Mauro Malin, Observatório da Imprensa
“Há no cenário da criminalidade fluminense diferentes lógicas que interagem e tornam complexa a análise, mais ainda a síntese que deve ser feita continuamente pelos meios de comunicação. Nas dobras do noticiário, movido a fatos graves e "sensacionais" (na acepção original, de causar sensação, emoção), abrigam-se algumas informações preciosas. Cabe apontá-las aqui para que não sejamos conduzidos, como leitores, ouvintes, telespectadores e internautas, pela lógica necessariamente improvisada do noticiário, embora ancorada em conceitos e preconceitos antigos.
Em primeiro lugar, o que se viu na quinta-feira (25/11) na Vila Cruzeiro foi uma reação da polícia fluminense a uma série de atos de terrorismo praticados no Grande Rio. Não foi uma ação que fizesse parte especificamente de um planejamento estratégico, embora a hipótese de "entrar na favela" esteja sempre no horizonte. Na própria Vila Cruzeiro foram feitas incursões em 2002 e em 2007, sem que o bastião local tenha sido desmontado.
Em segundo lugar, existe agora uma política de segurança pública mais consistente, da qual são expressões mais visíveis as UPPs, Unidades de Polícia Pacificadora, cujo próprio nome indica uma carga simbólica relevante, uma atenção constante à comunicação com a população, por intermédio da mídia, uma harmonização das diferentes instituições policiais e uma colaboração com forças militares e com o Judiciário. Esse ponto é importante, porque cria um ambiente de respaldo à ação policial, que, segundo as declarações do secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, não tem a finalidade de matar ou ferir, mas não pode deixar de revidar a agressões, produzindo também sua cota de violência.
Em terceiro lugar, nesses momentos de conflito desaparecem do radar as "bandas podres" das polícias e dos poderes Legislativo e Judiciário. Mas é preciso não perdê-las de vista. Ao longo de décadas, tiveram um papel importantíssimo no processo e continuam rendosamente ativas.
Em quarto lugar, e isso passou batido no noticiário de sexta-feira (26), o que está por trás da colaboração do governo federal ‒ que há muito é incapaz de manter controle sobre a entrada de armas militares e drogas no país ‒ com o governo do estado do Rio tem nomes e datas: Copa do Mundo de 2014 e Olimpíada de 2016. Trata-se de dois grandes eventos de massa que têm dimensões negociais (nos dois sentidos) e políticas autoevidentes.
Discurso abandonado
Em quinto lugar, quem imagina que o governador Sérgio Cabral Filho comanda a política de segurança pública de caso pensado deve ter em mente que ele fez campanha, em 2006, prometendo que a ação policial no Rio não seria mais baseada em incursões de "caveirões". Nos últimos dias de dezembro daquele ano, entretanto, bandidos puseram fogo num ônibus interestadual sem deixar que os passageiros saíssem antes. Houve numerosas vítimas, e uma delas foi a política de segurança que estava na cabeça e no discurso de Cabral Filho.
Ele começou 2007 com um discurso guerreiro. Hoje, aos "caveirões" se somam blindados da Marinha. Isso é dito aqui sem subestimar o papel das Forças Armadas, dos "caveirões" (às vezes manipulados por grupos criminosos) e de forças especiais de polícia, como o Bope. O poder de intimidação das forças públicas que investiram contra a Vila Cruzeiro em 25/11 fez a diferença (isso depõe a favor do uso de blindados e de outros meios capazes de promover a dissuasão). Em 2007, a incursão policial foi feita por 1.500 homens, provocou 19 mortes e não permitiu o controle do "território" pelo Estado. Agora, os bandidos fugiram levando suas armas, não conseguiram responder ao revide policial-militar.”
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