensa local não ter dado por certo, as declarações de Valério ao Ministério Público estão longe de ser críveis, sendo a versão apresentada por um “corrupto” condenado na justiça, que busca atenuar sua pena por meio da “delação premiada”.
Também é inexato mencionar “revelações” aquilo que Valério disse, porque, até o momento, não se tem conhecimento de nenhum documento que apoie a sua versão, sem esquecer que, nos corredores do Congresso, Valério se tornou conhecido como um personagem habituado a lançar bravatas vazias.
Nos últimos dias, ficou demonstrado que as aberrações publicadas no Brasil agravam-se mais uma vez quando chegam ao noticiário internacional. Alguns veículos, além de terem dado por verdadeiro o que Valério afirmou, chegaram a citá-lo como o “sócio” de Lula, algo majestosamente falso.
Outro exemplo do oceano que separa os fatos de sua versão televisiva foi a notícia de que o ex mandatário viajou repentinamente para a Europa “escapando das denúncias de corrupção que o têm preocupado”.
Segundo informações obtidas por este correspondente em novembro, a viagem para a França e a Espanha não se montou com o objetivo de salvar a pele de Lula, já que tinha sido planejada com antecipação o suficiente para incluir um evento em Paris, realizado na quinta-feira passada, onde estiveram Dilma Rousseff e seu colega francês François Hollande. E até o cidadão menos informado sabe que a agenda dos chefes de estado não é um “arranjo” de última hora.
Numa bem documentada reportagem publicada pela revista “Carta Capital”, uma das poucas que denuncia os atropelos da “Rede Globo”, reportou-se que grandes veículos e grupos empresariais financiam uma fundação destinada a recompor o ideário conservador, a ensinar que só há democracia quando impera o “livre mercado”, enquanto estimula o ressentimento antiPT e antiLula, como “expoentes do populismo, do estatismo e da corrupção”.
Mesas redondas e seminários organizados por essa entidade sustentada por empresas jornalísticas têm como tema recorrente o atual processo que se encerra no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a antiga cúpula do PT, do “Mensalão”, o suposto pagamento de subornos e desvio de [suposto] dinheiro público que comoveu o país em 2005 e pôs em risco a gestão de Lula.
Essas vozes predominantes da imprensa elogiam a intransigência do STF no julgamento dos petistas responsáveis pelo Mensalão, sem mencionar que o mesmo tribunal inocentou o folclórico ex-presidente Fernando Collor de Mello por falta de provas (ele havia renunciado ao cargo para escapar de um “impeachment”) e que há dois anos ratificou a “Lei de Anistia” herdada da ditadura, desafiando a Corte Interamericana de Direitos Humanos que reclamou a sua derrogação.
A campanha eleitoral para a presidência, em 2014, está em curso e o bloco conservador sabe que a Justiça ou, para ser mais preciso, o STF, é um aliado indispensável para dissimular o déficit político resultado da fratura do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), a maior força de centro-direita, onde ainda não surgiu nenhum dirigente capaz de herdar a liderança do octogenário Fernando Henrique Cardoso, o ex-presidente que encarna o antilulismo puro sangue.
Lula é um bicho político tão popular como astuto e, ao falar em Paris durante o seminário aberto por Dilma Rousseff e Hollande, insinuou que pode voltar a ser candidato a presidente dentro de dois anos. Fez a afirmação de forma meio sinuosa, mas suficientemente clara, como para que os executivos e donos de poder entendam a mensagem. E tremam.
Ele também falou da forma assimétrica com que as empresas de informação divulgam as notícias sobre casos de corrupção. “Quando um político é denunciado, sua cara sai na imprensa pela manhã, à tarde e à noite. Mas vocês já viram algum banqueiro corrupto no jornal? Sabem por que não o viram? Porque ele paga as propagandas dos jornais”, comentou Lula.
No dia seguinte, a ‘Rede Globo’ reportou que Lula tinha renovado os seus ‘ataques’ à ‘imprensa livre’.”
FONTE: escrito por Dario Pignotti, no jornal argentino “Página/12” e publicado no site “Carta Maior” com tradução de Katarina Peixoto (http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21419). [Pequenos entre colchetes adicionados por este blog 'democracia&política].
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