FRASES PRESAS.
Frases presas
Hoje, quero comentar algumas frases que foram cunhadas na semana que
passou. Não são frases soltas, pois são construções formais que
expressam conteúdos ideológicos bem definidos. Algumas delas mostram
que nem tudo está perdido para aqueles que, como eu, perseguem suas
utopias. Outras, porém, revelam a imensidão do caminho a perseguir para
que, aqui no Brasil, alcancemos os nossos melhores desígnios.
1. Melhor ouvir isso do que ser surdo?
Em artigo publicado em “O Globo”, o colunista Artur Xexéo estranhou a
ausência do pessoal do “Black Bloks” no “Rock in Rio”. Ele aventou como
uma possível razão o fato de a Cidade do Rock ficar muito longe... Eu
já acho que são mesmo públicos distintos aqueles que se esgoelam
histericamente diante de certos sons infernais – entre eles o tilintar
das caixas registradoras do Medina e da Globo - , e aqueles que gritam
reivindicações de cunho social, levando porrada da policia. O músico
“Marcel Schmier”, da banda “Destruction” (?), teria dito, para deleite
do público do “Rock in Rio”: “Meu português é uma merda, so let’s speak in the language of heavy metal” . Felizmente, não tive que ouvir nenhuma das duas linguagens...
2. Uns assumem , outros negam ...
Enquanto estamos assistindo, apesar dos pesares, à posse de diversos
médicos estrangeiros em lugares inóspitos, municípios esquecidos desse
Brasil para onde os nossos profissionais não querem ir , somos, com
frequência, sacudidos com as reações corporativas da classe médica
nacional, que já perdeu essa parada para o povo, a julgar pelas
pesquisas realizadas. A última declaração é para se incorporar aos
anais: o presidente de um dos Conselhos Regionais de Medicina , ao
renunciar ao cargo para não ter que conceder os registros provisórios
aos formados no exterior, citou Martin Luther King ao mencionar uma
posição que “não é segura, não é elegante, não é popular”, mas que tem que ser feita “porque a nossa consciência nos diz que é essa a atitude correta”.
Hipócrates e o próprio Luther King, não sei se de mãos dadas, devem
estar protestando no Além. Em tempo: não houve informações sobre se o
demissionário se aproveitou do embalo e também se demitiu da
profissão...
3. Os homens públicos e as privadas
A semana teve um episódio emblemático, com repercussões idem. O
personagem foi o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) , cujas palavras e
atos são tratados pela mídia como folclóricos, mas que traduzem, no
fundo, um posicionamento aplaudido por todos os saudosos da ditadura que
ainda andam por aí. Inserindo-se onde – por razões óbvias - não foi
chamado , quando da visita da Comissão da Verdade às antigas
dependências do DOI-CODI, reagiu aos que não o queriam ali e foi acusado
de dar um soco (que ele nega e chama de “empurrão por baixo”),
no Senador Randolfe Rodrigues, do PSOL. Quando alertado de que haveria
uma representação do PSOL contra ele, Bolsonaro foi enfático: “Estou me lixando para essa representação! Se chegar no meu gabinete, vou colocar na privada”. Suprema ironia: o deputado Sérgio Moraes (PTB-RS) – que em 2009 disse que estava “se lixando para a opinião pública” – foi escolhido nesta quinta-feira como relator da representação.
4. Soberaria, submissão e silêncio
O episódio da espionagem americana gerou frases de diversas
naturezas. As de Dilma foram as esperadas: a soberania brasileira
requeria mesmo que fossem proferidas e diante da plateia correta, a
assembleia da ONU: “O que temos diante de nós é um sério caso de
violação dos direitos humanos e desrespeito à soberania. Jamais uma
soberania pode firmar-se em detrimento de outra “. Mas temos no
Brasil, sempre tivemos, o pensamento entreguista de plantão, o da turma
que acha que “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”.
Ler as cartas dos leitores da grande imprensa é um prato cheio para um
exame dessa natureza. É a tal alienação, ou seja, a exaltação dos
valores alheios em detrimento dos próprios. O ruim mesmo é quando a
coisa vem de outros segmentos. Um exemplo: o senador Jarbas Vasconcelos
(que recordo com saudades do tempo em que combatia a ditadura) , talvez
por confundir a cabocla e pequena política partidária nacional com
interesses maiores da cidadania, afirmou: “ Foi um expediente
totalmente eleitoreiro, medíocre, que envergonha a história da política
externa brasileira. Uma iniciativa ruim para a senhora Dilma Rousseff e
seu partido, porém muito pior, muito mais grave, para o Brasil, como
nação". Mas houve também frases não ditas: as de Obama. Não sei o
que considero pior nesse caso: a conveniente subserviência de alguns
brasileiros ou a arrogância acintosa do estrangeiro agressor.
5 - Celso de Mello x Midia. Vindo de quem vem...
O Ministro Celso de Mello, sempre apontado como um cidadão ínclito, em entrevista a uma jornalista da Folha, desabafou: “Eu
honestamente, em 45 anos de atuação na área jurídica, como membro do
Ministério Público e juiz do STF, nunca presenciei um comportamento tão
ostensivo dos meios de comunicação sociais buscando, na verdade,
pressionar e virtualmente subjugar a consciência de um juiz”. Em editorial do dia seguinte, a Folha reagiu: “Ainda
que houvesse a tal tentativa de subjugação, seria impróprio tratar
todos os veículos de comunicação como um corpo monolítico. Se muitos
opinaram contra o cabimento do recurso, tantos outros manifestaram-se a
favor dele. Segundo --e mais importante--, a confusão entre a legítima
manifestação de opinião na esfera pública e a perniciosa tentativa de
intimidar magistrados”. Duas posições. Uma, vindo de quem vem,
merece reflexão. A outra é bem previsível. É seguir acompanhando para
tirar conclusões a respeito.
Fonte: Rodolpho Motta no Direto da Redação.
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