Quanto vale o petróleo?
Autor: Diomedes Cesário
Hidrocarbonetos (petróleo e gás) são
instrumentos de poder geopolítico: valem tanto quanto a capacidade de
produzir o desenvolvimento de uma nação e a melhoria das condições de
vida do seu povo. Isto significa que seu valor varia, dependendo do
local e das necessidades da época a que nos referirmos.
Esta pergunta vem à baila em função das
jazidas descobertas nas camadas do pré-sal, objeto de desejo de outros
países, grandes empresas nacionais e internacionais, políticos e da
sociedade brasileira, como solução para os problemas de educação, saúde e
emprego.
Para descobri-lo (atividade de
exploração) e tornar viável sua extração (atividade de produção) a mais
de 7.000 metros de profundidade total (água do mar e rochas
sobrejacentes) em áreas distantes cerca de 200 km da costa, a Petrobrás
teve que reunir capacidade técnica e recursos Não porque preferisse, mas
porque era lá que se encontrava uma nova fronteira exploratória.
Seu custo, claro, é maior que o do
Oriente Médio, onde é extraído a poucos metros da superfície em bacias
sedimentares terrestres. Em compensação, não necessitamos da quantidade
de armas e recursos gastos para protegê-lo de outros países, de grupos
internos rivais e da própria população, como lá ocorre. De acordo com o
Citigroup, a Arábia Saudita precisaria que o preço do petróleo fosse de
US$ 105 por barril para conseguir equilibrar seu orçamento, o Iraque, de
US$ 98 e o Irã, de US$ 137. [1]
Custo de extração e custo total do petróleo produzido
A Petrobrás anunciou recentemente que o
custo atual de extração do pré-sal era de US$ 9/barril. A imprensa
divulgou como se fosse o custo final de produção, levando os leitores à
visão de uma grande margem, comparada com o preço de venda, na faixa de
US$ 60 ou superior a US$ 100, há um ano atrás.
Na verdade, o custo de extração (lifting
cost para a SEC, a CVM americana) é apenas uma parcela do custo total,
contemplando apenas materiais, serviços, pessoal e alguns encargos,
necessários à elevação e tratamento do petróleo para retirá-lo do poço.
Antes disso, durante a fase de
exploração, muitos recursos tem que ser investidos para descobrí-lo. A
declaração de comercialidade de um novo campo (jazida) é o coroamento
final da fase exploratória, após ter dispendido uma grande quantidade de
recursos com a compra do bloco (concessão), aquisição de dados sísmicos
e perfuração de poços exploratórios de alto custo e alto risco. Muitas
campanhas exploratórias resultam em insucesso, quando os volumes
descobertos não compensam os investimentos, ou não há tecnologia para
extraí-los. Decidida sua viabilidade econômica (declaração da
comercialidade), inicia o plano de desenvolvimento da produção
(extração), que inclui planejamento e investimentos com plataformas,
dutos e outros investimentos que consomem bilhões de dólares ao longo da
vida útil do campo (geralmente algumas dezenas de anos).
Considerando toda a produção nacional, o
custo de extração [2], no quarto trimestre de 2014 era de US$ 14. Se
somarmos as participações governamentais (royalties, participação
especial, aluguéis, bônus, etc.) aos governos (União, Estados e
Municípios) o valor subia para US$ 26. No primeiro trimestre de 2014,
estes valores eram de US 14 e US$ 33, pois a parcela governamental varia
de acordo com o preço de venda do petróleo, mais elevada na época.
O custo total do petróleo produzido
inclui outras parcelas relativas à depreciação de investimentos,
overhead, P&D, custos financeiros, etc. Somente após toda esta
análise as empresas avaliarão se vale a pena sua produção.
Em nota à imprensa em janeiro deste ano
[3], a Petrobrás esclarecia: " A companhia informa que o break even
(preço mínimo do barril a partir do qual a produção é economicamente
viável) planejado no momento em que foram aprovados os projetos de
produção do pré-sal, situava-se no entorno de US$ 45 por barril,
incluída a tributação e sem considerar os gastos com infra-estrutura de
escoamento de gás. Ao considerá-los, esse valor pode aumentar entre US$ 5
e US$ 7 por barril. "
Mas por que o óleo do pré-sal é mais
barato, apesar de todas as dificuldades? Os poços do pré-sal tem
produção elevada, em média de 25 mil barris por dia, superior aos do
pós-sal em terra e no mar, que, além disso, sendo mais antigos estão com
produção decrescente, extraindo mais água e menos óleo.
O mesmo ocorrerá no futuro com o
pré-sal, daí a necessidade de continuar investindo em novos poços e em
processos para reduzir a perda e aumentar sua vida útil, não fazendo
produção predatória para recuperar rapidamente os valores investidos.
