A reversão do pessimismo, na opinião de um campeão de mercado
“O repórter
Fernando Travaglini, do Estadão, trouxe a melhor reportagem da semana
para avaliar o comportamento dos mercados em relação à economia: entrevistou um
administrador de fundos campeão, Luís Stuhlberger, que ganhou no começo do ano
apostando no pessimismo; e agora aposta no otimismo, mesmo com
ressalvas.
Os melhores
termômetros do mercado são os grandes gestores de fundos e os tesoureiros dos
grande grupos. Quando erra, o economista perde credibilidade (no caso
brasileiro, nem isso). O gestor perde dinheiro.
Por isso mesmo
são os leitores mais privilegiados das notícias econômicas. Sabem separar a
espuma do essencial, o conteúdo das manchetes escandalosas.
As análises
dos economistas são apenas um dos elementos de decisão. Elas servem de ponto de
partida porque partem de uma metodologia de pegar o passado e projetar o futuro.
Ou seja, se nada for feito nesse período, o resultado lá na frente será
xis.
Ora, a
construção do futuro depende de outros fatores subjetivos, nos quais experiência
e intuição são os elementos que diferenciam os grandes gestores da massa dos
analistas.
Como um craque
como Stuhlberger analisa, por exemplo, a questão fiscal:
1. Lê as
notícias sobre manipulação de indicadores e se assusta. E com
razão.
2, Depois, lê
as análises dos economistas prevendo que, a continuar no ritmo atual, o Brasil
perderá a condição de grau de investimento em pouco tempo. São mencionadas
agências de risco, frases entre aspas de gestores etc.
Aí, fará seu
próprio contraponto:
1. Dará o
devido desconto ao cenário econômico, porque, na maioria das vezes, limita-se a
ler o passado e projetar o futuro. Como já dito, entre o passado e o futuro, há
as decisões a serem tomadas.
2, Em vez de
se valer dos jornais, vai buscar a notícia na fonte. Recebe os relatórios da
Standard & Poors e constata que as manchetes de jornal são terrorismo: não
há o menor risco de derrubar a classificação nos próximos anos.
3. Aí ele
volta os olhares para Brasilia, lê as declarações de Guido, as manifestações de
Dilma, dá o devido desconto nos tropeções retóricos e se fixa no essencial: caiu
a ficha de que não se deve brincar com inflação e questão fiscal.
A partir daí,
define sua estratégia.
Nem se pense
que o grande gestor desgosta das manchetes escandalosas ou inverossímeis: elas
se constituem em elemento essencial de lucro. Quanto maior a dessintonia entre a
boa e a má informação, maior o ganho do gestor competente. Em suma, quanto mais
agentes de mercado acreditarem na direção apontada pelas manchetes, maior o
ganho de quem fizer o contraponto
As
conclusões de Stuhlberger
Na entrevista
de Stuhlberger as conclusões essenciais são as seguintes:
As críticas
dos analistas e a opinião do mercado são um fator de contenção. Ou seja, se a
situação fiscal começa a degradar, há uma grita que acorda o governo para a
questão, seguindo-se medidas corretivas. Esse fator de racionalidade é essencial
para garantir as expectativas positivas.
A política
econômica importa-se muito mais com a inflação do que com a Selic. Ou seja, o
fantasma da inflação é garantia de aumento dos juros e dos ganhos de tesouraria.
O fato do BC ter jogado a toalha da Selic baixa é péssimo para a economia; mas
trouxe tranquilidade para o mercado.
Fica tranquilo
em saber que o governo já tem o diagnóstico de que a próxima etapa do
desenvolvimento se dará através de investimentos - particularmente em
infraestrutura. É sinalização importante para a reciclagem da
poupança.
Sabe que a
questão fiscal imediata se resolve com alguma melhoria na margem.
Não consegue
entender porque o Banco Central persiste em segurar a desvalorização cambial -
que considera irreversível.
Persistema
fatores de risco, especialmente nas contas externas, mas acredita na
racionalidade de Dilma Rousseff e sabe que muitos dos problemas apontados pela
imprensa só se resolvem com muito tempo do país como um todo.
