Recebi do amigo José Jardelino da Costa Júnior, e divido com vocês, artigo publicado no New York Times, no qual o colunista David Carr mostra, de forma objetiva e lúcida, o papel desempenhado pela mídia diante de uma crise internacional como a que vivemos.
"Nunca o medo teve tantas formas de se infiltrar", diz o colunista para quem a mídia realmente cumpre seu papel quando prepara a opinião pública ante cada turbulência ou recessão, "mesmo quando mostra que as coisas estão terríveis e como ainda vão piorar".
Ele considera que a mídia cumpre seu papel, mesmo quando motiva - como eu observo agora - um pessimismo sem precedentes. Ou, ainda, quando age com muita antecedência em relação ao problema, como fez em seu país.
"A recessão nos EUA, de fato, só foi declarada oficialmente no começo de dezembro, mas a psicologia que a alimenta já havia passado meses sendo transmitida por e-mails, blogs e TVs", assinala Carr.
O articulista se fundamenta muito na realidade e personagens norte-americanos, mas em muitos trechos parece estar falando sobre nós e sobre o Brasil como, por esxemplo, quando escreve: "as demissões defensivas – não tanto com base na realidade atual, e sim nos horrores futuros – se tornaram regra."
Leia abaixo...
Estímulo ao medo está por toda a parte
Por David Carr
(Ensaio publicado no The New York Times, em 15 de dezembro de 2008)
David Carr
Na TV do banco traseiro do táxi, uma reportagem comenta o desemprego em Nova York. Num elevador em Manhattan, o texto em uma tela sugere que vamos todos na mesma direção – para baixo. Na Times Square, letreiros anunciam o desabamento da confiança do consumidor.
Qualquer recessão moderna inclui uma preleção da mídia sobre como as coisas estão terríveis e como ainda vão piorar, mas nunca o medo teve tantas formas de se infiltrar. A mesma dinâmica digital que provocou a exuberância irracional agora está motivando um pessimismo sem precedentes. A recessão nos EUA, de fato, só foi declarada oficialmente no começo de dezembro, mas a psicologia que a alimenta já havia passado meses sendo transmitida por e-mails, blogs e TVs.
“Quando só se fala em recessão, todos sentimos que alguma coisa tem de mudar, mesmo que nada tenha mudado para nós”, disse Dan Ariely, autor do livro “Predictably Irrational” (“Previsivelmente Irracional”), que ensina por que as pessoas fazem coisas inexplicáveis. “As repetidas mensagens apocalípticas da mídia afetam a todos – não só quem realmente tem problemas e precisa de mudanças, mas também quem está bem. Isso tem um efeito devastador na economia.”
Se o desemprego, as vendas de automóveis, as ações de despejo e a confiança do consumidor estão atingindo níveis históricos de angústia, os veículos de comunicação tampouco estão contribuindo. A economia congelou rápido porque, em comparação a antigamente, há dados assustadores demais, circulando com muito mais velocidade.
“Nossa mentalidade coletiva, de colméia, se perturba com coisas que de repente saltam aos olhos”, desse Xeni Jardim, um dos editores do blog Boing Boing. “’É um furacão!’, ‘Meu Deus, salmonela no hambúrguer!’, ‘Espera, estamos todos gordos!’. Há uma escalada de atenção que se auto-alimenta, porque esta recessão está aparecendo em todas as formas de expressão digital.”
Ninguém tem mais medo de ser surpreendido por uma retração do que os gestores de empresas de capital aberto, e as demissões defensivas – não tanto com base na realidade atual, e sim nos horrores futuros – se tornaram regra.
Num seminário recente, Barry Diller, executivo-chefe da empresa de serviços de internet IAC/Interactive, repreendeu os dirigentes do setor de entretenimento pelos (des)ajustes motivados pelo pânico e pela cobiça. “A idéia de que uma empresa que não está ‘industrialmente ameaçada’ tenha de fazer cortes para ganhar mais US$ 40 milhões é realmente um gesto horrível”, disse. “Acima de tudo, é fazer isso na pior hora. É jogar as pessoas em uma pilha maior de desemprego, sem que haja uma boa razão.”
Os meios de comunicação foram imediatamente afetados pela recessão porque dependem de publicidade, sempre um dos primeiros gastos a serem cortados. A Viacom teve lucros superiores a US$ 400 milhões no terceiro trimestre de 2008 – sofreu uma queda de 37% em relação ao mesmo período do ano anterior, mas continuou altamente lucrativa. Mesmo assim, demitiu 850 funcionários.
Michelle Rabinowitz, 28, produtora da MTV News, foi uma delas. Jornalista especializada em internet e cultura pop, já cobriu de Britney Spears ao massacre da universidade Virginia Tech. É o tipo de profissional que os meios de comunicação disputavam nos últimos anos e que voltarão a disputar no futuro.
“Muitos jovens tiveram de arrumar emprego depois do 11 de Setembro, então conhecemos tempos difíceis, mas pelo menos sabemos o que foi aquilo”, disse ela. “[Agora] eu saio, e o céu não está caindo, mas meu emprego não está lá, o valor do apartamento que eu comprei não está lá, meu fundo de Previdência não está lá. É esquisito, como se em algum momento alguém tivesse tomado a decisão errada – o Fed (Banco Central americano), uma empresa da mídia, um executivo, sei lá. Tudo de certa forma parece igual, mas mudou.”
É uma espécie de contágio emocional. James Fowler, professor da Universidade da Califórnia em San Diego, recentemente fez um estudo sobre como a felicidade se dissemina entre amigos – e o contrário também é verdade.
“Pessoas que conhecem outras que tiraram seu dinheiro do banco são muito mais propensas a fazê-lo também”, afirmou. “Sempre exageramos no lado positivo e, por causa dos mesmos efeitos contagiosos, exageramos no lado positivo e, por causa dos mesmos efeitos contagiosos, exageramos no lado negativo. Tudo está bem, e aí de repente estamos procurando água e mantimentos para resistir à tempestade.
Fonte: Beatrice/Zé Dirceu.
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