terça-feira, 3 de agosto de 2010

POLÍTICA - A revolução inconclusa (1)

Por Mauro Santayana

Há oitenta anos, nos primeiros dias de agosto, preparava-se a fase final da Revolução de 30. Como em todos os processos semelhantes, combinavam-se fatores objetivos e subjetivos, razões históricas e ambições pessoais de poder. Mas a principal causa da insatisfação, além da social, acabou sendo abafada pelas circunstâncias do momento: o problema da Federação, a necessidade de que a República tivesse o tamanho do Brasil, e não se limitasse aos estados mais poderosos. Essa razão, não obstante sua evidência, não era claramente exposta, a não ser pela acuidade de João Pessoa, então governador da pequena, mas importante, Paraíba.

Sabiam todos que o movimento era inevitável. Mais do que todos, sabia-o o presidente Washington Luís que – nascido em Macaé – sempre fizera política em São Paulo, estado de que fora governador no quatriênio 22-26. Seu raciocínio obedecia à presunção de poder dos paulistas, e rompia a política dos governadores, fundada no eixo Minas–São Paulo, não por considerá-la antirrepublicana e antidemocrática – o que era – mas por entendê-la como já desnecessária. A aliança, que o fizera presidente em 26, se firmara quando São Paulo e Minas mais ou menos se equivaliam em poder político e econômico. O grande desenvolvimento de São Paulo, do fim da Primeira Guerra Mundial a 1929, distanciara o estado de seu vizinho ao norte. A Depressão Econômica Mundial, que dava os seus primeiros passos, e os problemas internos reclamavam a solidariedade nacional. Isso recomendava concessões políticas e econômicas de São Paulo aos outros estados.

Como se sabe, o presidente tentou engambelar os mineiros e os gaúchos. Washington Luís enviou cartas pessoais a Antonio Carlos, governador de Minas, e a Getulio, do Rio Grande do Sul – já anunciado candidato dos dois estados à Presidência – afirmando que estava realizando “consultas” aos governadores sobre a sugestão de Minas. Na realidade, ele nem citava o nome de Vargas: pedia apoio a Júlio Prestes, governador de São Paulo. João Pessoa, em telegrama histórico, enviado à bancada paraibana na Câmara Federal, em julho de 1929, denunciou a manobra e negou apoio à candidatura do governador de São Paulo – isso ainda em julho de 1929. A leitura de sua mensagem provocou intensa reação em todo o país. Nos 12 meses seguintes, a nação conheceu a crise. As eleições se realizaram em 1º de março de 1930. As fraudes foram evidentes e deram a vitória a Júlio Prestes contra Vargas. Em julho e agosto, todos sabiam que a revolução era iminente.

O assassinato do candidato a vice de Getulio, João Pessoa, foi fator emocional poderoso, galvanizou a opinião pública. O crime ocorreu no Recife, aonde o governador da Paraíba fora visitar um amigo hospitalizado, no dia 26 de julho. No dia 8 de agosto, seu corpo chegava ao Rio, onde foi sepultado. O mineiro Carlos Pinheiro Chagas falou, no desembarque do corpo, na Praça Mauá, com veemência revolucionária, e disse que João Pessoa devia ser enterrado como fora sepultado Clemenceau: de pé, com o coração acima do estômago, e a cabeça acima do coração.

O tempo os acossava: sem a aquiescência do novo governador de Minas, Olegário Maciel, empossado em 7 de setembro, não tinham como mobilizar o estado. Com seu assentimento, decidiram que seria no início de outubro. Com o esforço enorme para produzir clandestinamente em Minas armas e munições, e graças à habilidade de Olegário em “tranquilizar” Washington Luís, a insurreição começou em Porto Alegre e Belo Horizonte exatamente às 5 horas da tarde de 3 de outubro.
(Continua)

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