Por Mauro Santayana
Não se considere expressão de malogro eleitoral a escassa presença de povo nos primeiros comícios desta campanha. A Cinelândia, espaço histórico de manifestações políticas, acolheu pouca gente no comício de Dilma e Lula, mas, no caso, a chuva foi em parte culpada. Em Belo Horizonte, terça-feira, o tempo estava bom, e a escassa afluência foi calculada, pelos partidários, em 12 mil pessoas e, pelos adversários, em 7 mil. É pouca gente, para ouvir o presidente Lula. A Praça da Estação, na capital mineira, sempre foi escolhida para os imensos comícios. Quando os promotores de qualquer manifestação temiam fraco comparecimento, escolhiam espaços mais apertados, nos quais bastam dez ou vinte mil pessoas para dar aparência de grande afluência.
Entendido tanto de política quanto de pecuária, o mineiro Hélio Garcia adverte que, em nossos dias, ninguém mais investe em comício, nem em gado gir. Mas, há pouco mais de 25 anos, o Brasil reuniu, em todas as suas grandes cidades, multidões imensas, as maiores de sua história política, na campanha que, começando pelas diretas, elegeu, nas ruas, Tancredo Neves para a Presidência da República. O Colégio Eleitoral não tinha como contrariar o povo, e alguns de seus membros sufragaram o nome do mineiro contra seus próprios interesses, sob o acosso da vontade nacional. Por mais méritos tivesse Tancredo (e ele os tinha, de sobra), não foram apenas a sua biografia e o carisma pessoal que reuniram milhões e milhões de brasileiros naquela mesma decisão. O que os reuniu foi a grande causa, com suas idéias e sua esperança. O Brasil não suportava mais a insegurança jurídica, a arrogância da burocracia cevada na Ditadura, as constantes ameaças de retrocesso.
As duas candidaturas presidenciais de hoje, com real possibilidade de vitória – e não há, na análise, qualquer juízo de valor pessoal dos postulantes, ambos respeitáveis – não surgiram naturalmente da nação e de seus instrumentos de expressão política. Por mais admiração tenhamos pelo presidente da República e pela expressão econômica de São Paulo, Dilma Rousseff e José Serra foram candidatos impostos ao país, que não foi ouvido. Os outros postulantes, privados de recursos e de padrinhos fortes, estão aí apenas para dar seu testemunho ideológico, e este é o caso de Plínio de Arruda Sampaio; acumular votos para futuras composições políticas, como o faz Marina Silva; ou buscar a fugaz glória da aparição, de segundos, na televisão, os candidatos sem qualquer expressão.
A indicação de Dilma Rousseff, como todos sabem, foge ao esquema clássico. É a primeira vez que alguém disputa a chefia do Estado sem ter postulado antes qualquer cargo eletivo. O caso de Serra é de outra natureza. Partido sem militantes populares, a não ser em São Paulo, contando, no resto do país, apenas com o prestígio de seus nomes maiores, o PSDB teria, na realização de prévias, a oportunidade de legitimar-se, de angariar militantes autênticos, de dar organização aos seguidores de seus líderes. Mas prevaleceu a vontade de dois ou três, que impuseram a candidatura paulista.
No legítimo esforço para eleger sua sucessora, o presidente se envolveu nas eleições estaduais, impondo alianças esdrúxulas, o que contribui ainda mais para o desencanto dos eleitores. A menos que as últimas semanas de campanha excitem os hormônios adormecidos, não será de estranhar que haja uma avalanche de votos em branco para a Presidência da República.
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