A crise orgânica do capitalismo
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Rob Sewell – “Onde estavam os Marxistas em 2008, quando a queda de Lehman Brothers quase provocou o colapso do capitalismo?”, se pergunta um desconcertado Ralph Atkins, o editor de mercados de capitais do Financial Times. Bem, ao contrário do Sr. Atkins e do seu círculo de partidários do livre mercado, não estávamos em estado de total desconcerto. Tínhamos previsto este acontecimento.
Enquanto o capitalismo mergulhava em profunda depressão, estávamos explicando a uma audiência cada vez maior que a crise, que os economistas burgueses negavam que poderia ocorrer, foi uma confirmação impressionante da correção das ideias de Marx. Essas ideias, que haviam sido repetidamente declaradas como obsoletas pelos apologistas do capitalismo, se mostraram surpreendentemente relevantes, em total contraste com a teoria econômica burguesa e em especial com a desacreditada hipótese da eficiência do mercado.
Em 2008, o capitalismo sofreu o que muitos já reconheceram como a crise mais profunda desde a década de 1930 e, em termos de alcance, possivelmente na história. O colapso inicial no comércio mundial foi muito pior do que no primeiro ano da Grande Depressão. Os estrategistas burgueses ficaram em estado de pânico abjeto. “A produção industrial global acompanha horrivelmente de perto o declínio da produção industrial durante a Grande Depressão”, escreveu Martin Wolf, economista-chefe do Financial Times. “Sem a Europa, o declínio da produção industrial da França e da Itália foi pior do que a esta altura na década de 1930. O declínio nos EUA e no Canadá também está muito perto daquele nos anos 1930. Mas o colapso industrial do Japão foi muito pior do que nos anos 1930, apesar de uma recuperação muito recente” (FT, 16/09/09).
Alguns chegaram a ousar comparar a recessão a uma parada cardíaca quase fatal. Mas o paciente enfermo, com a ajuda de resgates estatais de emergência, logo foi transferido de seu leito de morte para uma unidade de tratamento intensivo. Em igualdade de condições, eles acreditavam que o capitalismo se recuperaria desta crise da mesma forma como nas recessões cíclicas do passado. Uma recuperação da recessão era vista como inevitável. Contudo, as coisas não são sempre iguais e o caráter das crises não é sempre o mesmo. Foi um erro ver esta crise como uma simples repetição das anteriores. Ademais, é errado julgar o estado de um organismo simplesmente a partir de sua aparência exterior. Temos de descobrir sua verdadeira natureza, sua evolução e, sobretudo, suas profundas contradições internas, e ver como essas contradições operam na prática. Isto significa adotar não uma abordagem mecânica, que domina a perspectiva burguesa, mas uma abordagem dialética.
Situação anterior a 2008
Mesmo no período anterior a 2008, o auge do capitalismo se manteve em grande medida artificial, o que mostra como as contradições estavam se manifestando mesmo nesta etapa. O capitalismo já não podia mais se manter como no passado. O investimento na capacidade produtiva foi cada vez mais substituído em todos os aspectos pela especulação e jogos de azar. “Bolhas manifestamente insustentáveis e o afrouxamento dos padrões de crédito em meados da década passada, junto com o dinheiro muito fácil, foram suficientes para impulsionar somente um crescimento econômico moderado”, explicou Lawrence Summers, o ex-secretário do tesouro no governo de Bill Clinton. Estranhamente, medidas excepcionais somente produziram resultados modestos. O sistema capitalista não estava funcionando como antes. Mesmo então, isto resultou ser insustentável e somente teve êxito em preparar o caminho para uma crise devastadora.
A catástrofe de 2008 não foi, certamente, uma crise comum. Dada a sua profundidade e severidade, sem dúvida não haveria uma recuperação rápida, o que os economistas burgueses sérios foram forçados a reconhecer. O crédito, que serviu para prolongar o auge pré-crise, agora se transformou em uma montanha de dívidas. A recessão de fato marcou um ponto de viragem fundamental, como no crash de 1929, e serviu para inaugurar uma época totalmente nova para o capitalismo moderno, mais parecida com a Grande Depressão dos anos 1930. Esta não foi, portanto, nenhuma crise “normal”, onde, com pequenos e inteligentes ajustes, tudo voltaria como antes. Tal crise não correspondia aos livros de texto econômicos ou aos modelos de computador.
Sempre fiéis, desde o verão de 2009 os comentaristas burgueses estavam procurando desesperadamente ao redor por sinais dos “brotos verdes”. Mas, todas as vezes ficaram desapontados. Falsos alvoreceres após outros foram proclamados. Estes eruditos cavalheiros e damas não entenderam nada, e menos ainda a natureza desta crise capitalista. Atribuem a crise a todo tipo de coisas – a tudo, menos ao fato de que esta era um sintoma de um sistema social agonizante. Os Marxistas, por outro lado, entenderam muito bem que a velha “normalidade” havia desaparecido e que o capitalismo tinha entrado em uma agonia de morte “secular”, de longo fôlego, quando a crise é a regra e não a exceção.
Sem crise “final”
Diferentemente dos estalinistas do Terceiro Período, que declararam que 1929 era a “crise final” do capitalismo, os Marxistas não reconhecem tal coisa de “crise final”. “As crises capitalistas não são numeradas, nem é indicado com antecedência qual delas será a ‘última’”, explicou Trotsky (Trotsky, sobre a França, p. 71). O sistema capitalista pode continuar mesmo mancando, não importa a profundidade da crise, causando cada vez mais miséria e degradação. Sem a sua derrubada pela classe trabalhadora, a continuação do capitalismo lançará a humanidade no caos e na barbárie, com novas crises e catástrofes.
Naturalmente, recuperações, contudo anêmicas ou parciais, certamente podem ocorrer, mesmo em períodos de crise profunda, como a atual. Isto não contradiz a análise geral de um capitalismo doentio e declinante, causando miséria cada vez maior. Mesmo um organismo em agonia mostra ocasionalmente alguns movimentos espasmódicos de vida. Isto aconteceu nos anos 1930, durante a “Recuperação Roosevelt”, mas não alterou o caráter fundamental do período, que era de crise, depressão e desemprego em massa. Em qualquer caso, a recuperação de 1934-37 nos EUA não se prolongou, apesar das ilusões em contrário, e foi seguida por um novo colapso. “Surgiram esperanças de que o processo de crescimento econômico interrompido pela crise seria novamente restabelecido. Mas, mais cedo do que se poderia esperar, a hora de uma nova crise golpeou”, explicou Trotsky no momento. “Começou a partir de um nível mais baixo do que a crise de 1929 e está se desenvolvendo em ritmo mais rápido. Isto demonstra que não é uma recessão acidental, nem mesmo uma depressão conjectural, mas uma crise orgânica de todo o sistema capitalista” (Trotsky, 29 de novembro de 1937, ênfase nossa).
Usamos esta descrição de crise orgânica do capitalismo de Trotsky muitas vezes para descrever a natureza da presente época. Isto não deve ser confundido, naturalmente, com o termo de Marx, a composição orgânica do capital, que se refere simplesmente às relações entre trabalho vivo e trabalho morto (a ratio entre capital constante e capital variável). A crise orgânica do capitalismo é uma descrição de uma profunda crise histórica que reflete a desintegração das contradições inerentes ao sistema, ou seja, um sistema em declínio terminal.
Explicação cíclica da crise
Enfatizamos este ponto porque há aqueles que, mesmo se reivindicando Marxistas, veem as coisas em termos de ciclos econômicos e ciclos de lucro. Eles explicam a severidade da crise atual como “enraizada” nas debilidades e desequilíbrios do auge anterior, e não porque o capitalismo alcançou seus limites. Embora tenha havido uma especulação selvagem no período anterior, isto não explica a natureza da crise. Tal explicação é superficial e ignora a profunda natureza histórica desta crise do sistema capitalista.
Esta visão está muito ligada à ideologia do reformismo, que reconhece estas “debilidades e desequilíbrios” no capitalismo e busca corrigi-los. Os reformistas aceitam a explicação cíclica da crise, em oposição à crise histórica do capitalismo. Para eles, uma crise cíclica significa que os anos de auge voltarão e tudo caminhará bem. É por isso que os reformistas, bem como aqueles que abandonaram a política revolucionária, estão atraídos pelos ciclos de Kondratiev. Esta teoria é pouco diferente das estranhas ideias de Henry L. Moore, cuja teoria de “ciclos de geração” de oito anos estava vinculada à órbita de Vênus, que interceptava o Sol e a Terra, produzindo crises econômicas. Outro economista, W. Stanley Jevons, culpou a crise econômica pela existência das manchas solares.
Todas as teorias cíclicas de equilíbrio assumem que, sem importar o quanto as coisas piorem, sempre há uma tendência natural para restabelecer o equilíbrio. Para eles, o desenvolvimento capitalista é um caso de ganhos e perdas que se compensam. “Bem, existem problemas, mas no final tudo ficará bem; então, por que se preocupar com este absurdo de revolução socialista?”.
Nos anos 1930, a Grande Depressão resultou do colapso total e do impasse do sistema capitalista mundial, que se mostrou incapaz de desenvolver as forças produtivas como antes. Ela teve o mesmo caráter da crise atual: uma crise orgânica. Na década de 1930, a “solução” da crise capitalista veio através da guerra mundial e da destruição em massa das forças produtivas. Hoje, com o atual equilíbrio de forças e com a existência de armas nucleares, uma guerra mundial “solucionadora” está descartada. Com a guerra mundial fora da agenda, isto significa que todas as contradições serão internalizadas e que enfrentaremos anos, senão décadas, de austeridade selvagem e crises – pelo menos até que a classe trabalhadora tome o poder. Um “Verão” a la Kondratiev está descartado.
A recuperação mais fraca da história
Apesar da euforia atual da imprensa sobre a atual e fraca “recuperação”, a economia mundial continua em estado de crise, muito longe das expectativas previstas pelos estrategistas do capital. Até mesmo os estrategistas burgueses reconhecem este fato. Um recente e sombrio editorial do austero Financial Times abria com estas palavras: “Nos últimos cinco anos, a economia mundial esteve em crise” (FT, 19/04/2014). A “recuperação”, tal como é, é a recuperação mais fraca da história – sim, da história, o que diz muito sobre a natureza real da crise.
Hoje, depois de um impulso inicial, a economia japonesa foi reduzida a um ritmo muito lento, e ameaça reverter como nos vinte anos anteriores. A Europa continua a definhar em estancamento ou recessão aberta, com a potência alemã mostrando sinais alarmantes de exaustão e com o desemprego na Europa em níveis historicamente elevados. Há pouco espaço para melhorias. “Estamos caminhando de uma crise aguda para uma crise crônica”, explicou Philippe Legrain, um ex-assessor do Presidente da Comissão Europeia (FT, 8/4/2014). A crise do Euro simplesmente está se movendo da periferia para o centro, enquanto as preocupações se espalham à França e à Itália.
Mesmo nos EUA, a situação está longe de ser satisfatória, onde o crescimento mais uma vez reduziu a velocidade e onde a proporção de pessoas empregadas recentemente atingiu seu nível mais baixo desde 1978, enquanto milhões de homens e mulheres aptos abandonam a força de trabalho e desaparecem dos números do desemprego. 20 milhões estão desempregados ou subempregados, e entre 37 milhões e 50 milhões vivendo na linha da pobreza. O crescimento dos EUA desde 2010 tem flutuado entre deprimentes 1,8% e 2,4%, uma pobre performance quando comparada às recuperações anteriores. O PIB dos EUA está mais de 10% abaixo do que tinha sido previsto nas tendências antes da recessão. Na Grã-Bretanha, não está muito longe dos 20% abaixo daquelas tendências.
Com a estagnação das economias ocidentais, os capitalistas levantaram os olhos desesperadamente para as economias BRIC, como ajuda para retirá-los deste pântano. Mas estas economias estão agora experimentando uma desaceleração. A dívida familiar no Brasil, China, Cingapura, Tailândia e Turquia aumentou mais de 40% desde 2008. Segundo o FMI, no ano passado, “o déficit projetado no Brasil, Índia e China é similar aos golpes às taxas de produção que as economias avançadas sofreram no período pós-crise” (FT, 9/10/2013). O Financial Times explicou que “a razão para se ter medo é que o mundo parece que vai enfrentar anos de crescimento abaixo da média. O surto de crescimento dos últimos 30 anos dos mercados emergentes está chegando ao fim” (FT, 19/4/2014). Com todas as saídas bloqueadas, o sistema está, na melhor das hipóteses, aprisionado na estagnação de longo prazo, o que será acompanhado por um devastador e longo impacto sobre os níveis de vida. Ou seja, até a próxima recessão mundial.
Medidas desesperadas
Além do desespero, os capitalistas foram reduzidos a tomar medidas sem precedentes, não somente para evitar outra Grande Depressão, como também para manter o sistema capitalista funcionando. Precisa-se apenas considerar que o atual e magro crescimento foi obtido somente como resultado do maior programa de apoio monetário da história. E isto apesar das virtudes da economia de mercado e da livre empresa, que se supunham ser magníficos exemplos para todos nós! Estes são mares desconhecidos. O sistema capitalista em crise está sendo impulsionado artificialmente pela máquina de apoio vital de um Banco Central, que está despejando trilhões de dólares no sistema financeiro. Contudo, quanto mais essas medidas extraordinárias são usadas para impulsionar o sistema, menos impacto elas produzem, como um viciado em drogas que necessita de doses cada vez maiores para obter o mesmo resultado. Há cinco anos, precisava-se de mais de 1 dólar de dívida para gerar 1 dólar de crescimento na China. Em 2013, necessitava-se de perto de 4 dólares de dívida para gerar 1 dólar de crescimento – e um terço da nova dívida agora vai para pagar dívidas velhas. A taxa de crescimento da China caiu ao nível mais baixo em mais de 20 anos, enfraquecendo as importações e causando estragos no Brasil, África do Sul, Indonésia, Chile, Colômbia, Rússia e Peru. A maior parte deste dinheiro “novo” acaba em negócios especulativos e aventura de alto risco, e não no investimento produtivo, causando todo tipo de novas contradições.
Nos EUA, os efeitos da Expansão Quantitativa (QE – Quantitative Easing), de início bombeando 85 bilhões de dólares no sistema bancário por mês, teve resultados dúbios e o programa está sendo gradual e cautelosamente reduzido. Os balancetes da Reserva Federal agora alcançaram proporções assombrosas. Na Europa, enfrentado aos riscos de deflação, o Banco Central Europeu está pensando em embarcar em sua própria versão de imprimir dinheiro através da compra de títulos. Os alemães, no entanto, estão relutantes, devido ao medo da inflação, e são eles que têm a chave do cofre.
