segunda-feira, 27 de setembro de 2010

MÍDIA - Cureau, a censora.

Extraído do site da Carta Capital

Permito-me sugerir à doutora Sandra Cureau, vice-procuradora-geral daJustiça Eleitoral, que volte a se debruçar sobre os alfarrábios do seutempo de faculdade, livros e apostilas, sem esquecer de manter à mãoos códigos, obras de juristas consagrados e, sobretudo, a Constituiçãoda República. O erro que cometeu ao exigir de CartaCapital, no prazode cinco dias, a entrega da documentação completa do nossorelacionamento publicitário com o governo federal nos leva a duvidardo acerto de quem a escolheu para cargo tão importante. Refiro-me, em primeiro lugar, ao erro, digamos assim, técnico. Aceitouuma denúncia anônima para proceder contra a revista e sua editora. Dizela conhecer a identidade do denunciante, acoberta-o, porém, sob omanto do sigilo condenado pelo texto constitucional e por decisões doSupremo Tribunal Federal. Protege quem, pessoa física ou jurídica,condiciona a denúncia ao silêncio sobre seu nome. Ou seja, avice-procuradora comete uma clamorosa ilegalidade. Há outro erro, ideológico. Quem deveria zelar pela lisura do embateeleitoral endossa a caluniosa afronta que há tempo é cometida até porcolegas jornalistas ardorosamente empenhados na campanha do candidatotucano à Presidência. A ilação desfraldada a partir do apoiodeclarado, e fartamente explicado por CartaCapital, à candidatura- deDilma Rousseff revela a consistência moral e ética, democrática erepublicana dos acusadores, ou por outra, a total inconsistência. Atigrada não concebe adesão a uma candidatura sem a contrapartida emflorins, libras, dracmas. Reais justificados por abundante publicidadegovernista. Sabemos ser inútil repetir que a publicidade governista premia maisfartamente outras publicações. Sabemos que José Serra, aindagovernador, mas de mira posta na Presidência, assinou belos contratosde compra de assinaturas com todas as maiores empresas jornalísticasdo País, com exceção, obviamente, da editora de CartaCapital. Sabemosque não é o caso de esperar pela solidariedade- dos patrões da mídia edos seus empregados, bem como das chamadas entidades de classe, semfalar da patética Sociedade Interamericana de Imprensa. Estas, aliás,se apressam a apoiar a campanha midiática que aponta em Lula o perigopúblico número 1 para a democracia e a liberdade de imprensa. Nem todos os casos denunciados pela mídia nativa merecem as manchetesde primeira página, um e outro nem mesmo um pálido registro. Éinegável, contudo, que dentro do PT há uma lamentável margem demanobra para aloprados de extrações diversas. CartaCapital tem dado odevido destaque a crimes como a quebra de sigilo fiscal e adeploráveis fenômenos de nepotismo e clientelismo, embora não deixe deapontar a ausência das provas sofregamente buscadas pelos perdigueirosda informação, em vão até o momento, de ligações com a campanha deDilma Rousseff. Vale, porém, discutir as implicações da liberdade de imprensa, e deexpressão em geral. É do conhecimento até do mundo mineral que aliberdade de informar encontra seus limites no Código Penal. Se ojornalista acusa, tem de provar a acusação. E informar significarelatar fatos. Corretamente. Quanto à opinião, cada um tem direito àsua. Muito me agrada que o Estadão e o Globo em editoriais e, se não meengano,- um colunista tenham aproveitado a sugestão feita por mim nasemana passada. Por que não comparar Lula a Luís XIV, além deMussolini e Hitler? Compararam, para ampliar o espectro da evocação.De ditadores de extrema-direita a um monarca por direito divino,aprazível passeio pela história. Volto à carga: sinto a falta de Stalin, talvez fosse personagem maisafinada com a personalidade de Lula, aquele que ia transformar oBrasil em república socialista. Quem sabe, a tarefa fique para aguerrilheira terrorista, assassina de criancinhas. Espero ter sido útil, com uma contribuição aos delírios de quempercebe o