Assaz Atroz
A renúncia de Maurício Rands
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Favor não confundir a renúncia de Maurício Rands com as de outras figuras (Assaz Atroz)
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Urariano Mota*
Recife - Há três anos, quando lancei “Soledad no Recife”, na foto com o deputado federal Maurício Rands, eu lhe disse brincando:
- Essa foto vai abrir as portas para mim.
Ao que ele me respondeu, com ainda maior brincadeira:
- Pelo contrário, sou eu que vou ter as portas abertas por você.
E por isso ambos rimos. Ele então era líder do PT em Brasília, um dos 10 parlamentares mais influentes do Congresso Nacional. Longe estava da tempestade de hoje. E por isso ambos ríamos, porque era impossível adivinhar em 2009 estas últimas horas.
Agora, com a divulgação da sua carta, em que renuncia ao mandato de deputado federal e à secretaria do governo de Pernambuco, ao mesmo tempo em que sai do Partido dos Trabalhadores, duas ou três reflexões se impõem.
Na primeira delas, vem uma pergunta: será que no jogo real, no jogo bruto, pragmático da política, no jogo bandido de “o feio é perder”, existe algum espaço para as convicções, para a ideologia que serve ao povo em lugar de fazer do povo um criado?
Maurício Rands, em sua tríplice renúncia, em vez do jogo esperto de xadrez e do cinismo de quem em mais nada acredita, deveria ser motivo para a volta à ideia viva de que mais vale no mandato público o uniforme de servidor do que o manto de rei.
Aqui, na altura em ele fala, em trechos da sua carta:
Concluí que esgotei por inteiro minha motivação e a razão para continuar lutando por uma renovação no PT. Percebi terem sido infrutíferas e sem perspectivas minhas tentativas de afirmar a compreensão de que o “como fazer” é tão importante quanto os resultados.
As diferenças de métodos e práticas, aliás, já vinham sendo por mim amadurecidas e acumuladas há algum tempo. Todavia, este processo recente fez com que as divergências ficassem mais claras e insuperáveis.
Na luta pela renovação do partido, no Recife e em outros lugares, infelizmente, têm prevalecido posições da direção nacional, adotadas autoritária e burocraticamente, distantes da realidade dos militantes na base partidária...
Existiram diversas razões que me levaram a este caminho. A mais crucial dá-se no nível da minha consciência. Sempre agi, na vida e na política, com o maior rigor entre o que penso e o que faço. Sempre cumpri os deveres da minha consciência.
Os trechos acima acendem uma luz de alerta. Porque, antes dessas palavras remeterem ao específico do PT, remetem a um sinal vermelho em outros partidos de esquerda. Os parágrafos copiados da carta podem significar que subir ao poder é necessário, pois que é um ideal enfim de todo partido. Afinal, ninguém está na política para discutir a Escola de Atenas. Mas no caso de partidos de esquerda, o poder é a oportunidade de servir à realização do bem público. Esse óbvio, tão declarado em princípios, mais de uma vez é oculto, quando não destruído, na prática de muitos dias. Parece haver uma zona de conforto no poder que é também uma zona de putrefação. Longe do ardor dos anos da fase da luta, distante das batalhas do glorioso passado, vêm bactérias, nome que em política ganha a qualificação de militantes oportunistas, que cercam e apodrecem os mais caros ideais.
Penso, e quero crer, que a renúncia de Maurício Rands ao mandato, ao partido e ao governo, deveria ser um renascer da velha esperança de que homens são um caráter de humanidade. E por assim crer, envio daqui o meu fraterno e companheiro abraço ao político que desce à planície, para o convívio de todos nós.
Nobre e ex-deputado Maurício Rands, agora é claro que a foto do lançamento do livro não nos abriu nenhuma porta. Que nos sirva então de lembrança para as próximas batalhas.
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Urariano Motta* é natural de Água Fria, subúrbio da zona norte do Recife. Escritor e jornalista, publicou contos em Movimento, Opinião, Escrita, Ficção e outros periódicos de oposição à ditadura. Atualmente, é colunista do Direto da Redação e colaborador do Observatório da Imprensa. As revistas Carta Capital, Fórum e Continente também já veicularam seus textos. Autor de Soledad no Recife (Boitempo, 2009) sobre a passagem da militante paraguaia Soledad Barret pelo Recife, em 1973, e Os corações futuristas (Recife, Bagaço, 1997). Colabora com esta nossa Agência Assaz Atroz.
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