No final, todas as tentativas de aplicar esta morfina monetária longe de tirar o sistema capitalista da crise causaram grave mal estar, especialmente nos mercados emergentes. Em seu semestral Informe de Estabilidade Financeira Global, o FMI observou que “a redução progressiva de certos apoios políticos extraordinários não tem sido acompanhada pela preparação adequada de um novo ambiente de crescimento normal e autossustentável” (FT, 10/4/2014). Assim que anunciaram que a torneira de dinheiro barato estava para ser fechada, todo o dinheiro “quente” começou a desaparecer, causando desvalorizações e turbulências em seu rastro.
Mais uma vez, as taxas de juros se mantiveram artificialmente baixas para encorajar o crescimento. Na Grã-Bretanha, a taxa oficial de juros se encontra em nível mais baixo que há 300 anos, com poucas perspectivas de aumentar em breve. Nos principais países capitalistas, elas estão em nível próximo de zero. Isto não tem precedentes e mostra a profundidade da crise atual e como ela é qualitativamente diferente das crises mais recentes. Agora, o Banco Central Europeu está ameaçando se mover para onde nenhum banco central foi antes, o corte de suas principais taxas de juros abaixo de zero para promover o crescimento. A ideia de se pagar a um banco para guardar suas poupanças parece bizarra, mas é um reflexo dos tempos pouco convencionais em que estamos vivendo.
Segundo o novo livro de James Richards, um ex-conselheiro geral do Fundo de Gestão de Capital de Longo Prazo, que colapsou espetacularmente em 1998, já estamos vivendo em uma nova depressão. Para Richards, a economia dos EUA está como um alpinista em uma montanha de 28 mil pés de altura, com uma fenda de um lado e um precipício abrupto do outro. Insistir na escalada torna a coisa ainda mais difícil, mas voltar – e abandonar a QE – significa enfrentar a dor evitada em 2009. Não é uma má analogia. Seu destino não está em suas mãos.
Ademais, a OCDE e o FMI advertiram que o mundo capitalista corre o risco de cair durante anos, senão durante décadas, em crescimento mais baixo (“abaixo da média”) e em desemprego mais alto, a menos que os governos sigam em frente com as reformas estruturais radicais. Com um crescimento tipo depressão e alguns 50 milhões já desempregados nos principais países capitalistas, os informes apontam que o pior está por vir. O atual desemprego não tem caráter temporário, como no passado; não é meramente um desemprego cíclico, mas um desemprego estrutural, a expressão mais mortal da decadência do capitalismo. O capitalismo está tão quebrado e enfermo que não pode mais pôr em uso as forças produtivas, incluindo a força de trabalho humana a sua disposição. Se, no alvorecer do capitalismo, os trabalhadores ignorantes e famintos quebravam as máquinas, hoje são os capitalistas que são Ludditas, os que destroem as máquinas e deixam as pessoas sem trabalho, não como medida temporária, mas permanentemente. O desemprego de longa duração se tornou uma ferida aberta em todos os lugares. Agora, eles falam levianamente de uma “Nova Era da Máquina”, da tecnologia inteligente que eliminará as franjas dos postos de trabalho, causando ondas de choque de desemprego, derrubando os salários e fazendo declinar o nível de vida. Este é o pesadelo que está sendo preparado pelo capitalismo em seu leito de morte.
Oscilações clássicas
Nos anos 1930, Trotsky fez um ponto crítico assinalando a diferença entre “uma crise orgânica” de todo o sistema e as crises cíclicas normais, que faziam parte integrante do sistema capitalista desde seus inícios. O ciclo de boom/recessão do capitalismo é o ritmo natural do sistema, da mesma forma como a inalação de oxigênio e a exalação de dióxido de carbono do corpo humano. As oscilações críticas são inevitáveis, e são processos que acompanham o padrão cíclico de produção e troca sob o capitalismo.
Frederick Engels deu uma descrição clássica do ciclo normal de boom/recessão em seu livro Anti-Dühring:
“O enorme poder de expansão da indústria de grande escala, em comparação com o poder de expansão dos gases, é uma mera brincadeira de crianças; agora nos aparece como necessidade para a expansão, qualitativa e quantitativa, que ri de toda pressão contrária. Esta pressão contrária vem do consumo, venda, mercados para os produtos da indústria de grande escala. Mas a capacidade do mercado de se expandir, tanto extensiva quanto intensivamente, é diretamente controlada por muitas outras e menos eficazes leis. A expansão do mercado não pode seguir o ritmo de expansão da produção. A colisão se torna inevitável, e como não se pode dar nenhuma solução, desde que não destrua o próprio modo de produção capitalista, se torna periódica. A produção capitalista traz em si mesma um novo ‘círculo vicioso’ …
“A estagnação dura anos, tanto as forças produtivas quanto os produtos são desperdiçados e destruídos em grande escala, até que a massas acumuladas de mercadorias são por fim lançadas em uma depreciação mais ou menos considerável, até que a produção e a troca comecem gradualmente a se mover novamente. Pouco a pouco, o ritmo se acelera; torna-se um trote; o trote industrial passa ao galope, e o galope, por sua vez, passa para um mergulho de cabeça em uma completa corrida de obstáculos industrial, comercial, de crédito e especulativa, só para aterrissar mais uma vez no final, depois dos mais vertiginosos saltos – na vala de uma queda. E assim por diante, uma e outra vez”.
Esta é uma descrição excelente do ciclo de boom/recessão. O desenvolvimento capitalista toma esta forma cíclica da natureza anárquica da produção que sempre aumenta ao ponto em que se choca com a barreira do consumo limitado. Como explicou Engels, as leis da produção agem mais vigorosamente que as leis do consumo. Os investimentos massivos que ocorrem durante um boom derramam uma quantidade crescente de mercadorias que, em determinada etapa, começa a ultrapassar a capacidade de consumo da sociedade, levando assim a uma crise de superprodução – superprodução de consumidores e de bens de capital para a finalidade da produção capitalista. A finalidade da crise capitalista é a de eliminar esta superprodução e preparar o caminho para um novo boom.
Sob o capitalismo, todo boom contém dentro de si mesmo as sementes de uma nova crise, “Nestas crises, grande parte, não somente dos produtos existentes como também das forças produtivas previamente criadas, são periodicamente destruídas”, explicaram os autores do Manifesto Comunista. “Nestas crises irrompe uma epidemia que, em todas as épocas anteriores, teria parecido um absurdo – a epidemia da superprodução”. Estas recessões são exclusivas ao sistema capitalista e contrastam com as crises de sub-produção das sociedades pré-capitalistas.
O excesso de produção emerge das contradições da economia de mercado e da divisão da sociedade em classes mutualmente conflitantes. A classe trabalhadora, que produz todos os valores, não pode comprar de volta os produtos que produz, o que, em determinado ponto, se torna uma barreira para o desenvolvimento econômico provocando a crise. Os capitalistas logram contornar esta contradição fundamental, pelo menos temporariamente, reinvestindo a mais-valia extraída do trabalho da classe trabalhadora, criando, dessa forma, novos mercados. Contudo, isto, por sua vez, cria uma maior capacidade produtiva global e serve para exacerbar as novas crises quando elas surgem.
“As condições de exploração imediata e de realização desta exploração não são idêntica”, explicou Marx. “Não estão separadas somente no tempo e no espaço, também estão separadas teoricamente. A primeira é apenas restringida pelas forças produtivas da sociedade, a última pela proporcionalidade entre os diferentes ramos da produção e pelo poder de consumo da sociedade. E isto não é determinado nem pelo poder de produção absoluto nem pelo poder de consumo absoluto, mas sim pelo poder de consumo dentro de um determinado quadro de condições antagônicas de distribuição, que reduzem o consumo da vasta maioria da sociedade a um nível mínimo, capaz de variar somente dentro de limites mais ou menos estreitos… Mas, quanto mais se desenvolve a produtividade, mais entra em conflito com a estreita base em que as relações de consumo descansam” (Marx, O Capital, Livro 3).
“Deixem-nos igualmente ignorar”, afirma Marx, “os negócios fraudulentos e as transações especulativas que o sistema de crédito favorece. Neste caso, uma crise seria explicável somente em termos de uma desproporção na produção entre os diferentes ramos e de uma desproporção entre o consumo dos próprios capitalistas e sua acumulação. Mas, como as coisas realmente são, a substituição dos capitais investidos na produção depende em grande medida da capacidade de consumo das classes não produtivas; enquanto que a capacidade de consumo dos trabalhadores é restringida, em parte, pelas leis que regem os salários e, em parte, pelo fato de que eles são somente utilizados unicamente na medida em que se podem empregar em benefício da classe capitalista. A razão final de todas crises reais continua sendo a pobreza e o consumo restrito das massas, devido ao movimento da produção capitalista de desenvolver as forças produtivas como se somente a capacidade absoluta de consumo da sociedade estabelecesse um limite para elas” (Marx, O Capital, Livro 3, ênfase nossa).
Experimentamos uma dessas crises de superprodução em 2008-9, quando a economia capitalista mundial sofreu uma recessão devastadora. Deram um jeito para adiar esta recessão durante décadas por todos os tipos de meios, mas, no final, os capitalistas simplesmente agravaram a crise quando ela finalmente chegou. Como o Rei Canuto, foram incapazes de conter a maré. O comércio mundial colapsou em 30% em questão de meses, e a produção industrial desabou. Há muitas razões para a crise, mas a razão fundamental foi que a produção havia superado completamente a capacidade da sociedade de consumir os produtos que se vertem no mercado mundial, apesar da expansão em massa da dívida e do crédito barato.
O sistema de crédito
O crédito certamente permitiu ao sistema capitalista ir além de seus limites durante certo tempo, até que o castelo de cartas veio abaixo. O crédito não se cria no vazio, e tem que ser pago, com juros. Ele tem seus limites, como tudo o mais. Como explicou Marx: “Se o sistema de crédito aparece como a principal alavanca da superprodução e da especulação excessiva no comércio, isto se dá simplesmente porque o processo de reprodução, que é elástico por natureza, agora é forçado a ir aos seus limites extremos… Ao mesmo tempo, acelera os violentos surtos desta contradição, as crises, e com estas os elementos de dissolução do velho modo de produção” (Marx, O Capital, Livro 3).
Em certo ponto, todo o processo se inverte com as dívidas sendo reembolsadas e o consumo retomado. Este processo entra em uma espiral descendente até que todo o negócio se tenha desenvolvido. Os limites do sistema capitalista são alcançados e um recuo econômico massivo entra em ação, como Marx e Engels descreveram.
O ciclo normal de boom/recessão toma uma forma aguda, provocada pelos estragos da velhice. Em contraste com sua juventude, o fôlego de um regime capitalista em decadência se torna errático e até mesmo convulsivo. Os efeitos da recessão se tornam acentuados e dolorosos, como a respiração ofegante de um velho asmático. Em consequência, a recuperação também se torna dolorosa e anêmica, e não pode coincidir com as recuperações do passado. O crescente estancamento do sistema capitalista ficou revelado na sua incapacidade de recuperar as taxas de crescimento, rentabilidade, níveis de investimento ou de produtividade, que eram característicos dos anos 1950 e da chamada Idade de Ouro. Cada década desde então vê um declínio nas taxas de crescimento. Nos anos 1950, o comércio mundial – que desempenhou um papel chave em impulsionar a produção para a frente na etapa de expansão – cresceu a uma taxa anual de 12,5%. No período anterior à crise, o crescimento médio se reduziu a 6% durante a maior parte dos anos 1990 e 2000. No ano passado, o quarto ano da “recuperação”, ele foi abaixo para uns meros 2,1%, e não conseguiu se recuperar. Dados o crescimento lento e as debilidades por toda parte, isto dificilmente surpreende. Mas é uma clara indicação da crise orgânica de que sofre o capitalismo. As artérias enfermas do sistema tornaram-se cada vez mais bloqueadas.
Durante décadas, o comércio mundial se expandiu, em média, ao dobro da taxa da produção global. Foi a chave para a ascensão econômica do pós-guerra e que duraria uns 25 anos. Mas, acompanhando o colapso no comércio mundial na recessão de 2008-9, o comércio se tornou débil e anêmico. Isto provocou um acalorado debate entre os economistas burgueses sobre se a marcha da globalização está definitivamente chegando ao fim. O FMI prevê o crescimento do comércio mundial neste ano em 3,6%, enquanto a OMC prevê uma elevação de 4,7%, sendo que ambas as previsões são demasiado otimistas. O último, a OMC, é obrigado a advertir que “os riscos geopolíticos introduziram um elemento adicional de incerteza para a previsão”. Delta Economics, uma empresa de análise com sede em Londres, que monitora o comércio, prevê o crescimento do comércio mundial este ano, medido em preços correntes, em mero 1%. “2014 não está sendo um bom ano para o comércio”, disse Rebecca Harding, executiva-chefe de Delta Economics. Este é um quadro alarmante após cinco anos de “recuperação”, e é um claro reflexo do completo impasse do capitalismo mundial, como foi o caso no período entre as guerras. A globalização alcançou os seus limites. A globalização agora se manifesta, como previmos, como uma crise global do capitalismo.
Enquanto na década de 1930, o protecionismo serviu para espremer o comércio mundial, este não é mais o caso hoje, pelo menos abertamente. Existem barreiras e subsídios disfarçados em todos os níveis, que adicionaram atritos ao comércio, sobretudo entre a China, os EUA e a Europa. A manipulação da moeda também está no topo da agenda, com os EUA atacando a China, na sequência de uma forte desvalorização do Yuan desde o início de 2014. Falar de “guerra de divisas” não está muito longe das possibilidades. Mas as tendências protecionistas estão certamente emergindo e podem passar a primeiro plano na próxima recessão.
Morte agônica
“Na atual crise europeia e mundial de desemprego, os acontecimentos conjunturais estão ligados a processos orgânicos de decadência capitalista”, explicou Trotsky. “Temos mais de uma vez repetido que os ciclos conjunturais são inerentes à sociedade capitalista em cada etapa de seu desenvolvimento. Mas em diferentes estágios esses ciclos têm caráter diferente. Da mesma forma como nos anos de declínio de uma pessoa um surto de vitalidade é tão incerto quanto breve e cada enfermidade afeta todo o organismo, então os ciclos conjunturais do capitalismo imperialista, particularmente na Europa, mostram uma tendência à prolongação da crise, aliviada por comparativamente curtas mudanças para melhor” (Trotsky, Escritos 1930).
