terça-feira, 14 de dezembro de 2010

ANOS DE CHUMBO - Brasil condenado na OEA.

Corte da OEA condena Brasil por não apurar crimes da ditadura.

Em uma decisão inédita, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos) condenou o Estado brasileiro por não ter investigado crimes cometidos pela ditadura militar (1964-1985) no combate à Guerrilha do Araguaia.

A sentença, datada de 24 de novembro de 2010, foi divulgada nesta terça-feira (14) e afirma que a Lei de Anistia, de 1979, é incompatível com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (também chamado de Pacto de San José, do qual o Brasil é signatário) e não pode ser “um obstáculo” que impeça a investigação do caso, bem como a identificação e a punição dos responsáveis por violações dos direitos humanos.


No entendimento da Corte, trata-se de crimes imprescritíveis. O caso foi encaminhado ao tribunal pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e diz respeito a ações realizadas pelo Exército entre 1972 e 1975, quando combatia a Guerrilha do Araguaia no sul do Pará. A alegação é de que ao menos 70 pessoas, entre militantes do Partido Comunista e camponeses, foram vítimas de detenção arbitrária, tortura, execução e desaparecimento, e que o Estado brasileiro não apurou os crimes.

A ação chegou ao sistema interamericano por iniciativa do Cejil (Centro pela Justiça e o Direito Internacional), do grupo Tortura Nunca Mais e da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos de São Paulo.

Na decisão, o tribunal afirma que o Brasil descumpriu “a obrigação de adequar seu direito interno à Convenção Americana sobre Direitos Humanos [...] como consequência da interpretação e aplicação que foi dada à Lei de Anistia a respeito de graves violações de direitos humanos”.

No fim de abril, o STF (Supremo Tribunal Federal) negou uma ação da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) que pedia uma revisão da Lei de Anistia.

Em seu voto, o juiz Roberto de Figueiredo Caldas, responsável da corte da OEA pelo caso, diz que a decisão do STF esbarrou na jurisprudência da entidade internacional e não levou em consideração obrigações que devem ser seguidas pelos Estados signatários da Convenção Americana.

O magistrado pondera que o Pacto de San José equivale a uma Constituição supranacional referente aos direitos humanos, e diz que todos os poderes públicos e esferas nacionais, bem como as respectivas legislações federais, estaduais e municipais de todos os Estados signatários devem respeitá-la.

A Corte responsabilizou o Estado brasileiro pelo desaparecimento forçado e pela falta de investigação, julgamento e sanção dos responsáveis. Além disso, aponta para a “violação do direito à liberdade de pensamento e de expressão consagrado [...] pela afetação do direito a buscar e a receber informação, bem como do direito de conhecer a verdade sobre o ocorrido”.

Quanto às determinações, a entidade incita o Estado brasileiro a investigar os fatos e determinar as “correspondentes responsabilidades penais” e sanções; realizar esforços para determinar o paradeiro das vítimas desaparecidas e, se necessário, identificar e entregar os restos mortais aos familiares; e oferecer tratamento médico e psicológico às vítimas.

Foi decidido que o Estado deve promover um ato de reconhecimento de sua responsabilidade, além de implementar um programa obrigatório sobre direitos humanos para todos os níveis hierárquicos das Forças Armadas. Também será necessário pagar indenizações por dano material e imaterial e compensar valores referentes a custas e despesas com o processo.

O tribunal também determinou a continuidade de medidas de busca, sistematização e publicação de informações sobre a Guerrilha do Araguaia e qualquer violação de direitos humanos que tenha ocorrido durante a ditadura.

O Estado brasileiro deverá ainda tipificar o delito de desaparecimento forçado de pessoas e, enquanto isso não ocorrer, agir com base em mecanismos já existentes em sua legislação.

Na sentença, a Corte afirma que irá supervisionar o cumprimento integral de suas determinações e dá ao Brasil o prazo de um ano, a contar da notificação da decisão, para que apresente um relatório sobre as medidas adotadas.

A reportagem do R7 entrou em contato com a AGU (Advocacia-Geral da União) e com o Itamaraty, mas não obteve retorno até a publicação desta nota. O Ministério das Relações Exteriores informou que irá se pronunciar por meio de nota nesta quarta (15).

Fonte: R7

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