O
ativismo de sofá pode, na verdade, tratar-se de uma lenda. Com a
classificação pejorativa que sempre teve, de passividade, nunca existiu
de fato. Um “ativismo” não pode ser passivo, e o oxímoro caiu do sofá.
Foi a predisposição do “ativista de sofá” que levou multidões às ruas em
junho e que tem gerado força para as reincidências.
Mais:
para perpetuar o ciclo, as manifestações de rua também encorpam o
ativismo cibernético, apoiando causas em que a presença física é
impossível (em outros estados ou mesmo países, por exemplo).
É nesse cenário que a Change.org, uma plataforma de abaixo-assinados, vê sua adesão deslanchar no Brasil.
Autointitulado
“o Youtube das campanhas online”, o Change.org completa um ano no país
com 1,4 milhão de usuários que assinaram os 60 abaixo-assinados que
surgem semanalmente no site (no mundo, são 500 por dia).
Nascida
em 2007 nos EUA, a plataforma já contabiliza 45 milhões de usuários
mundo afora (em cerca de 200 países) e algumas conquistas importantes.
O
abaixo-assinado contra a PEC37 obteve 461.019 assinaturas. Com sua
votação ocorrida durante o calor de junho, pode-se dizer que a proposta
de emenda não passaria, independentemente do abaixo-assinado, mas não se
pode desconsiderar sua parcela de ajuda. E casos mais recentes dão
provas do quanto o ativismo da rede pode ter ganhado força em razão das
recentes manifestações “ao vivo”. Algumas causas inseridas na plataforma
exerceram seu papel de pressão e conseguiram a vitória em cerca de dois
meses.
Foi
assim com a conservação de 27 árvores que seriam derrubadas no entorno
do novo estádio do Palmeiras (as tipuanas seriam arrancadas da avenida
Francisco Matarazzo para dar lugar a carros) ou na desistência da
prefeitura de Ilhabela de urbanizar duas praias que se encontram em
reserva natural (o total de assinaturas exigindo o cancelamento do
projeto superou o número total da população da cidade). Desde a abertura
da campanha até o arrego do poder público não se passaram 60 dias. Um
relâmpago em termos de mobilização social.
Nem
sempre a grandeza do número de assinaturas é fator primordial. “É
importante salientar que às vezes um abaixo-assinado com 2 mil, 3 mil
assinaturas obtêm vitória, enquanto um com 500 mil não alcança. Em
causas pequenas o efeito pode ser maior e mais rápido”, diz Graziela
Tanaka, diretora de campanhas da Change.
Com
o poder da internet em propagar e mobilizar rapidamente milhares de
pessoas, em boa parte das vezes a eficiente pressão de um
abaixo-assinado é o suficiente para que empresas atendam a vontade
popular antes mesmo que seja preciso levar o assunto à esfera judicial.
Após tomar conhecimento da existência de mais de 6,3 mil assinaturas, o
site Buscapé rapidamente retirou as 200 lojas não recomendadas pelo
Procon da sua lista de resultados de busca e inseriu-as na sua própria
lista negra. Foi assim também que com apenas 14 mil assinaturas (um
montante não muito expressivo no meio industrial) que a Darling
respondeu positivamente à demanda de criação de sutiãs especiais para
mulheres mastectomizadas. Diante da abertura da fabricante, outras
marcas seguirão a tendência.
Nem
todas as empresas, no entanto, se sensibilizam facilmente. A Coca-Cola
está na berlinda com o caso do consumidor que alega intoxicação após
ingerir o refrigerante contaminado por um rato. Ele briga na justiça
contra a empresa há 13 anos. Mas só agora, com as 62 460 assinaturas
coletadas na plataforma (até o momento) o caso ganhou repercussão na
mídia. A Coca permanece na defesa, tratando o caso juridicamente
enquanto seu logotipo sofre intervenções artísticas várias nas redes
sociais. A pressão aumentou.
Não
há restrição nem filtro de relevância das causas. Uma simples pauta de
condomínio pode ser lançada ali. Obviamente que uma questão que abrange
um maior número de pessoas receberá atenção maior da Change, que faz a
ponte com o tomador de decisão, contata a imprensa, atualiza
permanentemente os apoiadores, enfim, faz o “barulho” necessário.
Manifestar-se,
mesmo que desde o sofá, indica a vocação ativista, amplia o debate,
fortalece as causas. Obter sucesso na empreitada obedece a variantes que
vão do engajamento à adesão de movimentos socias, do interesse à
importância do tema. Mas tudo isso hoje pode ser feito de sua casa,
graças à internet.
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