terça-feira, 25 de março de 2008

Revolta da Chibata II, no Observatório da Imprensa

É incrível como as classes dominantes de todas as épocas, procuram minimizar a importância histórica de personagens oriundos da plebe, como bem diz o historiador, neto do jornalista Edmar Morel, que escreveu uma obra tida como definitiva, sobre o "Almirante Negro". O mesmo aconteceu com Antônio Conselheiro, da Revolta de Canudos, e também com outras figuras do povo, como Zumbi dos Palmares e, mais recentemente, com Chico Mendes . Com relação à este último, existe um livro escrito pelo jornalista Zuenir Ventura acerca da luta deste brasileiro em favor da preservação da floresta amazônica e contra os grilheiros daquela região, que deveria ser leitura obrigatória em todas as escolas brasileiras. Aliás , o Chico Mendes parece que é mais reconhecido internacionalmente, do que em seu próprio pais, já que as novas gerações não têm a menor idéia de quem ele foi, num momento em que tanto se fala em ecologia e preservação do meio ambiente. No livro do Zuenir, é possível se conhecer o triste papel desempenhado pelo Senador Romeu Tuma, no assassinato do Chico.


OI NA TV O resgate da Revolta da ChibataLilia Diniz19/3/2008

Quase um século após a Revolta da Chibata, ocorrida em 1910, a Marinha liberou os arquivos do principal articulador do movimento, o "Almirante Negro" João Cândido. A luta pelo fim dos castigos físicos e pela melhoria das condições de trabalho dos marujos teve como palco o encouraçado Minas Gerais, entre outros navios de guerra, ancorados na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, para os festejos da posse de Marechal Hermes na presidência da República. O Observatório da Imprensa na TV de terça-feira (18/03) discutiu a importância do resgate de fatos importantes da história do Brasil. O historiador e jornalista Marco Morel, neto do repórter Edmar Morel, autor do livro A Revolta da Chibata, a primeira obra publicada sobre o tema, em 1963, participou do programa pelo estúdio do Rio de Janeiro. Morel foi contratado pelo Projeto Memória, da Fundação Banco do Brasil, para pesquisar sobre o movimento e publicará um livro de fotografias sobre a revolta. Também no estúdio do Rio de Janeiro, participou a coordenadora de Pesquisa e Difusão de Acervo do Arquivo Nacional, Maria Elizabeth Brêa. No estúdio de Brasília, esteve o presidente da Fundação Banco do Brasil, Jacques de Oliveira Pena. Fernando Granato, jornalista e escritor, autor de O Negro da Chibata, foi o convidado do estúdio da TV Cultura.A mídia em três temposAntes de entrar no tema do programa, Alberto Dines comentou três fatos relacionados com a mídia desta semana. O primeiro foi a contradição dos jornais de grande circulação de hoje terem sugerido uma grande crise financeira internacional e as bolsas de valores terem fechado o dia com saldos positivos. Para Dines, o fato revela que os especuladores não lêem jornal, preocupam-se com "o aqui e o agora", e que a mídia está exagerando na cobertura da crise. O lançamento da nova página fixa, a "Folha Corrida", na Folha de S.Paulo foi outro ponto levantado por Dines. A página, elaborada para ser lida em cinco minutos, seria uma estratégia para conter a queda de circulação. A imprensa estaria investindo no modelo da internet, mas ainda não teria encontrado o caminho entre a fragmentação da rede a densidade dos jornais impressos: "corrida, ela é descartável também", disse. O jornalista também comentou o requerimento apresentado pela deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP) que pedia explicações sobre o motivo do Conselho de Comunicação Social do Senado – órgão criado em 2002 para estudar solicitações encaminhadas pelo Congresso Nacional sobre os meios de comunicação – ainda não ter os integrantes deste ano escolhidos e não ter realizado nenhuma reunião em 2007.A revolta dos marinheiros"Nesta edição, o Observatório vai retomar o assunto que já mereceu diversos livros, filmes e até canções, mas continua praticamente desconhecido do grande público. Não pretendemos reabrir feridas ou reacender ressentimentos quase um século depois. A função da imprensa é relatar fatos e a função do Observatório da Imprensa é provocar reflexões sobre estes fatos", analisou o jornalista. Na reportagem que precede o debate, o almirante Leôncio Martins, que é historiador e escreveu o livro A Revolta dos Marinheiros de 1910, avaliou que depois que o Congresso concedeu a anistia aos revoltosos, a imprensa teve um comportamento "quase ridículo", enaltecendo a revolta de João Cândido. O diretor do Patrimônio Histórico