POLÍTICA - Ataques ao Lula.
Texto pescado do Facebook de Pedro Luiz Boemer
Um dos mais importantes especialistas
do País na área trabalhista, o advogado Valter Uzzo criou um fato
político ao enviar para amigos e-mail remetido para um de seus
conterrâneos da cidade de Pompéia, no interior de São Paulo, chamado
apenas por Lara, listando uma série de argumentos contrários à
proliferação de spams jocosos sobre o ex-presidente Lula e a presidente
Dilma Roussseff.
Ex-presidente do Sindicato dos
Advogados de São Paulo, Uzzo, no texto, descreve o cenário histórico da
presença e influência das forças conservadoras na política brasileira.
O e-mail de Uzzo está sendo velozmente
disseminado pela internet, ganhando status de peça política contra a
discriminação ideológica às forças de esquerda.
Abaixo, o conteúdo completo:
Caros.
Um amigo meu de infância passou a me
mandar um volume enorme de e-mails com piadas, comentarios e afirmações
sempre depreciativas em relação ao Lula, Dilma, PT, etc. A situação foi
em um crescendo tal, que atingiu as ráias da provocação e do insulto,
até que, outro dia, resolvi responder. E mandei este pequeno texto, que
é, em verdade, o que penso de pessoas como ele que, a pretexto de
criticar, escondem hipocritamente suas idéias e concepções.
Abcs. Valter Uzzo
Sent: Tuesday, February 05, 2013 3:42 PM
Caro Lara: Tenho, quase que
diariamente, recebido os seus e-mails, que trazem piadas, “fotos
interessantes”, e propaganda daquilo que, politicamente, você acredita.
Quero crer que estou me dirigido à pessoa certa, ou seja, ao Lara que
conheci em Pompéia, na infância e adolescência. Se assim é, tenho
algumas gratas recordações, de nossa convivência que, ao tempo, pela
idade e sem as agruras que viríamos a experimentar durante a vida, era
muito boa.
Recordo-me mesmo que uma das suas
habilidades, invejada por todos nós da mesma classe ginasial, era a
incrível capacidade que tinha de “colar”, já que você se abastecia de um
grande estoque das “sanfoninhas” (era o tipo de “cola” da época), que
escondia perfeitamente em sua mão direita e que lhe permitia -grande
perfeição !- colar sem interromper a escrita e, -perfeição maior !-, até
mesmo diante do olhar atento do professor. Ao que me recordo, nunca,
nenhum dos professores, na fiscalização que faziam, conseguiu algum
êxito diante de você. Nesse partícular, você era imbatível.
Mas, deixando-se de lado tais
reminiscências, eu estou me dirigindo à você para tratar de assunto que,
diante de sua volumosa correspondência eletrônica, parece lhe
interessar: trata-se de questões que envolvem a visão que temos da forma
como vem sendo dirigido este país, melhor dizendo, a questão política.
Para se ter uma conversa franca, devo
dizer que temos uma visão de mundo muito diferente. Acho mesmo, oposta.
Em minha profissão (sou advogado) acabei aprendendo a conviver na
divergência, já que, diariamente, senta do lado de lá da mesa de
audiência, ou dos autos do processo, um colega de mesmo grau de
escolaridade que defende justamente o contrário. Adversário. Mas,
terminada a audiência, retomamos o relacionamento, ou seja, é um
aprendizado constante e permanente, a nos ensinar que devemos respeitar
os que pensam de forma diversa.
Transposta tal relação para a política,
também aprendi a respeitar aqueles que tem uma visão de mundo diferente
da minha, embora com eles não concorde. Entre tais “adversários” de
pensamento existem dois tipos: os que assim agem por convicção, e os que
agem por interesse.
Creio que você se enquadra entre os
primeiros, ou seja, você tem ideias, a meu ver, que eu classifico como
“conservadoras”, mas que são catalogadas no jargão político comum como
“reacionárias”, ou por alguns “direitistas”, ou, se formos levar ao
extremo a sociologia política, “fascistas”.
Para mim, no entanto, você é um
“conservador”, por convicção. E é aí que eu quero conversar com você.
