07/08/2012 12:24 pm
A direita dá as caras
Por Mario Henrique de Oliveira
Por considerar que “não há partidos de direita no Brasil”, a estudante de direito Cibele Bumbel Baginski encabeça um movimento para refundar a Aliança de Renovação Nacional, ou Arena, partido político que comandou o Brasil durante os anos da ditadura militar. A moradora de Caxias do Sul diz que a sigla resgatará valores como conservadorismo e nacionalismo, e quer o partido já disputando as eleições de 2014.
Para o cientista político Benedito Tadeu César, a iniciativa pode ser interessante pelo fato de haver uma direita que não se declara como tal, mas é preciso respeitar os valores democráticos. “Na democracia há espaço para todas as vertentes políticas e é legitimo eles se declararem de direita, até porque há no Brasil uma cultura de quem é de direita não se declarar abertamente. Então, nesse sentido é muito válido. Mas o nome traz consigo toda uma história, é o partido que legitimou a ditadura, Se for ficar no campo democrático, na disputa de votos, ok. Mas não foi isso o que a Arena fez e isso não pode se repetir”, diz ele.
Essa é a principal preocupação de César, o cuidado com a democracia e a História do Brasil. Ele argumenta contra posições tomadas pela Arena que são bem vistos por Cibele. “Creditar o golpe como antecipação a um suposto golpe de esquerda é puro achismo. É verdade que na época havia toda uma insurgência da esquerda mundial, mas não há provas documentais que evidenciem que o país iria sofrer um golpe comunista. Depois disso, creditar crescimento econômico e outras coisas ao regime militar, temos que ver até que ponto tudo isso foi conseguido, porque senão podemos falar a mesma coisa da Alemanha Nazista, que teve índices sociais muito bons e a gente sabe em troca do que”, completa.
Confira abaixo a entrevista na integra com Cibele, realizada por e-mail, na qual ela conta um pouco das intenções da nova Arena e sua visão política.
Fórum – Cibele, você poderia nos dizer como está a situação hoje da Arena? O partido já está registrado no TSE? Se não, o que falta para ele voltar à ativa?
Cibele Bumbel Baginski – A Arena está em processo de formação, reunião de documentação conforme cita a lei, registros em cartório de pessoas jurídicas e, o mais complicado, a busca de assinaturas de apoio à sua criação, que são quase 500 mil no cálculo atual da base legal, para poder futuramente encaminhar isso ao TSE. Acredito que se tudo correr bem com o plano de metas traçado para nossas ações, até meados de 2013 tudo esteja concluído, nos tornando aptos a disputar as eleições de 2014.
Fórum – A intenção do partido é já participar das eleições em 2014?
Cibele – Sim, se possível apesar dos prazos apertados, desejamos poder atuar nas eleições de 2014 como sigla constituída e já podermos apresentar nosso trabalho para mais cidadãos.
Fórum – Gostaria que você nos contasse um pouco como surgiu a ideia de refundar o partido. Em uma entrevista você disse que o nome foi escolhido entre vários outros possíveis. Vocês já não sabiam ou imaginavam que com esse nome certamente iriam ganhar mais visibilidade e atenção, para o bem ou para o mal?
Cibele - Sim, na votação para escolha do nome e sigla haviam oito boas sugestões, mas a que mais trazia a ideia de representação de uma aliança com intenções conservadoras e nacionalistas, como nos declaramos abertamente, era realmente Aliança Renovadora Nacional, por isso ele foi escolhido, acredito, pelos votantes. Mas eu tinha dúvidas, havia uma ala dos aliados que estava considerando a possibilidade de escolher algo novo. Mesmo assim, a força da ideia de trazer a Arena como um diferencial na política já tão modorrenta atualmente para algumas pessoas, entre muitas considerações, acabou fazendo este nome ser escolhido. Imaginamos que haveria pessoas que gostariam da ideia, e outras nem tanto, mas não se pode querer agradar gringos e troianos. Quando se toma posição, está-se sujeito a receber elogios, mas também críticas, em qualquer caso, este só é um pouco mais barulhento.
Fórum – Defensores e opositores do período militar brasileiro se dividem em chamar o ato de 1964 como revolução ou golpe. Já vi entrevista sua chamando a queda do presidente João Goulart de “revolução”. Porque acha isso?
