Mauro Santayana
Se o encontro de Londres não servir para estabelecer o controle severo dos Estados sobre o sistema econômico e financeiro, terá contribuído para despir os estadistas de sua postura solene. Todos os presentes comportaram-se como gente comum – até mesmo a rainha da Inglaterra. A filha de Jorge VI e a primeira-dama dos Estados Unidos trocaram gestos afetuosos, o que contraria todo o protocolo real. Quanto mais as pessoas se conhecem, mais se entendem. Quando Joel Silveira apresentou José Aparecido de Oliveira, na época secretário da Presidência de Jânio Quadros, a Antonio Maria, o mineiro recusou a mão do pernambucano: não apertaria a mão de quem criticava a política do governo sem conhecê-la. Maria abriu os braços: "Deixa de bobagem, Aparecido. No Brasil, a gente só é adversário enquanto não se conhece. Conheceu, fica amigo".
Não se atribua, como alguns estão fazendo, essa descontração geral apenas à singular personalidade de Lula. Na verdade, nos últimos tempos, seja pela exposição constante dos homens de Estado, seja pela facilidade com que se encontram entre eles mesmos, o poder está perdendo aquela aparência cerimoniosa do passado. A televisão, em seus planos fechados, aproxima a imagem dos poderosos e lhes podemos ver os olhos, o que não ocorria antes. Os historiadores contam que Constantino, o Grande, vestia um manto diferente a cada dia do ano. Theodora – cuja personalidade fascinante, no século 6, antecipa a de Evita Perón, como mulher do povo que ascende ao poder – a fim de impedir que seu marido, o imperador Justiniano, fugisse diante de uma rebelião, disse-lhe que nenhuma mortalha era mais sublime do que o traje imperial.
Um dos grandes truques de Goebbels, o mestre de cerimônias da liturgia nazista, era o de destacar, nos palcos, a figura de Hitler envolta em cone de luz, enquanto se apagavam todas as luzes da Unter den Linden, a majestosa avenida de Berlim, onde se realizavam as grandes manifestações do nazismo. Hitler estava sob a luz, mas distante dos olhos da massa. Muitos especialistas concluem que, se em lugar de se dirigir ao povo alemão pelo rádio, com sua voz estridente e hipnótica, o Führer se utilizasse da televisão, seus olhos o trairiam, e ele não exerceria o fascínio diabólico que exerceu sobre seu povo. As imagens repetidas dos grandes do mundo, vistos pela janela da televisão, os faz nossos vizinhos, que vemos todos os dias, e que, de forma inconsciente, quase cumprimentamos. E assim como há vizinhos cuja aparição incomoda, algumas dessas personalidades mundiais suscitam em muitos de nós antipatia imediata. Qualquer um, ao ver e ouvir personalidades atualíssimas brasileiras, pela televisão, percebe logo que estão mentindo com desfaçatez – e registramos o desconforto em nosso espírito.
O presidente Obama poderia ter dito que respeitava a figura de Lula, com sua forte biografia e pela circunstância de governar um grande país, como o Brasil. Mas não seria a mesma coisa. Ao dizer "eu gosto desse cara", suas palavras, ao perderem cerimônia, ganharam credibilidade. A resposta de Lula não foi menos competente: Obama seria baiano, mineiro, carioca, se andasse entre nós. Enfim, ele e Lula podem entender-se. Dizia João Saldanha, há muitos anos, que os avós de Pelé e do mulato Eusébio, que jogava então em Portugal, haviam corrido do mesmo leão na África. Há alguma coisa semelhante que aproxima os inquilinos da Casa Branca e do Palácio da Alvorada. Ambos correram de destinos indesejáveis.
Enquanto cresce a desconfiança de que o encontro do G-20 se frustrará, manifestantes continuam, como ocorreu em Strasburgo, a protestar na Europa. A indignação dos homens comuns cresce enquanto surgem novas revelações da irresponsabilidade e avidez dos dirigentes das instituições financeiras, que querem manter sua remuneração milionária. Como sempre houve manifestações dessa natureza, dissolvidas pela repressão policial, não parece que elas estejam incomodando muito – pelo menos até agora. Se não houver, no plano mundial, alguma coisa semelhante à ocorrida durante os anos 30 nos Estados Unidos – quando o governo Roosevelt abriu frentes de trabalho, a fim de dar a todos, com o prato de sopa, a ração da esperança – as perspectivas serão sombrias. Há hoje 200 milhões de desempregados no mundo industrializado.
Fonte:JB
Um comentário:
Dória;
O que a Folha deste domingo fez, é canalhice!
Quero pedir sua ajuda, e de todos os blogueiros sérios deste país, para iniciarmos uma campanha organizada de desmonte desta mídia comprometida.
Nossas ações conjuntas podem, e vão, desmascarar farsa que a imprensa está produzindo contra o povo brasileiro.
Conto com você!
Júlio Pegna
SANDALIAS DO PIRATA
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