Já faz todo esse tempo? perguntei ao Odair Braz Junior, jovem editor do R7, que
me alertou logo cedo: hoje é o aniversário de 45 anos do AI-5. Ele se
lembrou do dia tristemente histórico, eu não. Pois é, agora parece que
foi ontem, e a gente imaginava que nunca fosse acabar este Ato
Institucional, o golpe dentro do golpe, que afundou de vez o país nas
profundezas da ditadura militar (1964-1984).
Na noite de 13 de dezembro de 1968, eu trabalhava na redação do Estadão, então o mais importante jornal do país que fazia dura oposição ao regime, quando ouvimos pelo rádio o pronunciamento em que Costa e Silva anunciou o AI-5.
Como não quero ser traído pela memória, reproduzo abaixo trecho do meu livro "Do Golpe ao Planalto _ Uma vida de repórter" (Companhia das Letras), uma "autobiografia autorizada", em que relato o que aconteceu naquela noite de terror e de muito medo para quem não nasceu para ser herói, como é o meu caso:
O pior ainda estava por acontecer. Na madrugada de 13 de dezembro, dia em que Costa e Silva editou o Ato Institucional nº 5, o principal editorial do jornal, na página 3, trazia o premonitório título "Instituições em Frangalhos". Informado por algum dos vários colaboradores do regime infiltrados na redação, o delegado Silvio Correia de Andrade, da Polícia Federal, invadiu a oficina, que dava para a rua Martins Fontes, e gritou a ordem: "Parem as máquinas!".
Em seguida, determinou aos policiais que o acompanhavam a apreensão de todos os exemplares, já prontos para a distribuição. Pela primeira vez desde o golpe, o Estado deixou de circular. Logo cedo, Julio Neto e Ruy Mesquita foram se queixar ao governador Abreu Sodré, um amigo da família nomeado para o cargo pelos militares. Comunicaram-lhe que o jornal não mudaria sua linha editorial, agora de oposição aberta ao regime.
No começo da noite, dois policiais à paisana da Divisão de Diversões Públicas da Secretaria de segurança do Estado de São Paulo chegaram à redação para examinar o noticiário político". Era o início oficial da censura prévia. Enquanto eles se aboletavam em volta da mesa de Oliveiros Ferreira, o secretário de redação, nós nos reuníamos para ouvir o pronunciamento do general Costa e Silva num rádio portátil posto sobre a mesa de Clóvis Rossi (o então jovem editor e chefe de reportagem).
No silêncio do ambiente destacava-se a voz grave do general, que não deixava nenhuma dúvida nas suas palavras: meninos, a brincadeira acabou. O Brasil entrava no quinto ato. Era um golpe dentro do golpe _ a ditadura total, sem disfarces, com mais cassações de mandatos, fechamento do Congresso Nacional e fim das liberdades e dos direitos individuais, começando pela censura prévia.
Ao recordar este episódio, muitos anos depois, Oliveiros me contou que Carlão (Luiz Carlos Mesquita, irmão de Julio e Ruy), o nosso amigo diretor, só se zangou quando um contínuo serviu café aos censores. Voltei para a minha mesa e continuei a escrever, como se nada estivesse acontecendo. Sem alternativa, eu e minha turma terminaríamos outra noite na Jussara (uma casa noturna que se tornou familiar para nós). Professor da USP, estudioso dos assuntos militares, Oliveiros Ferreira previu um longo e feroz período de ditadura.
Para azar de todos nós, e a desgraça da democracia brasileira, o velho e sábio mestre Oli estava certo.
E o caro leitor, principalmente os da minha geração, de que se lembra da noite de 13 de dezembro de 1968? Lembra onde estava, como foi?
***
Em tempo: estranhei o silêncio da grande imprensa, principalmente dos seus editorialistas, colunistas e blogueiros, sobre esta efeméride do AI-5.
Vale registrar que os principais meios de comunicação do país, quase todos, apoiaram vivamente o golpe de 1964.
Lembrar das nossas tragédias é importante para não repeti-las, como ficou claro no livro "Brasil Nunca Mais", que relata as maiores atrocidades deste período triste da nossa história.