“O capitalismo em sua morte agônica, como sabemos, também tem ciclos, mas estes ciclos são declinantes e mórbidos”, ele explicou. “Somente a revolução proletária pode dar um fim à crise do sistema capitalista”.
“A retomada do ciclo de negócios não pode ser nem considerável nem de longa duração, porque agora estamos enfrentando o ciclo de um capitalismo que está irremediavelmente enfermo. As novas crises, depois de uma breve recuperação, serão mais devastadoras que a atual. Todos os problemas se levantarão novamente com força e nitidez redobradas…”, afirma Trotsky. “Mas, hoje, a retomada econômica não é mais do que uma hipótese. A realidade é o aprofundamento da crise, os dois anos de serviço militar obrigatório, o rearmamento da Alemanha, o perigo de guerra”.
Foi o advento da Segunda Guerra Mundial, de fato, que atalhou esta perspectiva e forneceu uma rota de fuga ao capitalismo. Ainda houve a traição da onda revolucionária que se seguiu à guerra pelos líderes reformistas e estalinistas, para permitir ao capitalismo a oportunidade de se recuperar.
Toda uma série de fatores se uniram, na sequência da Segunda Guerra Mundial, permitindo ao capitalismo não somente se estabilizar, como também experimentar uma ascensão colossal que iria durar 25 anos. O comércio mundial foi a força impulsora por trás deste extraordinário desenvolvimento, o que permitiu ao capitalismo superar temporariamente suas contradições fundamentais, no caso, os limites do estado-nação e a propriedade privada dos meios de produção. O capitalismo foi muito além de seus limites. No entanto, as contradições do capitalismo, que tinham sido parcialmente reprimidas, não foram removidas.
Finalmente, o capitalismo em 1974 experimentou sua primeira e simultânea recessão mundial. Esta representou um ponto de viragem que marcou o fim da “Idade de Ouro” e o início de uma nova crise no capitalismo. Todas as velhas contradições vieram agora à superfície, produzindo uma crise de superprodução e de desemprego em massa em todos os lugares. Isto marcou o surgimento de uma nova crise orgânica que levantou barreiras ao desenvolvimento capitalista.
No entanto, o capitalismo ainda foi capaz de avançar cambaleante, tentando superar as contradições por todos os meios possíveis. O crédito foi o principal método, mas de forma alguma o único, para impulsionar o sistema para a frente. O crédito nos EUA sozinho cresceu de um trilhão de dólares, em 1964, a 50 trilhões de dólares em 2007. O capitalismo sempre conseguiu superar seus limites, mas unicamente criando barreiras cada vez maiores no futuro.
Finalmente, o sistema capitalista se exauriu. Quanto mais tempo ele conseguiu adiar sua crise interna, maior ela se tornaria quando finalmente chegasse. Todos os fatores que impulsionaram o sistema à frente se transformaram em seu oposto. Todos esses fatores que empurraram o capitalismo para a frente foram os fatores que se combinaram para levá-lo abaixo em uma espiral incontrolável.
Os estrategistas do capital, embora alarmados com a profundidade da recessão de 2008, assumiram que, da mesma forma que em todas as outras recessões do pós-guerra, uma forte recuperação ocorreria. Mas isto foi no passado. As perspectivas para o capitalismo mundial se parecem mais à experiência do Japão dos anos 1990, que entrou em uma prolongada e tortuosa estagnação que continua até hoje.
Mas os capitalistas não conseguiam entender o que tinha acontecido. Os anos de boom prolongado e de recuperação se foram para sempre. Estes foram um produto de um conjunto único de circunstâncias, que não podem se repetir. Em vez disso, estamos enfrentados, na melhor das hipóteses, a uma prolongada estagnação e aprofundamento da crise. As contradições do capitalismo, longe de serem resolvidas, se agravam. O sistema passou de um freio relativo a um freio absoluto para o desenvolvimento das forças produtivas e para o avanço da sociedade.
Mesmo antes da recessão de 2008, apesar de um aumento que durou 30 anos da taxa de lucro, o sistema capitalista somente pôde se desenvolver em ritmo muito lento, apesar das bolhas especulativas, montanhas de crédito e de dívidas e oceanos de dinheiro barato. Esta é uma clara indicação da exaustão do sistema capitalista, que alcançou seus limites há muito tempo e somente pode se sustentar artificialmente e com medidas excepcionais. Esta crise orgânica, que reemergiu em 1974, continuou com altos e baixos até hoje.
“O enigma da produtividade”
“A produção capitalista se esforça constantemente por superar estes obstáculos imanentes [ao seu desenvolvimento posterior], mas os supera somente através de meios que colocam novos obstáculos e em maior escala. O verdadeiro obstáculo à produção capitalista é o próprio capital” – Karl Marx
Surpreendentemente, a produtividade também ficou para trás nesta suposta recuperação. Os economistas se referem a isto como o “enigma da produtividade”, o que reflete sua total confusão. Na Grã-Bretanha, isso alcançou níveis extremos, onde a produtividade por hora trabalhada caiu de fato durante os últimos cinco anos. Esta é a terceira vez que tal queda ocorreu nos últimos 100 anos; as outras duas ocasiões foram no rescaldo das duas guerras mundiais. A economia mundial enfrenta crise similar.
A crise da produtividade nos EUA, o país mais rico do mundo, provocou um acalorado debate sobre as razões de sua queda. A argumentação se concentra na fraca demanda desta fraca recuperação ou no fato de que os fatores que impulsionam a inovação estão perdendo força ou estão paralisados. O debate foi provocado pelo Professor Robert Gordon da Universidade de Northwestern, que colocou a questão de se saber se as grandes inovações dos séculos XIX e XX, como o transporte eficiente e os instrumentos de economia de mão de obra nacional, eram agora coisa do passado. O progresso técnico dos EUA vem desacelerando claramente desde 1970, um efeito do retardo na inovação.
“O desenvolvimento mais inquietante é o que está acontecendo com a produtividade”, afirma o Financial Times. “Um informe da Conference Board think-tank realizada nesta semana revelou que, pela primeira vez em décadas, houve um declínio na capacidade mundial de converter capital e trabalho em bens e serviços. Se esta desaceleração continuar, as consequências para o nível de vida seriam sombrias: a eficiência e a inovação são os motores mais importantes do crescimento econômico mundial no longo prazo” (FT, 18/1/14).
Paul Krugman, o Prêmio Nobel de Economia, assinalou na década de 1990 que “A produtividade não é tudo, mas no longo prazo é quase tudo”. De fato, toda a economia pode ser reduzida a uma economia de tempo de trabalho. Quanto mais produtiva é uma sociedade, mais rica se tornará. O aumento da produtividade se deve ao avanço tecnológico e aos investimentos no processo de trabalho. O capitalismo produziu uma revolução em termos de produtividade do trabalho, mas agora chegou aos seus limites. O fato de que o capitalismo esteja enfrentando uma crise de produtividade põe em questão toda a justificação da economia de mercado. Em vez de investir continuamente a mais-valia extraída da classe trabalhadora de novo na produção, o capitalismo se transformou cada vez mais em um obstáculo para si mesmo.
Outro artigo que analisou o informe sobre produtividade da Conference Board sublinhou a gravidade da situação: “A história tanto para a produtividade do trabalho – produção por hora trabalhada – quanto para a produtividade total dos fatores é a mesma. Taxas de crescimento decrescentes são o resultado de uma longa história de queda do crescimento da produtividade nas economias avançadas, que já não é mais compensada por grandes aumentos na eficiência das economias emergentes”.
O artigo continua: “Nas economias emergentes, enquanto as tendências da produtividade ainda são significativamente melhores do que nos anos 1970 e 1980, os sinais preocupantes são de que o gasto sustentado em bens de capital não está produzindo as mesmas melhorias na eficiência como há dez anos, o que sugere que o capital não está sendo destinado às melhores áreas possíveis. A Conference Board estima que a produtividade total dos fatores estagnou no ano passado na China e diminuiu na Índia, o que sugere que mesmo as maiores economias emergentes estão lutando para manter os avanços na eficiência que anteriormente eram tão facilmente encontrados”. O artigo conclui: “Se esta desaceleração continuar, as consequências para o nível de vida serão sombrias”.
No que se refere “às melhores áreas possíveis”, o capitalismo sempre investiu seu capital onde quer que ele possa realizar os maiores retornos lucrativos. Os capitalistas não estão nos negócios por nenhuma outra razão. Esta é a lógica do capitalismo.
“Esfriando o Sol”
Este fato levou alguns da esquerda a imaginar que a crise do capitalismo pode ser explicada pela tendência à queda da taxa de lucro. Embora esta tendência exista, é somente uma tendência. Alguns períodos experimentam uma queda na taxa de lucro, enquanto outros experimentam uma elevação, dependendo dos fatores compensatórios. Esta tendência age durante um período prolongado de tempo. Concordamos com Rosa Luxemburgo quando ela disse que, se a queda na taxa de lucro fosse responsável pelo desaparecimento do capitalismo, isto “tomaria tanto tempo quanto o esfriamento do Sol”. Durante os últimos 30 anos anteriores à crise de 2008, houve uma elevação da taxa de lucro. Embora seja uma importante tendência dentro do capitalismo, isto não explica a causa da crise capitalista, que é a crise de superprodução.
Embora tenha havido uma recuperação na rentabilidade desde o colapso de 2008-9, o investimento, que é a chave de qualquer crescimento sustentável, está no fundo do poço. Em alguns países, como a Grã-Bretanha, o investimento caiu substancialmente. A razão disto não é a rentabilidade (que subiu) ou as dificuldades de acesso aos fundos (os capitalistas estão sentados em cima de centenas de bilhões), mas a ausência de mercados rentáveis (ou da “demanda”, como os burgueses gostam de dizer). O excesso de capacidade (superprodução) é generalizado, uma sobra do otimismo elevado e dos investimentos massivos feitos no período anterior à crise.
Normalmente, depois de uma recessão, com a destruição da superprodução, a taxa de lucro, que entrou em colapso durante a recessão, aumenta e age como estímulo a novos investimentos. Os meios de produção desgastados são substituídos por maquinaria e equipamentos novos, e isto proporciona as bases para uma expansão da produção. A redução dos salários e a deterioração dos termos e das condições nos locais de trabalho, junto à erradicação dos estoques excedentes, ajudam a restaurar ou restaurar parcialmente a taxa de lucro. Isto prepara um novo ciclo ascendente, mas também planta as sementes para uma nova recessão no futuro. Este é o chamado processo de “destruição criativa”. Contudo, ao fazer os salários baixarem destroem o poder de compra de que depende a realização de lucros.
Normalmente, uma crise eliminaria este excesso de produção, mas não foi este o caso desta vez. Apesar de ser a mais profunda crise desde os anos 1930, a destruição de valores de papel, bem como de instalações e maquinaria, não logrou erradicar por completo o “excesso de capacidade”, que é sinônimo de superprodução de capital e dos limites do mercado. É por isso que se fala de bancos e empresas “zumbis”, mantidas artificialmente flutuando através do crédito barato. Como resultado, o sistema capitalista está resfolegando devido ao excesso de capacidade e à falta de mercados para vender seus produtos. Este fracasso do sistema também é um reflexo do atual crescimento em passo de tartaruga do comércio mundial. A desaceleração das economias emergentes, particularmente a China, é um sintoma desta crise, assim como um fator que serve para exacerbar o problema.
Os que argumentam que a crise foi causada pela queda da taxa de lucro necessitam explicar por que a recuperação da taxa de lucro ao longo do período passado não levou a uma recuperação real no investimento e a um retorno do crescimento sustentado. “Os lucros como proporção do PIB estadunidense subiram de menos de 4% em meados dos anos 1980 a um pico tipo pós-guerra de 11% no ano passado, uma estatística que aquece o coração de um barão ladrão do século XIX”, afirma John Plender. “A participação dos salários caiu consistentemente desde o início dos anos 1970” (FT, 11/1/14). De acordo com o Escritório de Análise Econômica, com sede nos EUA, os lucros nos EUA antes dos impostos atingiram o pico no terceiro trimestre de 2006 de 1,865 bilhões de dólares, um ano antes da crise de crédito. A taxa de lucro diminuiu gradualmente ao longo de 2008, mas no quarto trimestre daquele ano a massa de lucros caiu a 861 bilhões de dólares. Isto coincidiu com a crise e colapso do comércio mundial, como já explicamos. No entanto, no primeiro trimestre de 2009, os lucros antes dos impostos se recuperaram a 1,130 bilhões de dólares, e no quarto trimestre tinha alcançado 1,549 bilhões. No terceiro trimestre de 2010, eles tinham quase alcançado o nível pré-crise chegando a 1, 845 bilhões.
Sendo este o caso, por que o capitalismo ainda se encontra em crise profunda, com um crescimento anêmico, no melhor dos casos, e queda do investimento, o sangue vital de qualquer recuperação? Com lucros recordes, a teoria de que a crise capitalista é causada pela tendência à queda da taxa de lucro revela-se errada. É uma explicação unilateral, mecânica, que contradiz o método dialético de Marx, que vê a crise capitalista não através de uma única causa, mas através de uma concatenação de contradições. Como ele explicou, “A lei funciona, portanto, simplesmente como uma tendência, cujo efeito é decisivo somente sob certas circunstâncias e durante períodos longos” (Marx, O Capital, Livro III, p. 346). Como já explicamos, a essência da crise capitalista é a superprodução simultânea de bens de capital e de consumo para fins de produção capitalista, ou seja, com a finalidade de produzir lucros. Quando não existem mercados, não há vendas e, portanto, nenhum lucro. Por que os capitalistas investiriam sob estas condições de crise orgânica?