Cibele – Vejo essa questão controversa entre historiadores, por isso chamo o governo posterior a 1964 de Brasil pós-64, mas mesmo que eu não deseje contestar especialistas maiores em História, que não é minha área profissional, vejo pessoalmente esse momento histórico como Revolução ou Contragolpe, pois o momento político indicava a possibilidade de um golpe comunista, de acordo com várias notícias de 57 em diante nos jornais da época ainda disponíveis para consulta em alguns arquivos, até onde me lembro, e depois de algumas ações incisivas do governo João Goulart, que foram o estopim naquela atmosfera política de momento. Tem que se observar que a visão da época era bem diferente de muito do que vemos hoje também, ainda era momento de Guerra Fria, entre outras coisas, mas, a meu ver, aquele decreto do presidente Goulart estatizando um sem fim de terras ao redor de rios, ferrovias, e outras estruturas, colocava praticamente todo o perímetro brasileiro como estatizado e isso, pessoalmente, me parece francamente com o fim da propriedade privada. Por isso tenho que concordar com o sentimento das pessoas à época em se preocuparem com a situação e tomarem as ações que no momento julgaram corretas, se eu estivesse lá, certamente poderia lhe dar uma opinião mais exata, mas superficialmente isso coloca alguns dos motivos que enveredam minhas análises pessoais.
Fórum – Um dos motivos que disse para o surgimento desse novo partido era a falta de partidos de direita no cenário político brasileiro. Você realmente acha isso? O que para você define direita/esquerda?
Cibele – Sim, não há partidos de direita no Brasil, no máximo, de centro, mas todos seguem uma linha que se aproxima cada vez mais de posturas adotadas por ideologias de esquerda, sejam socialistas, comunistas, social-democratas ou outras mais que poderiam ser enumeradas. Eu cheguei a trabalhar em artigos sobre direita e esquerda, há muitos detalhes que podem definir direita e esquerda em espectro político, entre outras teorias gráficas, mas o que estamos mais acostumados a ver no Brasil é ver a esquerda como alguma das já citadas ideologias (segui-las ou não depende da sigla de que se fala e situação), e a direita é vista pelas pessoas geralmente como o mal das privatizações, dos liberais extremistas ou personificado em algo como por exemplo o governo FHC, ou então pela mídia negativa veiculada quanto ao momento pós-64. Compreendo que é a visão comum, seja essa até por fatores afins, mas é completamente faltosa com muitos outros fatos a serem pensados. Quem é que disse que direita tem que ser liberal ao ponto de privatizar a mãe? E quem disse que todos os atos de governo X ou Y foram malvados? As pessoas devem ver com mais calma as coisas e atentar a mais informações para poderem formar uma opinião realmente crítica e própria.
A Arena vem como aliança de várias tendências de direita, conservadoras, nacionalistas, integralistas, militaristas, monárquicas, liberais moderadas, entre outras que podem se entender bem seguindo pontos pacificados, e tendo liberdade de pensamento para defender suas ideias, que é pelo que o cidadão elege seu candidato, para que o represente pelo que ele é, e não padronizando-se. Conseguimos representar uma direita democrática, e trazemos à luz tantas outras doutrinas respeitáveis de direita, que não são ruins como se estigmatizou. A direita é uma posição que preza pela mudança ordeira e planejada para a evolução da sociedade, sem grandes baques ou caos em ações repentinas e com efeito somente a curto prazo, tem um foco que não radicaliza.
Quanto aos governos pós-64, assim como todos os governos, têm seus erros e acertos, nenhum governo é perfeito, se fosse, não seria proibido se reeleger mais de uma vez. É necessário dar a chance de erros e acertos para outras lideranças. Se for olhar em um livro de História do antigo 1º grau, lembro mais ou menos bem de quando vimos Revolução Francesa, em que os sentados à esquerda eram os radicais e extremistas, e curiosamente, liberais burgueses como chamados à época, e os da direita eram os moderados e que desejavam estabilizar o país e consolidar conquistas para poder então encontrar a paz e o desenvolvimento, sem mais derramamentos de sangue (não que eles tenham conseguido, porque Robespierre guilhotinou mais um monte de gente antes de ser vítima do próprio remédio).
Fórum – Em outra entrevista você disse que não gostaria de ver o novo Arena ligado a figuras como Paulo Maluf. Há alguém em especial da antiga Arena que você gostaria de ver apoiando a nova sigla?
Cibele – Da antiga Arena acredito que uma entre tantas pessoas que me chamaram alguma atenção em questão de competência e posição que talvez tivesse interesse em retornar à política seria o ex deputado federal Victor Faccioni, mas é uma decisão que depende do interesse pessoal dele. Algumas outras pessoas que eu gostaria de convencer infelizmente se aposentaram da política. Enfim, faz bastante tempo que a sigla foi extinta e muitos se afastaram da política por interesses pessoais ou outros fatores.
