quarta-feira, 10 de agosto de 2011

ECONOMIA - China ensina capitalismo.

Quando em 2010 a China ultrapassou o Japão e se converteu na segunda maior economia do mundo, não deixou para trás apenas o seu rival histórico na Ásia, com quem mantém uma relação difícil devido aos seus conflitos armados no passado, mas deu um passo de gigante no ambicioso objetivo de ultrapassar algum dia os Estados Unidos e converter-se na maior potência do mundo. Não é uma meta declarada – bem ao contrário – especialmente porque na renda per capita a China ainda está muito longe do grupo da ponta, já que ocupa aproximadamente o posto 90 na classificação mundial. Mas o contínuo crescimento econômico e político do país mais populoso do mundo deixou claro a governantes estrangeiros e analistas que o equilíbrio geopolítico do mundo se deslocou de forma inexorável para a Ásia, onde o papel da China é protagônico.

A reportagem é de José Reinoso e está publicada no jornal espanhol El País, 08-08-2011. A tradução é do Cepat.

A decisão da agência Standard & Poor’s de rebaixar a dívida soberana dos Estados Unidos provocou a indignação de Pequim, que reagiu com grande dureza, e seus comentários, realizados por meio da imprensa oficial, soam como uma grande aula de capitalismo ao seu rival e sócio.

A China pediu no sábado a Washington para que aperte o cinto e ponha fim ao seu “vício pelo endividamento” porque “comer em abril o grão de maio nunca será uma solução duradoura para um problema”, segundo afirmou a agência de notícias Xinhua. “O Governo norte-americano tem que aceitar o fato doloroso de que os bons velhos tempos em que podia simplesmente pedir emprestado para sair dos problemas nos quais se meteu não voltam mais”.

Xinhua advertiu que o rebaixamento da S&P poderia ser seguido de novos cortes “devastadores” da classificação de risco e turbulências financeiras globais se os Estados Unidos não aprenderem a “viver na medida dos seus meios”. “A China, o maior credor da única grande potência do mundo, tem todo o direito de pedir aos Estados Unidos que enfrente seus problemas estruturais da dívida e garanta a segurança dos ativos chineses em dólares”, assegurou.

Pequim atacou diretamente o coração da política norte-americana. Disse que o mundo necessita de uma nova divisa de reserva global estável para “prevenir uma catástrofe causada por um único país” e urgiu a Washington para que aplique cortes dos “inchados custos de proteção social” e de seu “gigantesco gasto militar”.

No mês passado, o comandante do Estado-Maior chinês, Chen Bingde, também relacionou as dificuldades financeiras norte-americanas com seu orçamento militar e se perguntou se diminuir o gasto de defesa não seria a melhor coisa para os contribuintes norte-americanos.

Estes comentários refletem o desejo de Pequim de que Washington reduza sua presença militar na Ásia. Os Estados Unidos criticam regularmente a China pelo contínuo reforço do seu exército, ao que as autoridades deste país costumam responder que seus investimentos em defesa representam cerca de 1,4% do PIB, enquanto os dos Estados Unidos são de aproximadamente 4%, e os da Índia, Reino Unido ou França, mais de 2%.

Muitos políticos em Washington e outros países mudaram sua preocupação com o crescimento chinês e o verbo cada vez mais duro de seus altos funcionários, que, segundo asseguram fontes diplomáticas europeias em Pequim, nos últimos anos adotaram uma posição mais dura e inclusive “altiva” em relação aos seus interlocutores ocidentais. Os líderes chineses se mostram cada vez mais seguros de si mesmos, e a rapidez com que seu país começou a sair da crise global enquanto a incerteza varria a Europa e os Estados Unidos reforçou esta atitude. A China passou de recebedor de recomendações e conselhos sobre o capitalismo a dador.

Pequim pretende, em primeiro lugar, defender seus interesses financeiros. Tem reservas de divisas estrangeiras de 3,2 bilhões de dólares, dois terços dos quais são no bilhete verde. Destes, 1,2 bilhão de dólares estão investidos em dívida do Tesouro. Por outro lado, utiliza a vantagem econômica em seu benefício político e, ao mesmo tempo, aproveita para tirar proveito desta situação diante de seus cidadãos. “A dívida crescente e as lutas políticas ridículas em Washington prejudicaram a imagem da América no exterior”, afirmou a Xinhua.

O Diário do Povo – órgão oficial do Partido Comunista Chinês – redobrou no domingo as críticas aos Estados Unidos. Disse que o rebaixamento da dívida norte-americana por parte da S&P “fez soar o alarma sobre o sistema de divisas internacionais dominado pelo dólar” e advertiu que os principais afetados pela decisão da agência de qualificação de risco poderiam ser as economias exportadoras de produtos elaborados, que é o caso da China, ou aquelas que vendem recursos naturais, como algumas economias latino-americanas.

Maior potência mundial em 10 anos

O déficit comercial de Washington com a China atingiu um valor recorde de 273 bilhões no ano passado.

Os governantes chineses afirmam que o sucesso econômico obtido desde que Deng Xiaoping colocou em marcha o processo de abertura e reforma em 1978 e desmontou a herança maoísta, ao mesmo tempo que manteve o controle absoluto do poder, legitima o Partido Comunista Chinês. Alguns analistas políticos na Ásia consideram que o acordo alcançado pelo Congresso norte-americano para elevar o teto da dívida e evitar a suspensão de pagamentos questiona a credibilidade da maior economia do mundo e sua liderança global. Em Pequim, o difícil pacto entre democratas e republicanos nos Estados Unidos provavelmente seja visto como outra demonstração das desvantagens de um regime democrático, frente às decisões – inquestionáveis – do governo único do Partido Comunista Chinês.

O Fundo Monetário Internacional disse em junho passado que a economia chinesa deverá crescer 9,6% este ano, frente a 2,5% da norte-americana e 2% da europeia. Em 2010, cresceu 10,3%. Se os atuais ritmos de crescimento persistirem, os analistas calculam que o país asiático desbancará os Estados Unidos como maior economia mundial dentro de 10 ou 15 anos.

Fonte: IHU

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