Existe no Brasil uma forte corrente de pensamento conservador. Sempre
existiu, aliás, durante o império e durante a república, todos os
presidentes e Governos , até 2003, sempre tiveram um perfil conservador,
uns mais outros menos. Todos.
Getúlio Vargas (1º Governo, ditadura)
liderou uma “revolução” – que não era revolução no sentido sociológico
do termo- contra práticas condenáveis da República Velha, só isso.
Pertencia a elite agrária, era fazendeiro e fez um Governo ambíguo,
criando uma legislação trabalhista (que estava sendo criada, ao tempo,
por quase todos os países de mesmo grau de desenvolvimento que o
Brasil), e criou dois partidos políticos – o PTB, para lhe servir – e o
PSD, conservadoríssimo, para ajudá-lo a governar. No mais, encarcerou a
oposição e restringiu as liberdades públicas.
Em 45 foi substituído pelo Dutra (outro
conservador), que dissipou todas as reservas cambiais que havíamos
acumulado com a substituição das importações, durante a guerra.
Getúlio volta em 1950 e aí, após um
início de governo meio indefinido, começa a aproximar-se de ideias
progressistas, mas não conseguiu implementá-las, já que, ameaçado de
deposição, suicidou-se.
Juscelino foi um inovador em
realizações, mas seu governo, embora aparentemente liberal nos costumes,
sempre foi um produto das classes dominantes e um fiel seguidor da
política americana.
Jânio se foi muito rápido , e Jango
também nada tinha de progressista: era filho de uma família de
riquíssimos fazendeiros, era despreparado para a função e sua queda dá
bem a medida de seus compromissos de classe: preferiu viver rico no
exílio, do que participar ou liderar uma revolução popular com a qual
não se identificava.
Seguiram-se os governos militares,
Sarney, Collor, Itamar e Fernando Henrique. Se examinarmos todas as
medidas tomadas por tais governos (algumas muito boas, até) veremos que
nenhuma delas teve a preocupação ou conseguiu alterar o sistema de
distribuição de renda no país, -um dos mais injustos do mundo.
A dívida externa sempre em patamares
impagáveis, o salário mínimo medeando entre U$ 80 a U$ 120 dólares,
lenta queda da mortalidade infantil, poucos avanços na afalbetização,
grande transferência de rendas para o exterior, sistema de saúde pública
catastrófico, destruição da escola pública, gigantesca falta de
moradias e favelização, polícia corrupta, Justiça que não funciona,
previdência privada mais cara do mundo, seguros mais caros do mundo,
alta tributação e assim foi. Só discursos, só demagogia, e muita
roubalheira.
Aí vieram a eleição em 2003, reeleição
do Lula e eleição da Dilma. Muitos erros, houve e há corrupção, muitas
coisas não deram certo, os quadros do PT, em grande parte, eram
despreparados para administração, enfim, as coisas não saíram como o PT
pregava. No entanto, o salário mínimo triplicou (em dólares), a renda
familiar cresceu, a dívida externa foi paga, o consumo aumentou muito, o
emprego cresceu ( e o desemprego despencou) e o Brasil conseguiu
crescer, ao meio de uma grande crise internacional.
Caro Lara, esses são fatos. Fato é fato, não é discurso, nem proselitismo político, nem palavrório. FATOS.
O País está em regime de pleno emprego (
é a 1ª. vez em nossa história que isso acontece), e no ano de 2011, em
um universo de 200 países, fomos o 4º. País do mundo em receber
investimentos externos, só atrás dos Estados Unidos, China e Hong Kong
(notícia do Times, reproduzida no Estadão e Folha na semana passada, com
pouco destaque).
A arenga de que o Governo, em 2003,
pegou uma condição internacional favorável é coversa para boi dormir:
muitos outros países não progrediram, muitos entraram em crise, o
sistema financeiro internacional em 2008 quase ruiu, enfim, o Brasil
navegou muito bem por sua conta e seus méritos. Pensar de modo diverso é
revolver a mentalidade colonialista.
Mas, estou eu a pretender que você se
torne um apoiador do Lula e da Dilma ? É claro que não, até porque na
nossa idade ninguém muda mais. É que eu acho que essa sua “cruzada”
contra, poderia ser muito mais consequente e séria. Já que na clássica
definição “partido político é a opinião pública organizada”, porque
vocês, conservadores, não fundam um partido que expresse tal ideologia?
