Por Mauro Santayana
Os homens sentem-se atraídos por muitos motivos ao exercício do poder. De acordo com os exemplos históricos, há de tudo nessa atração, da paranoia e megalomania ao honrado desejo de melhorar a sociedade e o mundo. Muitos buscam o mando para desforrar-se de uma vida insípida, e anseiam pelas glórias de um mandato, ainda que efêmeras. E há os que, sendo ricos, compram os votos, mediante campanhas caras, da mesma forma que adquirem casas suntuosas e automóveis de alto luxo. Muitos dos que se elegem, na esquerda ou na direita, com demagogia ou com dinheiro, sabem que, no poder, terão a oportunidade de promover contratos, facilitar licitações, enfim, ganhar dinheiro.
O que salva a política, e a distingue da criminalidade vulgar, são os idealistas, que, de um lado e do outro do espectro, agem na defesa do que consideram ser o bem público. O conservador atua em defesa da ordem contra qualquer alteração que a comprometa. Defende, com convicção, o direito do capital contra o trabalho, da liberdade de empresa contra a organização dos trabalhadores em sindicatos, a propriedade ilimitada da terra contra os lavradores que aspiram a seu próprio chão.
A presidente Dilma Roussef sabe que se confrontará com grandes dificuldades a fim de compor o governo. Ela terá que atender a reivindicações legítimas de grupos partidários e de forças políticas regionais na formação de seu ministério, além das bancadas corporativas, sem legitimidade institucional, como a dos banqueiros, a do agronegócio, a das multinacionais. E deve se preparar para as ameaças de chantagem parlamentar, no voraz apetite de grupos pela ocupação dos cargos que administram os orçamentos bilionários. As forças políticas sabem que ela ouvirá muito, receberá os interlocutores certos, e confiam em seu juízo, a fim de preservar o interesse nacional e a sua biografia. Governar é resistir às pressões.
É conhecido e mil vezes repetido o provérbio suaili, citado por Jules Nyerere: o poder é como o ovo, na palma da mão; se abrimos os dedos, ele cai e se perde; se apertamos a mão, o esmagamos. É preciso manter o equilíbrio. É em razão disso que, desde os pensadores medievais, o estado é visto ora como um relógio, ora como uma balança. O relógio é a máquina quase perfeita, com suas engrenagens de funções definidas e graduadas. A balança é o equilíbrio em cada momento. Sempre há duas forças que se confrontam, e ao estadista cabe contrapor os pesos, de forma a manter a sobrevivência da comunidade nacional.
Apesar dos desmentidos habituais e claramente insinceros, a luta pelo poder no governo que se inaugura dentro de 50 dias já está encarniçada. É uma luta de partidos contra partidos e, mais acesa ainda, a luta no interior dos dois grandes partidos que constituíram o núcleo da aliança vitoriosa. Na verdade, Dilma é obrigada a ouvi-los, menos pelo que eles tenham contribuído para sua eleição, porque, provavelmente, ela teria sido eleita só com o apoio de Lula, mas pelo apoio que darão ao seu governo no Parlamento. Infelizmente, ela terá que negociar com os bons e com os maus, com os homens sérios mas, também, com os malfeitores espertos, que conseguem escapar da vigilância do Ministério Público e da polícia e controlam votos no Congresso.
A Lei da Ficha Limpa, se bem aplicada, nos traz a renovada esperança de saneamento moral da atividade política. O Brasil, graças a Deus e aos seus cidadãos, hoje muito mais atentos do que no passado, tem evoluído muito no combate à corrupção. O fato de que haja escândalos sucessivos não prova que tenham aumentado mas, sim, que são descobertos e denunciados. Essa vigilância leva, algumas vezes, a exageros e injustiças, que a verdade repara. É melhor que seja assim, do que a impunidade conhecida.
Fonte: JBonline
Nenhum comentário:
Postar um comentário