segunda-feira, 17 de março de 2008

Carta aberta ao jornalista Pedro Bial

Quem escreve é um petroleiro, embarcado numa das plataformas da Petrobrás, e que assistiu a queda do helicóptero que matou alguns de seus companheiros de trabalho.

Doria



OS HERÓIS DO CONFINAMENTO PRODUTIVO Prezado Senhor Pedro Bial Digníssimo Jornalista, apresentador da Rede Globo de Televisão. Confesso, Sr.Bial, que não sou espectador do programa que o senhor apresenta. Talvez para felicidade da minha cultura e para infelicidade do índice de audiência, ao qual seu programa está atrelado. Mas, tive durante um dia desses, num dos raros casos fortuitos que o destino apresenta, a oportunidade de, por alguns minutos, apreciar o tão falado Big Brother Brasil, o BBB. Para minha surpresa, durante uma ou duas vezes, o senhor, ao chamar os participantes para aparecerem no vídeo, o fez da seguinte maneira: - Vamos agora falar com nossos heróis! De imediato tive uma surpresa que me fez trepidar na cadeira. Heróis???? O senhor chama de heróis aqueles que passam alguns dias aboletados numa confortável casa, participando de festas, alguns participando até de sessões de sexo sob os edredons, falando palavras chulas e no fim podendo ganhar um milhão de reais? Pois bem, Sr. Pedro Bial, eu trabalho numa Plataforma Marítima que se localiza a aproximadamente 180 km da costa brasileira e contribuímos, mesmo modestamente, para que o nosso País alcançasse a auto-suficiência em Petróleo e continuamos lutando, todos nós, para superar esse patamar. Neste último dia 26 de Fevereiro presenciamos um acidente com um dos Helicópteros que faz nosso transporte entre a cidade de Campos e a Plataforma. As imagens, que ficaram em nossa mente, Sr. Bial, irão nos marcar para o resto das nossas vidas. Os seus `heróis`, Sr Bial, são meros coadjuvantes de filmes de segunda categoria comparados com os atos de heroísmos que presenciamos naquele momento. Certamente o Senhor, como Jornalista que é, deve estar a par de todo o acontecido. Mas sei que os detalhes o Sr. desconhece. Pois bem, perdemos alguns colegas. Colegas esses, Sr Bial, que estavam indo para casa após haver trabalhado 15 dias em regime de confinamento. Não o confinamento a que estão sujeitos os seus `heróis`, pois eles têm toda uma parafernália de conforto, segurança e bem estar, que difere um pouco da nossa realidade. Durante esse período de quinze dias esses colegas falaram com a família apenas por telefone. Não tiveram oportunidade de abraçar seus filhos, de beijar suas esposas, de rever seus amigos e parentes... Logo após decolar desta Plataforma com destino a suas casas o helicóptero caiu no mar ceifando suas vidas de modo trágico e desesperador. E seus `heróis` Sr Bial, a que tipo de risco eles estão expostos? Talvez aos paredões das terças-feiras, a rejeição do público, a não ganhar o premio milionário ou a não virar a celebridade da próxima novela das oito. Os heróis daqui, Sr Bial, foram aqueles que desceram num bote de resgate, mesmo com o mar apresentando um `suel` desafiador. Nossos heróis, Sr. Bial, desceram numa baleeira. Nossos heróis foram os mergulhadores que, de pronto, se colocaram à disposição para ajudar, mesmo que isso colocasse suas vidas em risco. Nossos heróis, Sr. Bial, não concorrem ao Premio de um Milhão de reais, não aparecem na mídia, nem mesmo os nomes deles são divulgados. Mas são heróis na verdadeira acepção da palavra. São de carne e osso e não meros personagens manipulados pelos índices de audiência. Nossos heróis convivem aqui no dia-a-dia, sem câmeras, sem aparecerem no Faustão ou no Jô Soares. Heróis, Sr Bial, são todos aqueles que, diariamente, saem das suas casas, nas diversas cidades brasileiras, chegam a Macaé ou Campos e embarcam com destino as Plataformas Marítimas, sem saber se regressarão para as suas casas, se ainda verão seus familiares, ou voltarão ilesos, pois tudo pode acontecer: numa curva da estrada, num acidente de helicóptero, no vôo comercial de regresso para sua cidade de origem.... Não tenho autoridade suficiente para convidá-lo a conhecer nosso local de trabalho e conseqüentemente esses nossos heróis, mas posso lhe garantir Senhor Bial, que, caso o Sr estivesse presente nesta plataforma durante aquele fatídico acidente, seu conceito de herói certamente seria outro. Em memória dos colegas: Durval Barros Adinoelson Gomes Guaraci Soares Escrito por um petroleiro da P-18

4 comentários:

Carlinhos Medeiros disse...

