segunda-feira, 1 de setembro de 2008

MST - Os senhores feudais do século XXI querem a criminilização do movimento.

por Silvia Ribeiro [*]

. Em Junho de 2008, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra do Brasil (MST) denunciou a existência de um relatório secreto contra esse grupo, elaborado por iniciativa da Brigada Militar do Rio Grande do Sul (corpo militar com funções policiais), com um par de promotores de aluguer como fachada. Este documento foi "aprovado" em Dezembro de 2007 pelo Conselho do Ministério Público desse estado, a partir do qual essa instituições decidem trabalhar para conseguir a "declaração de ilegalidade" e posterior "dissolução" do MST, um dos movimentos sociais mais relevantes da América Latina. O MST foi fundado em 1985 nesse mesmo estado, e actualmente tem milhões de membros em todo o Brasil. Segundo Leandro Scalabrim advogado de defesa, "estamos perante a maior conspiração civil-militar desde o fim da ditadura".

Por trás desta conspiração repressiva, em conluio com os latifundiários históricos do Rio Grande do Sul, militares e o governo títere da governadora Yeda Crusius, estão as grandes empresas transnacionais de monoculturas industriais de árvores e cereais, como Stora Enso, Aracruz Celulose, Votorantim, Bunge, Cargill e ADM. Ainda que se aproveitem de alianças com os sectores mais rançosos e exploradores do estado, estas empresas são agora as mais beneficiadas com a repressão aos movimentos sociais. É público que a Stora Enso, Aracruz e Votorantim entregaram centenas de milhares de dólares para a campanha da actual governadora, até então desconhecida, agora acusada de vários actos de corrupção.

A transnacionais florestais estão a ocupar agressivamente as mesmas terras que poderiam ser desapropriadas pelas autoridades a fim de entregar aos Sem Terra, segundo as leis de reforma agrária, ou seja, os grandes latifúndios com terras improdutivas. Argumentam que ao instalar milhares de hectares de eucaliptos a terra está "a produzir". Mas essas monoculturas, além de serem lucro só para as transnacionais e produzir papel inútil, depois de serem cortadas duas ou três vezes em 20 anos deixam a terra morta, sem nutrientes, esgotada e cheia de troncos cortados que nunca mais voltarão a crescer nem permitirão que cresça nenhuma outra coisa. Não estão a fazer a terra produzir e sim a matá-la para que ninguém mais a tenha.

O relatório, que ia ser secreto, tem as características típicas das ditaduras militares do continente: é completamente falso. Entre outras falácias, acusa o MST de estar conectado com as FARC da Colômbia, de que as suas escolas — que educam a nível primário e secundário milhares de filhos de camponeses — são centros de treino de guerrilheiros e de que a luta pela terra, que conduzem há mais de duas décadas e que conseguiu 650 mil famílias assentadas em terras desapropriadas legalmente a enormes latifúndios improdutivos, não é senão uma cobertura para outras actividades. Que cobertura!

Nos últimos anos o MST tem sofrido um recrudescimento violentos dos ataques e da repressão contra as acções legítimas (e garantidas pelo direito nacional e internacional de protesto), como mobilizações, marchas e acampamentos, que realiza com o fim de obrigar o governo a cumprir a lei da reforma agrária.

As repressões mais violentas que sofreram inscrevem-se na nova estratégia adoptada pela Brigada Militar a partir do relatório mencionado. Nesse âmbito iniciou-se em Março de 2008 um processo penal contra vários integrantes do MST, acusados do que seriam "delitos" segundo a Lei de Segurança Nacional, um diploma da ditadura. Em Julho de 2008, o conhecido advogado Nilo Batista apresentou em nome dos acusados um recurso para que se desconsiderasse o processo legal contra eles por ser baseado numa lei caduca. Um juiz federal negou o recurso e assim começou a paródia de processo "legal".

Isto é gravíssimo porque significa sinal verde para usar a Lei de Segurança Nacional da ditadura não só contra o MST como contra todos os movimentos e formas de protesto social no Brasil. Se este processo continuar, Lula converter-se-á em outro governo "popular" que usa leis da ditadura contra os movimentos populares. Assim aconteceu no Chile contra os índios mapuches, os quais protestam — inclusive com greve de fome de 112 dias — pela invasão das suas terras com monoculturas das empresas Celulosa Arauco e Mininco do Grupo CMPC.

A ponta de leis amanhadas e repressão governamental contra indígenas e camponeses, avançam os desertos verdes. Se os deixarmos, estes novos senhores feudais nos ilegalizarão a todos.
30/Agosto/2008
Assine o manifesto contra a criminalização do MST
Repúdio à iniciativa do Conselho Superior do Ministério Publico do Estado do Rio Grande do Sul
http://www.mst.org.br/mst/especiais.php?ed=71

[*] Investigadora do Grupo ETC

O original encontra-se em http://www.jornada.unam.mx/2008/08/30/index.php?section=opinion&article=021a1eco

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