por Flávio Tavares.
O próximo 1º de abril marca os 45 anos do golpe de Estado que, em 1964, depôs o presidente João Goulart e derrubou a ordem constitucional para implantar uma sui generis ditadura, que colocou o Brasil de pernas para o ar fazendo de conta que estávamos sentados. Ou, até, deitados em berço esplêndido, quando, de fato, vivíamos de borco na terra, nádegas ao ar. A data foi fiel ao significado popular do 1º de abril dia do logro, da mentira e do embuste.
Não repetirei o que se sabe sobre os anos ditatoriais - as liberdades tolhidas, as perseguições e limitações ao pensamento e à ciência. (As melhores cabeças foram varridas das universidades. Junto a muitos outros, expulsaram da UFRGS os dois únicos professores merecedores do título de filósofos no Brasil: Ernani Maria Fiori e Gerd Bornheim. O primeiro, católico; o segundo, agnóstico, ambos chamados, porém, de “comunistas subversivos” pela ignorância dos que serviam ao poder militar.)
Não lembrarei que o golpe foi urdido em Washington, na obsessão do militarismo dos EUA de tudo controlar na América Latina. Nem que, quando a direita civil-militar amotinou-se em Minas, a 5ª Frota Naval dos EUA zarpou de Miami rumo a Santos, em ajuda aos golpistas, com o porta-aviões Forrestal à frente, com ordens de bombardear Brasília e Porto Alegre.
Daqueles anos de tudo proibir, lembrarei a censura direta ou indireta aos meios de comunicação.
Jornalista algum podia investigar livremente num ministério ou onde fosse. A polícia se preocupava com os opositores à ditadura, não com os delinquentes, fossem assaltantes de calçada ou ladrões de casaca. Tudo era secreto e a corrupção cresceu amparada no sigilo. A promiscuidade entre ministros e grandes empresários ou líderes sindicais se institucionalizou.
A corrupção é anterior ao golpe. Mas, antes de 1964, era mero acidente a varejo, não uma norma na máquina do Estado. E a regra da ditadura passou à redemocratização. A democracia não tocou no aparelho do Estado. Ao não reformá-lo, o deformou ainda mais nos quase 30 anos que nos separam da anistia política do final de 1979.
Não há sociedade livre sem imprensa livre. Siamesas, uma é continuidade da outra. Quem, nos anos de tudo proibir, investigaria as falcatruas na construção da ponte Rio-Niterói, que corriam de boca em boca nos anos 1970? A principal empresa construtora, Camargo Corrêa, é a mesma que, hoje, está sob investigação da Polícia Federal, suspeita de fraudes por superfaturamento em obras públicas.
Na ditadura, a Polícia Federal se dedicava à repressão política, não em farejar criminosos. Nem havia a inter-relação atual, em que imprensa e autoridade investigam em busca da verdade.
Nos anos de tudo proibir, quem na Procuradoria da República teria a ousadia da procuradora Karen Kahn, mandando a Polícia Federal investigar agora uma poderosa empresa? Na Polícia Federal, quem cumpriria a ordem como obrigação legal?
E quem, na Justiça, se atreveria a ter a independência do juiz paulista Fausto De Sanctis? A alta rapina o transformou em especialista em “crimes de colarinho branco” e o levou a prender os banqueiros Daniel Dantas e Edemar Cid Ferreira. Agora, prendeu quatro diretores da Camargo Corrêa, entre outros, além de quatro “doleiros”, esses banqueiros avulsos que movem bilhões.
Não importa que chovam habeas corpus. Ou que rebaixem de posto o delegado que dirige o inquérito. Já não se pode proibir que se saiba do telefonema em que um diretor da construtora pede enviar dinheiro para o PMDB do Pará, na mesma época em que o Tribunal de Contas suspeitava de que a empresa superfaturara R$ 71,9 milhões em obras na Refinaria do Nordeste.
Os anos do proibir são de ontem.
Fonte:Luis Nassif on line
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