Do
Estadão
Para gestor
de recursos, modelo de desenvolvimento do País é ruim, mas ele diz estar se
posicionando para a tendência de um 'swing' de discreta melhora
21 de dezembro
de 2013 | 23h 06
Fernando
Travaglini - O Estado de S.Paulo
Luis
Stuhlberger, que administra uma das famílias de fundos de investimentos mais
bem-sucedidas do País, prefere não dizer se está otimista ou pessimista. "Gestor
de patrimônio não tem de ter essa resposta", diz ele. "Tem de pensar no que está
nos preços." Mas ao final admite: "Já estive expressando nos meus fundos uma
visão mais negativa do que hoje. Isso não quer dizer que estou otimista. Acho
apenas que a gente vai ganhar um tempo", afirma. "O Brasil ainda melhora um
pouco antes de piorar."
'O governo
aprendeu que a inflação tira a popularidade com uma rapidez enorme. Muito mais
do que a Selic', diz Luís Stuhlberger
NOTÍCIAS
RELACIONADAS'Economista gosta muito de pajelança', diz Belluzzo‘EsseEle explica:
"Nosso modelo de desenvolvimento é ruim, mas a gente tende a ter um ‘swing’
(oscilação) de discreta melhora. Estou me posicionando para isso", afirma em
entrevista ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, na
sede da corretora Credit Suisse Hedging-Griffo, da qual é diretor.
Esse
reposicionamento, que significa ajustar ativos superiores a R$ 20 bilhões, vem
depois de um ano em que o fundo Verde, sob sua gestão, apostou em acentuada
piora das condições brasileiras.
O resultado -
que ele faz questão de dizer que o deixou feliz por ter feito as previsões
corretas, que é o seu principal papel como gestor, mas "triste com o País" - foi
uma valorização acumulada de 16,14% no ano até novembro, contra um CDI (juros)
de 7,22% e uma bolsa que perdeu quase 15% nesse período.
Dois aspectos
o haviam levado, ainda em setembro de 2012, a prever essa deterioração: a
política fiscal e as contas externas. Mais recentemente, no entanto, ele começou
a ver sinais mais positivos vindos tanto de Brasília quanto do cenário externo.
O governo Dilma Rousseff, diz ele, tomou algumas medidas na direção certa, como
o leilão de Libra, as concessões de infraestrutura à iniciativa privada, além do
combate à inflação - inflação que ele credita como um dos principais
catalisadores para as manifestações de junho.
O reflexo da
mudança na visão de Stuhlberger nas carteiras de investimentos dos fundos
administrados por ele se deu principalmente pela compra de ações brasileiras -
cuja participação havia caída para 8%, mas voltou recentemente para 13%. Os
fundos mantiveram, no entanto, a posição comprada em dólar (apostando na alta da
moeda americana) - que ele entende estar "represado" pela atuação do Banco
Central, que vem ofertando semanalmente US$ 2 bilhões em swaps
cambiais.
Menos
pessimista
"Já estive
expressando nos meus fundos uma visão mais negativa do que hoje. Isso não quer
dizer que estou otimista. Acho apenas que a gente vai ganhar um tempo. O Brasil
ainda melhora um pouco antes de piorar. Nosso modelo de desenvolvimento é ruim,
mas a gente tende a ter um ‘swing’ (oscilação) de discreta melhora. Estou me
posicionando para isso. A piora na percepção do Brasil aumenta o prêmio, aumenta
a angústia, mas pelo menos já serviu para alguma coisa. Pelo menos, o governo
acordou para algumas questões. Estávamos assim há quatro, cinco anos e de
repente destravou Libra, destravou Galeão, destravou Confins, estradas. O
governo acordou para dar um certo ‘push’ nessa agenda. Você não conserta o
modelo totalmente, mas joga o muro onde você vai bater para mais
longe."
Inflação e
manifestações
"Minha
percepção é que o País continua com uma certa agonia lenta nesse modelo de
inflação resiliente, sem sair muito da meta, e pouco crescimento por mais algum
tempo. Mas o governo aprendeu que a inflação tira a popularidade com uma rapidez
enorme. Muito mais do que a Selic (taxa básica de juros). Ninguém se incomoda
com a Selic. A inflação, principalmente de alimentos, corrói a renda. Esse
movimento de junho (manifestações) foi desencadeado mesmo pela alta de alimentos
de abril e maio. E acho que em saúde, educação e mobilidade urbana se ganhou
muito pouco. Essa noção do equívoco ela também veio muito rápido."
