“Médicos cubanos” provocam fígado e alma do Brasil
Estão chegando os médicos cubanos. Em 700 municípios, 11 milhões de
brasileiros não têm nem um médico. Na maioria, em cidades do Norte e
Nordeste, com baixo índice de desenvolvimento humano e muita miséria.
Virão médicos também de outros países, mas, claro, Cuba é o
chamariz para o debate. Há quem imagine ser esse um debate
político-partidário e eleitoral. E é, mas é muito mais do que só isso.
O que esse tema provoca são percepções sobre o que é, o que deve ou
deveria ser a sociedade. O "Mais Médicos" arranca a visão que cada um
de nós tem da vida. Da vida privada e da vida em comunidade.
O programa é mais um a dividir opiniões radicalmente nos últimos 12
anos. Para lembrar outras ações de governo: Bolsa Família, Sistema de
Cotas, e a PEC das Empregadas Domésticas.
Bolsa Família, Cotas, PEC das Empregadas e Médicos… Para cada
programa existem argumentos irrefutáveis. E sempre haverá argumentos
refutáveis. Ao gosto e visão de cada um.
Quem contesta cotas -e há quem odeie- enxerga desprezo ao mérito, e
favorecimento. Quem apoia cotas lembra que o Brasil manteve humanos
como escravos por 385 anos, quatro quintos da sua história.
Bolsa Família. Entre os que reagem às bolsas predomina um
argumento: é um incentivo ao ócio, "dá o peixe e não ensina a pescar",
como se costuma repetir. A pior seca do Brasil nos últimos 50 anos
providencia fatos para quem defende as bolsas.
Não se viu, como em outros tempos, saques nas cidades. E ao lado do
chão esturricado, do gado morto, não há, como sempre houve, fome em
larga escala. Porque existem as bolsas. Porque existem redes de proteção
social. Ou não?
Na reação à PEC das Domésticas, cansamos de ouvir e ler: "Eu trouxe
essa babá para casa quando ainda era uma menina"; "Minha empregada é
como se fosse da família".
Não faltou quem lembrasse: a menina se tornou adulta e seguiu babá;
quase sempre sem estudar, e tantas sem carteira assinada. "Como se
fosse da família", a empregada serve café às 7 da manhã e o jantar à
noite.
No intervalo, banheiros, chão e roupa suja pra lavar . "Da
família", mas, claro, sem direito à herança. Agora, os médicos: não
faltarão problemas, desavenças e crises. Humanos são… humanos.
Mas há outro lado nessa história: 700 municípios não têm nem um
médico. E milhares têm, se tanto, um médico. Não têm médicos porque
faltam condições para tanto. Mas também porque médicos para lá não
querem ir.
Milhões que moram nestas cidades não querem saber se o médico é
baiano, sueco ou cubano. Querem médicos. E medicina. Sabem que um médico
é melhor do que nem um médico.
A boa medicina será cobrada, e muito, nesse caminho. O resto é o jeito de cada um de nós enxergar a vida.
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