Beco sem saída
Os ataques aos níveis de vida e a austeridade em massa serviram para reduzir o consumo e o investimento, sem os quais não pode haver crescimento significativo. No passado, o capitalismo se desenvolveria investindo o excedente extraído do trabalho não-pago da classe trabalhadora. Desta forma, o capitalismo superaria uma contradição profunda: a de que a classe trabalhadora não pode comprar de volta os produtos que ela cria. Mas os padrões de vida estão sob ataque em todos os sentidos. Salários baixos tornam possível grandes lucros, mas, ao mesmo tempo, tornam a realização de tais lucros impossível porque reduzem a demanda por bens. Além do mais, os governos capitalistas não podem aumentar o gasto público devido à crise das finanças do Estado, e os salários não podem ser aumentados (estes estão sendo cortados em todos os lugares), visto que isto vai comer os lucros. Sem investimento (que vem do trabalho não-pago da classe trabalhadora) e com a queda dos padrões de vida, o sistema está preso em um beco sem saída gigantesco. A produção capitalista depende da acumulação acelerada (investimento). A incapacidade de executar esta função deve provocar inevitáveis e sucessivas crises. A queda da acumulação tem um efeito dominó desastroso na prevenção do ciclo e do processo contínuo de produção, realização (vendas) e investimento. Quando a acumulação cessa, os lucros também cessam.
O capitalismo se vê obrigado a criar seu próprio mercado na forma de investimento em bens de capital, o que, por sua vez, age como um estímulo para o desenvolvimento econômico. Marx dividiu a produção capitalista em dois departamentos baseados em bens de capital e bens de consumo. A complexa interação entre o Departamento 1, a produção dos meios de produção (bens de capital, maquinaria, prédios etc.), e o Departamento 2, a produção de meios de consumo (bens de consumo), serve para expandir a economia. Além da pequena parte do excedente consumida pelos capitalistas, o restante é reinvestido na economia. Toda a justificação histórica do capitalismo tem sido o desenvolvimento das forças produtivas. Se a produção não aumenta, então o mercado continuará a estagnar. Os dois Departamentos da produção são interdependentes. Uma queda em um deve finalmente significar uma queda no outro. O sistema capitalista funciona quando todos os fatores interagem com todos os outros fatores, o que requer um constante aumento da produção, do investimento e o aumento dos mercados em uma espiral de desenvolvimento. Mas atualmente o processo oposto é o que ocorre, com excesso de capacidade e mercados minguantes, que têm consequências inevitáveis de estagnação e depressão.
A lei da “acumulação pela acumulação”, que impulsiona o capitalismo, deixa de funcionar. A crise geral do capitalismo se reflete na incapacidade do capitalismo de desenvolver as forças produtivas como no passado. A curva capitalista de produção, da qual falava Trotsky, encontra-se em trajetória descendente. A época agora se caracteriza por auges curtos ou recuperações anêmicas e profundas recessões e prolongadas depressões.
O que os capitalistas fizerem dará errado. Todas as tentativas para restaurar o equilíbrio econômico simplesmente servirão para desestabilizar o equilíbrio social e político. Estão empantanados entre o diabo e o mar azul profundo. É por isso que entramos no período mais turbulento da história, um período de convulsões – econômicas, políticas e sociais, e também em termos das relações mundiais. Todas essas convulsões se retroalimentam umas às outras em ciclo contínuo.
Austeridade Permanente
Hoje, mais de cinco anos depois da queda devastadora, a perspectiva sob o capitalismo parece sombria, para dizer o mínimo. Temos uma recuperação mais fraca do que em qualquer um dos anos das décadas de 1920 e 1930. Ao mesmo tempo, os níveis de vida estão sendo reduzidos até os ossos e a austeridade está em todos os lugares. O caminho da austeridade “vai ser longo, irregular e tortuoso”, afirma Janan Ganesh. “A recuperação econômica não significa o final da austeridade, ou mesmo o começo do fim. Na melhor das hipóteses, ela marca o fim do começo. Se isto faz nossa crise fiscal soar como um desafio histórico de grandes proporções, é porque deveria” (FT, 15/10/13).
Alguns comentaristas burgueses sérios, como Lawrence Summers, ex-Secretário do Tesouro dos EUA sob Clinton, sacaram algumas conclusões alarmantes. Em um artigo intitulado Por que a estagnação pode chegar a ser a nova normalidade, ele fala de uma “estagnação secular” para o capitalismo. De acordo com o dicionário, a palavra “secular” significa uma duração de tempo indefinidamente longa ou até mesmo um século. Mesmo que a economia acelere este ano, disse ele, “isto não proporciona nenhuma segurança de que seja capaz de um crescimento sustentado com taxas de juro reais normais. A Europa e o Japão preveem crescimento em nível bem abaixo dos EUA. Em todo o mundo industrial, a inflação está abaixo dos níveis-alvo e não mostra nenhum sinal de se elevar – o que sugere um déficit de demanda crônica” (Financial Times, 16/12/13).
Summers fez seu discurso sobre “estagnação secular” na conferência de pesquisa do FMI. Esta nova época de estagnação, abertamente reconhecida pelos comentaristas burgueses, é simplesmente outro termo para uma nova depressão, e um reflexo da crise orgânica do capitalismo. James Richards acredita que já estamos em uma depressão onde o crescimento lento é estrutural. “O sistema vai cambaleando”, disse ele, em umestranho eufemismo. Entre outros estrategistas mais clarividentes do capital, o otimismo anterior foi substituído por grande pessimismo, novamente mais um reflexo da profunda crise do capitalismo. Isto se refletiu em um comentário de Martin Wolf, economista-chefe de Financial Times, que ponderou como um retorno aos anos 1930 era possível. “Eu não sabia. Agora sei”, disse sem rodeios. A gravidade da situação (a nova “normalidade”) finalmente amanheceu sobre os representantes burgueses mais sérios. Foram obrigados a aceitar que estão em uma crise do sistema muito similar à crise dos anos 1930.
Sentimentos semelhantes foram expressos pela chefe do FMI, Christine Lagarde: “A economia global está virando a esquina da Grande Recessão [eles não se permitem usar a palavra depressão], embora o crescimento global permaneça demasiado lento e fraco”, disse a Senhora Lagarde. “A menos que os países se unam para realizar o tipo certo de medidas políticas, poderíamos estar diante de anos de crescimento lento e abaixo dos dois dígitos – muito abaixo do crescimento sólido e sustentável necessário para criar empregos suficientes e melhorar os padrões de vida no futuro” (FT, 3/4/14). Com toda honestidade, não há nenhuma possibilidade de países capitalistas “caminharem juntos” com o “tipo certo de políticas”. É uma ilusão ao extremo, como o mostra o quadro da política europeia.
Mas um novo espectro ronda a Europa – o espectro da deflação e da queda dos preços, que caracterizou a década de 1930. Os economistas burgueses sérios estão extremamente alarmados com a inflação da zona do euro no ano até março caindo a 0,5%. Na Espanha, os preços ao consumidor na verdade caíram uns 0,2% durante o mesmo período. Foi a queda mais aguda nos preços desde 2009. A tendência geral é claramente de baixa, o que sugere um déficit crônico na demanda, que temem que possa terminar em espiral descendente.
A deflação – descrita como um “ogro” [divindade infernal – NDT] por Christina Lagarde – simplesmente aumentará seus problemas ao encorajar as pessoas a adiar gastos e investimentos, bem como ao aumentar o peso da dívida. Como os preços caem, o valor nominal dos empréstimos permanece o mesmo enquanto a renda declina. Os devedores são obrigados a usar mais de sua renda para cobrir seus empréstimos. Isto amortece o consumo, pressionando os preços ainda mais para baixo. O investimento é adiado já que as empresas se aferram às suas reservas de caixa, enquanto cai o custo do seguro do dinheiro. Se eles têm dívidas, a deflação tenderá a aumentar a pressão para as empresas de desalavancagem mais rápida, forçando-as a uma espiral descendente. Como afirmou Luis Garicano, professor de economia em LSE: “Estamos em um território onde os modelos e análises utilizados pelos responsáveis políticos não parecem estar funcionando. E isso é muito preocupante” (FT, 3/4/14).
“Nenhum de nós [na Europa] experimentou alguma vez a deflação”, disse Graham Secker, chefe da estratégia de ações pan-europeia em Morgan Stanley. “Ninguém acreditava que a deflação pudesse ocorrer no Japão até que ocorreu” (FT, 3/3/14).
“Para a zona do euro”, explicou o economista Wofgang Munchau, “a deflação alemã é um pesadelo. Se a periferia quiser se tornar mais competitiva, necessita uma inflação mais baixa do que na Alemanha. Mas se a Alemanha, também, se desinfla, então ou o ajuste competitivo não ocorrerá; ou toda a zona do euro entra na deflação; ou, mais provavelmente, ambas as coisas” (FT, 24/2/14).
Eles estão particularmente assustados porque as taxas de juro estão próximas de zero e ameaçam se tornar negativas. Mas esta estratégia é inútil, forçando os depositantes a guardar dinheiro em seus próprios cofres em vez de pagar por ele em uma conta bancária. Ironicamente, a receita Keynesiana de gasto deficitário, que poderia impulsionar a demanda e a elevação dos preços, é descartada nos estados mais endividados onde a ameaça de deflação mais se agiganta. A única e notável exceção, e que parece estar caminhando para a quebra, é o Japão. Bilhões estão sendo injetados na economia endividada, mas com pequenos resultados exceto possivelmente levantar as taxas de juro, colocando em risco um default do governo.
Crise das forças produtivas
Como era de se esperar, os comentaristas burgueses oferecem todo tipo de razões para explicar a crise, exceto a razão real. Naturalmente, distintos elementos desempenham certamente um papel na crise. Na superfície, a queda foi vista como uma crise financeira. Mas a falta de financiamento foi causada pela crise e não ao contrário. Mas há algo mais fundamental que está operando. As leis do capitalismo não estão mais funcionando como no passado. A acumulação está secando. A globalização (ampliação e intensificação do mercado mundial) está chegando a um impasse e ameaçando reverter. Todos os fatores que contribuíram para os anos de auge se transformaram em seu oposto.
O Marxismo vê no desenvolvimento das forças produtivas a chave do desenvolvimento da sociedade e da história. Enquanto o capitalismo for capaz de desenvolver as forças produtivas, isto pode proporcionar uma estabilidade relativa ao sistema. Esta era a situação no passado, mas não é mais o caso. Hoje, temos o contrário, em que a crise significa instabilidade social em escala mundial. “O mundo entrou na era da insegurança”, explica Philip Stephens no Financial Times (21/2/14).
Mais de cinco anos depois do colapso de Lehman Brothers, o sistema capitalista mundial permanece em um beco sem saída. É um profundo mal-estar do qual não pode escapar. Isso tem consequências sérias. Como Marx explicou há muito, nenhum sistema social deixa o cenário da história antes de se exaurir e de se provar incapaz de desenvolver por mais tempo as forças produtivas. Assim que isto acontece, a sociedade entra em um período de revolução social. Esta é precisamente a situação que existe hoje em escala mundial. Há uma crise das forças produtivas, se rebelando contra as barreiras da propriedade privada e do estado-nação. O capitalismo exauriu sua missão histórica e se tornou em um gigantesco entrave para o desenvolvimento econômico e social e para o avanço humano em geral.
A propriedade privada dos meios de produção, em vez de fazer avançar, se tornou um enorme obstáculo ao progresso social. O modo de produção e a apropriação individual entraram em conflito com as necessidades da produção social. As relações de propriedade existentes, em particular, se tornaram historicamente obsoletas. Em geral, se converteram em um obstáculo para futuros avanços. “De formas de desenvolvimento das forças produtivas”, explicou Marx, “estas relações se converteram em seus grilhões”. As forças produtivas estão em revolta, em todos os aspectos, contra as relações capitalistas de propriedade. O materialismo histórico explica que, “nenhuma ordem social jamais perece antes que todas as forças produtivas para as quais nela haja espaço tenham se desenvolvido; e novas e mais elevadas relações de produção jamais aparecem antes que as condições materiais de sua existência tenham amadurecido no seio da mesma velha sociedade”. Estas condições não somente amadureceram, também estão demasiado maduras e colocaram a revolução mundial na agenda.
O beco sem saída do capitalismo se reflete no fato de que ele não pode utilizar plenamente a capacidade produtiva que trouxe à existência. Nos auges econômicos do passado, o sistema apenas podia utilizar 80% de capacidade produtiva. Em tempos de recessão, o sistema apenas pode utilizar 65% da capacidade instalada. Hoje em dia, este índice se situa no extremo inferior. Isto se pode ver pelos números dos EUA, onde a capacidade de utilização da capacidade instalada caiu para 66,9% em 2009 e subiu para 79% em 2013. Mais uma vez, isso reflete o completo impasse do sistema capitalista.
O próprio Marx resume assim toda a contradição:
“A produção capitalista se esforça constantemente por superar estas barreiras imanentes [ao seu desenvolvimento posterior], mas supera-as somente por meios que estabelecem novas barreiras e em escala mais poderosa. A verdadeira barreira da produção capitalista é o próprio capital” (Marx, O Capital, Livro 3, p. 358).
O sistema capitalista encontra-se em etapa de decadência terminal. O sistema está à beira de um grande choque que produzirá uma nova recessão mundial. Este choque pode ser qualquer coisa. É por esta razão que os comentaristas capitalistas estão alarmados com os acontecimentos na Ucrânia. Se esta situação escalar e a Rússia retaliar contra quaisquer sanções, cortando o abastecimento de energia à Ucrânia e à Europa, então isto poderia causar profundas consequências. A guerra no Oriente Médio de 1973 levou à quadruplicação dos preços do petróleo. Isto, por sua vez, desencadeou a crise mundial de 1974. Hoje em dia, um grande aumento dos preços da energia e o caos decorrente poderiam ter o mesmo efeito.
Mesmo sem isto, há pessimismo e desespero crescentes em todos os lugares. “Outra década de mal-estar econômico no Ocidente – ou, não o queira Deus, outra crise financeira – e é provável que vejamos emergir soluções e políticos mais radicais”, afirma Gideon Rachman no Financial Times (10/12/13).
Esta crise histórica sem solução está pavimentando o caminho para acontecimentos revolucionários e grandes mudanças na consciência em escala mundial. O que está absolutamente claro é que não há nenhuma forma de se sair da crise na base do capitalismo, que está destinado a submergir a humanidade em uma época de revolução e contrarrevolução. Somente podemos avançar através da derrubada revolucionária do sistema, superando o pesadelo da crise capitalista e tudo o que significa. Somente quando erradicarmos as contradições que emanam do capitalismo poderemos utilizar plenamente os recursos do mundo para erradicar a praga da fome, da pobreza e da miséria e criar uma vida digna para os seres humanos. Para a humanidade, isto significaria, de acordo com as palavras de Engels, “um salto do reino da necessidade ao reino da liberdade”.
