No dia 1º de outubro de 1949, Mao Tsé-Tung consagrava a sua vitória do alto do simbólico coração da China: a praça Tiananmen. Diante dele, centenas de milhares de pessoas reunidas. A grande maioria jamais havia visto Mao (1893-1976). Esta foi a primeira vez que o líder chinês se dirigiu a uma multidão tão grande, e também foi a última em que ele pronunciou um discurso verdadeiro. Em suas outras aparições, ao longo de seu reinado, ele se contentou apenas em enunciar rápidos slogans.
A reportagem é de Bruno Philip, publicada pelo Le Monde, 23-07-2009. A tradução é do Cepat.
Longe de exaltar os valores marxistas, as primeiras palavras de Mao Tsé-Tung tinham um tom nacionalista: "Nós, os 475 milhões de chineses, estamos agora de pé, e o nosso futuro é infinitamente luminoso!", exclamou ele.
Naquele outono de 1949, saindo de uma guerra civil e de um conflito com o Japão, cujo balanço em vidas humanas se aproxima de 15 milhões de mortos, Mao desejava encarnar a vingança da China contra as potências nipônica, européias e russa que, a partir de meados do século XIX, impuseram-se econômica e militarmente a uma China enfraquecida. No dia seguinte ao discurso, a União Soviética, dirigida por Stálin, reconheceu oficialmente o "governo central popular da China". Moscou considerou que "exprimia a vontade da esmagadora maioria do povo chinês"
As palavras do novo Grande Timoneiro – expressão inventada mais tarde durante a Revolução Cultural (1966-1977) – fecharam o capítulo da guerra com os exércitos do Kuomintang (partido nacionalista), dirigido pelo general Chiang Kai-shek. A queda deste último foi muito mais rápida do que Mao previa: em março de 1948, o futuro número um chinês pensava que as tropas nacionalistas seriam vencidas apenas em meados de 1951...
O chefe de guerra, Mao Tsé-Tung em 1946 teve a ideia de mudar a estratégia: no início da guerra civil, o imperativo era defender as bases "vermelhas" nos distritos rurais, segundo a teoria "o campo cerca as cidades". Assim que a vitória começou a se desenhar, deu aos generais do Exército de Libertação Popular (ELP) a ordem de avançar sobre as cidades. Apenas depois é que deveriam pensar em retomar as regiões rurais ainda nas mãos dos nacionalistas. A estratégia revelou-se acertada, ainda que Mao não estivesse com pressa: ele planejava atacar as forças do inimigo com tropas três ou quatro vezes superiores em número, ao contrário de se lançar em grandes batalhas com resultados incertos.
Em meados de março de 1948, grande parte da Manchúria, assim como as províncias de Shaanxi, de Hebei e de Shandong, caiu nas mãos dos comunistas. Alguns meses antes, Mao havia anunciado orgulhosamente que 640 mil soldados do exército de Chiang haviam sido mortos ou feridos e que mais de um milhão deles se renderam. Em janeiro de 1949, foi a vez de Pequim tombar nas mãos dos comunistas. Nanquim, a capital de Chiang Kai-shek, caiu em abril, e Xangai, em maio.
A derrota dos soldados do Kuomintang não se deu apenas pela genialidade militar maoísta: mas também foi causada pela incompetência de muitos oficiais nacionalistas, pela falta de disciplina e pelo baixo nível de motivação dos soldados alistados à força, e que sobreviviam em condições abomináveis. Durante um dos anos do conflito, conta-se que do milhão de novos recrutas nacionalistas, a metade havia morrido ou desertado.
Enquanto a China se prepara para celebrar com grandiosidade, no dia 1º de outubro de 2009, o sexagésimo aniversário da criação da República Popular, a imagem do presidente Mao permanece sendo sobretudo a do vitorioso, daquele que devolveu ao Império sua dignidade.
Com o tempo, as lembranças catastróficas do "Grande Salto Adiante" (1958-1961, que provocou fome e milhões de mortes), da terrível Revolução Cultural (a convocatória do comitê central para a "eliminação" dos "elementos da burguesia" que se "infiltraram" em todos os níveis do partido) e da ditadura maoísta parecem estar desaparecendo. Para a maioria dos jovens, essas tragédias são vistas, no máximo, como as etapas infelizes de um passado vago e praticamente ignorado.
Deng Xiaoping, o discípulo de Mao e que o sucedeu à frente do país após sua morte em 1976, estima que Mao foi "70% positivo" e "30% negativo". Os seus sucessores retomaram a frase e nunca, no auge do poder, ninguém se aventurou a arranhar a imagem do Grande Timoneiro por medo de corroer a legitimidade do partido.
Somente os intelectuais, ex-dignitários ou pessoas que sofreram a loucura maoísta criticam de forma ácida o personagem. Recentemente um blogueiro escreveu na internet que "a China não poderá progredir sem realizar uma crítica profunda ao maoísmo, pois Mao Tsé-Tung causou a destruição total dos valores chineses".
Fonte:IHU
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