Um lado só
Autor: Janio de Freitas
Parece lógico que, se um ministro cai, por indícios de corrupção, há um corruptor; mas a lógica é outra.
AINDA UMA vez, indícios de corrupção em obras públicas levam a um acesso de agitação noticiosa e política. Derrubam um ministro bem enraizado. Dão alguma aparência de vida à oposição. Forçam depoimentos e investigações de servidores. E sobre os que corromperam, nada.
A corrupção nas obras públicas brasileiras tem geração espontânea. É assim aos olhos dos congressistas inquiridores, das polícias, do Ministério Público, do Judiciário e do noticiário.
De certa vez, respondi em inquérito da Polícia Federal, com a presença inquiridora também de um procurador da República, a longa e insistente série de perguntas. A razão foi a fraude em uma grande concorrência de obra pública, anulada porque o resultado foi aqui publicado, sob disfarce, com antecipação. Eram 18 grandes empreiteiras que dividiam a concorrência e os bilhões por intermédio da fraude.
Pois não me foi feita nem uma só pergunta sobre qualquer das empreiteiras ou dos seus dirigentes.
Aquela foi a primeira concorrência de obra pública anulada por revelação de fraude. Foi tudo arquivado pela Procuradoria-Geral da República. Mas, bem-sucedida, a receita praticada então pelas instituições e pessoas responsáveis por moralidade administrativa e aplicação das leis ficou para as sucessivas fraudes e atos corruptores do serviço público.
Parece lógico que, se um ministro e assessores graduados caem, por indícios de corrupção, há o lado corruptor. Parece. Mas a lógica a reger tais situações é outra.
Provém, por extensão quando as circunstâncias o exigem, daquela, mais que secular, de aplicação dos ônus a um só lado: nos incidentes comuns, a punição aos humildes; nos casos graúdos, o ônus para os menos influentes ou menos afortunados. E os empreiteiros, se você ainda não notou, com que o ganham no uso dos seus métodos estão ficando donos do Brasi l: telefonia, rodovias, ferrovias, petróleo, TV, hidrelétricas, mineração, siderurgia, não tem fim.
O Brasil também está ficando de um lado só.
BEM NA FITA
O escândalo dos grampos telefônicos usados pelo jornal "News of the World" tem inúmeros precedentes na imprensa inglesa. De igual e até de maior gravidade, inclusive com a decorrência de suicídio.
A cada episódio, discutiram-se a função e a ética da imprensa, códigos de conduta pessoal, mais comissões de orientação.
Tudo com o efeito apenas de proporcionar e tornar mais enganoso o intervalo até o seguinte escândalo de ordinarice jornalística. A existência de jornalismo decente e brilhante não nega que o sensacionalismo repugnante é da natureza da imprensa feita na Inglaterra. E seu grande êxito empresarial.
Não há razão alguma, portanto, para supor que o atual escândalo resulte em alguma inovação saudável por lá. A mecânica será diferente, mas o escândalo futuro da imprensa suja não faltará. Lá.
Aqui, como você pode comprovar graças ao escândalo inglês, a qualidade jornalística é inferior à da imprensa inglesa decente, mas não o padrão ético. A imprensa de sarjeta não chega, aqui, a alterar a média ética da imprensa de que você tanto se queixa. E nós, jornalistas, quase todos também.
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