Texto postado originalmente em:
http://www.marxist.com/2015-04-17-14-05-17.htm
Rob Sewell – “Onde estavam os Marxistas em 2008, quando a queda de Lehman Brothers quase provocou o colapso do capitalismo?”, se pergunta um desconcertado Ralph Atkins, o editor de mercados de capitais do Financial Times. Bem, ao contrário do Sr. Atkins e do seu círculo de partidários do livre mercado, não estávamos em estado de total desconcerto. Tínhamos previsto este acontecimento.
Enquanto o capitalismo mergulhava em profunda depressão, estávamos explicando a uma audiência cada vez maior que a crise, que os economistas burgueses negavam que poderia ocorrer, foi uma confirmação impressionante da correção das ideias de Marx. Essas ideias, que haviam sido repetidamente declaradas como obsoletas pelos apologistas do capitalismo, se mostraram surpreendentemente relevantes, em total contraste com a teoria econômica burguesa e em especial com a desacreditada hipótese da eficiência do mercado.
Em 2008, o capitalismo sofreu o que muitos já reconheceram como a crise mais profunda desde a década de 1930 e, em termos de alcance, possivelmente na história. O colapso inicial no comércio mundial foi muito pior do que no primeiro ano da Grande Depressão. Os estrategistas burgueses ficaram em estado de pânico abjeto. “A produção industrial global acompanha horrivelmente de perto o declínio da produção industrial durante a Grande Depressão”, escreveu Martin Wolf, economista-chefe do Financial Times. “Sem a Europa, o declínio da produção industrial da França e da Itália foi pior do que a esta altura na década de 1930. O declínio nos EUA e no Canadá também está muito perto daquele nos anos 1930. Mas o colapso industrial do Japão foi muito pior do que nos anos 1930, apesar de uma recuperação muito recente” (FT, 16/09/09).
Alguns chegaram a ousar comparar a recessão a uma parada cardíaca quase fatal. Mas o paciente enfermo, com a ajuda de resgates estatais de emergência, logo foi transferido de seu leito de morte para uma unidade de tratamento intensivo. Em igualdade de condições, eles acreditavam que o capitalismo se recuperaria desta crise da mesma forma como nas recessões cíclicas do passado. Uma recuperação da recessão era vista como inevitável. Contudo, as coisas não são sempre iguais e o caráter das crises não é sempre o mesmo. Foi um erro ver esta crise como uma simples repetição das anteriores. Ademais, é errado julgar o estado de um organismo simplesmente a partir de sua aparência exterior. Temos de descobrir sua verdadeira natureza, sua evolução e, sobretudo, suas profundas contradições internas, e ver como essas contradições operam na prática. Isto significa adotar não uma abordagem mecânica, que domina a perspectiva burguesa, mas uma abordagem dialética.
Situação anterior a 2008
Mesmo no período anterior a 2008, o auge do capitalismo se manteve em grande medida artificial, o que mostra como as contradições estavam se manifestando mesmo nesta etapa. O capitalismo já não podia mais se manter como no passado. O investimento na capacidade produtiva foi cada vez mais substituído em todos os aspectos pela especulação e jogos de azar. “Bolhas manifestamente insustentáveis e o afrouxamento dos padrões de crédito em meados da década passada, junto com o dinheiro muito fácil, foram suficientes para impulsionar somente um crescimento econômico moderado”, explicou Lawrence Summers, o ex-secretário do tesouro no governo de Bill Clinton. Estranhamente, medidas excepcionais somente produziram resultados modestos. O sistema capitalista não estava funcionando como antes. Mesmo então, isto resultou ser insustentável e somente teve êxito em preparar o caminho para uma crise devastadora.
A catástrofe de 2008 não foi, certamente, uma crise comum. Dada a sua profundidade e severidade, sem dúvida não haveria uma recuperação rápida, o que os economistas burgueses sérios foram forçados a reconhecer. O crédito, que serviu para prolongar o auge pré-crise, agora se transformou em uma montanha de dívidas. A recessão de fato marcou um ponto de viragem fundamental, como no crash de 1929, e serviu para inaugurar uma época totalmente nova para o capitalismo moderno, mais parecida com a Grande Depressão dos anos 1930. Esta não foi, portanto, nenhuma crise “normal”, onde, com pequenos e inteligentes ajustes, tudo voltaria como antes. Tal crise não correspondia aos livros de texto econômicos ou aos modelos de computador.
Sempre fiéis, desde o verão de 2009 os comentaristas burgueses estavam procurando desesperadamente ao redor por sinais dos “brotos verdes”. Mas, todas as vezes ficaram desapontados. Falsos alvoreceres após outros foram proclamados. Estes eruditos cavalheiros e damas não entenderam nada, e menos ainda a natureza desta crise capitalista. Atribuem a crise a todo tipo de coisas – a tudo, menos ao fato de que esta era um sintoma de um sistema social agonizante. Os Marxistas, por outro lado, entenderam muito bem que a velha “normalidade” havia desaparecido e que o capitalismo tinha entrado em uma agonia de morte “secular”, de longo fôlego, quando a crise é a regra e não a exceção.
Sem crise “final”
Diferentemente dos estalinistas do Terceiro Período, que declararam que 1929 era a “crise final” do capitalismo, os Marxistas não reconhecem tal coisa de “crise final”. “As crises capitalistas não são numeradas, nem é indicado com antecedência qual delas será a ‘última’”, explicou Trotsky (Trotsky, sobre a França, p. 71). O sistema capitalista pode continuar mesmo mancando, não importa a profundidade da crise, causando cada vez mais miséria e degradação. Sem a sua derrubada pela classe trabalhadora, a continuação do capitalismo lançará a humanidade no caos e na barbárie, com novas crises e catástrofes.
Naturalmente, recuperações, contudo anêmicas ou parciais, certamente podem ocorrer, mesmo em períodos de crise profunda, como a atual. Isto não contradiz a análise geral de um capitalismo doentio e declinante, causando miséria cada vez maior. Mesmo um organismo em agonia mostra ocasionalmente alguns movimentos espasmódicos de vida. Isto aconteceu nos anos 1930, durante a “Recuperação Roosevelt”, mas não alterou o caráter fundamental do período, que era de crise, depressão e desemprego em massa. Em qualquer caso, a recuperação de 1934-37 nos EUA não se prolongou, apesar das ilusões em contrário, e foi seguida por um novo colapso. “Surgiram esperanças de que o processo de crescimento econômico interrompido pela crise seria novamente restabelecido. Mas, mais cedo do que se poderia esperar, a hora de uma nova crise golpeou”, explicou Trotsky no momento. “Começou a partir de um nível mais baixo do que a crise de 1929 e está se desenvolvendo em ritmo mais rápido. Isto demonstra que não é uma recessão acidental, nem mesmo uma depressão conjectural, mas uma crise orgânica de todo o sistema capitalista” (Trotsky, 29 de novembro de 1937, ênfase nossa).
Usamos esta descrição de crise orgânica do capitalismo de Trotsky muitas vezes para descrever a natureza da presente época. Isto não deve ser confundido, naturalmente, com o termo de Marx, a composição orgânica do capital, que se refere simplesmente às relações entre trabalho vivo e trabalho morto (a ratio entre capital constante e capital variável). A crise orgânica do capitalismo é uma descrição de uma profunda crise histórica que reflete a desintegração das contradições inerentes ao sistema, ou seja, um sistema em declínio terminal.
Explicação cíclica da crise
Enfatizamos este ponto porque há aqueles que, mesmo se reivindicando Marxistas, veem as coisas em termos de ciclos econômicos e ciclos de lucro. Eles explicam a severidade da crise atual como “enraizada” nas debilidades e desequilíbrios do auge anterior, e não porque o capitalismo alcançou seus limites. Embora tenha havido uma especulação selvagem no período anterior, isto não explica a natureza da crise. Tal explicação é superficial e ignora a profunda natureza histórica desta crise do sistema capitalista.
Esta visão está muito ligada à ideologia do reformismo, que reconhece estas “debilidades e desequilíbrios” no capitalismo e busca corrigi-los. Os reformistas aceitam a explicação cíclica da crise, em oposição à crise histórica do capitalismo. Para eles, uma crise cíclica significa que os anos de auge voltarão e tudo caminhará bem. É por isso que os reformistas, bem como aqueles que abandonaram a política revolucionária, estão atraídos pelos ciclos de Kondratiev. Esta teoria é pouco diferente das estranhas ideias de Henry L. Moore, cuja teoria de “ciclos de geração” de oito anos estava vinculada à órbita de Vênus, que interceptava o Sol e a Terra, produzindo crises econômicas. Outro economista, W. Stanley Jevons, culpou a crise econômica pela existência das manchas solares.
Todas as teorias cíclicas de equilíbrio assumem que, sem importar o quanto as coisas piorem, sempre há uma tendência natural para restabelecer o equilíbrio. Para eles, o desenvolvimento capitalista é um caso de ganhos e perdas que se compensam. “Bem, existem problemas, mas no final tudo ficará bem; então, por que se preocupar com este absurdo de revolução socialista?”.
Nos anos 1930, a Grande Depressão resultou do colapso total e do impasse do sistema capitalista mundial, que se mostrou incapaz de desenvolver as forças produtivas como antes. Ela teve o mesmo caráter da crise atual: uma crise orgânica. Na década de 1930, a “solução” da crise capitalista veio através da guerra mundial e da destruição em massa das forças produtivas. Hoje, com o atual equilíbrio de forças e com a existência de armas nucleares, uma guerra mundial “solucionadora” está descartada. Com a guerra mundial fora da agenda, isto significa que todas as contradições serão internalizadas e que enfrentaremos anos, senão décadas, de austeridade selvagem e crises – pelo menos até que a classe trabalhadora tome o poder. Um “Verão” a la Kondratiev está descartado.
A recuperação mais fraca da história
Apesar da euforia atual da imprensa sobre a atual e fraca “recuperação”, a economia mundial continua em estado de crise, muito longe das expectativas previstas pelos estrategistas do capital. Até mesmo os estrategistas burgueses reconhecem este fato. Um recente e sombrio editorial do austero Financial Times abria com estas palavras: “Nos últimos cinco anos, a economia mundial esteve em crise” (FT, 19/04/2014). A “recuperação”, tal como é, é a recuperação mais fraca da história – sim, da história, o que diz muito sobre a natureza real da crise.
Hoje, depois de um impulso inicial, a economia japonesa foi reduzida a um ritmo muito lento, e ameaça reverter como nos vinte anos anteriores. A Europa continua a definhar em estancamento ou recessão aberta, com a potência alemã mostrando sinais alarmantes de exaustão e com o desemprego na Europa em níveis historicamente elevados. Há pouco espaço para melhorias. “Estamos caminhando de uma crise aguda para uma crise crônica”, explicou Philippe Legrain, um ex-assessor do Presidente da Comissão Europeia (FT, 8/4/2014). A crise do Euro simplesmente está se movendo da periferia para o centro, enquanto as preocupações se espalham à França e à Itália.
Mesmo nos EUA, a situação está longe de ser satisfatória, onde o crescimento mais uma vez reduziu a velocidade e onde a proporção de pessoas empregadas recentemente atingiu seu nível mais baixo desde 1978, enquanto milhões de homens e mulheres aptos abandonam a força de trabalho e desaparecem dos números do desemprego. 20 milhões estão desempregados ou subempregados, e entre 37 milhões e 50 milhões vivendo na linha da pobreza. O crescimento dos EUA desde 2010 tem flutuado entre deprimentes 1,8% e 2,4%, uma pobre performance quando comparada às recuperações anteriores. O PIB dos EUA está mais de 10% abaixo do que tinha sido previsto nas tendências antes da recessão. Na Grã-Bretanha, não está muito longe dos 20% abaixo daquelas tendências.
Com a estagnação das economias ocidentais, os capitalistas levantaram os olhos desesperadamente para as economias BRIC, como ajuda para retirá-los deste pântano. Mas estas economias estão agora experimentando uma desaceleração. A dívida familiar no Brasil, China, Cingapura, Tailândia e Turquia aumentou mais de 40% desde 2008. Segundo o FMI, no ano passado, “o déficit projetado no Brasil, Índia e China é similar aos golpes às taxas de produção que as economias avançadas sofreram no período pós-crise” (FT, 9/10/2013). O Financial Times explicou que “a razão para se ter medo é que o mundo parece que vai enfrentar anos de crescimento abaixo da média. O surto de crescimento dos últimos 30 anos dos mercados emergentes está chegando ao fim” (FT, 19/4/2014). Com todas as saídas bloqueadas, o sistema está, na melhor das hipóteses, aprisionado na estagnação de longo prazo, o que será acompanhado por um devastador e longo impacto sobre os níveis de vida. Ou seja, até a próxima recessão mundial.
Medidas desesperadas
Além do desespero, os capitalistas foram reduzidos a tomar medidas sem precedentes, não somente para evitar outra Grande Depressão, como também para manter o sistema capitalista funcionando. Precisa-se apenas considerar que o atual e magro crescimento foi obtido somente como resultado do maior programa de apoio monetário da história. E isto apesar das virtudes da economia de mercado e da livre empresa, que se supunham ser magníficos exemplos para todos nós! Estes são mares desconhecidos. O sistema capitalista em crise está sendo impulsionado artificialmente pela máquina de apoio vital de um Banco Central, que está despejando trilhões de dólares no sistema financeiro. Contudo, quanto mais essas medidas extraordinárias são usadas para impulsionar o sistema, menos impacto elas produzem, como um viciado em drogas que necessita de doses cada vez maiores para obter o mesmo resultado. Há cinco anos, precisava-se de mais de 1 dólar de dívida para gerar 1 dólar de crescimento na China. Em 2013, necessitava-se de perto de 4 dólares de dívida para gerar 1 dólar de crescimento – e um terço da nova dívida agora vai para pagar dívidas velhas. A taxa de crescimento da China caiu ao nível mais baixo em mais de 20 anos, enfraquecendo as importações e causando estragos no Brasil, África do Sul, Indonésia, Chile, Colômbia, Rússia e Peru. A maior parte deste dinheiro “novo” acaba em negócios especulativos e aventura de alto risco, e não no investimento produtivo, causando todo tipo de novas contradições.
Nos EUA, os efeitos da Expansão Quantitativa (QE – Quantitative Easing), de início bombeando 85 bilhões de dólares no sistema bancário por mês, teve resultados dúbios e o programa está sendo gradual e cautelosamente reduzido. Os balancetes da Reserva Federal agora alcançaram proporções assombrosas. Na Europa, enfrentado aos riscos de deflação, o Banco Central Europeu está pensando em embarcar em sua própria versão de imprimir dinheiro através da compra de títulos. Os alemães, no entanto, estão relutantes, devido ao medo da inflação, e são eles que têm a chave do cofre.
