Fonte: Carta Capital
Perpétua Almeida*
Nesta questão não cabem indefinições.
O modelo de privatização dos lucros e socialização dos prejuízos vem mostrando os seus resultados ao longo da última década, através da crescente concentração de renda e todas as mazelas consequentes. Mesmo assim a sanha privatista, que julgávamos um capítulo encerrado na nossa história, arma novo bote.
De acordo com Fernando Rizzolo, da OAB de São Paulo, quem iniciou a defesa da privatização dos aeroportos brasileiros foi o ex-senador Jorge Bornhausen (DEM-SC), em um seminário realizado em São Paulo em 2007, em que reivindicou que a administração dos aeroportos, subordinados à Infraero, fosse concedida a grupos privados. Bornhausen, segundo Rizzolo, é apontado como sócio de uma empresa que explora os free shops de alguns dos principais aeroportos internacionais do País, a Brasif, da qual foi vice-presidente.
Foram interesses como este, que nada têm a ver com ganhos para a população ou qualidade para os usuários, que impulsionaram as privatizações no Brasil. Naquelas “tenebrosas transações“, como diz a música de Chico Buarque, o povo brasileiro arcou com o ônus de entregar seu dinheiro e seu patrimônio para empresas privadas, a maioria delas estrangeiras, que, além de pagar valor “suborçado”, ainda foram financiadas pelos impostos pagos pelo povo; ganharam isenção fiscal e remeteram os lucros para suas sedes localizadas no exterior. O que, na explicação do jornalista Aloysio Biondi, equivale a um cliente chegar numa lanchonete, comer o lanche de graça e ainda receber um pagamento do dono da lanchonete, por ter comido o tal lanche.
Um modelo tão absurdo que não tem nada a ver nem com o adotado no país berço das privatizações. Como explica Biondi, a privatização inglesa não representou a doação de empresas estatais, a preços baixos, a poucos grupos empresariais (como aconteceu no Brasil). Ao contrário: seu objetivo foi exatamente a “pulverização” das ações, isto é, transformar o maior número possível de cidadãos ingleses em “donos” de ações, acionistas das empresas privatizadas.
Nos EUA, centro do capitalismo mundial, a prática é protecionista. O país que concentra 50% da aviação mundial tem todos os milhares de aeroportos com linhas comerciais sob o controle dos governos locais ou regionais.
Giovanni Bisignani, diretor internacional da Associação Internacional de Transporte Aéreo, afirmou que a privatização dos aeroportos na América Latina foi um fracasso, porque só tem gerado benefícios aos seus proprietários e não novos investimentos em infraestrutura.
Diante do exposto, pergunto: o que está acontecendo com o Brasil, onde a privatização dos aeroportos ainda está em debate, quando já deveria ter sido descartada?
A Infraero, segunda maior empresa aeroportuária do mundo, dá lucro! No ano passado, fechou o balanço com 400 milhões de reais em caixa, apesar de administrar 56 aeroportos deficitários, de um total de 68, que compõem o sistema aeroportuário. Somente uma empresa estatal tem a responsabilidade social e política de administrar e manter uma rede na qual um pequeno número de aeroportos superavitários garante o equilíbrio do conjunto do sistema, formado por uma maioria deficitária.
Por que o Estado e o povo brasileiro não podem continuar controlando uma empresa lucrativa? Por que, quando uma empresa dá lucro, começa-se a discutir a possibilidade de transferi-la à iniciativa privada? Os problemas da aviação civil brasileira não serão resolvidos com a privatização dos aeroportos. O que precisamos é aperfeiçoar os serviços.
O Brasil precisa de uma Política Nacional de Aviação Civil e de um Plano Aeroviário Nacional, que possam estabelecer os eixos de desenvolvimento da infraestrutura aeroportuária nacional, a evolução de novas tecnologias de transporte aéreo e o controle do espaço aéreo nacional.
Reestruturar a Infraero como empresa pública, a serviço do povo brasileiro, é um desafio que se impõe às autoridades deste país.
*Perpétua Almeida, deputada federal (PCdoB-AC/Desemprego Zero.
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