Por Mauro Santayana
Tudo indica que a ruptura de relações entre a Venezuela e a Colômbia, decidida ontem pelo presidente Chávez, não durará muito. O bom-senso voltará, mais uma vez, a imperar. Dentro de poucos dias, tomará posse o sucessor de Uribe, e essa será a oportunidade para que intervenham, de um e de outro lado da fronteira, os moderados de ambos os países.
Frustrada a esperança bolivariana de uma pátria grande, de vez em quando surgem questões entre as nações hispano-americanas. A Venezuela e a Colômbia, irmãs siamesas desde os movimentos de independência, são particularmente sensíveis aos problemas de convivência.
Tanto na Venezuela quanto na Colômbia há o conflito, às vezes mais aberto, outras vezes mais discreto, entre a minoria branca, senhora do poder político e dos grandes negócios (entre eles, o do narcotráfico), submissa aos interesses norte-americanos, e a maioria descendente dos índios da cordilheira. A integração entre os primitivos habitantes das terras altas e os conquistadores brancos e seus descendentes não se deu ainda, apesar do esforço de alguns líderes dos dois grupos. Na Venezuela esse conflito não é tão claro quanto na Colômbia, porque no país de Chávez tem sido maior a presença de mestiços no poder.
As elites intelectuais e políticas da Colômbia terão que buscar solução política para o conflito armado que castiga o país, como resultado do bogotazo de 1948. Todas as tentativas de pacificação foram frustradas, porque os dois lados não respeitaram as regras do entendimento. Os guerrilheiros chegaram a participar das eleições, mas os grupos paramilitares assassinaram seus líderes, que haviam deixado a segurança das selvas. Para desarmar os guerrilheiros, a sociedade colombiana terá que os integrar, mediante o trabalho e a participação na vida política. Isso não será fácil: para que se desarmem os membros das Farc, deverão ser dissolvidos os grupos paramilitares de extrema-direita. Do contrário, será entregar os combatentes de um lado ao ódio de seus inimigos, que os massacrarão impiedosamente.
São inúmeros os observadores internacionais que denunciam crimes hediondos perpetrados pelos grupos de extermínio e pelas forças oficiais de repressão. O caso dos falsos positivos é crime de lesa-humanidade que o governo norte-americano não vê. Jovens são arrebanhados nos meios rurais ou na periferia dos centros urbanos, sob promessa de emprego, e vilmente executados, como se fossem membros das Farc, eliminados em combate. Seus cadáveres servem para nutrir as estatísticas e justificar a gratificação distribuída aos militares como recompensa a falsos atos de bravura. Do outro lado, os movimentos guerrilheiros sequestram e mantêm em cativeiro seus adversários, e, da mesma maneira, atingem pessoas inocentes. O Estado não exerce soberania sobre todo o território, nem os guerrilheiros conseguem ampliar seu domínio.
As fronteiras da Colômbia com os vizinhos são permeáveis, o que possibilita trânsito fácil entre os países, sem que as autoridades percebam. As pessoas falam a mesma língua, têm os mesmos costumes e a mesma face castigada pela pobreza.
Há, no Brasil, os que simpatizam com Chávez e os que o detestam; os que aplaudem a política de aliança incondicional da Colômbia com os Estados Unidos e os que a repudiam. Mas o Brasil, como Estado, deve atuar com absoluta isenção, na busca do entendimento entre Bogotá e Caracas – como, aliás, está fazendo o governo.
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