No final, todas as tentativas de aplicar esta morfina monetária longe de tirar o sistema capitalista da crise causaram grave mal estar, especialmente nos mercados emergentes. Em seu semestral Informe de Estabilidade Financeira Global, o FMI observou que “a redução progressiva de certos apoios políticos extraordinários não tem sido acompanhada pela preparação adequada de um novo ambiente de crescimento normal e autossustentável” (FT, 10/4/2014). Assim que anunciaram que a torneira de dinheiro barato estava para ser fechada, todo o dinheiro “quente” começou a desaparecer, causando desvalorizações e turbulências em seu rastro.
Mais uma vez, as taxas de juros se mantiveram artificialmente baixas para encorajar o crescimento. Na Grã-Bretanha, a taxa oficial de juros se encontra em nível mais baixo que há 300 anos, com poucas perspectivas de aumentar em breve. Nos principais países capitalistas, elas estão em nível próximo de zero. Isto não tem precedentes e mostra a profundidade da crise atual e como ela é qualitativamente diferente das crises mais recentes. Agora, o Banco Central Europeu está ameaçando se mover para onde nenhum banco central foi antes, o corte de suas principais taxas de juros abaixo de zero para promover o crescimento. A ideia de se pagar a um banco para guardar suas poupanças parece bizarra, mas é um reflexo dos tempos pouco convencionais em que estamos vivendo.
Segundo o novo livro de James Richards, um ex-conselheiro geral do Fundo de Gestão de Capital de Longo Prazo, que colapsou espetacularmente em 1998, já estamos vivendo em uma nova depressão. Para Richards, a economia dos EUA está como um alpinista em uma montanha de 28 mil pés de altura, com uma fenda de um lado e um precipício abrupto do outro. Insistir na escalada torna a coisa ainda mais difícil, mas voltar – e abandonar a QE – significa enfrentar a dor evitada em 2009. Não é uma má analogia. Seu destino não está em suas mãos.
Ademais, a OCDE e o FMI advertiram que o mundo capitalista corre o risco de cair durante anos, senão durante décadas, em crescimento mais baixo (“abaixo da média”) e em desemprego mais alto, a menos que os governos sigam em frente com as reformas estruturais radicais. Com um crescimento tipo depressão e alguns 50 milhões já desempregados nos principais países capitalistas, os informes apontam que o pior está por vir. O atual desemprego não tem caráter temporário, como no passado; não é meramente um desemprego cíclico, mas um desemprego estrutural, a expressão mais mortal da decadência do capitalismo. O capitalismo está tão quebrado e enfermo que não pode mais pôr em uso as forças produtivas, incluindo a força de trabalho humana a sua disposição. Se, no alvorecer do capitalismo, os trabalhadores ignorantes e famintos quebravam as máquinas, hoje são os capitalistas que são Ludditas, os que destroem as máquinas e deixam as pessoas sem trabalho, não como medida temporária, mas permanentemente. O desemprego de longa duração se tornou uma ferida aberta em todos os lugares. Agora, eles falam levianamente de uma “Nova Era da Máquina”, da tecnologia inteligente que eliminará as franjas dos postos de trabalho, causando ondas de choque de desemprego, derrubando os salários e fazendo declinar o nível de vida. Este é o pesadelo que está sendo preparado pelo capitalismo em seu leito de morte.
Oscilações clássicas
Nos anos 1930, Trotsky fez um ponto crítico assinalando a diferença entre “uma crise orgânica” de todo o sistema e as crises cíclicas normais, que faziam parte integrante do sistema capitalista desde seus inícios. O ciclo de boom/recessão do capitalismo é o ritmo natural do sistema, da mesma forma como a inalação de oxigênio e a exalação de dióxido de carbono do corpo humano. As oscilações críticas são inevitáveis, e são processos que acompanham o padrão cíclico de produção e troca sob o capitalismo.
Frederick Engels deu uma descrição clássica do ciclo normal de boom/recessão em seu livro Anti-Dühring:
“O enorme poder de expansão da indústria de grande escala, em comparação com o poder de expansão dos gases, é uma mera brincadeira de crianças; agora nos aparece como necessidade para a expansão, qualitativa e quantitativa, que ri de toda pressão contrária. Esta pressão contrária vem do consumo, venda, mercados para os produtos da indústria de grande escala. Mas a capacidade do mercado de se expandir, tanto extensiva quanto intensivamente, é diretamente controlada por muitas outras e menos eficazes leis. A expansão do mercado não pode seguir o ritmo de expansão da produção. A colisão se torna inevitável, e como não se pode dar nenhuma solução, desde que não destrua o próprio modo de produção capitalista, se torna periódica. A produção capitalista traz em si mesma um novo ‘círculo vicioso’ …
“A estagnação dura anos, tanto as forças produtivas quanto os produtos são desperdiçados e destruídos em grande escala, até que a massas acumuladas de mercadorias são por fim lançadas em uma depreciação mais ou menos considerável, até que a produção e a troca comecem gradualmente a se mover novamente. Pouco a pouco, o ritmo se acelera; torna-se um trote; o trote industrial passa ao galope, e o galope, por sua vez, passa para um mergulho de cabeça em uma completa corrida de obstáculos industrial, comercial, de crédito e especulativa, só para aterrissar mais uma vez no final, depois dos mais vertiginosos saltos – na vala de uma queda. E assim por diante, uma e outra vez”.
Esta é uma descrição excelente do ciclo de boom/recessão. O desenvolvimento capitalista toma esta forma cíclica da natureza anárquica da produção que sempre aumenta ao ponto em que se choca com a barreira do consumo limitado. Como explicou Engels, as leis da produção agem mais vigorosamente que as leis do consumo. Os investimentos massivos que ocorrem durante um boom derramam uma quantidade crescente de mercadorias que, em determinada etapa, começa a ultrapassar a capacidade de consumo da sociedade, levando assim a uma crise de superprodução – superprodução de consumidores e de bens de capital para a finalidade da produção capitalista. A finalidade da crise capitalista é a de eliminar esta superprodução e preparar o caminho para um novo boom.
Sob o capitalismo, todo boom contém dentro de si mesmo as sementes de uma nova crise, “Nestas crises, grande parte, não somente dos produtos existentes como também das forças produtivas previamente criadas, são periodicamente destruídas”, explicaram os autores do Manifesto Comunista. “Nestas crises irrompe uma epidemia que, em todas as épocas anteriores, teria parecido um absurdo – a epidemia da superprodução”. Estas recessões são exclusivas ao sistema capitalista e contrastam com as crises de sub-produção das sociedades pré-capitalistas.
O excesso de produção emerge das contradições da economia de mercado e da divisão da sociedade em classes mutualmente conflitantes. A classe trabalhadora, que produz todos os valores, não pode comprar de volta os produtos que produz, o que, em determinado ponto, se torna uma barreira para o desenvolvimento econômico provocando a crise. Os capitalistas logram contornar esta contradição fundamental, pelo menos temporariamente, reinvestindo a mais-valia extraída do trabalho da classe trabalhadora, criando, dessa forma, novos mercados. Contudo, isto, por sua vez, cria uma maior capacidade produtiva global e serve para exacerbar as novas crises quando elas surgem.
“As condições de exploração imediata e de realização desta exploração não são idêntica”, explicou Marx. “Não estão separadas somente no tempo e no espaço, também estão separadas teoricamente. A primeira é apenas restringida pelas forças produtivas da sociedade, a última pela proporcionalidade entre os diferentes ramos da produção e pelo poder de consumo da sociedade. E isto não é determinado nem pelo poder de produção absoluto nem pelo poder de consumo absoluto, mas sim pelo poder de consumo dentro de um determinado quadro de condições antagônicas de distribuição, que reduzem o consumo da vasta maioria da sociedade a um nível mínimo, capaz de variar somente dentro de limites mais ou menos estreitos… Mas, quanto mais se desenvolve a produtividade, mais entra em conflito com a estreita base em que as relações de consumo descansam” (Marx, O Capital, Livro 3).
“Deixem-nos igualmente ignorar”, afirma Marx, “os negócios fraudulentos e as transações especulativas que o sistema de crédito favorece. Neste caso, uma crise seria explicável somente em termos de uma desproporção na produção entre os diferentes ramos e de uma desproporção entre o consumo dos próprios capitalistas e sua acumulação. Mas, como as coisas realmente são, a substituição dos capitais investidos na produção depende em grande medida da capacidade de consumo das classes não produtivas; enquanto que a capacidade de consumo dos trabalhadores é restringida, em parte, pelas leis que regem os salários e, em parte, pelo fato de que eles são somente utilizados unicamente na medida em que se podem empregar em benefício da classe capitalista. A razão final de todas crises reais continua sendo a pobreza e o consumo restrito das massas, devido ao movimento da produção capitalista de desenvolver as forças produtivas como se somente a capacidade absoluta de consumo da sociedade estabelecesse um limite para elas” (Marx, O Capital, Livro 3, ênfase nossa).
Experimentamos uma dessas crises de superprodução em 2008-9, quando a economia capitalista mundial sofreu uma recessão devastadora. Deram um jeito para adiar esta recessão durante décadas por todos os tipos de meios, mas, no final, os capitalistas simplesmente agravaram a crise quando ela finalmente chegou. Como o Rei Canuto, foram incapazes de conter a maré. O comércio mundial colapsou em 30% em questão de meses, e a produção industrial desabou. Há muitas razões para a crise, mas a razão fundamental foi que a produção havia superado completamente a capacidade da sociedade de consumir os produtos que se vertem no mercado mundial, apesar da expansão em massa da dívida e do crédito barato.
O sistema de crédito
O crédito certamente permitiu ao sistema capitalista ir além de seus limites durante certo tempo, até que o castelo de cartas veio abaixo. O crédito não se cria no vazio, e tem que ser pago, com juros. Ele tem seus limites, como tudo o mais. Como explicou Marx: “Se o sistema de crédito aparece como a principal alavanca da superprodução e da especulação excessiva no comércio, isto se dá simplesmente porque o processo de reprodução, que é elástico por natureza, agora é forçado a ir aos seus limites extremos… Ao mesmo tempo, acelera os violentos surtos desta contradição, as crises, e com estas os elementos de dissolução do velho modo de produção” (Marx, O Capital, Livro 3).
Em certo ponto, todo o processo se inverte com as dívidas sendo reembolsadas e o consumo retomado. Este processo entra em uma espiral descendente até que todo o negócio se tenha desenvolvido. Os limites do sistema capitalista são alcançados e um recuo econômico massivo entra em ação, como Marx e Engels descreveram.
O ciclo normal de boom/recessão toma uma forma aguda, provocada pelos estragos da velhice. Em contraste com sua juventude, o fôlego de um regime capitalista em decadência se torna errático e até mesmo convulsivo. Os efeitos da recessão se tornam acentuados e dolorosos, como a respiração ofegante de um velho asmático. Em consequência, a recuperação também se torna dolorosa e anêmica, e não pode coincidir com as recuperações do passado. O crescente estancamento do sistema capitalista ficou revelado na sua incapacidade de recuperar as taxas de crescimento, rentabilidade, níveis de investimento ou de produtividade, que eram característicos dos anos 1950 e da chamada Idade de Ouro. Cada década desde então vê um declínio nas taxas de crescimento. Nos anos 1950, o comércio mundial – que desempenhou um papel chave em impulsionar a produção para a frente na etapa de expansão – cresceu a uma taxa anual de 12,5%. No período anterior à crise, o crescimento médio se reduziu a 6% durante a maior parte dos anos 1990 e 2000. No ano passado, o quarto ano da “recuperação”, ele foi abaixo para uns meros 2,1%, e não conseguiu se recuperar. Dados o crescimento lento e as debilidades por toda parte, isto dificilmente surpreende. Mas é uma clara indicação da crise orgânica de que sofre o capitalismo. As artérias enfermas do sistema tornaram-se cada vez mais bloqueadas.
Durante décadas, o comércio mundial se expandiu, em média, ao dobro da taxa da produção global. Foi a chave para a ascensão econômica do pós-guerra e que duraria uns 25 anos. Mas, acompanhando o colapso no comércio mundial na recessão de 2008-9, o comércio se tornou débil e anêmico. Isto provocou um acalorado debate entre os economistas burgueses sobre se a marcha da globalização está definitivamente chegando ao fim. O FMI prevê o crescimento do comércio mundial neste ano em 3,6%, enquanto a OMC prevê uma elevação de 4,7%, sendo que ambas as previsões são demasiado otimistas. O último, a OMC, é obrigado a advertir que “os riscos geopolíticos introduziram um elemento adicional de incerteza para a previsão”. Delta Economics, uma empresa de análise com sede em Londres, que monitora o comércio, prevê o crescimento do comércio mundial este ano, medido em preços correntes, em mero 1%. “2014 não está sendo um bom ano para o comércio”, disse Rebecca Harding, executiva-chefe de Delta Economics. Este é um quadro alarmante após cinco anos de “recuperação”, e é um claro reflexo do completo impasse do capitalismo mundial, como foi o caso no período entre as guerras. A globalização alcançou os seus limites. A globalização agora se manifesta, como previmos, como uma crise global do capitalismo.
Enquanto na década de 1930, o protecionismo serviu para espremer o comércio mundial, este não é mais o caso hoje, pelo menos abertamente. Existem barreiras e subsídios disfarçados em todos os níveis, que adicionaram atritos ao comércio, sobretudo entre a China, os EUA e a Europa. A manipulação da moeda também está no topo da agenda, com os EUA atacando a China, na sequência de uma forte desvalorização do Yuan desde o início de 2014. Falar de “guerra de divisas” não está muito longe das possibilidades. Mas as tendências protecionistas estão certamente emergindo e podem passar a primeiro plano na próxima recessão.
Morte agônica
“Na atual crise europeia e mundial de desemprego, os acontecimentos conjunturais estão ligados a processos orgânicos de decadência capitalista”, explicou Trotsky. “Temos mais de uma vez repetido que os ciclos conjunturais são inerentes à sociedade capitalista em cada etapa de seu desenvolvimento. Mas em diferentes estágios esses ciclos têm caráter diferente. Da mesma forma como nos anos de declínio de uma pessoa um surto de vitalidade é tão incerto quanto breve e cada enfermidade afeta todo o organismo, então os ciclos conjunturais do capitalismo imperialista, particularmente na Europa, mostram uma tendência à prolongação da crise, aliviada por comparativamente curtas mudanças para melhor” (Trotsky, Escritos 1930).
