Uma das poucas vantagens de se ficar velho na profissão de jornalista é ter sido testemunha ocular de muitos fatos importantes no último meio século da vida brasileira. Por isso, não me conformo quando vejo uma história contada de um jeito errado, que não foi como ela aconteceu de verdade, por que eu estava lá, e sei do que estou falando.
É o caso da matéria publicada nesta quarta-feira pela nova Folha de S. Paulo (a reforma, diga-se, é um sucesso, o jornal melhorou muito, tanto na forma como no conteúdo) sob o título “Marina Silva recorre a inventor do Lula-Lá´”.
Segundo o jornal, “PV recruta Paulo de Tarso, mas diz rejeitar marqueteiro profissional´. Autor do jingle petista nas eleições de 1989 já prepara senadora para eventos; contrato ainda estaria em negociação”.
Não é verdade. Letra e música de “Lula-Lá”, o jingle que se tornou uma espécie de hino eleitoral do atual presidente em todas as eleições, desde 1989, são de autoria do compositor Hilton Acioly, que foi parceiro de Geraldo Vandré em canções que fizeram muito sucesso nos antigos festivais de música popular brasileira.
O publicitário Paulo de Tarso Santos foi o responsável pelo programa de televisão batizado de “Rede Povo” no horário político, criação de um grupo de profissionais de comunicação ligados ao PT, do qual eu fazia parte, alguns deles trabalhando como voluntários depois do expediente em suas empresas.
Pois foi exatamente este o caso de Hil patrióticoton Acioly, já compositor consagrado, que criou o jingle sozinho, e não cobrou nada por isso. Não foi fácil, no entanto, emplacá-lo no comando da campanha petista.
A começar pelo próprio Paulo de Tarso, que não gostou da primeira versão de Acioly, alguns dirigentes do PT achavam que o jingle era muito despolitizado e nem falava do PT e das demais siglas aliadas naquela eleição, como eles queriam. ”Se eu fizesse isso, viraria um samba-enredo, não um jingle”, comentou comigo o compositor.
Lula-lá! Brilha uma estrela!
Lula-lá! Cresce a esperança!
Como muita gente ainda se lembra e canta por onde Lula passa, começava assim esta canção singela, que mexia com a emoção das pessoas e nada tinha de político-partidário, mas apenas buscava animar a militância petista nos comícios.
Paulo de Tarso havia encomendado o jingle a Acioly com a única sugestão de que brincasse com o nome dele, o tal do Lula-lá. Houve muita resistência quando o compositor levou seu violão ao comitê eleitoral da Vila Mariana para mostrar o jingle pronto. Quem acabou batendo o martelo foi o próprio Lula, que não se cansou de ouvir a fita nos carros que usamos em nossas viagens no começo da campanha. Mais adiante, onde ele chegava, as pessoas o recepcionavam já cantando o jingle, que pegou logo, e as pessoas não mais esqueceram.
Escrevo para fazer justiça a um músico que trabalha com muita humildade e a um cidadão que contribuiu para o alto astral daquela primeira campanha de Lula para presidente. Marina pode estar contratando a pessoa errada se rejeita um “marqueteiro tradicional”. Santos, que já trabalhou também para o PSDB no governo Fernando Henrique Cardoso, é um profissional do ramo. Não trabalha de graça, como fez Hilton Acioly, o verdadeiro autor do jingle.
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