Como cada barril retirado não dá outra
safra, novas reservas tem que ser descobertas, sob pena da empresa
desaparecer. Isto exige mais recursos, daí porque o setor é oligopólio
de gigantes e mesmo assim somente poucas conseguem elevar ou manter as
reservas. É o caso da Petrobrás, pelo 23º ano consecutivo, conseguindo
repor 1,25 barril para cada um produzido em 2014. Nossas reservas
provadas de petróleo e gás natural no Brasil, pelo critério da ANP/SPE,
são de 16,3 bilhões de barris de óleo equivalente, suficientes para
abastecer o país por 19 anos com a produção atual. Além disso, podem
aparecer problemas como ocorrência de H2S e CO2, que requerem
tecnologia, pessoal especializado e recursos.
Foi o que o Eike Batista descobriu com a
OGX, imaginando que bastava arrematar áreas nos leilões e levar alguns
gerentes da Petrobras, a peso de ouro, por terem informações reservadas
da estatal.
Operadora única
A Petrobrás mantém o país abastecido e
aumenta a produção de petróleo e derivados. Descobriu petróleo nas
camadas pré-sal, desenvolveu tecnologia para retirá-lo, produzindo
atualmente mais de 800 mil barris por dia em apenas oito anos [4]. Mas,
alguns políticos propõem que deixe de ser a operadora única do pré-sal,
com participação mínima de 30% nos investimentos dos consórcios
responsáveis pela produção, como prevê a lei da partilha do pré-sal (Lei
12.351/2010). Dizem que é para ajudá-la, pois lhe faltarão recursos
financeiros.
O ex-diretor da Petrobrás Guilherme
Estrella, coordenador da equipe que viabilizou o pré-sal, em entrevista
ao Conselho de Economistas-RJ, responde: “Qual crise pode abalar uma
empresa petrolífera que detém mais de 30 bilhões de barris de reservas
de petróleo e gás natural, possui conhecimento, tecnologia e excelência
operacional para produzi-los em grandes e crescentes volumes (hoje mais
de 2,8 milhões de bbl equivalentes) com excepcional lucratividade –
mesmo aos atuais preços internacionais?”[5]
A pergunta que se coloca é: qual deve
ser o ritmo adequado de produção para o país? Alguns (entre os quais os
que propõem a retirada da companhia como operadora única) dirão que o
país necessita de recursos urgentes para gastar já. Outros, apontam o
caminho da Noruega, adequando a produção à capacidade do país em
capacitar suas indústrias, treinar pessoal, gerar empregos, gastando de
forma parcimoniosa e reservando a maior parcela para um fundo destinado
às gerações futuras.
Afinal, o petróleo não dá duas safras.
Pode ser uma benção ou uma maldição, como descobriu o México, com
reservas de 48 bilhões de barris em 1996, extraiu predatoriamente a US$
30/barril, vendo suas reservas caírem para 11 bilhões no final de 2013. A
Inglaterra e a Holanda enveredaram pela desindustrialização, extraindo
num ritmo superior ao que sua indústria e economia deveriam absorver.
No caso do Brasil, este cuidado é ainda
maior, pois temos uma grande população e economia que requerem um grande
consumo de energia, limitando eventual exportação do petróleo que
necessitaremos no futuro. É o que fazem os EUA, proibindo a exportação
do petróleo produzido no país. O pré-sal é uma das poucas grandes
reservas disponíveis fora das regiões de conflito do Oriente Médio.
O professor Carlos Lessa, ex-presidente
do BNDES, defende que devemos manter nossas reservas para consumo
interno. Comenta que poderemos “nos converter num Iraque do futuro, ou
mesmo numa Noruega, que, apesar de seu bom senso, perdeu 1/3 das
reservas financeiras que havia amealhado com a venda de petróleo e
gás”.[6]
A condição de operadora única é a
garantia de podermos manter este projeto nacional de desenvolvimento da
indústria local; termos controle maior sobre a produção, mantermos nossa
liderança tecnológica na área, junto com as universidades e centros de
pesquisa do país. Afinal, a operadora será a principal responsável pelos
projetos, especificação dos equipamentos e tecnologias que define onde
os empregos serão gerados.
É uma decisão que não pode ser deixada
para poucos, deve estar acima de interesses partidários e pessoais e
será fundamental para o futuro do país, independentemente de quem
estiver no comando da nação.
Diomedes Cesário da Silva
Ex-presidente da AEPET
[1] http://www1.folha.uol.com.br/colunas/kennethmaxwell/2015/05/1628757-petroleo-e-ferro.shtml
[2]
http://www.investidorpetrobras.com.br/pt/destaques-operacionais/custos-e-tributos/custo-de-extracao-e-refino-no-brasil/custo-de-extracao-e-refino-no-brasil.htm
[3] http://www.petrobras.com.br/fatos-e-dados/esclarecimento-viabilidade-de-producao-no-pre-sal.htm[4] http://www.petrobras.com.br/fatos-e-dados/producao-que-operamos-no-pre-sal-bate-novo-recorde-e-ultrapassa-o-patamar-de-800-mil-barris-de-petroleo-por-dia.htm
[5] http://portalclubedeengenharia.org.br/arquivo/1428929646.pdf/documentos
[6] Plebiscito popular: questão nacional, Lessa C, Valor Econômico 06/06/2012, pag. 13
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