e Cultural da Marinha, almirante Amando de Senna Bittencourt, acredita que tanto a marinha quanto os revoltosos cometeram erros: "Há erros de parte a parte. Sem dúvida é um episódio lamentável. Absolutamente não se pode exaltar alguém que pretendeu fazer justiça com as próprias mãos havendo um país com as instituições constituídas". O cineasta Marcos Marins, que dirigiu o curta A Revolta da Chibata acredita que o resgate do levante ajudará a promover o orgulho da raça negra através da figura de João Cândido como líder. As polêmicas memórias do Almirante NegroUm episódio curioso sobre a imprensa na época da revolta foi a publicação das memórias do Almirante Negro na Gazeta de Notícias, em 1912, logo após o marinheiro ter sido libertado. O jornalista João do Rio, que trabalhava na Gazeta, assim que soube que o líder da revolta estava em liberdade foi procurá-lo e pouco tempo depois as memórias começaram a ser publicadas. Acusado de ter sido o primeiro ghost writer brasileiro (escritor fantasma, em português), ao supostamente formatar o conteúdo como se fosse o marinheiro, o jornalista recebeu fortes críticas de outros órgãos de imprensa do período. O pesquisador João Carlos Rodrigues, autor de uma biografia sobre João do Rio, acredita que João Cândido tenha sido remunerado para permitir a publicação do material.No debate, Marco Morel comentou que o avô era uma figura muito marcante e carismática, parte de uma geração de grandes jornalistas, a exemplo de Joel Silveira. Um traço de Edmar Morel destacado por ele foi produção de reportagens baseadas em pesquisas históricas, como a do livro Revolta da Chibata. Apaixonado pela profissão, Edmar teria pago um alto preço pela publicação do livro, que teria contribuído para a cassação dos seus direitos políticos durante a ditadura militar. Além da formação afetiva, o avô contribuiu para a formação intelectual do historiador. Sobre a polêmica em torno da memórias publicadas na Gazeta de Notícias, o historiador acredita que foram escritas pelo próprio João Cândido, mas que João do Rio colocou o "molho". Fernando Granato contou que o levante dos marinheiros sempre o intrigou e que escreveu O Negro da Chibata para despertar o interesse das novas gerações. Granato classificou a obra de Edmar Morel como "definitiva" e disse que usou uma linguagem mais simples e acessível para os dias de hoje. A obra está disponível em cerca de 40 mil bibliotecas de escolas públicas no Brasil, o que para o jornalista é uma honra e representa o ápice da sua carreira. A pesquisa teve como ponto de partida o livro de Edmar Morel, mas Granato entrevistou familiares, consultou diversos documentos, fichas médicas. "Senti a poeira dos arquivos", disse.Problemas de ontem e hojeO presidente da Fundação Banco do Brasil explicou que o Projeto Memória, que é editado anualmente há cerca de uma década, escolhe uma personalidade para homenagear e, além do estudo da biografia, analisa a obra e o contexto histórico no qual esteve inserido. Um livro, um almanaque e exposições itinerantes estão planejados, entre outros produtos, para relembrar a Revolta da Chibata. Jacques Pena acredita que a escolha de João Cândido como homenageado é um marco no projeto, porque será a primeira vez que um negro ocupará a posição. Temas como escravidão, monocultura e latifúndio, ligados à sociedade da época e com profundos reflexos no Brasil de hoje, voltariam a ser discutidos por intermédio deste personagem.Para Maria Elizabeth Brêa, o movimento, embora pertença ao início do século XX, é fruto de um processo anterior de insatisfação e que reflete racismo, falta de participação social das camadas inferiores e passividade. Com a República ainda recente e o processo de consolidação das instituições em curso, valores período imperial como desigualdade social estavam presentes na sociedade. A Revolta da Chibata teria sido uma oportunidade de atores que não tinham espaço na história serem discutidos. Marco Morel acredita que a posição da Marinha em relação à revolta é retrógrada e precisa ser superada. A instituição deveria pedir perdão para se reconciliar com o passado e "virar a pagina". Morel contou que têm sido tomadas algumas iniciativas para reparar a família de João Cândido, como projetos de anistia póstuma. O historiador afirmou que em outros momentos a Marinha enfrentou movimentos de quebra de disciplina e hierarquia – como a Proclamação da República e o Tenentismo – e que a postura da instituição foi diferente, talvez pelo movimento dos marujos ser uma revolta da plebe.

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