Os efeitos da recessão sobre as contas públicas
A política econômica não pode ser vista como um arquipélago de esforços isolados, cada qual tocando sua tarefa independente dos demais.
O conhecimento das ferramentas fiscal e monetária é simples. É como o médico que conhece o antibiótico para cada infecção. O desafio é a dosagem, a combinação adequada das duas políticas de maneira a não intoxicar o organismo do paciente.
Ponto 1 - Quando a economia caminha em uma direção – seja de desaquecimento ou aquecimento – qualquer medida pró-cíclica (isto é, na mesma direção) potencializa os movimentos. Desde o último trimestre do ano passado a economia vem despencando.
Ponto 2 – Além da queda de renda e do consumo, já estava no ar o efeito Lava Jato que sabia-se iria prolongar no tempo.
Ponto 3 – Aí entra o Banco Central como se fosse a ilha autônoma e se propõe a fazer a “sua” recessão, induzida pelo aumento da Selic. Aplica uma política monetária virulenta, explodindo os juros e spreads bancários, pegando no contrapé todas as empresas e pessoas físicas que se valiam do capital de giro bancário.
A resultante final
O objetivo final do ajuste fiscal é estabilizar a relação dívida/PIB. Mas o que acontece se o PIB cai?
Veja o exemplo simples: 33,8 (dívida líquida) / 100 (PIB) = 33,8%
Suponha que o PIB caia 2% e a dívida permaneça a mesma: 33,8 / 98 = 34,5%
Ou seja, só pelo efeito PIB em queda, mudando o numerador, a relação aumentou 0,7 ponto percentual.
Para exemplificar, vamos montar contas bem simplificadas em cima dos seguintes grandes números:
- PIB = 100
- Dívida líquida = 33,8
- Arrecadação = 35,95
- Superávit nominal = 1,2
- Gastos públicos 3-4 = 34,75
Esses 34,75 financiam todas as despesas e investimentos públicos.
Efeito queda do PIB
Se o PIB cair 2 pontos, conforme já se viu, a relação dívida/PIB aumenta 0,7 ponto percentual. O superávit teria que subir para 1,9 para manter a relação anterior. Mas como o PIB caiu para 98, esse 1,9 representará 1,914% do novo PIB. Os gastos públicos teriam que cair de 34,75 para 34,07 (em termos nominais) para gerar o superávit necessário.
Efeito queda da arrecadação
Para não complicar as contas, suponhamos que a receita caia com a mesma intensidade do PIB. Ou seja, 2%. Essa queda representará 0,72 nominal ou 0,73% do novo PIB que caiu 2%. Somado ao efeito queda no PIB, o superávit teria que subir de 1,2% para 2,65% do novo PIB para manter estável a relação dívida/PIB. E os gastos públicos cairiam para 33,36.
Efeito juros
O BC calculava que superávit primário de 1,2% do PIB seria suficiente para estabilizar a relação dívida/PIB. Com 4 pontos a mais de taxa real, e o PIB caindo 2 pontos percentuais, para voltar à relação anterior seria necessário aumentar em 2,03 (ou 2,07% do novo PIB) o superávit primário. Significaria reduzir as despesas para 31,33 – ou 3,42% do PIB antes da queda.
Conclusões
São cálculos que levam em conta apenas alguns fatores. Não se incluíram aí os efeitos do desarmamento das danosas operações de swap reverso – uma política indecente de transferência de lucros para o setor financeiro. Nem os efeitos da inflação sobre a despesa nominal.
Mas é um desenho simplificado dos problemas trazidos por uma política recessiva.
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