poder a lhe escorrer entre os dedos. A campanha midiática afavor do candidato tucano não é digna do país que o Brasil merece ser,e sim adequada ao manicômio. Aumenta o clamor de grupelhos deinconformados de uma velha-guarda que não dispensa militares depijama, todos protagonistas de um espetáculo que fica entre aópera-bufa e o antigo Pinel. Que tem a ver com liberdade de imprensaacusar Lula e Dilma de pretenderem “mexicanizar”, ou “venezuelizar” oBrasil? Ou enterrar a democracia? Mesmo que o presidente não pronuncie sempre palavras irretocáveis,onde estão as provas desse terrificante projeto? Temos, isto sim, asprovas em sentido contrário: os golpistas arvoram-se a paladinos deuma legalidade que eles somente ameaçam. A união da mídia já produziualguns entre os piores momentos da história brasileira. A morte deGetúlio Vargas, presidente eleito, a resistência a Juscelino, o golpede 1964 e suas consequências 21 anos a fio, sem contar com a oposiçãoà campanha das Diretas Já. Ou com o apoio maciço à candidatura deFernando Collor, à reeleição de Fernando Henrique, às privatizaçõesvergonhosamente manipuladas. É possível perceber agora que este congraçamento nunca foi tãocompacto. Surpreende-me, por exemplo, o aproveitamento que o Estadãofaz das reportagens de Veja, citada com todas as letras. Em outrostempos não seria assim, a família Mesquita tachava os Civita de“argentários” em editoriais da terceira página. As relações entre osmesmos Mesquita, os Frias e os Marinho não eram também das melhores.Hoje não, hoje estão mais unidos do que nunca. Pelo desespero, creioeu. A união, apesar das divergências, sempre os trouxe à mesma frentequando o risco foi comum. Ameaça ardilosamente elevada à enésimapotência para justificar o revide pronto e imediato. E exorbitante. Aaliança destes dias tem uma peculiaridade porque o risco temido poreles é real, a figurar uma situação muito pior do que aquela imaginadaaté o começo de 2010. Desespero rima com conselheiro, mas como tal épéssimo. De sorte que estão a se mover para mais uma Marcha daFamília, com Deus, pela Liberdade. A derradeira, esperamos. Não nosiludamos, no entanto. São capazes de coisas piores. Otimista em relação ao futuro, na minha visão vivemos os estertores deum sistema, mudança essencial ao sabor de um confronto social emandamento, sem violência, sem sangue. Diria natural, gerado pelodesenvolvimento, pelo crescimento. Donde, por mais sombrios que sejamos propósitos dos verdadeiros inimigos da democracia, eles, desta vez,no pasaran. Eles próprios se expõem a risco até ontem inimaginável. Sehouver chance para uma tentativa golpista, desta vez haverá reaçãopopular, com consequências imprevisíveis. Episódio representativo da situação, conquanto não o mais assombroso,longe disso, é a demanda da vice-procuradora da Justiça Eleitoral paraaveriguar se vendemos, ou não, a nossa alma. Falo em nome de umapequena redação que não desiste há 16 anos na prática do jornalismohonesto, pasma por estar sob suspeita ao apoiar às claras acandidatura Dilma. Sugiro à doutora Sandra que, de mão na massa, verifique também se arevista IstoÉ recebeu lauta compensação do Sindicato dos Metalúrgicosde São Bernardo e Diadema quando o acima assinado em companhia dorepórter Bernardo Lerer, escreveu uma reveladora, ouso dizer,reportagem sobre Luiz Inácio da Silva, melhor conhecido como Lula,publicada em fevereiro de 1978. Ou se acomodou-se em uma espécie demensalão ao publicar oito capas a respeito da ação de Lula à frente deuma sequência de greves entre 1978 e 1980. Ou se me locupleteipessoalmente por ter estado ao lado dele na noite de sua prisão, e dasua saída da cadeia, quando enquadrado pela ditadura na Lei deSegurança Nacional, bem como nas suas campanhas como candidato àPresidência da República. Desde o dia em que conheci o atualpresidente da República, pensei: este é o cara. Mino Carta

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