‘Foi uma das cenas mais tristes da minha vida’, conta brasileiro que presenciou golpe chileno
Foto: http://glo.bo/1aFmfDo |
A reportagem é de Marina Gonçalves, publicada no jornal O Globo, 11-09-2013.
- A derrota estava estampada no rosto de cada um deles. Tive vontade de chorar.
Benjamin, na época com 25 anos, viu bem de perto o golpe que há 40 anos tirou o então presidente Salvador Allende do poder e instaurou o regime que durou até 1990. Militante da luta armada no Brasil, e parte do MR-8, ele participou do sequestro do embaixador americano Charles Elbrick, em 1969. No Chile, usava passaporte falso, já que pensava em voltar clandestinamente ao Brasil. A sucessão de prisões e mortes, no entanto, inviabilizou o regresso.
- O clima estranho estava no ar há algum tempo, mas ninguém sabia o que aconteceria exatamente. No dia do golpe, saí cedo para um compromisso político. Nas ruas, senti algo esquisito, não passava nenhum ônibus. Perguntei a um popular, que me informou: “Los milicos se alzarón” (”os militares se levantaram”) - conta.
Ao chegar em casa, o jornalista tentou entender o que acontecia pelo rádio. Mas todas as emissoras receberam um ultimato para que entrassem em cadeia com uma já ocupada pelos militares. Ainda assim, uma delas, a Rádio Magallanes, transmitiu o último discurso de Allende, feito quando o Palácio de La Moneda estava sendo bombardeado pela Força Aérea.
- Esse discurso é uma peça histórica. Não o escutei no dia, mas cada vez que o ouço, mesmo anos depois, me emociono com a inteireza política, a lucidez e a coragem demonstrada pelo presidente chileno.
Com o clima de tensão no ar, ele e a família acabaram buscando asilo na embaixada do México, que pouco depois foi cercada por carabineiros. Foram 20 dias com cerca de 200 pessoas na casa, que era grande, mas sem capacidade para receber tanta gente.
- As janelas tinham que ficar sempre fechadas, para evitar o risco de franco-atiradores, que já haviam assassinado com um tiro de fuzil uma refugiada que estava no gramado da embaixada da Itália - conta ele, que acabou escalado para seguir rumo ao México no primeiro vôo de refugiados.
O jornalista, hoje com 64 anos, nunca mais voltou ao país, apesar de ter se casado com uma chilena que conheceu na Suécia - e hoje vive no Brasil com seu segundo filho.
- Tenho vontade de voltar, mas não conheço mais ninguém. Apesar disso, a cada 11 de setembro me lembro, emocionado, daqueles dias, com enorme carinho pelo povo chileno.
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