Fórum – Você não acha que os valores políticos pregados pela Arena vão de encontro com a realidade política de hoje no Brasil?
Cibele – Certamente que os valores pregados vão de encontro à realidade política do Brasil de hoje como um carro se espatifa em um muro quando perde o controle. Quando chega um pessoal que se reúne e decide que vai ser sincero e fazer alguma coisa ao invés de somente sugar o dinheiro do contribuinte, isso é novidade. Dizer a verdade nunca foi um ato tão revolucionário, a meu ver, porque simplesmente estamos dizendo o que pensamos e oferecendo um espaço diferente para a troca de ideias e a chance de fazer alguma coisa. Fazer mesmo, arregaçar as mangas e agir nem que seja preciso caminhar por horas para descobrir um problema a ser solucionado, perder horas de sono projetando uma solução para algo que é importante para o Brasil, não só ficar brincando de alisar mutuamente o ego uns dos outros como se vê infelizmente em muitas siglas que já foram respeitáveis algum dia. A realidade política no Brasil tem sido desmoralizante, as pessoas estão cansadas e pensando que nada mais poderá resolver as coisas, mas ao se retirarem da política, estão simplesmente dando permissão para que coisas erradas aconteçam, e é isso que tentaremos evitar, ao incentivar a cidadania e mostrar que é possível sim mudar as coisas para melhor.
Fórum – Obviamente com o nome Arena, vão surgir, e acredito que você já deve estar sentido isso, algumas contestações, principalmente sobre isso ser um retrocesso e a ligação do partido com a ditadura. Como você vem lidando com isso, e no que a novo Arena diverge e no que ela é parecida com a antiga Arena, principalmente no que diz respeito a princípios e valores?
Cibele – Há inspiração nos princípios de conservadorismo e nacionalismo na antiga Arena, e assim como a antiga, esta também é uma aliança de interpretações da direita em busca de uma participação política séria. Surgiram e sempre irão surgir contestações porque, realmente, não se pode agradar a todos, querendo ou não, mesmo sendo católica, devo ser franca em dizer, nem mesmo Cristo conseguiu agradar a todos, apesar de os cristãos continuarem se esforçando para evangelizar. Esse é um panorama também da política, quando se toma um posicionamento, haverá quem será contra e quem será favorável. As pessoas que não concordam dirão seus argumentos ou, na falta deles, irão atacar a história da antiga Arena, associando tão somente ao nome. Mas o que faz um partido é política, pautar propostas, desenvolver ações e atuar para a melhoria do país com projetos de relevância sendo realizados. Questionamentos sobre a história são importantes, claro, mas um partido não é um museu ou uma instituição de pesquisa histórica, então isso deve ser deixado para os profissionais, e a postura de partido político da Arena é de respeitar a História do Brasil.
Ideias de retrocesso suscitadas podem ocorrer, mas o Brasil certamente não teria metade das indústrias, estradas, ferrovias e eletricidade que tem atualmente se não fosse pelos governos pós-64. Nenhum governo é perfeito, mas estes governos fizeram o seu melhor para poderem melhorar o país, e isso não deve lhes ser retirado, assim como quando qualquer outro governo faz algo bom, e assim como o que é ruim em algum governo deve ser analisado e alterado para algo que seja eficiente e bom no próximo. É por isso que na democracia estamos, para termos uma renovação e dinamismo, permitindo a evolução do país.
Fórum – Estamos vivendo a época das Comissões da Verdade. Você acha importante investigarem as mortes no período militar?
Cibele – Pessoalmente, acho importante sim investigar mortes terríveis, mas não somente de um dos lados do conflito armado. Pesquisa histórica é sempre louvável, mas não se deve criar sensacionalismo sob o falecimento de pessoas que merecem a paz para seu descanso eterno, a meu ver. O que eu vejo nessa comissão infelizmente é uma parcialidade que não tem precedentes, creio. Acredito que realmente para ser uma Comissão da Verdade, ela deveria contemplar as mortes de todas as demais pessoas que foram vitimadas pelos ataques terroristas decorrentes da oposição, apurar realmente tudo, ou então fechar as portas e dar tudo por encerrado. Se é pra fazer um trabalho pela metade então que não se faça nada e que se respeite o descanso dos mortos.
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