Pedro do Coutto
Reportagem – muito boa – de Fernando Nakagawa, O Estado de São Paulo de 30 de abril, focaliza a posição do sistema bancário diante do aumento de 0,75% estabelecido na Selic e acentua que, por isso, os bancos já aumentam a cobrança de juros tanto no crédito para as pessoas físicas, quanto para as empresas. No primeiro caso – não incluídas as taxas do cheque especial – sobe para 43,2% a/a. Para as pessoas jurídicas, a 26%. Na média, 35%. Isso para uma inflação nove vezes menor. O que faz com que os juros reais cobrados sejam na realidade 800% acima do índice inflacionário. Um paraíso para os bancos e principalmente para os banqueiros. Mas a reportagem sustenta que o realimento da Selic é a causa do encarecimento ainda maior do crédito bancário. Não é fato.
Não existe nenhuma razão para isso. Os bancos têm em seu estoque 1 trilhão e 400 bilhões de reais em títulos do Tesouro que lastreiam a dívida mobiliária interna do país. Até o mês passado, recebiam anualmente 8,75% para rolagem desses papeis. Agora passam a receber 9,5%. Este acréscimo representa, de fato, uma receita adicional em torno de 13 bilhões de reais por ano para a rede bancária. Recebe mais com a Selic mais alta, e não a menos. Constitui um equívoco pensar o contrário. Pois na realidade os bancos são, no caso, recebedores e não pagadores de tal taxa.
É necessário derrubar esse mito de que os bancos têm sua despesa aumentada com a Selic maior. Não é verdade. Ao contrário: passam a receber mais em conseqüência da elevação. Basta fazer as contas. A rede bancária é tomadora e não devedora dos títulos federais que garantem o giro da dívida interna. Então –cabe a pergunta clara – se passam a ter receita maior, porque elevar os juros cobrados a seus clientes? Não tem lógica.
Da mesma forma, o raciocínio se aplica aos investidores dos fundos de investimento quando a principal fonte de rendimento estiver nos papéis do Tesouro. Tanto é assim que, ao longo dos dezenoves meses que a Selic sofreu redução, o valor das quotas dos Fundos DI passaram a ser menores em alguns casos perdendo para a rentabilidade (baixa por sinal) das cadernetas de poupança. Logo a relação Selic-bancos está plena e verdadeiramente estabelecida na oscilação dos fundos. Maior Selic, maior receita. Menor Selic, menor receita. E não o contrário.
A matéria de Fernando Nakagawa expôs claramente a contradição, embora não a aponte diretamente. As financeiras acompanharam os bancos e elevaram as taxas de financiamento de automóveis e bens de consumo durável. Também não há lógica nisso. As financeiras operam com base nos fundos de captação e rentabilidade do sistema bancário. Com a elevação da Selic, igualmente tiveram sua receita melhorada. Tudo mais o que se disser sobre o assunto é mera especulação. Para aumentar a cobrança dos juros a seus clientes, o universo bancário encontra sempre uma justificativa por menor lógica que possua na realidade. Sua constelação de interesses, como definia Santiago Dantas, é tão forte quanto o poder do Estado. Constelação: a palavra é exatamente esta.
Enquanto isso, como revelou Joelmir Beting no Jornal da Band de quinta-feira à noite, o total de empréstimos efetuados pela rede de bancos alcançou metade do PIB do país, ou seja, igualmente algo em torno de 1 trilhão e 400 bilhões de reais. Por coincidência, montante equivalente ao da dívida mobiliária interna. Com a nova Selic e os novos juros aos clientes, os bancos ganham duplamente. Impressionante a altura dos juros pagos no Brasil.
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