sábado, 30 de maio de 2015

POLÍTICA - Lá como aqui, a virulência da onda anti-Dilma, é fruto do arrastão neoliberal, do pensamento único difundido pelo PIG e do conservadorismo retrógrado e reacionário principalmente do novo Congresso.

O macaco Obama


          
Autor: José Augusto Ribeiro


Barack Obama já é um Presidente no fim de seu segundo mandato, que terminará no início de 2016, não pode mais ser candidato a coisa alguma nos Estados Unidos, não tem maioria no Congresso e não conseguiu cumprir a maior parte de suas promessas, nem mesmo a de  fechar a infame prisão  de Guantánamo, onde os presos não têm direito sequer ao habeas corpus (como, aliás, no Brasil do AI-5). Apesar disso, continua incomodando.

 

Noticia-se agora que ele tem recebido pelo twitter mensagens insultuosas, rancorosas e ameaçadoras. No mínimo tentam ofendê-lo chamando-o de negro, o que ele, sem dúvida, tem orgulho de ser, e houve quem o chamasse de macaco e quem lhe mandasse um desenho que pretende ser o dele na forca, com uma legenda que em  português significaria mais ou menos  “precisa-se de corda”, embora o boneco do desenho apareça com a corda no pescoço.

 

Isso acontece logo depois da morte a tiros de vários negros por agentes de polícia, um dos quais, no Sul, foi liminarmente absolvido por um grand jury, o júri preliminar que deveria indiciá-lo e mandá-lo a julgamento pelo júri regular (e outro, agora, em Cleveland, no Norte). E logo depois, também, da decisão de Obama de entender-se com Cuba, reconhecendo finalmente que o regime de Fidel e Raul Castro não constitui hoje o menor perigo para os Estados Unidos e para a civilização ocidental e cristã (da qual, aliás, não se fala mais, já há bom tempo). 

 

Isso também acontece pouco antes da visita do Papa Francisco aos Estados Unidos, onde conversará com Obama, será recebido pelo Congresso e falará, o primeiro Papa a fazer isso, na assembleia-geral da ONU. O Papa, por sinal, acaba de receber no Vaticano o Presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, a quem saudou como o “anjo da paz”, ao mesmo tempo que o Vaticano, em documento oficial, referia-se expressamente ao Estado Palestino e apoiava a ideia  conhecida como a dos “dois Estados”, Israel e a Palestina. Na viagem aos Estados Unidos, o Papa fará escala em Cuba, para novo encontro com Raul Castro, que há pouco esteve com ele no Vaticano e saiu de lá encantado e dizendo que pode voltar a ser católico se o Papa continuar dizendo as coisas que diz.

 

Nos bolsões que os americanos chamam de lunatic fringe (franja lunática) de sua extrema direita, a combinação desses encontros, os já havidos e os vindouros, deve provocar uma reação das mais paranoicas: a certeza de estar surgindo no mundo um novo Eixo do Mal, agora formado pela aliança Franciso-Obama-Raul e Fidel Castro-Mahmoud Abbas. Já que Abbas e os palestinos são muçulmanos, essa aliança deve estar mancomunada com os terroristas do Estado Islâmico. 

 

Não por acaso o Papa Francisco é odiado, com virulência assassina, pela franja lunática de uma extrema direita que se pretende cristã. Uma biografia sua publicada no ano passado informava que ele prefere fazer as refeições no bandejão dos funcionários do Vaticano. Esse é um hábito simpático e democrático, mas mesmo que o Papa não tenha pensado nisso, no bandejão será mais difícil algum aloprado ceder à tentação  de pôr em prática, por envenenamento, sugestões já enunciadas publicamente de que alguém precisa dar um jeito nas extravagâncias de Sua Santidade.

 

Sei que estou exagerando, mas o irracionalismo extremado é capaz de delírios como esse - e até mais dementes. Na década de 1950, por exemplo, um grupo norte-americano de extrema direita denunciou como perigosa arma da conspiração comunista internacional  os programas de fluoretação da água então iniciados nos Estados Unidos.  

 

Voltando a Obama, não é por acaso que implicam com ele. Derrotado nas eleições de novembro passado, que deram aos republicanos  grande maioria no Congresso, e, entre os republicanos, asseguraram a hegemonia aos mais conservadores e reacionários, os inimigos imaginaram que ele estava definitivamente acabado e se tornava um Presidente lame duck, como se diz no jornalismo político dos Estados Unidos (literalmente, “pato manco”, ou seja, um bicho impotente e inofensivo. Obama, porém, foi bom aluno de Direito Constitucional (do brasileiro Roberto Mangabeira Unger, em Harvard), conhece exatamente o alcance das prerrogativas presidenciais que não dependem do Congresso e resolveu usá-las desassombradamente no ano e tanto que ainda tem de mandato. Não podendo acabar unilateralmente com o bloqueio econômico a Cuba, que depende de um Congresso cada vez mais refratário a suas propostas, Obama partiu para a normalização das relações diplomáticas com o governo cubano, aproveitando a iniciativa do Papa Francisco. 

 

Agora que não tem mais nenhuma eleição pela frente, na qual sua política poderia prejudicar o  Partido Democrata, Obama deve estar à espera de uma boa oportunidade para fechar a prisão de Guantánamo, não em homenagem a Fidel e Raul Castro, mas em respeito à Constituição dos Estados Unidos, que exige a observância do princípio do devido processo legal em todos os procedimentos criminais, princípios que começam pelo direito ao habeas corpus. Nesse caso, o obstáculo não é o Congresso, mas a opinião pública, amedrontada desde o atentado às Torres Gêmeas e agora intimidada pelos avanços e atentados do Estado Islâmico. 

 

Os fatos já produzidos e a expectativa dos que ainda venha a produzir alimentam a onda anti-Obama. A virulência dessa onda, porém, é resultado, ainda, do arrastão neoliberal, do pensamento único e do conservadorismo retrógrado que dominam a sociedade americana.

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