“O capitalismo em sua morte agônica, como sabemos, também tem ciclos, mas estes ciclos são declinantes e mórbidos”, ele explicou. “Somente a revolução proletária pode dar um fim à crise do sistema capitalista”.
“A retomada do ciclo de negócios não pode ser nem considerável nem de longa duração, porque agora estamos enfrentando o ciclo de um capitalismo que está irremediavelmente enfermo. As novas crises, depois de uma breve recuperação, serão mais devastadoras que a atual. Todos os problemas se levantarão novamente com força e nitidez redobradas…”, afirma Trotsky. “Mas, hoje, a retomada econômica não é mais do que uma hipótese. A realidade é o aprofundamento da crise, os dois anos de serviço militar obrigatório, o rearmamento da Alemanha, o perigo de guerra”.
Foi o advento da Segunda Guerra Mundial, de fato, que atalhou esta perspectiva e forneceu uma rota de fuga ao capitalismo. Ainda houve a traição da onda revolucionária que se seguiu à guerra pelos líderes reformistas e estalinistas, para permitir ao capitalismo a oportunidade de se recuperar.
Toda uma série de fatores se uniram, na sequência da Segunda Guerra Mundial, permitindo ao capitalismo não somente se estabilizar, como também experimentar uma ascensão colossal que iria durar 25 anos. O comércio mundial foi a força impulsora por trás deste extraordinário desenvolvimento, o que permitiu ao capitalismo superar temporariamente suas contradições fundamentais, no caso, os limites do estado-nação e a propriedade privada dos meios de produção. O capitalismo foi muito além de seus limites. No entanto, as contradições do capitalismo, que tinham sido parcialmente reprimidas, não foram removidas.
Finalmente, o capitalismo em 1974 experimentou sua primeira e simultânea recessão mundial. Esta representou um ponto de viragem que marcou o fim da “Idade de Ouro” e o início de uma nova crise no capitalismo. Todas as velhas contradições vieram agora à superfície, produzindo uma crise de superprodução e de desemprego em massa em todos os lugares. Isto marcou o surgimento de uma nova crise orgânica que levantou barreiras ao desenvolvimento capitalista.
No entanto, o capitalismo ainda foi capaz de avançar cambaleante, tentando superar as contradições por todos os meios possíveis. O crédito foi o principal método, mas de forma alguma o único, para impulsionar o sistema para a frente. O crédito nos EUA sozinho cresceu de um trilhão de dólares, em 1964, a 50 trilhões de dólares em 2007. O capitalismo sempre conseguiu superar seus limites, mas unicamente criando barreiras cada vez maiores no futuro.
Finalmente, o sistema capitalista se exauriu. Quanto mais tempo ele conseguiu adiar sua crise interna, maior ela se tornaria quando finalmente chegasse. Todos os fatores que impulsionaram o sistema à frente se transformaram em seu oposto. Todos esses fatores que empurraram o capitalismo para a frente foram os fatores que se combinaram para levá-lo abaixo em uma espiral incontrolável.
Os estrategistas do capital, embora alarmados com a profundidade da recessão de 2008, assumiram que, da mesma forma que em todas as outras recessões do pós-guerra, uma forte recuperação ocorreria. Mas isto foi no passado. As perspectivas para o capitalismo mundial se parecem mais à experiência do Japão dos anos 1990, que entrou em uma prolongada e tortuosa estagnação que continua até hoje.
Mas os capitalistas não conseguiam entender o que tinha acontecido. Os anos de boom prolongado e de recuperação se foram para sempre. Estes foram um produto de um conjunto único de circunstâncias, que não podem se repetir. Em vez disso, estamos enfrentados, na melhor das hipóteses, a uma prolongada estagnação e aprofundamento da crise. As contradições do capitalismo, longe de serem resolvidas, se agravam. O sistema passou de um freio relativo a um freio absoluto para o desenvolvimento das forças produtivas e para o avanço da sociedade.
Mesmo antes da recessão de 2008, apesar de um aumento que durou 30 anos da taxa de lucro, o sistema capitalista somente pôde se desenvolver em ritmo muito lento, apesar das bolhas especulativas, montanhas de crédito e de dívidas e oceanos de dinheiro barato. Esta é uma clara indicação da exaustão do sistema capitalista, que alcançou seus limites há muito tempo e somente pode se sustentar artificialmente e com medidas excepcionais. Esta crise orgânica, que reemergiu em 1974, continuou com altos e baixos até hoje.
“O enigma da produtividade”
“A produção capitalista se esforça constantemente por superar estes obstáculos imanentes [ao seu desenvolvimento posterior], mas os supera somente através de meios que colocam novos obstáculos e em maior escala. O verdadeiro obstáculo à produção capitalista é o próprio capital” – Karl Marx
Surpreendentemente, a produtividade também ficou para trás nesta suposta recuperação. Os economistas se referem a isto como o “enigma da produtividade”, o que reflete sua total confusão. Na Grã-Bretanha, isso alcançou níveis extremos, onde a produtividade por hora trabalhada caiu de fato durante os últimos cinco anos. Esta é a terceira vez que tal queda ocorreu nos últimos 100 anos; as outras duas ocasiões foram no rescaldo das duas guerras mundiais. A economia mundial enfrenta crise similar.
A crise da produtividade nos EUA, o país mais rico do mundo, provocou um acalorado debate sobre as razões de sua queda. A argumentação se concentra na fraca demanda desta fraca recuperação ou no fato de que os fatores que impulsionam a inovação estão perdendo força ou estão paralisados. O debate foi provocado pelo Professor Robert Gordon da Universidade de Northwestern, que colocou a questão de se saber se as grandes inovações dos séculos XIX e XX, como o transporte eficiente e os instrumentos de economia de mão de obra nacional, eram agora coisa do passado. O progresso técnico dos EUA vem desacelerando claramente desde 1970, um efeito do retardo na inovação.
“O desenvolvimento mais inquietante é o que está acontecendo com a produtividade”, afirma o Financial Times. “Um informe da Conference Board think-tank realizada nesta semana revelou que, pela primeira vez em décadas, houve um declínio na capacidade mundial de converter capital e trabalho em bens e serviços. Se esta desaceleração continuar, as consequências para o nível de vida seriam sombrias: a eficiência e a inovação são os motores mais importantes do crescimento econômico mundial no longo prazo” (FT, 18/1/14).
Paul Krugman, o Prêmio Nobel de Economia, assinalou na década de 1990 que “A produtividade não é tudo, mas no longo prazo é quase tudo”. De fato, toda a economia pode ser reduzida a uma economia de tempo de trabalho. Quanto mais produtiva é uma sociedade, mais rica se tornará. O aumento da produtividade se deve ao avanço tecnológico e aos investimentos no processo de trabalho. O capitalismo produziu uma revolução em termos de produtividade do trabalho, mas agora chegou aos seus limites. O fato de que o capitalismo esteja enfrentando uma crise de produtividade põe em questão toda a justificação da economia de mercado. Em vez de investir continuamente a mais-valia extraída da classe trabalhadora de novo na produção, o capitalismo se transformou cada vez mais em um obstáculo para si mesmo.
Outro artigo que analisou o informe sobre produtividade da Conference Board sublinhou a gravidade da situação: “A história tanto para a produtividade do trabalho – produção por hora trabalhada – quanto para a produtividade total dos fatores é a mesma. Taxas de crescimento decrescentes são o resultado de uma longa história de queda do crescimento da produtividade nas economias avançadas, que já não é mais compensada por grandes aumentos na eficiência das economias emergentes”.
O artigo continua: “Nas economias emergentes, enquanto as tendências da produtividade ainda são significativamente melhores do que nos anos 1970 e 1980, os sinais preocupantes são de que o gasto sustentado em bens de capital não está produzindo as mesmas melhorias na eficiência como há dez anos, o que sugere que o capital não está sendo destinado às melhores áreas possíveis. A Conference Board estima que a produtividade total dos fatores estagnou no ano passado na China e diminuiu na Índia, o que sugere que mesmo as maiores economias emergentes estão lutando para manter os avanços na eficiência que anteriormente eram tão facilmente encontrados”. O artigo conclui: “Se esta desaceleração continuar, as consequências para o nível de vida serão sombrias”.
No que se refere “às melhores áreas possíveis”, o capitalismo sempre investiu seu capital onde quer que ele possa realizar os maiores retornos lucrativos. Os capitalistas não estão nos negócios por nenhuma outra razão. Esta é a lógica do capitalismo.
“Esfriando o Sol”
Este fato levou alguns da esquerda a imaginar que a crise do capitalismo pode ser explicada pela tendência à queda da taxa de lucro. Embora esta tendência exista, é somente uma tendência. Alguns períodos experimentam uma queda na taxa de lucro, enquanto outros experimentam uma elevação, dependendo dos fatores compensatórios. Esta tendência age durante um período prolongado de tempo. Concordamos com Rosa Luxemburgo quando ela disse que, se a queda na taxa de lucro fosse responsável pelo desaparecimento do capitalismo, isto “tomaria tanto tempo quanto o esfriamento do Sol”. Durante os últimos 30 anos anteriores à crise de 2008, houve uma elevação da taxa de lucro. Embora seja uma importante tendência dentro do capitalismo, isto não explica a causa da crise capitalista, que é a crise de superprodução.
Embora tenha havido uma recuperação na rentabilidade desde o colapso de 2008-9, o investimento, que é a chave de qualquer crescimento sustentável, está no fundo do poço. Em alguns países, como a Grã-Bretanha, o investimento caiu substancialmente. A razão disto não é a rentabilidade (que subiu) ou as dificuldades de acesso aos fundos (os capitalistas estão sentados em cima de centenas de bilhões), mas a ausência de mercados rentáveis (ou da “demanda”, como os burgueses gostam de dizer). O excesso de capacidade (superprodução) é generalizado, uma sobra do otimismo elevado e dos investimentos massivos feitos no período anterior à crise.
Normalmente, depois de uma recessão, com a destruição da superprodução, a taxa de lucro, que entrou em colapso durante a recessão, aumenta e age como estímulo a novos investimentos. Os meios de produção desgastados são substituídos por maquinaria e equipamentos novos, e isto proporciona as bases para uma expansão da produção. A redução dos salários e a deterioração dos termos e das condições nos locais de trabalho, junto à erradicação dos estoques excedentes, ajudam a restaurar ou restaurar parcialmente a taxa de lucro. Isto prepara um novo ciclo ascendente, mas também planta as sementes para uma nova recessão no futuro. Este é o chamado processo de “destruição criativa”. Contudo, ao fazer os salários baixarem destroem o poder de compra de que depende a realização de lucros.
Normalmente, uma crise eliminaria este excesso de produção, mas não foi este o caso desta vez. Apesar de ser a mais profunda crise desde os anos 1930, a destruição de valores de papel, bem como de instalações e maquinaria, não logrou erradicar por completo o “excesso de capacidade”, que é sinônimo de superprodução de capital e dos limites do mercado. É por isso que se fala de bancos e empresas “zumbis”, mantidas artificialmente flutuando através do crédito barato. Como resultado, o sistema capitalista está resfolegando devido ao excesso de capacidade e à falta de mercados para vender seus produtos. Este fracasso do sistema também é um reflexo do atual crescimento em passo de tartaruga do comércio mundial. A desaceleração das economias emergentes, particularmente a China, é um sintoma desta crise, assim como um fator que serve para exacerbar o problema.
Os que argumentam que a crise foi causada pela queda da taxa de lucro necessitam explicar por que a recuperação da taxa de lucro ao longo do período passado não levou a uma recuperação real no investimento e a um retorno do crescimento sustentado. “Os lucros como proporção do PIB estadunidense subiram de menos de 4% em meados dos anos 1980 a um pico tipo pós-guerra de 11% no ano passado, uma estatística que aquece o coração de um barão ladrão do século XIX”, afirma John Plender. “A participação dos salários caiu consistentemente desde o início dos anos 1970” (FT, 11/1/14). De acordo com o Escritório de Análise Econômica, com sede nos EUA, os lucros nos EUA antes dos impostos atingiram o pico no terceiro trimestre de 2006 de 1,865 bilhões de dólares, um ano antes da crise de crédito. A taxa de lucro diminuiu gradualmente ao longo de 2008, mas no quarto trimestre daquele ano a massa de lucros caiu a 861 bilhões de dólares. Isto coincidiu com a crise e colapso do comércio mundial, como já explicamos. No entanto, no primeiro trimestre de 2009, os lucros antes dos impostos se recuperaram a 1,130 bilhões de dólares, e no quarto trimestre tinha alcançado 1,549 bilhões. No terceiro trimestre de 2010, eles tinham quase alcançado o nível pré-crise chegando a 1, 845 bilhões.
Sendo este o caso, por que o capitalismo ainda se encontra em crise profunda, com um crescimento anêmico, no melhor dos casos, e queda do investimento, o sangue vital de qualquer recuperação? Com lucros recordes, a teoria de que a crise capitalista é causada pela tendência à queda da taxa de lucro revela-se errada. É uma explicação unilateral, mecânica, que contradiz o método dialético de Marx, que vê a crise capitalista não através de uma única causa, mas através de uma concatenação de contradições. Como ele explicou, “A lei funciona, portanto, simplesmente como uma tendência, cujo efeito é decisivo somente sob certas circunstâncias e durante períodos longos” (Marx, O Capital, Livro III, p. 346). Como já explicamos, a essência da crise capitalista é a superprodução simultânea de bens de capital e de consumo para fins de produção capitalista, ou seja, com a finalidade de produzir lucros. Quando não existem mercados, não há vendas e, portanto, nenhum lucro. Por que os capitalistas investiriam sob estas condições de crise orgânica?