Em tempo 2: recomendo a todos a leitura dos comentários de Enio Barroso Filho e de Vitor Buaiz, ex-prefeito de Vitória e ex-governador do Espírito Santo, grande figura e meu velho amigo. São pessoas assim que fazem a grandeza deste Balaio.
Na noite de 13 de dezembro de 1968, eu trabalhava na redação do Estadão, então o mais importante jornal do país que fazia dura oposição ao regime, quando ouvimos pelo rádio o pronunciamento em que Costa e Silva anunciou o AI-5.
Como não quero ser traído pela memória, reproduzo abaixo trecho do meu livro "Do Golpe ao Planalto _ Uma vida de repórter" (Companhia das Letras), uma "autobiografia autorizada", em que relato o que aconteceu naquela noite de terror e de muito medo para quem não nasceu para ser herói, como é o meu caso:
O pior ainda estava por acontecer. Na madrugada de 13 de dezembro, dia em que Costa e Silva editou o Ato Institucional nº 5, o principal editorial do jornal, na página 3, trazia o premonitório título "Instituições em Frangalhos". Informado por algum dos vários colaboradores do regime infiltrados na redação, o delegado Silvio Correia de Andrade, da Polícia Federal, invadiu a oficina, que dava para a rua Martins Fontes, e gritou a ordem: "Parem as máquinas!".
Em seguida, determinou aos policiais que o acompanhavam a apreensão de todos os exemplares, já prontos para a distribuição. Pela primeira vez desde o golpe, o Estado deixou de circular. Logo cedo, Julio Neto e Ruy Mesquita foram se queixar ao governador Abreu Sodré, um amigo da família nomeado para o cargo pelos militares. Comunicaram-lhe que o jornal não mudaria sua linha editorial, agora de oposição aberta ao regime.
No começo da noite, dois policiais à paisana da Divisão de Diversões Públicas da Secretaria de segurança do Estado de São Paulo chegaram à redação para examinar o noticiário político". Era o início oficial da censura prévia. Enquanto eles se aboletavam em volta da mesa de Oliveiros Ferreira, o secretário de redação, nós nos reuníamos para ouvir o pronunciamento do general Costa e Silva num rádio portátil posto sobre a mesa de Clóvis Rossi (o então jovem editor e chefe de reportagem).
No silêncio do ambiente destacava-se a voz grave do general, que não deixava nenhuma dúvida nas suas palavras: meninos, a brincadeira acabou. O Brasil entrava no quinto ato. Era um golpe dentro do golpe _ a ditadura total, sem disfarces, com mais cassações de mandatos, fechamento do Congresso Nacional e fim das liberdades e dos direitos individuais, começando pela censura prévia.
Ao recordar este episódio, muitos anos depois, Oliveiros me contou que Carlão (Luiz Carlos Mesquita, irmão de Julio e Ruy), o nosso amigo diretor, só se zangou quando um contínuo serviu café aos censores. Voltei para a minha mesa e continuei a escrever, como se nada estivesse acontecendo. Sem alternativa, eu e minha turma terminaríamos outra noite na Jussara (uma casa noturna que se tornou familiar para nós). Professor da USP, estudioso dos assuntos militares, Oliveiros Ferreira previu um longo e feroz período de ditadura.
Para azar de todos nós, e a desgraça da democracia brasileira, o velho e sábio mestre Oli estava certo.
E o caro leitor, principalmente os da minha geração, de que se lembra da noite de 13 de dezembro de 1968? Lembra onde estava, como foi?
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Em tempo: estranhei o silêncio da grande imprensa, principalmente dos seus editorialistas, colunistas e blogueiros, sobre esta efeméride do AI-5.
Vale registrar que os principais meios de comunicação do país, quase todos, apoiaram vivamente o golpe de 1964.
Lembrar das nossas tragédias é importante para não repeti-las, como ficou claro no livro "Brasil Nunca Mais", que relata as maiores atrocidades deste período triste da nossa história.
Em tempo 2: recomendo a todos a leitura dos comentários de Enio Barroso Filho e de Vitor Buaiz, ex-prefeito de Vitória e ex-governador do Espírito Santo, grande figura e meu velho amigo. São pessoas assim que fazem a grandeza deste Balaio.
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