Moto-contínuo
tropical não deu certo
PT e Dilma
estão aprendendo
"Eu acho,
honestamente, que o PT sempre aprende. Acho a Dilma uma mulher inteligente e
preparada. Se você me dissesse que conseguiriam ressuscitar a Margaret Thatcher,
ainda assim ela teria dificuldades para consertar isso aqui. Por que onde você
vai achar os R$ 4 trilhões que deixaram de ser investidos nos últimos 20 anos?
Isso aqui não é um problema de pessoas. O aparente ‘way of life’ dos mercados
emergentes, enfiando US$ 1 trilhão por ano, melhora muito. Mas quanto tempo é
necessário para melhorar a qualidade das instituições? Demora muito, uma centena
de anos. Estamos vivendo as dores de ter melhorado algumas coisas e não
melhorado em outras."
Câmbio
represado pelos US$ 80 bi em swaps
"O BC tem de
agir. Não estou dizendo que o Banco Central está equivocado (com o programa de
oferta diária de swap cambial - venda de dólares). Eu acho que ele está, talvez,
exagerando na dose. Vendendo seguro em dia de sol. Em momentos de pânico, como
quando começou a história, em maio, do tapering, todas as moedas se depreciaram.
Hoje o Brasil ficou sozinho nessa política de intervenção. Isso não é de se
achar que é normal. Há dois fatores para levar a uma desvalorização no câmbio:
conta corrente (contas externas) ou fiscal. E os dois vão na mesma direção (de
piora). Acho que o BC vai administrar uma alta. Não vai querer congelar o
câmbio."
Fiscal precisa
de Pelés para marcar gol todo ano
"As despesas
do governo - e não é um ano eleitoral - vão acabar o ano subindo quase 8%. E as
receitas, algo como 3,5%, mesmo com Libra e Refis. A receita federal sem as
excepcionalidades estaria crescendo na proporção do PIB, 2,5%. O superávit
primário sem as receitas extraordinárias é quase zero. Está em 0,3%, 0,4% (no
conceito estrutural - sem receitas extraordinárias). Mostrar que o País tem
sustentabilidade fiscal sem precisar de receitas extraordinárias é justamente o
maior desafio brasileiro. Isso me lembra dos anos 60, quando falavam que o
Santos só ganhava porque tinha o Pelé. O Pelé estava sempre lá para fazer os
gols salvadores. Este ano, o Brasil teve seus ‘Pelés’. Teve Libra, o Refis da
crise e dos lucros no exterior. Quais serão os Pelés dos próximos
anos?"
Dá para ter
alguma melhora na margem
"Em suma, eu,
por incrível que pareça, estou menos pessimista do que já estive. Um país que
gasta tanto dinheiro, que consome 41% do PIB, se ele puser um pouco de ordem na
casa, ainda que no longo prazo esse modelo seja insustentável sem reformas, dá
para melhorar. Alguma melhoria na margem dá para ter e acho que o mundo indo bem
nos ajuda."
Exagero com o
tapering
"Saiu o
tapering. Se você me perguntasse às 16h50 (dez minutos antes do anúncio), eu
diria que iriam esperar mais um mês. Mas é questão de mais um mês, apenas. Não
tem muita diferença. Agora, dado que havia uma expectativa de 70% de não ocorrer
agora o tapering, eu esperava que a reação dos mercados, que a valorização do
dólar, fosse maior do que foi. O tapering, francamente, não é tightening
(aperto). É simplesmente imprimir menos dinheiro. Não é que estão subindo os
juros. Há um certo exagero nisso. Deu um certo ‘shake’ em maio, junho, mas no
segundo semestre ele foi típico: cada um na sua. Honestamente, não culpe os
americanos, os gregos, os espanhóis, os russos e os chineses pelos problemas dos
brasileiros. Nossos problemas são nossos. De todos nós. É muito fácil sempre
colocar a culpa no Fed pelos nossos problemas. Vamos ignorar o
Fed."
Economia
internacional não joga contra
"A China andou
bem. A Europa andou médio, mas melhorando. E os Estados Unidos andaram muito.
Isso naturalmente é benéfico. Pelo menos para a indústria brasileira e para as
commodities. Não necessariamente é bom para o consumo, mas ajuda a economia
brasileira. Em 2014, o cenário se repetirá, com crescimento moderado no mundo e
com juros sob controle lá fora."
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