Promessa de campanha do presidente Lula, a Sudene foi recriada, mas, na prática, sobrevive sem força política e recursos
Fonte: JORNAL DO COMÉRCIO, Recife (25/07/2009).
Bem diferente da obra do seu principal idealizador, o economista paraibano Celso Furtado (1920-2004), a Sudene parece a cada dia mais dissociada dos ventos que empurram a economia do Nordeste para um crescimento acima da média nacional. Promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a recriação da autarquia de fato aconteceu. Mas não há motivo para festa. Na prática, a Sudene sobrevive sem força política, sem recursos e quase sem pessoal. Pode-se até dizer que a recriação não adiantou de nada. No ano do cinquentenário do clássico Formação Econômica do Brasil (leia matéria vinculada), de Celso Furtado, a Sudene nada mais é do que um monumento a uma fracassada e quase inexistente política de desenvolvimento regional. Definitivamente, um dos mais destacados intelectuais do Brasil não merecia isso.
A Sudene ocupa hoje apenas parte da Ala Norte do edifício de 13 andares que já abrigou seus mais de 3 mil funcionários, nos tempos áureos, e que foi tomado por varas da Justiça do Trabalho. Tem um quadro de 140 funcionários e já recusa cartas-consultas para concessão de incentivos fiscais do Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE) porque o seu orçamento de 2009, da ordem de R$ 1,4 bilhão, está praticamente todo comprometido com o projeto da Ferrovia Transnordestina, da Transnordestina Logística (antiga Companhia Ferroviária do Nordeste, CFN), que absorve R$ 1,3 bilhão, a ser liberado com a execução da obra. Mesmo que isso não ocorra, os recursos estão empenhados e não podem ser destinados a outros projetos privados.
A frágil atuação da Agência de Desenvolvimento do Nordeste, substituta da Sudene até 2007, ano em que foi recriada pelo presidente Lula, provocou um vácuo político que os governadores da sua área de abrangência ou seja, do Nordeste, Espírito Santo e norte de Minas Gerais, não preencheram. “Não entendo como os governadores, que integram o Conselho Deliberativo da Sudene e se reúnem num fórum paralelo, não vêem que a Sudene é favorável a eles. Se estivessem usando a Sudene como palco, a instituição teria sua força política restaurada como fórum de articulação entre os governos federal e estadual”, analisa a economista Tânia Bacelar, ex-secretária nacional de Política de Desenvolvimento Regional que coordenou o Grupo de Trabalho Interministerial de Recriação da Sudene.
O deputado Zezéu Ribeiro (PT-BA), coordenador da bandada nordestina na Câmara Federal, e relator do projeto de recriaçao da Sudene, compartilha da opinião e vai mais além: “A Sudene é sempre falada nas reuniões da bancada, mas falta ação e empenho político do governo federal, que não reconhece a questão regional como eixo das políticas públicas”, diz o deputado. O senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) vê problemas diante dos investimentos estruturadores que estão chegando ao Nordeste, desvinculados de um planejamento governamental mais amplo. “O governo federal distribuiu grandes empreendimentos com os Estados, mas sem uma estratégia de desenvolvimento integrado. Os grandes projetos - como refinarias, siderúrgicas - são fundamentais para o crescimento econômico. Mas o desenvolvimento sustentável exige também grandes investimentos na área de educação básica e na melhoria das condições de vida de quem vive no Semi-Árido e nas periferias das capitais”, resume. Para Ribeiro, falta à Sudene uma assessoria parlamentar para acompanhar a disputa política de recursos orçamentários e garantir a regionalização do orçamento federal. “Mesmo debilitado, o órgão deveria se impor mais no processo”, afirma.
Para Tânia Bacelar, não se pode culpar o presidente Lula pelo enfraquecimento financeiro da Sudene. “Lula tentou criar o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional nos dois projetos de reforma tributária, mas ele foi excluído nas votações”, lamenta. O Fundo, segundo Zezéu Ribeiro, seria abastecido por 3% da arrecadação anual do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e do Imposto de Renda (cerca de R$ 11 bilhões) e destinaria 94% dos seus recursos para Norte, Nordeste e Centro-Oeste e outras áreas debilitadas como os pampas gaúchos, deixando 6% para outras ações pontuais. “O Fundo nem entrou na apresentação da reforma porque o governo vive de emergências”, afirma. Sem lastro financeiro, sem pessoal, é difícil imaginar como a Sudene implementará o Plano Nordeste, desenhado pelo ex-ministro Mangabeira Unger e que deverá ser lançado em 45 dias com a proposta de preencher o vácuo do planejamento regional.
Sudene espera liberação de verba
Quando tomou posse como superintendente da Sudene, em fevereiro de 2008, o baiano Paulo Fontana achou que tinha muito dinheiro em caixa contando com a liberação de R$ 5,6 bilhões do Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE), que ficaram retidos “por falta de condições de aprovação” dos projetos que os pleiteavam durante a vigência da Adene. Este ano, o volume chega a R$ 6,2 bilhões e não se tem ideia de quando eles sairão. Os seis projetos passíveis de contratação em 2009 solicitam R$ 865 milhões do FDNE, mas como os recursos estão comprometidos com a Transnordestina, a expectativa, ainda não confirmada, é que venha uma suplementação do Ministério da Integração Nacional.
A grande dificuldade para a liberação dos recursos, a circularização das notas fiscais do uso do dinheiro do Fundo, que exigia pareceres da Receita Federal e das Fazendas estaduais e municipais comprovando o pagamento dos impostos, e emperrava os processos, foi suspensa por decreto e agora as notas são disponibilizadas na internet, eliminando a burocracia. Até meados de agosto, sai um “decretão” assinado pelos ministros da Fazenda e da Integração Nacional que irá estender de 30 para 60 dias o prazo de apreciação das cartas-consulta e aumentar a taxa de risco do Banco do Nordeste do Brasil (BNB) que opera o Fundo Constitucional do Nordeste (FNE) de 2,5% para 10% e o del credere, a taxa de administração dos tomadores de empréstimos, de 0,1% para 0,60%. O decretão também irá incluir a aviação civil regional e a indústria gráfica entre os segmentos que poderão contar com o FDNE. Já o FNE, que é operado pelo BNB e tem R$ 3,5 bilhões no orçamento de 2009, podendo chegar a R$ 7,5 bilhões com o retorno de empréstimos, fez 172.191 contratações, num total de R$ 3,9 bilhões, no semestre passado.
Enquanto aguarda as mudanças, Fontana arruma a casa. Recuperou o 13º andar da Sudene, onde despacha, e quer realizar a próxima reunião do Conselho Deliberativo da Sudene no tradicional anexo Nilo Coelho, reformado e aguardando a compra dos equipamentos de som. Mesmo aprovado pelo Ministério do Planejamento, em agosto de 2008, e contando com uma moção de apoio dos governadores da área de atuação da Sudene, o plano de cargos e salários que prevê concurso para 400 vagas e cria uma estrutura regimental com 166 cargos comissionados, ainda não tem data para ser autorizado e implementado. “Conseguimos uma gratificação para os funcionários que estavam trabalhando e estamos tocando, fazendo capacitações para garantir mais qualidade nas análises dos incentivos”, diz Fontana, revelando que, com apenas oito analistas de projetos que pleiteiam incentivos em 11 Estados, ele mesmo tem que viajar a Brasília para tratar de assuntos técnicos.
Fonte:Desemprego Zero.
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