Beco sem saída
Os ataques aos níveis de vida e a austeridade em massa serviram para reduzir o consumo e o investimento, sem os quais não pode haver crescimento significativo. No passado, o capitalismo se desenvolveria investindo o excedente extraído do trabalho não-pago da classe trabalhadora. Desta forma, o capitalismo superaria uma contradição profunda: a de que a classe trabalhadora não pode comprar de volta os produtos que ela cria. Mas os padrões de vida estão sob ataque em todos os sentidos. Salários baixos tornam possível grandes lucros, mas, ao mesmo tempo, tornam a realização de tais lucros impossível porque reduzem a demanda por bens. Além do mais, os governos capitalistas não podem aumentar o gasto público devido à crise das finanças do Estado, e os salários não podem ser aumentados (estes estão sendo cortados em todos os lugares), visto que isto vai comer os lucros. Sem investimento (que vem do trabalho não-pago da classe trabalhadora) e com a queda dos padrões de vida, o sistema está preso em um beco sem saída gigantesco. A produção capitalista depende da acumulação acelerada (investimento). A incapacidade de executar esta função deve provocar inevitáveis e sucessivas crises. A queda da acumulação tem um efeito dominó desastroso na prevenção do ciclo e do processo contínuo de produção, realização (vendas) e investimento. Quando a acumulação cessa, os lucros também cessam.
O capitalismo se vê obrigado a criar seu próprio mercado na forma de investimento em bens de capital, o que, por sua vez, age como um estímulo para o desenvolvimento econômico. Marx dividiu a produção capitalista em dois departamentos baseados em bens de capital e bens de consumo. A complexa interação entre o Departamento 1, a produção dos meios de produção (bens de capital, maquinaria, prédios etc.), e o Departamento 2, a produção de meios de consumo (bens de consumo), serve para expandir a economia. Além da pequena parte do excedente consumida pelos capitalistas, o restante é reinvestido na economia. Toda a justificação histórica do capitalismo tem sido o desenvolvimento das forças produtivas. Se a produção não aumenta, então o mercado continuará a estagnar. Os dois Departamentos da produção são interdependentes. Uma queda em um deve finalmente significar uma queda no outro. O sistema capitalista funciona quando todos os fatores interagem com todos os outros fatores, o que requer um constante aumento da produção, do investimento e o aumento dos mercados em uma espiral de desenvolvimento. Mas atualmente o processo oposto é o que ocorre, com excesso de capacidade e mercados minguantes, que têm consequências inevitáveis de estagnação e depressão.
A lei da “acumulação pela acumulação”, que impulsiona o capitalismo, deixa de funcionar. A crise geral do capitalismo se reflete na incapacidade do capitalismo de desenvolver as forças produtivas como no passado. A curva capitalista de produção, da qual falava Trotsky, encontra-se em trajetória descendente. A época agora se caracteriza por auges curtos ou recuperações anêmicas e profundas recessões e prolongadas depressões.
O que os capitalistas fizerem dará errado. Todas as tentativas para restaurar o equilíbrio econômico simplesmente servirão para desestabilizar o equilíbrio social e político. Estão empantanados entre o diabo e o mar azul profundo. É por isso que entramos no período mais turbulento da história, um período de convulsões – econômicas, políticas e sociais, e também em termos das relações mundiais. Todas essas convulsões se retroalimentam umas às outras em ciclo contínuo.
Austeridade Permanente
Hoje, mais de cinco anos depois da queda devastadora, a perspectiva sob o capitalismo parece sombria, para dizer o mínimo. Temos uma recuperação mais fraca do que em qualquer um dos anos das décadas de 1920 e 1930. Ao mesmo tempo, os níveis de vida estão sendo reduzidos até os ossos e a austeridade está em todos os lugares. O caminho da austeridade “vai ser longo, irregular e tortuoso”, afirma Janan Ganesh. “A recuperação econômica não significa o final da austeridade, ou mesmo o começo do fim. Na melhor das hipóteses, ela marca o fim do começo. Se isto faz nossa crise fiscal soar como um desafio histórico de grandes proporções, é porque deveria” (FT, 15/10/13).
Alguns comentaristas burgueses sérios, como Lawrence Summers, ex-Secretário do Tesouro dos EUA sob Clinton, sacaram algumas conclusões alarmantes. Em um artigo intitulado Por que a estagnação pode chegar a ser a nova normalidade, ele fala de uma “estagnação secular” para o capitalismo. De acordo com o dicionário, a palavra “secular” significa uma duração de tempo indefinidamente longa ou até mesmo um século. Mesmo que a economia acelere este ano, disse ele, “isto não proporciona nenhuma segurança de que seja capaz de um crescimento sustentado com taxas de juro reais normais. A Europa e o Japão preveem crescimento em nível bem abaixo dos EUA. Em todo o mundo industrial, a inflação está abaixo dos níveis-alvo e não mostra nenhum sinal de se elevar – o que sugere um déficit de demanda crônica” (Financial Times, 16/12/13).
Summers fez seu discurso sobre “estagnação secular” na conferência de pesquisa do FMI. Esta nova época de estagnação, abertamente reconhecida pelos comentaristas burgueses, é simplesmente outro termo para uma nova depressão, e um reflexo da crise orgânica do capitalismo. James Richards acredita que já estamos em uma depressão onde o crescimento lento é estrutural. “O sistema vai cambaleando”, disse ele, em umestranho eufemismo. Entre outros estrategistas mais clarividentes do capital, o otimismo anterior foi substituído por grande pessimismo, novamente mais um reflexo da profunda crise do capitalismo. Isto se refletiu em um comentário de Martin Wolf, economista-chefe de Financial Times, que ponderou como um retorno aos anos 1930 era possível. “Eu não sabia. Agora sei”, disse sem rodeios. A gravidade da situação (a nova “normalidade”) finalmente amanheceu sobre os representantes burgueses mais sérios. Foram obrigados a aceitar que estão em uma crise do sistema muito similar à crise dos anos 1930.
Sentimentos semelhantes foram expressos pela chefe do FMI, Christine Lagarde: “A economia global está virando a esquina da Grande Recessão [eles não se permitem usar a palavra depressão], embora o crescimento global permaneça demasiado lento e fraco”, disse a Senhora Lagarde. “A menos que os países se unam para realizar o tipo certo de medidas políticas, poderíamos estar diante de anos de crescimento lento e abaixo dos dois dígitos – muito abaixo do crescimento sólido e sustentável necessário para criar empregos suficientes e melhorar os padrões de vida no futuro” (FT, 3/4/14). Com toda honestidade, não há nenhuma possibilidade de países capitalistas “caminharem juntos” com o “tipo certo de políticas”. É uma ilusão ao extremo, como o mostra o quadro da política europeia.
Mas um novo espectro ronda a Europa – o espectro da deflação e da queda dos preços, que caracterizou a década de 1930. Os economistas burgueses sérios estão extremamente alarmados com a inflação da zona do euro no ano até março caindo a 0,5%. Na Espanha, os preços ao consumidor na verdade caíram uns 0,2% durante o mesmo período. Foi a queda mais aguda nos preços desde 2009. A tendência geral é claramente de baixa, o que sugere um déficit crônico na demanda, que temem que possa terminar em espiral descendente.
A deflação – descrita como um “ogro” [divindade infernal – NDT] por Christina Lagarde – simplesmente aumentará seus problemas ao encorajar as pessoas a adiar gastos e investimentos, bem como ao aumentar o peso da dívida. Como os preços caem, o valor nominal dos empréstimos permanece o mesmo enquanto a renda declina. Os devedores são obrigados a usar mais de sua renda para cobrir seus empréstimos. Isto amortece o consumo, pressionando os preços ainda mais para baixo. O investimento é adiado já que as empresas se aferram às suas reservas de caixa, enquanto cai o custo do seguro do dinheiro. Se eles têm dívidas, a deflação tenderá a aumentar a pressão para as empresas de desalavancagem mais rápida, forçando-as a uma espiral descendente. Como afirmou Luis Garicano, professor de economia em LSE: “Estamos em um território onde os modelos e análises utilizados pelos responsáveis políticos não parecem estar funcionando. E isso é muito preocupante” (FT, 3/4/14).
“Nenhum de nós [na Europa] experimentou alguma vez a deflação”, disse Graham Secker, chefe da estratégia de ações pan-europeia em Morgan Stanley. “Ninguém acreditava que a deflação pudesse ocorrer no Japão até que ocorreu” (FT, 3/3/14).
“Para a zona do euro”, explicou o economista Wofgang Munchau, “a deflação alemã é um pesadelo. Se a periferia quiser se tornar mais competitiva, necessita uma inflação mais baixa do que na Alemanha. Mas se a Alemanha, também, se desinfla, então ou o ajuste competitivo não ocorrerá; ou toda a zona do euro entra na deflação; ou, mais provavelmente, ambas as coisas” (FT, 24/2/14).
Eles estão particularmente assustados porque as taxas de juro estão próximas de zero e ameaçam se tornar negativas. Mas esta estratégia é inútil, forçando os depositantes a guardar dinheiro em seus próprios cofres em vez de pagar por ele em uma conta bancária. Ironicamente, a receita Keynesiana de gasto deficitário, que poderia impulsionar a demanda e a elevação dos preços, é descartada nos estados mais endividados onde a ameaça de deflação mais se agiganta. A única e notável exceção, e que parece estar caminhando para a quebra, é o Japão. Bilhões estão sendo injetados na economia endividada, mas com pequenos resultados exceto possivelmente levantar as taxas de juro, colocando em risco um default do governo.
Crise das forças produtivas
Como era de se esperar, os comentaristas burgueses oferecem todo tipo de razões para explicar a crise, exceto a razão real. Naturalmente, distintos elementos desempenham certamente um papel na crise. Na superfície, a queda foi vista como uma crise financeira. Mas a falta de financiamento foi causada pela crise e não ao contrário. Mas há algo mais fundamental que está operando. As leis do capitalismo não estão mais funcionando como no passado. A acumulação está secando. A globalização (ampliação e intensificação do mercado mundial) está chegando a um impasse e ameaçando reverter. Todos os fatores que contribuíram para os anos de auge se transformaram em seu oposto.
O Marxismo vê no desenvolvimento das forças produtivas a chave do desenvolvimento da sociedade e da história. Enquanto o capitalismo for capaz de desenvolver as forças produtivas, isto pode proporcionar uma estabilidade relativa ao sistema. Esta era a situação no passado, mas não é mais o caso. Hoje, temos o contrário, em que a crise significa instabilidade social em escala mundial. “O mundo entrou na era da insegurança”, explica Philip Stephens no Financial Times (21/2/14).
Mais de cinco anos depois do colapso de Lehman Brothers, o sistema capitalista mundial permanece em um beco sem saída. É um profundo mal-estar do qual não pode escapar. Isso tem consequências sérias. Como Marx explicou há muito, nenhum sistema social deixa o cenário da história antes de se exaurir e de se provar incapaz de desenvolver por mais tempo as forças produtivas. Assim que isto acontece, a sociedade entra em um período de revolução social. Esta é precisamente a situação que existe hoje em escala mundial. Há uma crise das forças produtivas, se rebelando contra as barreiras da propriedade privada e do estado-nação. O capitalismo exauriu sua missão histórica e se tornou em um gigantesco entrave para o desenvolvimento econômico e social e para o avanço humano em geral.
A propriedade privada dos meios de produção, em vez de fazer avançar, se tornou um enorme obstáculo ao progresso social. O modo de produção e a apropriação individual entraram em conflito com as necessidades da produção social. As relações de propriedade existentes, em particular, se tornaram historicamente obsoletas. Em geral, se converteram em um obstáculo para futuros avanços. “De formas de desenvolvimento das forças produtivas”, explicou Marx, “estas relações se converteram em seus grilhões”. As forças produtivas estão em revolta, em todos os aspectos, contra as relações capitalistas de propriedade. O materialismo histórico explica que, “nenhuma ordem social jamais perece antes que todas as forças produtivas para as quais nela haja espaço tenham se desenvolvido; e novas e mais elevadas relações de produção jamais aparecem antes que as condições materiais de sua existência tenham amadurecido no seio da mesma velha sociedade”. Estas condições não somente amadureceram, também estão demasiado maduras e colocaram a revolução mundial na agenda.
O beco sem saída do capitalismo se reflete no fato de que ele não pode utilizar plenamente a capacidade produtiva que trouxe à existência. Nos auges econômicos do passado, o sistema apenas podia utilizar 80% de capacidade produtiva. Em tempos de recessão, o sistema apenas pode utilizar 65% da capacidade instalada. Hoje em dia, este índice se situa no extremo inferior. Isto se pode ver pelos números dos EUA, onde a capacidade de utilização da capacidade instalada caiu para 66,9% em 2009 e subiu para 79% em 2013. Mais uma vez, isso reflete o completo impasse do sistema capitalista.
O próprio Marx resume assim toda a contradição:
“A produção capitalista se esforça constantemente por superar estas barreiras imanentes [ao seu desenvolvimento posterior], mas supera-as somente por meios que estabelecem novas barreiras e em escala mais poderosa. A verdadeira barreira da produção capitalista é o próprio capital” (Marx, O Capital, Livro 3, p. 358).
O sistema capitalista encontra-se em etapa de decadência terminal. O sistema está à beira de um grande choque que produzirá uma nova recessão mundial. Este choque pode ser qualquer coisa. É por esta razão que os comentaristas capitalistas estão alarmados com os acontecimentos na Ucrânia. Se esta situação escalar e a Rússia retaliar contra quaisquer sanções, cortando o abastecimento de energia à Ucrânia e à Europa, então isto poderia causar profundas consequências. A guerra no Oriente Médio de 1973 levou à quadruplicação dos preços do petróleo. Isto, por sua vez, desencadeou a crise mundial de 1974. Hoje em dia, um grande aumento dos preços da energia e o caos decorrente poderiam ter o mesmo efeito.
Mesmo sem isto, há pessimismo e desespero crescentes em todos os lugares. “Outra década de mal-estar econômico no Ocidente – ou, não o queira Deus, outra crise financeira – e é provável que vejamos emergir soluções e políticos mais radicais”, afirma Gideon Rachman no Financial Times (10/12/13).
Esta crise histórica sem solução está pavimentando o caminho para acontecimentos revolucionários e grandes mudanças na consciência em escala mundial. O que está absolutamente claro é que não há nenhuma forma de se sair da crise na base do capitalismo, que está destinado a submergir a humanidade em uma época de revolução e contrarrevolução. Somente podemos avançar através da derrubada revolucionária do sistema, superando o pesadelo da crise capitalista e tudo o que significa. Somente quando erradicarmos as contradições que emanam do capitalismo poderemos utilizar plenamente os recursos do mundo para erradicar a praga da fome, da pobreza e da miséria e criar uma vida digna para os seres humanos. Para a humanidade, isto significaria, de acordo com as palavras de Engels, “um salto do reino da necessidade ao reino da liberdade”.
Texto postado originalmente em:
http://www.marxist.com/2015-04-17-14-05-17.htm
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