quarta-feira, 17 de abril de 2024

Google alimenta máquina de guerra.

 


Google alimenta máquina de guerra israelita

O gigante tecnológico de Silicon Valley assinou este ano um acordo de parceria com Israel que, segundo os seus próprios funcionários, poderá aumentar a capacidade de vídeovigilância e de seleção de alvos militares através do Google Photos. Mas lá dentro, os trabalhadores organizam-se para responder. Por Pablo Elorduy.
Imagem do No Tech for Apartheid.

É oficial: o exército israelita está a utilizar as infraestruturas da Google. Depois de o ter negado aos seus trabalhadores e à opinião pública, as informações reveladas na sexta-feira pela revista Time(link is external) confirmam as denúncias, que sublinham, há pelo menos três anos, que o gigante de Silicon Valley tem continuado a negociar com as Forças de Defesa de Israel (FDI) para fornecer mais ferramentas que, alegadamente, são utilizadas para localizar e identificar alvos pelo regime sionista.

O documento revelado pela revista norte-americana indica que as FDI têm a sua própria "zona de aterragem" na Google Cloud, a "nuvem" em que a empresa unifica a informação armazenada nos seus servidores e na qual estão integradas diferentes ferramentas de inteligência artificial e de big data.

O aprofundamento da relação entre a empresa norte-americana e o exército israelita permitiu que "múltiplas unidades" das FDI acedessem a estes serviços. É também uma extensão financeira do controverso Projeto Nimbus, em que também participa a Amazon Cloud, anunciado em 2018 e que, a partir de 2021, fornece a Israel tecnologia para uso militar e civil. O próprio Ministério das Finanças israelita garantiu nesse ano que o Nimbus seria utilizado pelas FDI e vangloriou-se de que a Google teria pouca capacidade para limitar as ações com as suas ferramentas. O acordo, no valor de mais de 1,2 mil milhões de dólares, inclui cláusulas segundo as quais a Google não intervirá mesmo que a pressão dos cidadãos a isso obrigue.

O facto de se ter reconhecido este novo fornecimento de ferramentas confirma o possível envolvimento da Google na rede de reconhecimento facial em toda a Faixa de Gaza, relatada por Sheera Frenkel noutro órgão de comunicação social dos EUA, o The New York Times(link is external), através da qual os palestinianos comuns estão a ser analisados quando se deslocam pelo território devastado. O Intercept amplia a informação sobre a nuvem proporcionada a Israel e como esta lhe daria "capacidades de deteção facial, categorização automática de imagens, localização de objetos e até análise de sentimentos que visa avaliar o conteúdo emocional de imagens e discursos".

Embora não haja confirmação oficial de que a tecnologia Google Cloud esteja a ser utilizada para tais fins, o facto é que, ao abrigo do Nimbus, a empresa americana tem pouca capacidade para controlar o que é feito com as suas ferramentas e isso apesar de, nos seus próprios termos de responsabilidade empresarial, a Google proibir a utilização da sua ferramenta fotográfica "para promover atividades, bens, serviços ou informações que causem danos imediatos e graves às pessoas".

As informações revelaram que o sistema de reconhecimento se baseava numa tecnologia fabricada pela empresa israelita Corsight e numa outra que capta imagens carregadas no Google Photos. Agentes da Unidade de Inteligência 8200 do exército israelita carregaram bases de dados de "suspeitos" na ferramenta Google, a partir da qual utilizaram uma função de pesquisa para localizar pessoas.

Um deles foi o poeta Mosab Abu Toha, que foi parado numa barreira de estrada e espancado no que mais tarde foi apresentado como um erro de identificação das FDI.

As ações da Google têm sido alvo de fortes críticas por parte de um número crescente de trabalhadores da empresa. Organizadas no âmbito do movimento No tech for Apartheid(link is external), as acusações têm vindo a aumentar desde a aprovação do programa Nimbus. A acusação inicial, que deu nome ao grupo, sublinhava que a Google e a Amazon estão a fazer negócios com o apartheid: "Ao ampliar a capacidade de computação na nuvem pública e ao fornecer a sua tecnologia de ponta ao governo e às forças armadas israelitas, a Amazon e a Google estão a ajudar a tornar o apartheid israelita mais eficiente, mais violento e ainda mais mortífero para os palestinianos", afirmava o grupo de programadores e pessoal de alta tecnologia. Estima-se que, para além dos simpatizantes, o grupo seja composto por mais de 200 funcionários da Google.

Em 2021, um grupo de programadores judeus da Google (jewglers) denunciou que o acordo serviria para que a empresa ajudasse a construir centros de dados e fornecer infraestruturas de computação em nuvem "a várias agências governamentais israelitas, incluindo o exército israelita e a Autoridade de Terras de Israel, que é a agência responsável pelo roubo de mais terras palestinianas para colonatos israelitas ilegais". A carta foi assinada por 500 trabalhadores, que foram mantidos no anonimato por receio de represálias.

Uma das programadoras, Ariel Koren, foi despedida por causa da carta, o que levou uma centena de outros empregados do gigante tecnológico a protestar. Koren escreveu um texto(link is external) no qual detalha as circunstâncias de assédio que vive até ser despedida: “A Google silencia sistematicamente as vozes palestinianas, judias, árabes e muçulmanas que se preocupam com a cumplicidade da Google nas violações dos direitos humanos na Palestina, ao ponto de retaliar formalmente os trabalhadores e criar uma atmosfera de terror.

Já depois do início da campanha de extermínio liderada por Israel, a partir de 7 de outubro de 2023, os protestos dos funcionários da Google deram origem a episódios relevantes. O mais conhecido é o protesto do funcionário Eddie Hatfield durante uma conferência do diretor executivo da Google Israel, Barak Regev, em Nova Iorque, a 4 de março. Hatfield foi despedido e dois outros empregados demitiram-se em consequência disso.

Nesta terça-feira, dia 16, está previsto que funcionários da Google participem em três manifestações simultâneas em frente às sedes da Google em Nova Iorque, Seattle e Sunnyvale, em Silicon Valley, na Califórnia. "Chegou o momento de nos insurgirmos contra o Projeto Nimbus, de apoiar a libertação da Palestina e de nos juntarmos aos apelos para pôr fim à ocupação israelita e ao genocídio dos palestinianos em Gaza. Nunca foi tão urgente", diz a convocatória(link is external).


Texto publicado originalmente no El Salto(link is external). Traduzido por Carlos Carujo para o Esquerda.net.

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