Que paulada!
Dória, seu blog está linkado na bodega,
abs!

Receitas Miriam Gonzalez disse...

Uma pena essa carta não chegar ao destino certo,imagino como se sente já q tive um membro da minha família trabalhando durante anos em uma dessas plataformas,parabéns pela carta gostei muito do q li, infelizmente é a nossa realidade.
bjs

Enildo Amaral (Nil) disse...

Prezado,

Obrigado pelo depoimento sobre os verdadeiros heróis brasileiros, aproveito para incluir na lista dos verdadeiros heróis aqueles trabalhadores (engenheiros, técnicos e cientistas) que foram queimados vivos quando houve a explosão do foguete brasileiro na plataforma de Alcântara.

No dicionário Aurélio, o conceito de herói é: “Homem extraordinário por seus feitos guerreiros, seu valor ou sua magnanimidade”. Tal definição, em nenhuma hipótese, se aplica a um conjunto de pessoas improdutivas e vivendo de maneira nada recomendável numa casa de luxo, servindo de péssimos exemplos para os nossos filhos, principais alvos desse tipo de programação. De péssima qualidade, que só nos mostra como o ser humano pode ser fútil.

Também gostaria de incluir nesse conceito de herói, aqueles milhões de brasileiros que se levantam todos os dias para construir um futuro melhor para suas famílias e também para seu país. Fazendo isso de maneira honrada, trabalhando, gerando empregos, impostos, educando pessoas etc.

Também incluo nesta categoria de heróis, aqueles milhares de brasileiros que hoje são alvos das balas perdidas, dos bandidos e da violência policial. Fruto da omissão do estado, da mídia e também da sociedade, que prefere não enxergar a realidade e passa a valorizar a mediocridade, ou seja, a estética no lugar da ética.

Mais uma vez parabéns pelo seu alerta,

De um cidadão brasileiro que também não assiste o BBB...
E. Amaral – Brasília (DF)
http://espacoalma.blogspot.com/

Anônimo disse...

Encho-me de coragem em saber que em nosso País ainda existem verdadeiros heróis, que se dispõe a lutar por um Brasil melhor, nos aspectos MORAIS e INTELECTUAIS, como você, prezado Herói Dória. Também comungo totalmente com a sua revolta, sua indignação com tamanha INCULTURA (existe esta palavra?) patrocinada pelo tal BBB, principalmente pelo nosso Fantoche PEDRO BIAL. Os Heróis que ele conhece são daqueles que afirmam ser ANGRA DOS REIS a Capital de um estado da nação localizada em uma ilha.São aqueles que ficam a esperar a próxima edição do BBB para se colocarem nas vitrines do baixo caráter e moral do ser humano.São aqueles que brigam, vendem sua moral (se existir), trazem fortunas pelos votos aos paredões, dos telespectadores, que na grande maioria são beneficiários do Bolsa-Família ou equivalente, em busca de conquistarem um premiozinho de um milhão de reais, se comparado ao tesouro arrecadado pela globo semanalmente.
Revolto-me quando vejo tanta imbecilidade humana, em busca do TER e esquecem de SER.
O TER é sinônimo de egoismo.
O SER é sinônimo de necessidade.
Então, sejamos necessitados do melhor porque eles já são dominados pelo egoismo do TER.
E viva o Brasil, terra abençoada, nação mais rica do mundo, sabe porque?
"O Brasil, desde o seu descobrimento, até hoje, só convive com ladrão e ainda não faliu", é ou não é o mais rico.....

É este o único orgulho que tenho em me declarar "Brasileiro".

J. Augusto - Fortaleza-CE