Marcos Troyjo *, Jornal do Brasil
JB Online
RIO - Crise. Eis a palavra de ordem para jornais no mundo inteiro. Penúria, dificuldade. Momento, como sugeria Antonio Gramsci, em que o velho ainda não morreu e o novo tampouco nasceu.
Mas crise é também julgamento, exame, avaliação. E, nesse repensar, as perguntas: o que acontecerá com o jornalismo impresso? Qual o futuro da mídia? Vale começar, contudo, com o que está acontecendo agora; com o presente da mídia.
Esta conjuntura de 2009, em que o Jornal do Brasil celebra seus 118 anos, é a de um mundo em que:
– a maior empresa de mídia, o Google, não produz um único grama de conteúdo sequer;
– jornais comem poeira da TV, Rádios, Instant Messengers e noticiosos on-line nos chamados “furos”, cada vez mais raros – e, vale dizer, dispensáveis – na mídia impressa;
– na Wikipedia, a enciclopédia colaborativa on-line, há 12 vezes mais verbetes do que na Enciclopédia Britânica, com diferencial de erros desprezível;
– o New York Times, maior marca de mídia impressa do planeta, perdeu 50% de sua circulação paga nos últimos 5 anos;
– o Clarín, jornal argentino, o maior da América Latina, não tem um assinante sequer;
– a redação do maior jornal de economia em espanhol, o Expansión, funciona numa laje de 120 m² em Madri;
– no Brasil, onde a densidade digital da sociedade ainda é relativamente baixa, a venda de celulares ultrapassa a de computadores, que por seu turno supera a de televisores;
– um em cada 4 indivíduos encontra-se plugado na internet;
– centros dinâmicos de empreendedorismo e conhecimento como Boston, Seattle e São Francisco estão perdendo seus tradicionais Globe, Post-Intelligencer e Chronicle. O Boston Globe, a propósito, comprado pelo Grupo NYT há 16 anos por US$ 1 bilhão, está à venda nesta semana por US$ 12 milhões.
A julgar por esse quadro, parece anacrônica a questão se os jornais um dia irão acabar. Com base no fracasso de modelos de negócios tradicionais, eles já acabaram.
Como explicar então o inegável fato de que as pessoas estão cada vez mais bem informadas, que nunca se consumiram doses tão abundantes de notícias, análises, opiniões; que nunca o jornalismo repercutiu tanto.
Além de apontar o óbvio paradoxo de que a disponibilidade da informação vem (fatalmente, para a imprensa) acompanhada de gratuidade, há que sublinhar: não é apenas a mídia (meios) que mudou, mas também a origem e os destinos da informação.
A origem, há um tempo restrita à Redação própria de cada jornal, hoje está no universo de sites, agências de notícias, blogs, vlogs, universidades, nas empresas de qualquer ramo. Circula, enfim, no ciberespaço.
O destino, na mesma medida, que segmentava, por mídia, o tipo de consumidor em suas várias formas (leitor, ouvinte, telespectador, internauta, etc.) condensa-se progressivamente graças à convergência tecnológica.
O grande sucesso da editoria Sociedade Aberta, neste Jornal do Brasil, é exemplo vivo disso. Nenhum jornal do país traz tantos artigos de opinião dos mais diferentes matizes ideológicos e técnicos da sociedade quanto o JB.
Daí surgir mesmo um novo profissional de mídia. Muito preparo e talento na comunicação via texto, som, vídeo. Distinto do profissional passivo, pautado, monomídia, apenas “jornalista”.
Ele hoje tem de ser um publisher capaz de operar em várias plataformas e atento aos vários aspectos do “negócio” além do conteúdo. E, é claro, uma fixação com o aprimoramento constante que beira o “apenas os paranóicos sobrevivem”, conforme o ensinamento de Andrew Grove, o fundador da Intel. Se ele é este profissional, então neste novo mundo ele é um sujeito de grande importância e alcance sempre.
O jornal escrevia para o leitor. A marca de mídia terá, contudo, de estar com o consumidor em toda dimensão de sua cidadania informacional.
Nos países da OCDE, por exemplo, onde são altos os índices de leitura e de alfabetização digital, o tempo médio diário de um leitor com o jornal na mão é de apenas 22 minutos. Fica, no entanto, com seu computador ligado durante 8 horas por dia; seu celular por 16 horas.
No Brasil, a situação não é muito diferente. No futuro breve, jornais diários de grande circulação serão quase que sinais de subdesenvolvimento ou atraso digital de um país. Não é de estranhar que nos EUA, em 2008, mais pessoas obtiveram suas notícias gratuitamente na Internet do que em jornais ou revistas pelas quais tenham pago algum dinheiro. Será que nesse mundo faz algum sentido o lema do New York Times “all the news that's fit to print”?
Talvez aí esteja a chave para o futuro dos jornais. Deixarão de ser newspapers em mais de um sentido, já que são derrotados ingloriamente na corrida tecnológica da notícia e nos custos (econômicos e ambientais) do papel.
De modo crescente – e irreversível – as notícias (news) vão para o digital, para o tempo real gratuito e, onde houver aprofundamento e exclusividade, para um modelo pago e portanto economicamente sustentável.
Daí a importância dos diferenciais, como já apresenta o jb.com.br, nos blogs, serviços e pesquisas que funcionam como atrativos de tráfego. O impacto da enquete online do JB sobre o Obelisco de Ipanema ilustra a pulsão vital deste elo entre o jornal e sua comunidade.
E o papel? Os jornais haverão de se tornar journals. “Diários”, a bem dizer, não como algo impresso a cada dia, mas na dimensão quase afetiva do objeto físico onde se depositam (Querido Diário, hoje eu...) impressões, análises e opiniões sobre aquilo que se vive e viveu. A Economist, “revista” mais influente do mundo, gosta de se definir como journal.
No limite, a missão – e a chance – dos jornais impressos será rever o cotidiano com os olhos da razão. É isso. Rever. Jornais impressos serão revistas. E, no nosso caso, este caminho será trilhado de mãos dadas entre o jornal e os milhares que amam e torcem pelo JB.
* CEO da Companhia Brasileira
de Multimídia/FNDC
Nenhum comentário:
Postar um comentário