Grécia derrota abutres e mídia rentista
Foto: Marco Djurica/Reuters |
A decisão histórica da Grécia, que rejeitou neste domingo (5) o terrorismo da “troika” – Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e Comissão Europeia –, ainda terá inesperados e tensos desdobramentos. Mas já dá para identificar os grandes derrotados nas urnas: os abutres do capital financeiro, o governo imperial de Angela Merkel e a mídia rentista. Como afirmou o primeiro-ministro Alexis Tsipras, logo após o fim da apuração – 61,3% votaram “não” e 38,7% pelo “sim” –, o resultado “demonstra que a democracia não pode ser chantageada”. A partir de agora as negociações com os banqueiros se darão em outro patamar, o que influenciará todo o velho e saqueado continente.
A famigerada “troika” fez de tudo para curvar e humilhar o povo grego, que em janeiro elegeu um governo contrário à austeridade fiscal imposta pela oligarquia financeira. Nos dias que antecederam o plebiscito, os abutres ameaçaram afundar o país no caos econômico e na desestabilização política. Na sua arrogância imperial, a chanceler alemã Angela Merkel condenou a consulta soberana e rejeitou qualquer diálogo. Já o presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, disse que o futuro do país seria “lamentável”, com sua exclusão da zona do euro e a suspensão dos créditos. Para os abutres, só havia uma alternativa: aceitar o pacote de corte dos gastos, do aumento de impostos e de uma radical reforma da Previdência.
Nesta ação terrorista, a oligarquia financeira contou com o apoio ostensivo da mídia privada – hoje totalmente associada e servil aos bancos. Na Grécia, quase 80% do noticiário dos jornais, revistas e das emissoras de rádio e tevê foi favorável ao “sim”. No restante da Europa, a imprensa do capital também ajudou a difundir as chantagens dos abutres. O mesmo ocorreu no Brasil, onde a mídia colonizada tentou desqualificar a postura corajosa e altaneira do povo grego. William Waack, serviçal da TV Globo, rotulou o premiê Alexis Tsipras de “populista irresponsável”. Já a urubóloga Miriam Leitão, do mesmo império midiático, criticou o governo grego por “improvisar à beira do precipício”.
Derrotados no plebiscito, agora os abutres financeiros e os seus servos midiáticos estão angustiados. Temem que a democracia grega contamine a Europa e o restante do mundo, colocando na berlinda a ditadura do capital financeiro. O jornal espanhol El País, tão paparicado pelo colunista Clóvis Rossi, da Folha, exige uma postura incisiva e firme da “troika”. Outros veículos pedem cautela e a volta do diálogo com o Syriza, a coalizão de esquerda da Grécia. A onda de revoltas populares iniciada em 2011 no velho continente ainda assusta os donos do capital e sua mídia venal. Os próximos dias serão decisivos, não apenas para a Grécia, mas para o futuro do capitalismo no mundo!
A festa nas ruas de Atenas
No meio destas incertezas, vale o registro das cenas de alegria do povo grego em Atenas – segundo relato da própria Folha rentista:
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Sentimento de orgulho predomina nas ruas de Atenas
Clima festivo, com música e apitaço, ocupou praça que, há cinco anos, abrigou protestos contra austeridade
Sem conhecer detalhes de proposta negociada com credores, gregos fizeram diferentes leituras do plebiscito
Uma erupção de orgulho nacional tomou conta da praça Syntagma, no centro de Atenas, assim que a apuração começou a indicar a vitória do "não" no plebiscito.
Enrolados na bandeira da Grécia, milhares tomaram a mesma praça onde, há cinco anos, ocorreram os protestos contra as medidas de austeridade da União Europeia.
"Estou orgulhoso do que aconteceu aqui: estamos dando à Europa uma lição de democracia. A crise afetou nosso bolso, mas não nossa alma", disse o cantor Michaelis Nemaris, 60.
Vendedores ambulantes de bandeiras brotaram na praça logo que os resultados foram divulgados. O ambiente era festivo, ruidoso, com música e apitaço, bem ao estilo grego, e puxado, sobretudo, por apoiadores do Syriza, partido de esquerda do primeiro-ministro, Alexis Tsipras.
"Não existe mudança sem risco", disse a enfermeira Izabela Galatou, 32, que ganha hoje € 700 por mês, € 200 a menos que seu salário anterior no início da crise.
Os pais de Izabela, um professor e uma enfermeira, perderam mais de € 6.000 de renda anual com os cortes orçamentários adotados pelos governos gregos pós-crise.
Dimitra Mitrakos, 31, desempregada há três anos, votou "não" e descarta a hipótese de agravamento da crise.
Durante a votação, a complexidade do tema e a falta de tempo para entender as negociações levaram os gregos a interpretar cada um à sua maneira o plebiscito.
Para alguns, a votação era rejeitar medidas de austeridade e apoiar o primeiro-ministro Alexis Tsipras. Para outros, tratava-se de decidir sobre a permanência na zona do euro, embora, oficialmente, isso não esteja em discussão.
Os gregos receberam apenas uma cédula com a seguinte pergunta a responder: "Deve ser aceito o acordo submetido por CE (Conselho Europeu), BCE e FMI para o Eurogrupo no dia 25 de junho, que consiste em duas partes que formam sua proposta completa?". Eles colocaram o voto 'sim' ou 'não' num envelope e o depositaram na urna.
Sem ter lido as propostas, a servidora Rodanthi Polomarkaki, 44, votou pelo 'sim'. "Para ser honesta, só acompanhei pela televisão, desconheço os detalhes, mas acredito que o 'sim' é a coisa certa a fazer", disse.
Em seguida, votou Nikos Sapralis, 65, dentista aposentado. Optou pelo 'não': "Precisamos mandar uma mensagem para Europa de que tem de conversar também no campo político, não só econômico, onde somos mais frágeis".
As discussões nos cafés e seções de votação da capital Atenas raramente passaram pela complexa proposta negociada com os credores.
"Nem que os gregos tivessem dois meses para discutir a proposta seria possível para um leigo entender tantos detalhes técnicos", disse o economista Stefanos Gavalas, que trabalha no mercado financeiro em Atenas.
Aos 86 anos, o aposentado Kostas Supalikas chegou de bengala e acompanhado por uma enfermeira para votar. Sem poder subir as escadas da escola, votou do pátio, com a ajuda de uma mesária que levou até a ele a cédula. E Supalikas pediu: "Quero votar 'sim', por favor". (LC E FG)
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