domingo, 21 de agosto de 2011

A REDE VESPA DOS ESPIÕES CUBANOS

Enviado por luisnassif, sab, 20/08/2011 - 21:45

Por Fábio (o outro)

http://oglobo.globo.com/cultura/mat/2011/08/18/fernando-morais-conta-impressionante-historia-da-rede-vespa-de-agentes-secretos-cubanos-925158391.asp


Fernando Morais conta a impressionante história da Rede Vespa de agentes secretos cubanos


RIO - Se fazia calor ou frio, o jornalista Fernando Morais não recorda. O fato é que um suor frio umedecia a sua roupa, enquanto ele aguardava na fila da imigração o embarque para o Brasil. Com seis mil documentos na mala, muitos deles com o carimbo de "secreto" do FBI, Morais temia ser abordado pelos agentes e confundido com um espião. Naquele momento de tensão, vivido no Aeroporto Internacional de Miami, o jornalista experimentou na própria pele a tensão de um dos últimos lugares do planeta em que a Guerra Fria insiste em sobreviver.


Fernando Morais, que passou incólume pelo aeroporto, não era um espião. Mas os cinco personagens centrais de seu novo livro, sim. Após três anos de trabalho, incluindo uma difícil garimpagem nos arquivos do FBI, o jornalista está lançando "Os últimos soldados da Guerra Fria", sobre a Rede Vespa, um grupo de agentes infiltrado pelo serviço secreto cubano no coração das organizações anticastristas da Flórida para monitorar as suas ações.

Presos em 1998, depois de oito anos de operações clandestinas, eles se transformaram nos novos heróis nacionais da terra de Fidel, homenageados em outdoors que disputam o espaço público com as imagens de Che Guevara e Camilo Cienfuegos. Do grupo inicial, formado por 14 agentes, apenas cinco foram presos. Três outros conseguiram escapar, um já havia retornado a Cuba quando o FBI lhe deu voz de prisão, e os cinco restantes desapareceram, provavelmente depois de virar colaboradores dos americanos.

'Eles me enrolaram por dez anos'

Com o trabalho, cuja história é toda passada fora do Brasil, Morais internacionalizou seu talento para o livro-reportagem. Recorreu ao repertório de repórter investigativo, fuçando papéis, pulando de avião em avião entre Cuba e Miami, driblando a desconfiança dos serviços secretos e apelando a amigos para fazer contatos importantes. Mais do que tudo, precisou ter paciência:

- A ideia nasceu numa viagem de táxi em São Paulo, quando ouvi no rádio a notícia sobre a prisão dos cubanos. Imediatamente pensei: "Esse troço dá alguma coisa." Logo depois, pedi ajuda a conhecidos em Cuba para liberar o material, mas eles me enrolaram por dez anos - conta.

Embora a queda da Vespa tenha ocorrido em 1998, em circunstâncias que Morais pode revelar em um futuro projeto, mas às quais confessa ainda não ter chegado, a imprensa cubana só mencionou o caso pela primeira vez em junho de 2001, quando o grupo foi condenado pela Justiça americana. A demora deu ao autor a medida da dificuldade para começar os levantamentos.

Quatro anos depois, chegou o sinal que Morais tanto esperava. Na véspera de voltar ao Brasil, após participar em 2005 de uma feira literária em Havana, o escritor foi avisado pelo presidente da Assembleia Nacional, Ricardo Alarcón, de que o governo havia liberado a papelada dos serviços de inteligência sobre a Vespa.

- Mas trabalhar com os documentos cubanos seria suficiente? Concluí que não. A outra metade da história estava em Miami, e não poderia ignorá-la.

O projeto, que começaria de fato em 2008, após o lançamento da biografia de Paulo Coelho ("O mago"), obrigou o autor a ficar na cansativa ponte-aérea Havana-Miami, com trocas de avião em Kingston, Manágua, Cancún e Cidade do Panamá. Tudo isso coberto pelo adiantamento que recebera da editora, a Companhia das Letras. Até que o dinheiro acabou, no meio do trabalho.

A sorte que abençoa os repórteres quando a pauta parece perdida não falhou com Morais:

- Me apresentaram o (produtor) Rodrigo Teixeira, que estava comprando argumentos de vários autores. Ele gostou do projeto e comprou o direito de adaptação para o cinema. Com o pagamento adiantado, pude prosseguir - diz Morais.

Para contar a história dos "Cinco de Cuba", como são chamados Fernando González, René González, Gerardo Hernández, Ramón Salazar e Antonio Guerrero, que cumprem penas que variam de 18 anos de cadeia a prisão perpétua, Morais optou pela narrativa linear, mostrando-os inicialmente como desertores que abandonam as forças armadas, a pátria e a família, cansados dos desmandos da "ditadura castrista".

Nesse ponto, a história impressiona: para enganar as organizações de ultradireita baseadas na Flórida, os agentes esconderam a condição até para os parentes mais queridos, que tiveram dificuldade em suportar a traição. Uma vez assimilados pelos anticastristas, eles passaram a municiar Havana de informações que neutralizaram ataques terroristas em território cubano e levaram à captura de mercenários a serviço da desestabilização do regime.

Daí para a frente, a bola está com Morais. A riqueza de detalhes não prejudica o estilo literário. Para os mais rigorosos, uma leve observação: a escrita é um pouco mais generosa com Havana, de onde saíram os cinco agentes determinados a manter vivos os ideais revolucionários de seu povo, do que com Miami, terra dos anticastristas, cuja ambição é um revival, a Cuba de Fulgêncio Batista e seus cassinos.

Cada informação revela a vitalidade do escritor-repórter. Ele conta que, para entrevistar o mercenário salvadorenho Raúl Ernesto Cruz León, preso em Cuba por colocar bombas em hotéis e pontos turísticos de Havana, pediu a Frei Betto que convencesse Raúl Castro.

No fim da entrevista, o repórter confessa a Morais que teve inveja, porque foi a Cuba, percebeu o frenesi em torno dos cinco heróis, teve vontade de contar a história, mas nunca escreveu uma linha sequer. Morais o conforta, bem-humorado:

- Eu também teria a mesma inveja se outro tivesse feito.

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