A grande farsa que existe é que os
conservadores, ou os direitistas, ou os neoliberais, não assumem o
próprio rosto. O PSDB (neoliberal) não se diz neoliberal, diz que vai
mudar, que é de centro esquerda, que é progressista, e outras baboseiras
mais. Porque não se diz neoliberal, e faz um programa neoliberal?
E vocês, conservadores, porque não se
assumem, e fazem um programa com o conteúdo daquilo que vocês acreditam;
contra as cotas, contra o aborto, contra o casamento gay, pela redução
dos direitos trabalhistas, dos impostos, por uma política externa mais
invasiva, etc, etc, , tal qual o Partido Republicano (Conservador) dos
Estados Unidos ? Se você fizer as contas, aqui como lá, o eleitorado se
divide, o que, aliás, ocorre em todos países civilizados (França
Inglaterra, Austrália, Itália, Espanha, Alemanha, Austria, etc, etc,
etc).
Ou seja, no mundo todo, o eleitorado se
divide em conservadores e progressistas. Mas, aqui não, em razão da
hipocrisia política da direita, a luta não é limpa. Estimule a criação
de um verdadeiro partido conservador, que defenda as teses conservadoras
e o modo de governar conservador e aí, sim, teríamos um debate limpo,
direto, sem enganações, sem subterfúgios.
A meu ver, essa situação da direita
esconder suas verdadeiras propostas, de vestir um manto progressista
quando não o é, é a pior forma de trapacear uma nação, posto que esconde
seus verdadeiros desígnios.
Em suma,já é tempo de sair do armário e
vir corajosamente para o debate de ideias. O outro ponto que gostaria
de conversar com você é sobre a forma negativa e pejorativa de sua
“crítica” política. As piadas, imagens, dizeres, etc, que se referem aos
que não pensam como você, revelam um rancor que tem de tudo:
preconceito, desinformação, insultos, etc. Se você acha que este tipo de
crítica desperta alguma simpatia para as suas ideias, ou fazem mal a
figura dos criticados, então está na hora de você fazer algumas
reflexões sobre o que muda as pessoas. Uma pessoa decente muda de
opinião quando você demonstra que ela está errada. Só não mudará se
tiver “interesses” em se manter no erro, ou, então, se por alguma razão
(preconceito, ignorância, intolerância, irracionalidade, etc) não
entender o seu erro e o significado da mudança. Fora disso, a
“propaganda” pejorativa contrária é um tiro na culatra. E isso é tanto
no aspecto individual como coletivo.
O Lula cresceu eleitoramente depois que
mudou sua imagem para o “Lula, paz e amor”. Antes, o eleitorado
preferia o FHC, com sua voz e modos blandiciosos. Serra com sua
linguagem belicosa só perdeu votos. Obama derrotou duas vezes os seus
adversários com um discurso suave, sofrendo agressões de todo os lados. O
Berluscomi e Sarkosi, na Itália e França, perderam as eleições, em
razão de suas práticas autoritárias e arrogantes.
Enfim, na medida que a sociedade
evolui, essa linguagem truculenta, ofensiva, enganosa, que intui uma
falsa moralidade e prega medidas radicais extremadas (para os outros,
nunca para si) vai caindo em desuso, não engana mais ninguém. Pode ter
servido em outra época, chegou a levar os hitlers e mussolinis ao poder,
mas, hoje em dia, ninguém mais cai neste canto de sereia.
As pessoas querem é ser convencidas,
sem imposições. Bem, fico por aqui. Se você quiser prosseguir
mandando-me os e-mails, gostaria que não mais me enviasse os relativos à
política, a não ser quando nesta terra tiver um partido conservador, ou
direitista, ou de natureza fascista ( o Plínio Salgado pelo menos teve
coragem e honestidade criando os “camisas verdes”), para que se possa
ter um debate decente e honesto. Daí sim, quem sabe, talvez até eu me
convença de que existe alguma verdade nessas ideias trapaceadas e
escondidas sob o manto de uma falsa moralidade. Ideias tão escondidas,
tal como você fazia com as colas e era invejado por toda classe.
Abraços e saudades. Valter Uzzo
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